FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E POLÍTICOS DO MARXISMO
REVOLUCIONÁRIO
PARA A LUTA DE CLASSES PROLETÁRIA,
TRAVADA EM PROL DA CONSTRUÇÃO DE UMA SOCIEDADE
MUNDIAL
SEM EXPLORAÇÃO DO HOMEM PELO HOMEM, SEM
EXPLORAÇÃO DE NAÇÕES POR NAÇÕES
CARTA DE FRIEDRICH ENGELS
a Walther Borgius
(Heinz Starkenburg)
25 de Janeiro de 1894
FRIEDRICH ENGELS[1]
Concepção e Organização, Compilação e
Tradução Emil Asturig von
München
Publicação em Homenagem a Portau Schmidt von
Köln
Outubro 2007 emilvonmuenchen@web.de
Voltar ao Índice Geral http://www.scientific-socialism.de/FundamentosCartasMarxEngelsCapa.htm
Londres,
25 de janeiro de 1894
122,
Regents’ Park Road, N.W.
Prezado
Senhor,
Eis
aqui a resposta às suas perguntas :
1. Por relações econômicas, as quais consideramos como sendo a base
determinante da história da sociedade, entendemos o modo e a maneira segundo os
quais os seres humanos de uma determinada sociedade produzem a sua subsistência
e trocam entre si os produtos (na medida em que existe divisão do trabalho).
Portanto,
toda
a técnica da produção e dos transportes encontra-se incluída nessas
relações.
Em
consonância com nossa concepção, essa técnica determina igualmente a forma
e o modo das trocas, bem como a distribuição dos produtos e, com isso, após a
dissolução da sociedade gentílica, também a repartição das classes e, assim,
determina, adicionalmente, as relações de dominação e subjulgação e, com isso,
o Estado,
a política, o Direito etc.
Além
disso, nas relações econômicas estão incluídas tanto a base geográfica, sobre
a qual essas relações se desenrolam, quanto os resquícios efetivamente
transmitidos por fases precedentes de desenvolvimento econômico que se
mantiveram, transmissão essa ocorrida, freqüentemente, apenas por tradição ou
por vis
inertiae (EvM.: por força da inércia).
Naturalmente,
inclui-se nas relações econômicas também o meio que se projeta para o exterior
e envolve essa forma de sociedade.
Se a técnica,
tal como dizemos, depende, é verdade, em grande parte, do nível da ciência, depende
esta ainda muito mais do nível e das necessidades da técnica.
Possuindo
a sociedade uma necessidade técnica, esta ajuda mais a ciência a avançar do que
dez universidades juntas.
Toda a
hidrostática (Torricelli etc.) foi
criada por causa da necessidade de regulação das correntes das montanhas da Itália,
nos séculos XVI e XVII.
Sobre a
eletricidade soubemos apenas alguma coisa de racional depois de que sua
aplicação técnica ter sido descoberta.
Porém,
na Alemanha,
adquiriu-se, lamentavelmente, o hábito de escrever a história das ciências
como se estas tivessem caído do céu.
2. Consideramos as condições econômicas como o aquilo que condiciona, em última
instância, o desenvolvimento histórico.
Mas, a
própria raça é um fator econômico.
Muito
bem. Há aqui, porém, dois pontos que não devem ser desprezados.
A) O desenvolvimento
político, jurídico, filosófico, religioso, literário, artístico etc.
assenta-se sobre o desenvolvimento econômico.
Nada
obstante, todos eles reagem também uns sobre os outros e sobre a base
econômica.
Isso
ocorre não porque a situação econômica seja a única causa ativa e todo
o resto, apenas efeito passivo.
Mas sim
trata-se, pelo contrário, da interação, fundada na necessidade econômica que se
impõe sempre, em última instância.
P.ex.,
o Estado intervém por meio de tarifas protecionistas, livre comércio, boa ou má
tributação.
E até
mesmo o esgotamento e a impotência fatais do filisteu alemão, resultantes da
miserável situação econômica da Alemanha, havida de 1648 a
1830, as quais se manifestaram, de
início, na forma do pietismo e, a seguir, no sentimentalismo e servilismo
rasteiro dos príncipes e da nobreza, não deixaram de produzir efeitos
econômicos.
Estes
constituíram um dos maiores obstáculos da retomada do apogeu e foram apenas
abalados porque as Guerras Revolucionárias e Napoleônicas levaram a que a miséria
crônica se tornasse aguda.
Portanto,
não se trata – tal como se pretende aqui e ali comodamente imaginar – de um
efeito automático, provocado pela situação econômica.
Pelo
contrário, são os próprios seres humanos que fazem a sua história.
Fazem-na,
porém, em um meio determinado que a condiciona, com base em relações reais preexistentes, entre as quais
as relações econômicas, por mais que possam ser influenciadas também pelas
demais relações políticas e ideológicas, são, porém, em última instância, as
relações determinantes e constituem, de um lado a outro, o único fio vermelho
que conduz à compreensão.
B) Os
próprios seres humanos fazem a sua história.
Porém,
até o presente, não a fizeram com uma vontade comum, em conformidade com um
plano geral, nem mesmo em uma dada sociedade, precisamente delimitada.
Suas
aspirações entrecruzam-se e, em todas essas sociedades, reina, precisamente por
isso, a necessidade cuja extensão e forma fenomênica é o acaso.
A
necessidade que aqui prevalece por meio de todo o acaso é, mais uma vez, no fim
das contas, a necessidade econômica.
É nesse
contexto que devemos, então, tratar dos assim denominados grandes homens.
Trata-se,
evidentemente, de uma mera casualidade o fato de que um desses grandes homens e
precisamente um desses surja, em um dado país.
Mas, se
o eliminarmos, permanece a necessidade de ser substituído e o substituto em
causa acaba sendo encontrado, tant bien que mal (EvM.: de um jeito
ou de outro), mas acaba sendo encontrado, com o tempo.
Foi uma
casualidade que Napoleão Bonaparte, precisamente um corso, tornou-se o Ditador Militar de que
carecia a República Francesa, esgotada por sua própria guerra.
Demonstra-se
que, na falta de um Napoleão um outro haveria cumprido a sua função, pelo fato de
que sempre se encontrou a pessoa em questão, tão logo se tornou necessário.
Eis aí
os casos de César, Augusto, Cromwell etc.
Se Marx
descobriu a concepção materialista da histórica, Thierry, Mignet, Guizot,
bem como todos os historiadores ingleses até 1850, evidenciam que estavam
procurando por isso.
Ademais,
o descobrimento dessa mesma concepção por Morgan demonstra que para ela o
tempo havia amadurecido, tendo ela de ser necessariamente descoberta.[2]
O mesmo
se passa com todos os outros acasos e com tudo aquilo que aparenta ser um
acaso, no curso da história.
Quanto
mais o domínio, por nós investigado, distancia-se do domínio econômico,
aproximando-se do domínio da pura ideologia abstrata, tanto mais verificaremos
que mais apresenta acasos, em seu desenvolvimento, mais sua curva projeta-se em
ziguezagues.
Porém,
desenhando-se o eixo médio da curva, descobriremos que, quanto mais longo é o
período considerado e maior o domínio assim tratado, tanto mais esse mesmo eixo
se aproxima do eixo do desenvolvimento econômico, tendendo a projetar-se
paralelamente a ele.
Na Alemanha,
o maior obstáculo existente a uma correta compreensão é a irresponsável
negligência, verificada na literatura da história da economia.
Não
apenas é extremamente difícil desacostumar-se às concepções históricas,
inculcadas nas escolas, como também é ainda mais difícil reunir o material
necessário, para executar esse feito.
Quem é
que leu, p.ex., ao menos, o velho G. v. Gülich, cuja coletânea seca de
materiais contém, porém, tanta substância para a clarificação de incontáveis
fatos políticos![3]
De
resto, o belo modelo, fornecido por Marx, no “18° Brumário”, deverá,
creio, prestar-lhe já bastante informação sobre as questões que o Sr. formula,
precisamente porque versa sobre um exemplo prático.
Também
no “Anti-Dühring”,
Parte I, Capítulos de 9 a 11, e Parte II, Capítulos de 2 a 4, como também Parte
III, Capítulo 1, ou na introdução e, então, na Parte Final de “Feuerbach”,
creio já haver tocado a maior parte desses pontos.
Solicito-lhe
não colocar as palavras, acima redigidas, em uma balança de ouro, mas sim
atentar para o contexto.
Lamento
não possuir o tempo para escrever-lhe,
com elaborações tão exatas, como haveria de fazê-lo em caso de publicação.
Apresente
minhas recomendações ao Sr. ... (EvM.: identificado no original alemão),
agradecendo-lhe, em meu nome, pelo envio do ... (EvM.: também assim no
original) que muito me alegrou.
Reiterando
protestos de elevada estima e distinta consideração, subscrevo-me,
Friedrich
Engels
EDITORA
DA ESCOLA DE AGITADORES E INSTRUTORES
“UNIVERSIDADE
COMUNISTA REVOLUCIONÁRIA J. M. SVERDLOV”
PARA
A FORMAÇÃO, ORGANIZAÇÃO E DIREÇÃO MARXISTA-REVOLUCIONÁRIA
DO
PROLETARIADO E SEUS ALIADOS OPRIMIDOS
MOSCOU
- SÃO PAULO - MUNIQUE – PARIS
[1] Cf. ENGELS,
FRIEDRICH. Brief an Walther Borgius in Breslau (Heinz Starkenburg)(Carta a
W. Borgius em Bratislava – Heinz Starkenburg)(25 de Janeiro de 1894), in : Karl
Marx und Friedrich Engels Werke (Obras de Karl Marx e Friedrich Engels), Vol.
39, Berlim : Dietz, 1968, pp. 205 e s. A
presente carta de Friedrich Engels é a resposta que formulou a uma carta que W.
Borgius havia-lhe enviado, em 19 de janeiro de 1894. Heinz
Starkenburg publicou, em 1895, a referida resposta de Engels
nas páginas da revista “Der sozialistische Akademiker (O Socialista
Acadêmico)”, Nr. 20, porém sem qualquer indicação do destinatário. Em
todas as publicações realizadas ulteriormente, até 1967, indicou-se, assim,
erroneamente, o nome de Starkenburg como sendo o
destinatário dessa missiva de Engels. Um posterior exame,
realizado na carta de W. Borgius, datada de 19 de janeiro
de 1894 e a Engels enderaçada, permitiu determinar incontestavelmente o
verdadeiro destinatário da resposta deste. Ademais disso, assinalo que, à época
da carta em causa, W. Borgius era um estudante de Direito, matriculado na Universidade
de Breslau, onde estudou de 1893 a 1895. Quanto a Heinz Starkenburg,
destaco que, em 1895, era um colaborador social-democrata do revista “Die
Neue Zeit (O Novo Tempo)”, bem como redator da revista “Der
sozialistische Akademiker (O Acadêmico Socialista)”.
[2] Sobre Morgan,
vide, em particular, MORGAN, LEWIS HENRY. Ancient Society,
Or: Researches in the Lines of Human Progress from Savagery Through Barbarism
to Civilisation (A Sociedade Antiga ou : Investigações das Linhas do Progresso
Humano desde a Selvajeria através do Barbarismo até à Civilização), Londres :
Mcmillan, 1877, pp. III e s.
[3] Acerca do tema, vide GÜLICH, GUSTAV VON. Geschichtliche
Darstellung des Handels, der Gewerbe und des Ackerbaus der bedeutendsten
handeltreibenden Staaten unserer Zeit (Exposição Histórica do Comércio, da
Indústria e da Agricultura dos Mais Significativos Estados Comerciais de Nossa
Época), Jena : Frommann, Volumes de 1 a 5, 1830-1845, pp. 3 e s.