ACADEMIA VERMELHA DE ARTE MILITAR PROLETÁRIO-REVOLUCIONÁRIA MIKHAIL V. FRUNZE :

A ARTE PROLETÁRIA DA INSURREIÇÃO SOCIALISTA

ASPECTOS INTRODUTÓRIOS

 

As Lições da Insurreição de Dezembro de 1905 em Moscou

   

VLADIMIR I. LENIN[1]

 

Concepção e Organização, Compilação e Tradução Rochel von Gennevilliers

Fevereiro 2005 emilvonmuenchen@web.de

Voltar ao Índice Geral http://www.scientific-socialism.de/ArteCapa.htm  

 

 

 

(...) Em 7 e 8 de dezembro de 1905 : greve pacífica, manifestações pacíficas das massas.

Em 8 de dezembro, pela noite : ocupação do prédio do aquário.

Em 9 de dezembro, durante o dia : os Dragões da Cavalaria atacam os participantes de uma assembléia, realizada na Praça Stratsnaia.

Pela noite : demolição da Casa do Violino. Cresce a exasperação.

A massa desorganizada pelas ruas começa a levantar as primeiras barricadas, de modo inteiramente espontâneo e ainda de forma insegura.

Em 10 de dezembro : a artilharia põe-se a disparar nas ruas contra as barricadas e as assembléias das pessoas.

Toda a população encontra-se nas ruas.

Nos principais centros, a cidade inteira é coberta por uma rede de barricadas.

Durante alguns dias, desenvolve-se uma desperada luta de partisãos, travada entre os grupos de luta e as tropas governamentais.

Uma vez desmoralizadas estas por meio da luta em questão, Dubassov é levado a implorar por reforços.

Apenas em 15 de dezembro, as tropas oficiais alcançam uma superioridade decisiva e, em 17 do mesmo mês, o Regimento Semionovsky captura a região metropolitana de Presnia, última fortaleza da insurreição.

Passaram da greve e das manifestações às barricadas avulsas, destas à massiva formação de barricadas e às lutas de rua, travada contra as tropas.

Por além da cabeça das organizações, transitou a luta de massas do proletariato, transitando da greve à insurreição.

Nisso reside a maior de todas as conquistas históricas alcançadas em Dezembro de 1905, uma conquista que, tal quais todas as precedentes, obteve-se ao preço de grandes sacrifícios.

Partindo da greve política de massas, o movimento elevou-se a um nível superior.

Forçou a reação a prosseguir até o último limite, aproximando-se, assim, com passos imensos, do momento em que a revolução passaria ao uso dos meios de ataque, atingindo, igualmente, o último limite.

A reação não pode ir além do bombardeio da artilharia contra barricadas, casas e massas humanas, situadas nas ruas.

A revolução pode ir mais além, até o combate dos grupos de luta de Moscou.

Pode ir muito mais além, em profundidade e amplidão.

E, desde dezembro, a revolução seguiu adiante.

A base da crise revolucionária tornou-se incomensuravelmente mais larga : o calibre de sua arma tem de tornar-se, agora, muito mais pesado.

O proletariado sentiu, antes mesmo de seus dirigentes, a mudança das condições objetivas da luta, a qual exigia a transição da greve à insurreição.

Como sempre, a prática precede à teoria.

A greve pacífica e as manifestações logo deixaram de satisfazer os trabalhadores.

Perguntavam, exigindo intervenção mais ativa : “E agora, o que mais vamos fazer ?”

A orientação para levantar barricadas chegou aos bairros da cidade com um atraso monumental, em um momento em que, no centro, já haviam sido erigidas as primeiras delas.

Os trabalhadores dedicaram-se, em massa, a esse trabalho.

Não se dando, porém, por satisfeitos, perguntavam : “E agora, o que mais vamos fazer ?”, exigindo intervenção ainda mais ativa.

 

A PRIMEIRA LIÇÃO DE DEZEMBRO DE 1905

 

Em Dezembro de 1905, nós, os dirigentes do proletariado social-democrático parecíamos aquele comandante militar que tão absurdamente postou suas tropas, a ponto de a maior parte delas não poder atuar ativamente na batalha.

As massas trabalhadoras procuraram, em vão, por instruções para as suas ações de massas.

Nesse sentido, nada mais míope existe do que a concepção de Plekhanov - defendida por todos os oportunistas - de que não teria sentido algum começar uma greve inoportuna : “Não se deveria ter pêgo em armas”.             

Pelo contrário, dever-se-ia ter recorrido às armas mais resolutamente, mas energicamenta e mais offensivamente.

Dever-se-ia ter esclarecido as massas sobre a impossibilidade de uma greve puramente passiva e sobre a necessidade de uma luta armada, corajosa e impiedosa.

Devemos, agora, finalmente, declarar a todos, de modo claro e inteligível, que as greves políticas são insuficientes.

Devemos agitar entre as amplas massas em favor da Insurreição Armada, sem disfarçar essa questão por meio de qualquer tipo de “estágio precendente”, sem acobertá-la com qualquer coisa que seja.

Ocultar às massas a necessidade de uma guerra amarga, sangrenta, aniquiladora, enquanto tarefa imediata da ação situada pela frente, significa enganar o povo e enganar a si mesmo.

Essa é a primeira lição dos acontecimento de Dezembro de 1905.

 

A SEGUNDA LIÇÃO DE DEZEMBRO DE 1905

 

A segunda lição está relacionada com o caráter da insurreição, o modo como foi executada, as condições de passagem das tropas para o lado do povo.

Na ala direita de nosso Partido, difundiram-se concepções extremamente unilaterais acerca dessa passagem.

Segundo estas, não se poderia lutar contra as modernas tropas oficiais, seria necessário que as tropas governamentais se tornassem revolucionárias etc.

É óbvio que não se pode falar de uma luta séria enquanto a revolução não se transformar em movimento de massas e não envolver também as tropas.

Evidentemente, o trabalho realizado entre estas é imprescindível.

Porém, não se deve conceber essa passagem das tropas como se fosse um simples e único ato, o resultado, por um lado, do convencimento, por outro, da consciência.

A Insurreição de Moscou de 1905 demonstra-nos, ilustrativamente, quão esquemático e distante da realidade é uma tal concepção.

Na prática, a vacilação das tropas que é forçosamente provocada por todo movimento popular verdadeiro conduz, com o aguçamento da luta revolucionária no sentido mais autêntico da palavra, à luta pela Forças Armadas.

A Insurreição de Moscou em questão mostra-nos, precisamente, o quadro de uma luta extremamente amarga e desesperada, travada entre a reação e a revolução em torno das Forças Armadas.

O próprio Dubassov declarou que dos 15.000 homens das tropas governamentais de Moscou apenas 5.000 seriam confiáveis.

O Governo procurou manter recuados os hesitantes através dos meios mais variados e mais desesperados.

Tentou convencê-los, adulá-los, corrompê-los com relógios, com dinheiros etc., não poupando bebidas alcóolicas.

Tratou de enganá-los, intimidá-los, trancafiá-los nos quartéis, desarmá-los, isolando, com o auxílio da traição e da violência, os soldados que eram considerados particularmente indignos de confiança. 

É preciso ter coragem para admitir, aberta e diretamente, que, nesse quadro, permanecemos atrás do Governo.

Não soubemos utilizar as forças de que dispunhamos para uma semelhante luta ativa, ousada e conduzida com iniciativa e ofensiva, pelas Forças Armadas, tal qual o Governo a iniciou e a concluiu.

É certo que já iniciamos a “preparação espiritual” das tropas e vamos dinamizá-la ainda de modo mais insistente.

Porém, seríamos uns tristes pedantes se esquecêssemos que, no momento da insurreição, era necessário também um luta física pelas tropas.

 

LIÇÕES MAGISTRAIS DE “PREPARAÇÃO  ESPIRITUAL” DAS TROPAS

 

O proletariado de Moscou conferiu-nos, nos Dias de Dezembro de 1905, lições magistrais sobre como deve ser essa “preparação espiritual” das tropas.

 

·         Assim, p. ex., em 8 de dezembro de 1905, quando as massas da Praça Strastnaia cercaram os cossacos, misturando-se entre eles e com eles confraternizando-se, levaram a que se retirassem, em galope;

 

·         Em 10 de dezembro, quando, na região metropolitana de Presnia,  duas jovens trabalhadoras, carregando, em meio a um aglomerado de dezenas de milhares de manifestantes, uma bandeira vermelha, precipitaram-se contra os cossacos, gritaram :

 

“Matem-nos ! Pois vivas, não lhes entregaremos jamais a nossa bandeira!” 

 

Os cossacos ficaram confusos e partiram para longe, acompanhados com os gritos das massas : “Viva os cossacos !”

 

Esses exemplos de ousadia e de heroísmo devem ficar gravados para sempre na consciência do proletariado.

 

Agora, porém, alguns exemplos de como ficamos atrás de Dubassov.

 

·         Em 9 de dezembro, soldados marcharam, cantando a Marseillaise, ao longo da Rua Bolschaia Serpukhovskaia, e decidiram aderir aos sublevados.

Os trabalhadores enviaram-lhes delegados. Porém, o próprio Malakhov saltou, desesperadamente, sobre esses soldados.

Os trabalhadores chegaram tarde, Malakhov chegou a tempo.

Discursou candentemente, levou a que os soldados hesitassem, ordino que fossem cercados pelos Dragões da Cavalaria, levou-os de volta aos quartéis e trancafiou-os ali.

Malakhov chegou a tempo, ao passo que nós, não - apesar de que, em dois dias, acudiram à nossa convocação 150.000 pessoas que poderiam e deveriam ter organizado serviço de patrulhas nas ruas.

Malakhov mandou cercar os soldados com os Dragões da Cavalaria. Nós, porém, não cercamos os homens de Malakhov com lançadores de bombas.

Podíamos e devíamos tê-lo feito.

 

·         A imprensa social-democrática (vide o velho “Iskra”) havia indicado que, durante uma insurreição, nossa obrigação é sempre operar a eliminação impiedosa de todos os dirigentes civis e militares do lado adversário.

Mas, o que ocorreu na Rua Bolschaia Serpukhovskaia repetiu-se, aparentemente, em largos traços, diante dos Quartéis Nesvischky e Krutitsky, bem como nas tentativas de o proletariado ”aarrancar para fora” os Yekaterinoslavos, no quadro do envio de delegados aos sapadores, em Alexandrov, no retorno da artilharia de Rostov- que pretendiam enviar a Moscou - no desarmamento dos sapadores, em Kolomna etc.

 

No momento da insurreição, não fomos capazes de cumprir a tarefa de dirigir a luta pela tropas vacilantes.

Dezembro de 1905 confirmou, brilhantemente, uma frase muito profunda de Marx, esquecida pelos oportunistas, a qual afirma que a insurreição é uma arte e que a principal regra dessa arte é a ofensiva, a ser conduzida com ousadia destemida e grande resolução.

Não nos demos suficientemente conta dessa verdade.

Nós mesmos não aprendemos essa arte, essa regra da ofensiva a todo custo, e nisso não educamos as massas.

Precisamos, agora, com toda a energia, recuperar essa perda.

Não basta agrupar pessoas, segundo sua compreensão das consignas políticas : além disso, é imprescindível agrupá-las, segundo seu posicionamento em relação à Insurreição Armada. 

Quem for contra a insurreição, quem não se preparar para ela, deve ser riscado, impiedosamente, do número dos adeptos da revolução e ser contado entre os seus adversários, entre os traidores ou covardes, pois se aproxima o dia em que o curso dos acontecimentos, a situação da luta, forçar-nos-á a separar inimigos e amigos, uns dos outros, segundo esse critério.   

Não devemos propagar passividade, um simples “ficar esperando” que as tropas venham a “passar” para o nosso lado.

Não! Temos de tocar os tambores e proclamar, ampla e abrangentemente, que é indispensável atacar, ousadamente, de arma na mão, que, nesse contexto, é imprescindível aniquilar os dirigentes militares e travar a luta mais enérgica pelas tropas vacilantes.

 

A TERCEIRA LIÇÃO DE DEZEMBRO DE 1905

 

A terceira grande lição que Moscou nos concedeu respeita à tática e organização das forças para a insurreição.

A tática militar depende da natureza da técnica militar : esse fato Engels esclareceu, repetidamente, gravando-o na memória dos marxistas[2].

 

A tática militar é, presentemente, uma outra, em relação àquela de meados do século XIX.

Seria um estupidez avançar, em bandos, contra a artilharia e defender as barricadas com revólveres.

Kautsky tinha razão quando escreveu que, depois da Insurreição de Moscou, estaria em tempo de examinar as conclusões de Engels[3].

 

Moscou haveria criado “uma nova tática de barricadas.” 

Essa tática foi a tática da guerra de partisãos.

A organização condicionada por essa tática foi o destacamento extremamente pequeno e de fácil locomoção : grupos de 10, grupos de 3 e, até mesmo, grupos de 2.

Pode-se, agora, freqüentemente, encontrar entre nós sociais-democratas que começam a rir, às escondidas e em menosprezo, quando se trata de falar de grupos de 5 e de 2.

Porém, com esse escárnio pretendem apenas, de maneira vulgar, esquivar-se do fato de que fecham os olhos diante de uma nova questão de tática e de organização, tal é exigida, na nova condição da técnica militar:  as lutas de ruas.

Leiam atenciosamente o relatório acerca da Insurreição de Moscou, meus caros senhores, e compreenderão que tipo de relação existe entre os “grupos de 5” e a questão da “nova tática de barricadas” !         

Moscou produziu essa tática, porém não a desenvolveu, suficientemente, nem de longe, não a transformou ainda, realmente, em tática das mais amplas massas.

Existiram poucos grupos de luta, as consignas de assaltos audazes não foram incorporadas pelas massas e nem por elas concretizadas.

Os destacamentos de partisãos foram, segundo o seu caráter, demasiadamente homogêneos, suas armas e seus métodos de luta, insuficientes, suas habilidades de dirigirem as massas, apenas pouco formadas.

Temos de reverter tudo isso e vamos fazê-lo, na medida em que apreciemos as lições da Insurreição de Moscou, difundindo essas lições entre as massas, despertando a sua própria força criativa, visando a que sigam desenvolvendo essas lições.

A guerra de partisãos, o terror de massas que é praticado agora, depois de Dezembro, por todos os lados da Rússia, quase que de modo ininterrupto, ajudarão, sem dúvida alguma, as massas a aprenderem que, no momento da insurreição, devem empregar a tática correta.

A Social-Democracia deve aprovar esse terror de massas e torná-lo parte integrante de sua tática.

Nesse quadro, há, naturalmente, de organizá-lo e controlá-lo, subordinando-o aos interesses e condições do movimento operário e da luta revolucionária geral, eliminando e exterminando, impiedosamente, as distorções “lumpen-proletárias” dessa guerra de partisãos.

Esssas distorções foram magnifica e implacavelmente afastadas pelos moscovitas, nos dias da insurreição, e pelos letões, nos dias das tão mencionadas Repúblicas da Letônia.

 

Nos tempos mais recentes, a técnica militar realiza, novamente, novos progressos.

A Guerra do Japão introduziu a granada de mão.

Aa fábricas de armamentos levaram ao mercado o fuzil automático.

Ambos foram, em verdade, já empregados, exitosamente, na Revolução Russa de Dezembro de 1905, porém, de longe, ainda, em medida insuficiente.

Podemos e devemos lançar mão de aperfeiçoamentos técnicos, devemos ensinar os destacamentos operários a produzirem bombas em massa, ajudar nossos grupos de luta e os destacamentos operários a providenciarem estoques de materiais e ignições explosivas e fuzis automáticos.

Se as massas operárias participarem da insurreição na cidade, se assaltarem o inimigo, se as lutas pelas tropas – que, depois da Duma, depois de Sveaorg e Kronstadt, vacilam ainda mais – for dirigida de modo capaz e decisivo, assegurando-se a participação das pequenas povoações na luta comum, obteremos a vitória na próxima Insurreição Armada, que abarcará toda a Rússia !

Por isso, queremos, apoiados nas lições das grandes jornadas da Revolução Russa de Dezembro de 1905, desenvolver mais amplamente nossa tarefa, impulsionando-a mais intrepidamente.

Nosso trabalho funda-se na correta apreciação dos interesses de classe, bem como em tudo aquilo que exige, no período presente, o desenvolvimento do povo em seu conjunto.

A consigna com a qual reunimos e reuniremos uma parte cada vez maior do proletariado, do campesinato e das tropas é esta : derrubada do Poder Czarista e convocação da Assembléia Constituinte por um Governo Revolucionário.

O desenvolvimento da consciência das massas constituirá, assim como sempre, o fundamento e o principal conteúdo de todo o nosso trabalho.      

Não nos esqueçamos, porém, de que, em um período como o que vivenciamos presentemente na Rússia, associam-se tarefas especiais a essa tarefa geral, permanente e importantíssima.

Não nos queremos transformar em pendantes e filisteus, esquivando-nos ao cumprimento das tarefas especiais do momento - tarefas especiais determinadas pelas formas de luta concretas - mediante indicações vagas dos nossos deveres imodificáveis, cumpridos a todo e qualquer tempo, deveres permanentes, em todas as circunstâncias.

 

Sejamos conscientes do fato de que se aproxima uma grande luta de massas.

Essa luta será a Insurreição Armada.

De acordo com as possibilidades, deverá ter lugar em todas as localidades, ao mesmo tempo.

As massas devem saber que se dirigem a uma luta armada, sangrenta e implacável.

O desprezo pela morte há de envolvê-las, assegurando-lhes a vitória.

A ofensiva contra o inimigo deve ser executada, da maneira mais enérgica possível.

O ataque – e não a defesa – deve ser a consigna das massas.

A aniquilação impiedosa do inimigo será a sua tarefa.

A organização da luta será móvel e elástica.

Os elementos hesitantes das Forças Armadas serão arrastados para a luta ativa.

Nessa grande luta, o Partido do proletariado, dotado de consciência de classe, deve cumprir o seu dever.

 

 

ACADEMIA VERMELHA DE ARTE MILITAR PROLETÁRIO-REVOLUCIONÁRIA MIKHAIL V. FRUNZE

ESTUDOS MILITARES SOCIALISTAS-INTERNACIONALISTAS

DEDICADOS À FORMAÇÃO

DE TRABALHADORES, SOLDADOS E MARINHEIROS MARXISTAS REVOLUCIONÁRIOS

 

EDITORA DA ESCOLA DE AGITADORES E INSTRUTORES

“UNIVERSIDADE COMUNISTA J. M. SVERDLOV”

PARA A FORMAÇÃO, ORGANIZAÇÃO E DIREÇÃO MARXISTA-REVOLUCIONÁRIA

DO PROLETARIADO E SEUS ALIADOS OPRIMIDOS

MOSCOU - SÃO PAULO - MUNIQUE – PARIS

 

 



[1] Cf. LENIN, VLADIMIR I. Uroki Moskovskovo Vosstania (Lições da Insurreição de Moscou) (26 de Agosto de 1906), in : V. I. Lenin. Polnoe Sobranie Sotchinenii (Obras Completas de V. I. Lenin) , Vol. 13, Moscou : GIPL, 1961, pp. 369 e s. Assinale-se, por oportuno, que o presente texo de Lenin foi publicado, logo a seguir, no dia 29 de agosto de 1906, nas páginas do Nr. 2 do jornal bolchevique ilegal “Proletari (O Proletário)”.

[2] Acerca do tema, assinalamos ao leitor que cumpre examinar não apenas a obra ENGELS, FRIEDRICH. Revolution und Konterrevolution in Deutschland (Revolução e Contra-Revolução na Alemanha) (Agosto de 1851 a Setembro de 1852), especialmente Capítulo 17 : Der Aufstand (A Insurreição) (Agosto de 1852), in : Karl Marx und Friedrich Engels Werke (Obras de Marx e Engels), Vol. 8, Berlim : Dietz Verlag, 1960, pp. 3 e s., senão ainda suas inúmeras considerações elaboradas nesse sentido, contidas em IDEM. Herrn Eugen Dühring’s Umwälzung der Wissenschaft (A Subversão da Ciência do Sr. Eugen Dühring) (Setembro de 1876 – Junho de 1878), in : ibidem, Vol. 20, Berlim : Dietz Verlag, 1962, pp. 1 e s.   

[3] Anotação de Emil Asturig von München: Trata-se aqui de uma referência à célebre introdução de Engels à obra de Karl Marx, intitulada ”Lutas de Classe na França de 1848 a 1850”.  Impende anotar que, entre 14 de fevereiro e 6 de março de 1895, Engels redigiu sua “Introdução à Luta de Classes na França de 1848 a 1850 de Karl Marx”, a qual foi publicada no curso do mesmo ano, na cidade de Berlim. Depreende-se, entretanto, de uma carta de Richard Fischer, dirigida a Engels, em 6 de março de 1895, que a direção do Partido Social-Democrático da Alemanha (SPD) exigiu de Engels uma atenuação do tom linguístico-revolucionário, contido em sua referida “Introdução”. Na carta de resposta de Engels a Fischer, datada de 8 de março de 1895, verifica-se, além disso, que Engels contestou, detalhadamente, as preocupações que a direção do SPD levantava, elucidando, inequivocamente, sua posição jurídico-político-revolucionária. A crítica de Engels dirigia-se contra a atitude irresoluta da direção do SPD, encabeçada por August Bebel, Wilhelm Liebknecht, Karl Kautsky, Eduard Bernstein, Richard Fischer etc. – e sua pretensão de intervir exclusivamente no quadro da legalidade burguesa. Engels foi obrigado, entretanto, a fazer certas alterações léxicas e gramaticais em seu texto original, bem como eliminar, inteiramente, certas passagens, em que realçava a necessidade da luta armada do proletariado vindoura contra a burguesia. Baseados no texto dessa notável “Introdução”, alguns célebres dirigentes do SPD empreenderam, a seguir, a tentativa de deformar os posicionamentos de Engels, incluindo-o entre os adeptos da via pacífica “quand même (EvM.: custe o que custar)”, para a tomada do poder pela classe trabalhadora. Nesse sentido, em 30 de março de 1895, publicou-se, no “Vorwärts (Avante)”, um artigo editorial, intitulado “Wie man heute Revolutionen macht (Como se Fazem Revoluções Hoje)”, em que diversas citações, extraídas aleatoriamente da “Introdução” de Engels, produziam a falsa impressão de que Engels haver-se-ia tornado “ein friedfertiger Anbeter der Gesetzlichkeit quand même(EVM.: um venerador pacifista da legalidade, sob todas as condições)”. Assim, o texto de de Engels foi deformado, por ocasião de sua publicação em 1895, realizada pela Social-Democracia Alemã e, então, por ela interpretada enquanto rejeição expressa de Engels à insurreição armada e à luta de barricadas. Apenas posteriormente, surgiu publicado, na URSS, o texto integral da introdução em referência.

Logo depois da reedição da obra de Marx em questão, Engels exigiu, energicamente, que sua “Introdução” fosse publicada, na íntegra, na revista “Neue Zeit (O Novo Tempo)”. Sem embargo, o Nr. 27/28, 2 Vol. 13° Ano, 1894/95 dessa revista decidiu-se por publicar apenas a “Introdução” com as alterações e as supressões referidas que Engels fora forçado a efetuar, sob pressão da direção do SPD. Entretanto, a despeito destas, é efetivamente possível verificar que a “Introdução” em causa preserva, ainda assim, seu caráter revolucionário, pouco podendo prestar-se às degenerações de posições, contidas no artigo editorial do “Vorwärts(Avante)”, intitulado “Wie man heute Revolutionen macht (Como se Fazem Revoluções Hoje)”. Neste comenos, uma publicação integral da “Introdução” de Engels não teve em lugar, na Alemanha, antes de eliminado o perigo de promulgação de uma nova Lei contra os Socialistas. Para um exame integral do texto em apreço, vide ENGELS, FRIEDRICH. Einleitung zu Karl Marx’ Klassenkämpfe in Frankreich 1848 bis 1850(Introduçao à Luta de Classes na França de 1848 a 1850)(1895), in : ibidem, Vol. 27, pp. 509-527. Sobre o pano de fundo dos métodos utilizados pela corrente oportunista de Liebknecht, Bebel e Kautsky, visando ao impulsionamento de suas disputas políticas de outrora, dá-nos conta, precisamente, Engels, em 3 de abril de 1895, poucos meses antes de sua morte, em uma de suas cartas enviadas a Paul Lafargue, ao protestar contra as amputações literárias realizadas por Wilhelm Liebknecht em sua “Introdução” referida: “Wilhelm Liebknecht aplicou-me, agora mesmo, um golpe de mau gosto. Retirou de minha introdução aos ensaios de Marx sobre a França, de 1848 a 1850, tudo aquilo que lhe podia servir, para apoiar, a todo custo, a tática pacífica e refutadora da violência. Essa tática, adora pregá-la, desde algum tempo e particularmente nesse momento em que, em Berlim, estão sendo preparadas Leis de Exceção. Recomendo uma tática do gênero apenas e tão somente para a Alemanha de hoje, fazendo-o, ainda, com reservas consideráveis. Para a França, a Bélgica, a Itália e a Áustria, essa tática não é adequada, em seu conjunto, e, mesmo para a Alemanha, pode demonstrar-se inaplicável já no dia de amanhã.  Peço-lhe, portanto, que espere pelo artigo completo, antes de julgar – provavelmente este aparecerá no “Neue Zeit(Novo Tempo)”. Espero, de um dia para o outro, exemplares das brochuras. É lamentável que Wilhelm Liebknecht veja apenas o preto e o branco. Para ele, as nuances não existem. Além disso, as coisas estão quentes na Alemanha, o que promete um fim de século grandioso. ...” Cf. ENGELS, FRIEDRICH. Brief an Paul Lafargue in Le Perreux(Carta a P. Lafargue em Le Perreux)(3 de Abril de 1895), in : ibidem, Vol. 39, p. 458.

Após a morte de Engels, os dirigentes oportunistas e revisionistas do SPD propagandearam, de modo deformado, as posições engelsianas, constantes em sua “Introdução”, como forma de reforçar, até a exaustão, sua tática pacífica e refutadora da violência. Impediram, sistematicamente, que os trabalhadores e militantes de base tivessem acesso ao texto original e integral da “Introdução”. Calaram-se sobre o fato de haverem forçado Engels a operar certas modificações léxicas e gramaticais em seu texto, a fim de aliviar o seu tom revolucionário. Alegaram que, em sua “Introdução” – apregoada como seu definitivo “politiches Vermächtnis(legado político)” -  Engels haveria aderido ao reformismo e ao pacifismo, abdicando de suas posições revolucionárias precedentes. 

Falar-se do SPD, pura e simplesmente, como se fosse o “Partido de Engels” - sem destacar a luta travada por esse último contra o filistinismo do “livre pensar” -,  constitui um equívoco patente : caberia falar ou do Partido Social-Democrático da Alemanha (SDAP/SAPD/SPD) com que Marx e Engels colaboraram criticamente a partir da Inglaterra – pois, ambos haviam sido expulsos da Alemanha, logo após a Revolução de 1848 – 1849, tendo sido Marx forçado a tornar-se apátrida - ou do Partido que se opunha à orientação de Marx e Engels, em vez de falar, sem mais nem menos, do “Partido de Engels”. Cabe, em verdade, a Ernst Mandel e aos incorrigíveis adeptos e colaboradores do mandelismo, distribuídos pelos mais diversos partidos, sindicatos, institutos culturais e órgãos de imprensa da atualidade, defenderem - no estilo de Daniel Bensaïd - a tese arenosa de que o “Partido de Engels” se integrou ao imperialismo alemão, por permanecer em sua “velha e preservada tática”, finalmente antagonizada por Rosa Luxemburgo. Vide MANDEL, ERNST. Rosa Luxemburg und die deutsche Sozialdemokratie (Rosa Luxemburgo e a Social-Democracia Alemã) (Março de 1971), in: Ernst Mandel – Karl Mandel. Rosa Luxemburg Leben – Kampf – Tod (Vida – Luta – Morte), Frankfurt a.M. : isp – Verlag, Mai 1986, pp. 46 e s.  Por outro lado, cumpre destacar que a grandiosa e corajosa luta travada pela águia revolucionária do proletariado, Rosa Luxemburgo contra a direção social-reformista do Partido Social-Democrático Alemão (SPD), possuía como elementos de enfraquecimento a própria postura equivocada de Rosa Luxemburgo. Defendendo, por um lado, a derrubada de Wilhelm II, Rosa mantinha invariável sua posição que rejeitava abertamente o Direito de auto-determinação das nações oprimidas – contra a orientação de Marx e Engels -, propugnava uma teoria de acumulação do capital inteiramente revisionista – contra os posicionamentos de Marx e Engels -, postulava, nas lutas proletárias, uma defesa essencialmente democratista de direitos e liberdades fundamentais para todos os indivíduos e organizações sociais – contra a concepção de Marx e Engels  -, repudiava a teoria de Partido centralizado – contra a concepção de Marx e Engels -, o que, sem dúvida, favorecia estrategicamente, em grande parte, as posições do social-reformismo e do oportunismo organizativo da Social-Democracia Alemã. Entre os proletários revolucionários alemães desse período histórico encontraremos também aqueles que, não apenas defendendo a derrubada do Imperador Alemão, inclinavam-se também – ainda que intermediados por Karl Radek - a favor da defesa do modo de funcionamento e da linha geral internacionalista do Partido Bolchevique de Lenin. Reuniam-se em torno de Paul Fröhlich, Johan Knief e Julian Borchard e de seu trabalho surgiram também importantes sustentáculos, indispensáveis à fundação do Partido Comunista da Alemanha (Liga Spartakus), em fins de 1918 e início de 1919.