ACADEMIA VERMELHA DE ARTE MILITAR PROLETÁRIO-REVOLUCIONÁRIA MIKHAIL V. FRUNZE :

A ARTE PROLETÁRIA DA INSURREIÇÃO SOCIALISTA

ASPECTOS INTRODUTÓRIOS

 

As Ações de Luta dos Sublevados Durante uma Insurreição:

Características das Lutas de Rua - Observações Preliminares

  

MIKHAIL N. TUKHATCHEVSKY[1]

 

Concepção e Organização, Compilação e Tradução Rochel von Gennevilliers

Fevereiro 2005 emilvonmuenchen@web.de

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“A força não se encontra nos números, mas sim nas táticas revolucionárias.”

 

Jakob M. Sverdlov

citado em E. N. Burdjalov. Acerca da Tática dos Bolcheviques

em Março e Abril de 1917, in : Voprossy Istorii (Questões da História), Nr. 4,

Abril de 1956, p. 54  

                                                                                                                                                          

No capítulo precedente, tratamos da questão da luta de rua, no sentido apropriado dessa expressão, tão somente em traços inteiramente genéricos.

O centro de gravidade daquele capítulo residiu na apresentação das regras táticas fundamentais segundo as quais é necessário que nos guiemos, no contexto da elaboração de um plano para a insurreição armada.

Esse plano prevê combates primordialmente de assalto das forças de luta do proletariado, no início da insurreição.

 

SOBRE A POSSIBILIDADE DESTRUIÇÃO

 DO PODER DO ESTADO BURGUÊS-CAPITALISTA

POR MEIO DE UM ÚNICO GOLPE ANIQUILADOR

 

É difícil, porém, imaginar uma situação em que o proletariado será capaz de destruir o poder do Estado da classe definhante, por meio de um único golpe, de curta duração, ainda que este seja poderoso, conseguindo aniquilar a sustentação armada do Estado em questão, a saber : as forças armadas regulares, a polícia e as organizações voluntárias de  para-militares que o apóiam.

Em todo caso, deve-se conjecturar acerca de uma semelhante situação possível apenas como hipótese excepcional, em relação a uma cidade isolada, para não se falar de um país inteiro. 

Se o inimigo de classe não tiver ainda se envolvido, firme e definitivamente, em contradições, conservando até então, também razoavelmente, sua capacidade de defender suas posições dominantes, as ações primordiais de luta das forças armadas do proletariado podem e devem  conduzir à captura de armas e ao armamento das amplas massas da classe trabalhadora e dos elementos proletários, em geral, que estejam dispostos a lutar pela revolução, com armas nas mãos, e por ela morrerem.

Essas ações devem levar à organização de insurreições em setores das tropas, visando a arrastá-las, levando-as para o lado do proletariado revolucionário.

Tais ações devem conduzir à tomada de objetos táticos vantajosos, visando à liquidação de, no mínimo, uma parte dos dirigentes da contra-revolução.

Em uma palavra : essas ações podem e devem assestar golpes mais amplo possíveis, de ordem material e político-moral, no inimigo de classe do proletariado, criando, dessa forma, a correlação de forças das tropas de luta mais favorável ao proletariado, bem como os pressupostos para a subseqüente luta vitoriosa, destinada à consolidação definitiva do Poder Proletário.

Os ensinamentos das insurreições armadas confirmam a correção dessa regra, com seguranca categórica.

Se o desejo de derrotar o inimigo de classe através de um único golpe aniquilador pode ainda ser tão sedutor, revela-se como praticamente irrealizável, se considerarmos que:

 

1)    também o adversário de classe prepara-se para uma luta desesperada; e

 

2)    que, para ele, os ensinamentos das lutas já transcorridas não são baldados.

 

PREPARAÇÃO PARA UMA LUTA MAIS OU MENOS PROLONGADA

 

O proletariado que se prepara para a insurreição tem de estar em guarda e preparado para uma duração mais ou menos prolongada da luta armada, com vistas a quebrar definitivamente a resistência das classes dominantes.

As condições da luta que surgirão depois do assalto geral, original e repentino, das organizações de luta do proletariado, serão essencialmente distintas das condições existentes até o momento de deflagração desse assalto.

A iniciativa relacionada com o começo da insurreição - vale dizer com o principiar das ações de luta, provocadas pelas forças armadas de combate dos sublevados - encontrar-se-á no quadro de uma preparação planejada da insurreição, colocada nas mãos do proletariado.

 

SOBRE O INFORMAÇÃO DAS CLASSES DOMINANTES

 ACERCA DA INSURREIÇÃO PROLETÁRIA DE MASSAS

 

As classes dominantes estarão indubitavelmente informadas sobre a insurreição de massas que se encontra em preparação.

Porém, ainda que o inimigo de classe pressinta o aproximar-se das lutas decisivas, permanecer-lhe-á desconhecido seja o momento para o qual se prevê o início da insurreição, seja a seqüência de seu desencadeamento, na hipótese de o processo insurreicional ser corretamente preparado e organizado, velando-se pela necessária conspiração a ser empreendida.

 

MOMENTO DA SUBORDINAÇÃO

DOS DEMAIS TIPOS DE LUTA DE CLASSES À LUTA ARMADA

 

Uma situação inteiramente distinta surge, porém, depois de que os primeiros golpes da organização de luta do proletariado forem desferidos contra os objetos do velho poder, colocados em questão.

A partir de então, encontrar-se-ão ambos os lados combatentes em uma situação de Guerra Civil, aberta e impiedosa.

Todos os demais tipos de luta de classes ficarão subordinados, a partir desse momento, precisamente à luta armada.

Toda a vida, normal e costumeira, da cidade em causa suspende, transitoriamente, suas funções, concentrando-se a atenção pública nas ações de luta das partes litigantes.

Por causa dessas ações, manter-se-á a respiração suspensa.

 

MÉTODOS TÁTICOS DAS LUTAS DE RUA

 

As distintas condições situacionais ditam a necessidade de diferentes métodos táticos de luta.

A luta armada, ocorrida sob as condições de insurreição proletária, adquire o caráter de lutas nas ruas da cidade.

A tática das lutas de rua é uma variante da tática geral militar que se submete, fundamental e inteiramente, às mesmas regras, tais quais a tática geral das forças armadas regulares.

A tarefa dos capítulos subseqüentes é a apresentação das regras táticas fundamentais dos diferentes tipos de ações de luta nas ruas de uma cidade, tendo-se em consideração as particularidades específicas, próprias dessa tática, no contexto de sua aplicação pelos insurgentes, i.e. pelas forças armadas irregulares de combate, durante o curso de uma insurreição.

Na medida em que, no capítulo precedente, penetramos, de modo bastante detalhado, em uma série de momentos geralmente táticos - tal qual, exemplificativamente, a necessidade de empregar o momento de surpresa na luta, o princípio das vitoriais parciais, i.e. a concentração das principais forças, voltando-as para a direção principal, a necessidade de dinamismo e pertinácia na luta etc. -, não nos ocuparemos, doravante, com essas regras táticas, do ponto de vista de seu significado geral. 

 

 

 

DURAÇÃO DAS LUTAS DE RUA

 

A duração das lutas de rua, praticadas sob as condições de insurreição proletária, depende de toda uma série de circunstâncias e, sobretudo, da correlação de forças dos combatentes.

Em conformidade com as circunstâncias e a situação dada, essa duração será respectivamente distinta.

A experiência histórica demonstra que não se pode contar com um transcurso particularmente rápido das lutas de rua.

Em Moscou, em 1917, tais lutas duraram aproximadamente uma semana. Em Hamburg e em Cantão, mais de dois dias. Em Xangai, 28 horas. Em Reval (RvG.: Tallin, capital da Estônia), duraram de três a quatro horas.

Nesse último caso, a correlação de forças das unidades revolucionárias de combate, disponíveis e ativas, era inequivocamente desfavorável para os sublevados. Através disso, esclarece-se também o rápido transcurso das lutas, em Reval.

 

CARÁTER IMPIEDOSO DAS LUTAS DE RUA

 

Nas condições por nós investigadas, as lutas de rua possuem um caráter em grande medida impiedoso, no sentido de implicarem na aniquilação física do inimigo de classe.

Qualquer sentimento de humanidade em face desse inimigo de classe, assediado pelo proletariado durante sua insurreição, produz desnecessárias dificuldades na luta, acarretando uma efetiva catástrofe para a insurreição, com circunstâncias efetivamente desfavoráveis.

Essa regra fundamental foi compreendida, integralmente, pela burguesia.

Todos as insurreições que acabaram em um fiasco para o proletariado demonstram com que brutalidade desumana as classes dominantes acertam as contas com seu adversário de classe.

A mesma brutalidade é inteiramente empregada, também durante a luta armada.

Com base nas experiências das insurreições proletárias, ocorridas na Alemanha e na Rússia, W. Balk, o teórico militar da burguesia alemã, escreve acerca dessa questão do seguinte modo :

 

"Prisões em massa de sublevados produzem grandes incômodos, porquanto não é, costumeiramente, possível acomodá-los em nenhum lugar.

O que deve acontecer com os sublevados que forem encontrados com armas na mão, será determinado pelas ordens correspondentes.

Em todo caso, não poderão esperar nenhum tratamento demasiadamente clemente, da parte dos oficiais e soldados, encolerizados pelas lutas travadas nas ruas e, particularmente, nas habitações."[2]

 

 

Todo mundo sabe o que as "ordens correspondentes" determinam sobre o tratamento a ser concedido aos sublevados.

Todos os aprisionados, integrantes de uma tropa de luta, e, em geral, todos os que tenham até mesmo o mínimo a ver com a insurreição serão fuzilados, um por um.

Esse ensinamento, extraído pela burguesia da experiência da Guerra Civil deve ser respeitado também pelo proletariado.

 As lutas de rua representam um tipo especialmente difícil de luta.

Em uma Instrução Britânica, concernente às lutas de rua, consta o seguinte :

 

"Nenhum tipo de guerra exige uma direção tão talentosa da parte dos dirigentes de tropas mais inferiores, bem como um correspondente exemplo de coragem pessoal, haja vista o sistema de combate em espaço estreito e em luta corpo-a-corpo, como ocorre no caso das lutas de rua.

As lutas de rua apontam para uma imensa quantidade de dificuldades, desconhecidas no quadro das lutas habituais.

Todo dirigente de tropa que se envolva em lutas de rua, sem contar com precedente instrução relativamente a ela, pode ser facilmente derrotado."

 

Essa regra fundamental, contida na referida instrução, redigida para os oficiais das forças armadas britânicas, deve ser também carinhosamente observada pelos dirigentes das unidades revolucionárias sublevadas. 

 

 

 

ACADEMIA VERMELHA DE ARTE MILITAR PROLETÁRIO-REVOLUCIONÁRIA MIKHAIL V. FRUNZE

ESTUDOS MILITARES SOCIALISTAS-INTERNACIONALISTAS

DEDICADOS À FORMAÇÃO

DE TRABALHADORES, SOLDADOS E MARINHEIROS MARXISTAS REVOLUCIONÁRIOS

 

EDITORA DA ESCOLA DE AGITADORES E INSTRUTORES

“UNIVERSIDADE COMUNISTA J. M. SVERDLOV”

PARA A FORMAÇÃO, ORGANIZAÇÃO E DIREÇÃO MARXISTA-REVOLUCIONÁRIA

DO PROLETARIADO E SEUS ALIADOS OPRIMIDOS

MOSCOU - SÃO PAULO - MUNIQUE – PARIS

 

 

 

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BREVES REFERÊNCIAS BIOGRÁFICAS DE

 

        TUKHATCHEVSKY, MIKHAIL 

por Rochel von Gennevilliers

 

 

Mikhail Tukhatchevsky nasceu em 1893, na cidade de Slednevo, na Rússia Czarista, no seio de uma família nobre.

Sem embargo, tornou-se, ao longo de sua vida, uma das mais expressivas personalidades revolucionárias das Forças Armadas Vermelhas.

Em 1914, graduou-se na Academia Militar Aleksandersk.

Como cadete e tenente das Forças Armadas Czaristas, combateu ativamente na I Guerra Mundial Imperialista.

Após a vitória da Revolução Socialista de Outubro de 1917, Tukhatchevsky aderiu, de corpo e alma, ao bolchevismo, tornando-se oficial das Forças Armadas Vermelhas.

Já em 1918, assumiu a defesa militar revolucionária de Moscou.

Acerca desse fato, assinalou Trotsky :

 

Tukhatchevsky não apenas ofereceu seus serviços às Forças Armadas Vermelhas, senão ainda se tornou comunista.

Distinguiu-se, quase imediatamente, no fronte e, dentro de um ano, tornou-se General do Exército Vermelho.

Seu brilhantismo como estrategista foi reconhecido por inimigos de classe que o admiravam, dele caindo como vítimas.”[3]

 

Em 1920, Trotsky investiu-o no Comando do V Exército Vermelho. Nessa condição, Tukhatchevsky organizou a captura da Sibéria e a derrota do General Branco Alexander Koltchak.

Ainda em 1920, contribuiu resolutamente para a derrota do General Branco Anton Denikin, na região da Criméia.

Combateu na Campanha da Polônia de 1920, exercendo funções de principal comandante das Forças Armadas Vermelhas.

Como um dos principais dirigentes militares, foi, em março de 1921, incumbido do esmagamento da Insurreição Armada Contra-Revolucionária de Kronstadt.

Mesmo opondo-se a Stalin e Voroshilov, serviu, a seguir, entre 1925 e 1928, como Chefe do Corpo de Comando e Vice-Comissário da Defesa, quando deu início a um amplo processo de reorganização do sistema militar soviético.

Tornou-se, ainda, em 1935, Marechal das Forças Armadas Vermelhas, quando demonstrou possuir expressiva ousadia e independência, em seu intento de proteger o sistema militar soviético em face das intromissões desmedidas, efetuadas pela GPU stalinista nesse domínio do Estado Soviético. 

Em junho de 1937, Tukhatchevsky e outros sete altos comandantes soviéticos foram presos e acusados pelo stalinismo burocrático-soviético contra-revolucionário de atuarem como conspiradores em defesa dos interesses da Polícia Secreta Alemã (Gestapo).

Denunciado por Karl Radek como um dos Marechais Soviéticos colaboradores da oposição democrático-soviética, foi, em 1937, julgado culpado e sumariamente executado.

Acerca das falaciosas acusações levantadas pelo stalinismo contra Tukhatchevsky e todos os comandantes das Forças Armadas Vermelhas da Guerra Civil, Trotsky escreveu, com grande retidão :

 

“Todos os que dirigiram as Forças Armadas Vermelhas durante o período stalinista – Tukhatchevsky, Yegorov, Blücher, Budenny, Yakir, Uborevitch, Garmarnik, Dybenko, Fedko, Kork, Putna, Feldman, Alksnis, Eidemann, Primakov e muitos outros – foram, cada qual a seu tempo, promovidos a postos de responsabilidade militar quando estive à cabeça do Comissariado de Guerra.

Foram, na maioria dos casos, promovidos por mim pessoalmente, durante minhas rondas nos frontes e minha direta observação de seus trabalhos de guerra.

Ainda que o meu próprio comando houvesse sido ruim, foi, aparentemente, bom o suficiente para ter selecionado os melhores dirigentes militares disponíveis, uma vez que Stalin, por mais de dez anos, não pôde encontrar ninguém para substituí-los.

Em verdade, quase todos os comandantes das Forças Armadas Vermelhas da Guerra Civil, todos os que subseqüentemente construíram nossas Forças Armadas, revelaram-se, no final das contas, «traidores» e «espiões». Porém, isso não altera a questão : foram esses homens que defenderam a Revolução e o país.”[4]

 

E, além disso, enfatizou :

 

O Governo Soviético não apenas prendeu e executou seu Comissário da Guerra em exercício, Tukhatchevsky, senão além disso e sobretudo, exterminou todo o corpo de comando mais antigo do Exército, da Marinha e da Aeronáutica.

Auxiliado por correspondentes estrangeiros complacentes, situados em Moscou, a propaganda da máquina stalinista tem enganado sistematicamente a opinião pública do mundo sobre o estado atual das coisas na União Soviética.

O governo stalinista monolítico é um mito.”[5]

 

 

 

 

 

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[1] Cf. TUKHATCHEVSKY, MIKHAIL N. Die Kampfhandlungen von Aufständischen zu Beginn eines Aufstandes. Grundlegende taktische Regeln (As Ações de Luta dos Sublevados no Início de uma Insurreição. Regras Táticas Fundamentais), in : A. Neuberg. Der bewaffnete Aufstand. Versuch einer theoretischen Darstellung(A Insurreição Armada. Tentativa de uma Apresentação Teórica), Frankfurt a. M. : Georg Wagner, 1971, pp. 239 e s.

[2] Cf. W. BALK. Die Taktik des Straßenkampfes(A Tática da Luta de Rua), in : Monatshefte für Politik und Wehrmacht (Caderno Mensal de Política e Poder Militar), 1919.

[3] Cf. TROTSKY, LEV DAVIDOVITCH. Stalin (1941), Capítulo : The Civil War (A Guerra Civil), Londres : Hollis and Carter, 1947, p. 327.

[4] Cf. IDEM. ibidem, Livro II, Capítulo : A Guerra Civil, Benson-Vermont: Felshtinsky, 1985, p. 269.

[5] Cf. IDEM. ibidem, Livro II, Capítulo : Kinto no Poder, Benson-Vermont: Felshtinsky, 1985, pp. 420 e s.