FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E POLÍTICOS DO MARXISMO
REVOLUCIONÁRIO
PARA A LUTA DE CLASSES PROLETÁRIA,
TRAVADA EM PROL DA CONSTRUÇÃO DE UMA SOCIEDADE
MUNDIAL
SEM EXPLORAÇÃO DO HOMEM PELO HOMEM, SEM
EXPLORAÇÃO DE NAÇÕES POR NAÇÕES
Sobre a Autoridade
FRIEDRICH ENGELS[1]
Concepção e Organização, Compilação e
Tradução Emil Asturig von
München
Publicação em Homenagem a Portau Schmidt von
Köln
Fevereiro 2008 emilvonmuenchen@web.de
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Precisam apenas dizer que esse ou aquele ato é autoritário
para condená-lo.
Com esse procedimento sumário, realiza-se um tal abuso
que é necessário apreciar o assunto um pouco mais de perto.
Autoridade quer dizer no sentido da palavra de que aqui estamos
tratando tanto quanto: a imposição da vontade de uma outra pessoa
sobre a nossa vontade.
A autoridade pressupõe, por outro
lado, a subordinação.
Uma vez que essa duas palavras soam mal, sendo
desagradável a relação que exprimem para a parte subordinada, trata-se da
questão de saber se não existe um meio de resolver a questão de outro jeito,
se, sob as atuais condições sociais, não podemos criar uma outra situação
social, na qual essa autoridade não tenha mais nenhum sentido e,
conseqüentemente, deva desaparecer.
Se examinarmos as relações econômicas – industriais e
agrícolas – que formam o fundamento da atual sociedade burguesa, verificaremos
que possuem a tendência de substituir, cada vez mais, a atividade isolada pela ação
combinada dos indivíduos.
No lugar das pequenas oficinas de produtores isolados,
surgiu a indústria moderna, com grandes fábricas e grandes locais de
trabalho, nos quais centenas de trabalhadores supervisionam máquinas
complicadas, movidas a vapor.
Os veículos e vagões das grandes estradas foram
substituídos por trens de ferroviais, tais quais o foram os pequenos barcos a
remo e a vela pelos navios a vapor.
As máquinas e o vapor assenhoram-se, cada vez mais, da
própria agricultura, na medida em que, no lugar dos pequenos proprietários colocam,
lenta, porém seguramente, grandes capitalistas que cultivam,
com o auxílio de trabalhadores assalariados, grandes áreas fundiárias.
Por todos os lados, emerge a ação combinada, a
complexidade de processos dependentes entre si, no lugar da atividade
independente dos indivíduos.
Porém, quem diz ação combinada, está também dizendo organização.
E, então, é possível existir organização sem autoridade?
Admitamos, por um momento, que uma revolução social
destronasse os capitalistas, cuja autoridade dirige, hoje, a produção e a
circulação das riquezas.
Para adotarmos bem o ponto de vista dos adeptos do anti-autoritarismo,
continuemos a admitir que o solo e a terra, bem como os instrumentos de
trabalho, tenham-se tornado propriedade coletiva dos trabalhadores que deles se
servirão.
Desaparecerá, então, a autoridade ou apenas mudará de
forma?
Vejamos essa questão:
Tomemos como exemplo a fiação do algodão.
O algodão deve percorrer, ao menos,
seis operações consecutivas, antes de adquirir a forma do fio, operações
essas que – em grande parte – têm lugar em diferentes salas.
Além disso, para manter as máquinas em movimento,
são necessarios um engenheiro que supervisione as máquinas, movidas a vapor, os
mecânicos, ocupados com as reparações dessas máquinas, e muitos trabalhadores
sem qualificação que têm de transportar os produtos de uma sala para outra etc.
Todos esses trabalhadores, homens, mulheres e crianças,
são obrigados a começar e terminar o seu trabalho em uma hora certa,
estabelecida pela autoridade da força a vapor que não se preocupa absolutamente
com a autonomia individual.
Portanto, é necessário que os trabalhadores entrem de
acordo acerca das horas de trabalho.
Uma vez determinadas essas horas de trabalho, todos, sem
nenhuma exceção, estão a elas subordinados.
Ademais disso, surgem, em cada uma das salas e a cada
momento, questões envolvendo detalhes sobre o modo de produção, a repartição
do material etc., questões essas que devem ser imediatamente
resolvidas, caso não se pretenda paralisar a inteira produção, no mesmo
momento.
Não importando o fato de que essas questões serem
resolvidas com base na decisão de um delegado, colocado na direção de cada um
dos ramos de trabalho, ou, caso isso não seja possível, por meio de resolução
da maioria, sempre será imprescindível que a vontade de cada indivíduo se
subordine.
Isso significa que as questões serão resolvidas de
modo autoritário.
O autômato mecânico de uma grande fábrica
é muito mais déspota do que jamais o foram os pequenos capitalistas que
empregam trabalhadores.
No mínimo, no que concerne às horas de trabalho, pode-se
escrever sobre os portões de entrada das fábricas:
“Lasciate ogni autonomia, voi che entrate!
(EvM.: Abandonai toda e qualquer autonomia, vós que entrais!”)
Se, com o auxílio da ciência e do espírito inventivo, o ser
humano subjulgou as forças da natureza, estas, por sua vez, vingam-se
dele, na medida em que as coloque a seu service. Sujeitam-no a um verdadeiro
despotismo, independente de toda e qualquer organização social.
Pretender abolir a autoridade na grande indústria,
significa pretender suprimir a própria indústria, aniquilando a fiação a vapor,
para voltar à roda de fiar.
Tomemos como outro exemplo as estradas de ferro.
Também aqui, a cooperação de um número infinito de
indivíduos é inteiramente necessária : uma cooperação deve ocorrer em horas precisamente
determinadas, a fim de que não venha a ocorrer uma desgraça.
Nesse caso, igualmente, a primeira condição de
funcionamento é uma vontade dominante que resolve todas
as questões subordinadas, sendo essa vontade representada por um único delegado
ou por um comitê, ao qual se atribua a execução das resoluções de uma maioria
de interessados.
Tanto em um caso como no outro, estamos tratando de uma
autoridade completamente manifesta.
Mais ainda : o que ocorreria com o primeiro trem que
partisse, se a autoridade dos funcionários ferroviários, exercida em relação
aos senhores passageiros, fosse abolida?
Porém, a indispensabilidade de uma autoridade
– e, em verdade, de uma autoridade imperiosa – emerge, da
maneira mais clara, em um navio em alto mar.
Aqui, em um momento de perigo, a vida de todos depende do
fato de todos obedecerem, imediata e absolutamente, à vontade de uma única
pessoa.
Toda vez que refiro argumentos do gênero aos mais
selvagens adeptos do anti-autoritarismo, nada conseguem me responder
senão o seguinte :
“Ah! É
verdade. Porém, aqui não se trata de uma
autoridade que conferimos aos delegados, mas sim de um encargo!”
Esses senhores acreditam modificar as coisas, quando
modificam os seus nomes.
È desse modo que esses profundos pensadores ficam
caçoando do mundo.
Vimos, portanto, que, por um lado, uma certa autoridade,
transferida seja lá da maneira que for, e, por outro lado, uma determinada subordinação
são coisas
impostas a nós mesmos, independentemente de toda e qualquer organização
social, juntamente com as condições materiais, sob as quais
produzimos e fazemos circular os produtos.
Por outro lado, vimos que as condições materiais de produção e
de circulação são inevitavelmente ampliadas pela grande indústria e pela agricultura
de grande escala, possuindo a tendência de alargar, cada vez mais, o
campo dessa autoridade.
Por consegüinte, é absurdo falar do princípio da autoridade
como se fosse absolutamente mal e do princípio da autonomia como se fosse
absolutamente bom.
Autoridade e autonomia são coisas
relativas cujos domínios de aplicação variam, nas diferentes fases do
desenvolvimento social.
Se os autonomistas se contentassem em
dizer que a organização social do futuro restringirá a autoridade, única e
exclusivamente, àqueles limites nos quais as condições de produção
tornarem-na inevitável, poderíamos, então, entrar em acordo.
Porém, são cegos para todos os fatos que tornam a autoridade
necessária e se lançam contra a essa palavra.
Por que os anti-autoritários não se limitam a
gritar contra a autoridade política e o Estado ?
Todos os socialistas concordam em que o Estado
político e, com ele, a autoridade política desaparecerão
como decorrência da próxima revolução social e isso significa que as funções
públicas perderão seu caráter político, transformando-se
em simples
funções administrativas que velarão pelos verdadeiros interesses
sociais.
Porém, os anti-autoritários reivindicam que o Estado
político-autoritário seja suprimido de um só golpe, ainda antes de
serem aniquiladas as condições sociais que o fizeram surgir.
Exigem que o primeiro ato da revolução social seja a supressão
da autoridade.
Por acaso esses senhores já viram uma revolução?
Uma revolução é certamente a coisa mais autoritária que
existe.
É o ato mediante o qual uma parte da população impõe sua
vontade a outra, por meio de fuzis, baionetas e canhões, i.e. através dos meios
mais autoritários possíveis.
E o partido vitorioso, se não pretende haver combatido baldadamente,
tem de tornar duradoura essa dominação através do terror que suas
armas infundem nos reacionários.
Teria a Comuna de Paris existido por um
único dias apenas, se não houvesse feito uso dessa autoridade do povo armado
contra a burguesia ?
Portanto, de duas uma : ou os anti-autoritários não
sabem o que dizem – e, nesse caso, semeiam apenas confusão – ou sabem mesmo o
que dizem, caso em que cometem uma traição contra o movimento do proletariado.
Tanto em um caso como no outro, prestam um serviço à reação.
Friedrich
Engels
EDITORA
DA ESCOLA DE AGITADORES E INSTRUTORES
“UNIVERSIDADE
COMUNISTA REVOLUCIONÁRIA J. M. SVERDLOV”
PARA
A FORMAÇÃO, ORGANIZAÇÃO E DIREÇÃO MARXISTA-REVOLUCIONÁRIA
DO
PROLETARIADO E SEUS ALIADOS OPRIMIDOS
MOSCOU
- SÃO PAULO - MUNIQUE – PARIS
[1] Cf. ENGELS, FRIEDRICH. Von der Autorität (Sobre a Autoridade)(Outubro
de 1872 - Março de 1873), in : Marx
& Engels Werke (Obras de Marx e Engels), Vol. 18, Berlim : Dietz, 1962, pp.
305 e s. Assinalo que o presente texto de Marx foi publicado, pela primeira
vez, em lingual italiana, no “Almanacco Repubblicano per l’Anno 1874”.