PRODUÇÕES LITERÁRIAS DEDICADAS À FORMAÇÃO

DE REVOLUCIONÁRIOS MARXISTAS QUE ATUAM NO DOMÍNIO DO DIREITO, DO ESTADO E DA JUSTIÇA DE CLASSE

 

KARL MARX E FRIEDRICH ENGELS SOBRE O DIREITO E O ESTADO, OS JURISTAS E A JUSTIÇA

 

Carta Joseph Weydemeyer

 

O Que Fiz De Novo Foi Demonstrar:

1.    Que a Existência das Classes Está Vinculada Meramente a Determinadas Fases Históricas de Desenvolvimento da Produção ;

2.    Que a Luta de Classes Conduz Necessariamente à Ditadura do Proletariado ;

3.    Que Essa Ditadura Mesma Constitui Apenas a Transição Rumo á Abolição de Todas as Classes e a uma Sociedade Sem Classes

 

KARL MARX[1]

 

Concepção e Organização, Compilação e Tradução

 Emil Asturig von München, Agosto de 2008

 

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5 de março de 1852

28, Dean Street, Soho, Londres

Caro Weywy! 

 

Receio que ocorreram alguns transtornos, porque, having misundestood thy last letter (EvM.: tendo-me equivocado quanto à sua última carta), atribui aos últimos dois envios o endereço : “Office of the Revolution, 7 Chambers’ Street, Box 1817”.

A maldita “caixa portal 1817” provocou toda a confusão, porquanto você me escreveu dizendo para que lhe enviasse esse apêndice ao “último endereço”, sem diferenciar o primeiro endereço do segundo.

Espero, porém, que a coisa toda se resolva, antes que a presente carta chegue até você, tanto mais porque a carta da última sexta-feira contém o Capítulo V, bem detalhado, do meu artigo.[2]

 

 

Essa semana, acabei sendo impedido de concluir o Capítulo VI que é, ao mesmo tempo, o último.

Se o seu jornal aparecer novamente, não haverá mais nenhum empecilho, visto que você está amplamente equipado com materiais. (...)

O artigo que você elaborou contra Karl Heinzen – artigo esse a mim, lamentavelmente, enviado tarde demais por Engels - é mesmo muito bom, simultaneamente áspero e fino, e essa combinação é adequada a uma polêmica que deve ser digna do nome que possui.[3] (...)

 

 

A propósito, quanto à Inglaterra, não é necessário recorrer aos “extremistas”. 

Se um membro do Parlamento da Inglaterra torna-se ministro, deve adotar iniciativas para que seja reeleito.

Assim, Benjamim Disraeli, o novo Ministro da Fazenda, Lord of Exchequer,  escreveu aos seus eleitores, em 1° de março, o seguinte :

 

“We shall endeavour to terminate that strife of classes which, of late years, has exercised so pernicious an influence over the welfare of this kingdom. (EvM.: Esforçar-nos-emos por encerrar essa confrontação de classes que, nos últimos anos, exerceu uma influência tão perniciosa sobre o bem-estar do reino.)”   

 

A esse respeito, o jornal “Times (Tempos)”, assinalou, em 2 de março :

 

“If anything would ever divide classes in this country beyond reconciliation, and leave no chance of a just and honourable peace, it would be a tax on foreign corn.” (EvM.: Se alguma coisa puder, em algum momento, dividir as classes nesse país, para além do ponto da reconciliação, não conferindo chance alguma a uma paz justa e honrada, isso haveria de ser um imposto sobre o grão de trigo estrangeiro.)” 

 

E para que nenhum “homem de caráter” ignorante, no estilo de Heinzen, imagine que os aristocratas são a favor a Lei do Grão de Trigo e a burguesia, contra, porque aqueles exigem o “monopólio”, estes, a “liberdade” -  um homem de bem reconhece os antagonismos apenas nessa forma ideológica -, há de se destacar que, no século XVIII, os aristocratas eram, na Inglaterra, a favor da “liberdade” (no comércio) e a burguesia, a favor do “monopólio” – precisamente a mesma atitude que encontramos, defendida, agora, por ambas essas classes, na Prússia, relativamente a Lei do Grão de Trigo. 

O “Neue Preußische Zeitung (Novo Jornal da Prússia)” tornou-se o mais furioso free trader (EvM.: livre-cambista).

Por fim, se eu fosse você, advertiria os Senhores Democratas en général (EvM.: em geral)  de que agiriam melhor se entrassem em contato com a própria literatura burguesa, antes de se meterem a ladrar contra as posições de seus oponentes.

Esses senhores deveriam, p.ex., estudar as obras históricas de Augustin Thierry, François Guizot, John Wade etc.,  para se conscientizar acerca da “história da luta de classes” já transcorrida.

Dever-se-iam familiarizar com os primeiros fundamentos da economia política, antes de pretender criticar a crítica da economia política.

Basta, p.ex.,  abrir a grande obra de David Ricardo para encontrar, na primeira página, as seguintes palavras, com as quais inicia o seu prefácio :

 

“The produce of the earth — all that is derived from its surface by the united application of labour, machinery, and capital, is divided among three classes of the community; namely the proprietor of the land, the owner of the stock or capital necessary for its cultivation, and the labourers by whose industry it is cultivated. (EvM. O produto da terra – tudo aquilo que deriva de sua superfície, através da aplicação unificada de trabalho, maquinaria e capital – é dividido entre as três classes da comunidade; A saber : o proprietário da terra, o proprietário do estoque ou capital necessário ao seu cultivo e os trabalhadores, mediante cuja indústria é a terra cultivada.)”  (…)[4]

 

 

Ora, do quão pouco a sociedade burguesa dos EUA amadureceu, para ser capaz de tornar ilustrativa e compreensiva a luta de classes, fornece-nos prova magistral Henry Charles Carey da (Filadélfia), o único economista norte-americano de significado.[5]

 

 

Carey ataca Ricardo, o representante mais clássico da burguesia e o adversário mais estóico do proletariado, porque Ricardo seria um homem cuja obra haveria fornecido o arsenal para os anarquistas, os socialistas e todos os inimigos da ordem burguesa.

Carey não apenas acusa Ricardo, senão ainda Thomas Malthus, John Stuart Mill, Jean-Baptiste Say, Robert Torrens, Wakefield, John MacCulloch, Senior, Richard Whately, Richard Jones etc. – esses líderes da ciranda econômica na Europa – porque dilaceram a sociedade, preparando a Guerra Civil, através de sua comprovação de que os fundamentos econômicos das diferentes classes têm de provocar um antagonismo necessário e sempre crescente entre elas.

Carey procura refutá-los, em verdade, não como o faz o ignaro do Heinzen ao vincular a existência das classes à existência de privilégios políticos e ao monopólios -, senão procurando demonstrar que as condições econômicas : a renda (propriedade fundiária), o lucro (capital) e o salário do trabalho (trabalho assalariado), em vez de serem condições de luta e antagonismo, são, muito mais, condições de associação e harmonia.

Pois bem, no que me diz respeito, não me cabe o mérito de ter descoberto nem a existência das classes na sociedade moderna nem a luta travada entre estas.

Historiadores burgueses já haviam, muito antes de mim, apresentado o desenvolvimento histórico dessa luta de classes e os economistas burgueses, a anatomia econômica das classes.

 

O que fiz de novo foi demonstrar :

 

1. que a existência das classes está vinculada meramente a determinadas fases históricas de desenvolvimento da produção ;

 

2. que a luta de classes conduz necessariamente à Ditadura do Proletariado ;

 

3. que essa Ditadura mesma constitui apenas a transição rumo à abolição de todas as classes e a uma sociedade sem classes. (...)

 

 

 

Pessoas grosseiras como Heinzen  - que negam não apenas a luta, senão até mesmo a existência das classes - demonstram apenas que, sem embargo do escândalo sanguinário e do derrame de humanismo que promovem, consideram as condições sociais, nas quais a burguesia é dominante, como o último produto, o non plus ultra (EvM:: o ponto supremo), da história e que são apenas servos da burguesia, uma servidão tanto mais repugnante quanto menos esses desavergonhados são capazes de compreender o caráter da magnitude e necessidade passageira do próprio regime burguês.      

A partir da glosas acima,  extraia aquilo que julgar ser bom para você.

A propósito, Heinzen adotou a nossa “centralização”, no lugar da sua “República Federativa” etc.  

Quando as concepções agora difundidas sobre as classes tornarem-se triviais, convertendo-se em mobília familiar para o “senso comum”, aquele tosco irá as proclamar, com grande estardalhaço, como o produto mais recente de sua “própria perspicácia” e ladrará, então, contra o nosso desenvolvimento subseqüente, mais avançado.

Desse mesmo modo, ladrou ele, com sua “propria perspicácia”, contra a filosofia de Hegel,  enquanto esta foi progressiva.

No presente momento, alimenta-se dos pedaços desta que se tornaram melífluos, ao serem escarrados, de novo, sem digestão, por Arnold Ruge. (...)         

Quando aparecer o seu jornal,  envie-me mais cópias, a fim de que seja possível melhor distribuí-lo.

 

Do seu

Karl Marx

Com as melhores saudações a você e à sua esposa, enviadas por todos os amigos daqui e, especialmente, por minha esposa. (…)

 

 

EDITORA DA ESCOLA DE AGITADORES E INSTRUTORES

“UNIVERSIDADE COMUNISTA REVOLUCIONÁRIA J. M. SVERDLOV”

PARA A FORMAÇÃO, ORGANIZAÇÃO E DIREÇÃO MARXISTA-REVOLUCIONÁRIA

DO PROLETARIADO E SEUS ALIADOS OPRIMIDOS

MOSCOU - SÃO PAULO - MUNIQUE – PARIS



[1] Cf. MARX, KARL. Brief an Joseph Weydemeyer in New York (Carta a J. Weydemeyer em Nova Iorque)(5 de Março de 1852), in : Karl Marx und Friedrich Engels Werke (Obras de Karl Marx e Friedrich Engels), Vol. 28, Berlim : Dietz, 1963, pp. 503 e s. A presente carta de Marx – ora traduzida para o português – foi publicada, pela primeira vez, nas páginas da revista “Die Neue Zeit (O Novo Tempo)”, Caderno Nr. 13, 1907, então sob a direção de Franz Mehring. Anoto, de passagem, que Joseph Arnold Weydemeyer (1818 – 1866) foi jornalista, oficial militar e destacado representante do movimento operário da Alemanha e, por fim, dos EUA. De início, atuou como oficial do Exército do Reino da Prússia. No dealbar dos anos 40 do século XIX, aderiu, porém, às posições da corrente do “Verdadeiro Socialismo”, encabeçada por Karl Grün e Moses Heß e marcada por ideologia idealista de matiz pequeno-burguês, segundo a qual a causa de todos os males sociais encontrar-se-iam não nas relações capitalistas de produção, mas sim no egoísmo dos seres humanos. Por isso, rejeitavam a luta revolucionária de classes, procurando harmonizar exploradores e explorados, sob as consignas de “Liebe und allgemeines Menschentum (amor e humanidade geral)”, impedindo, dessa forma, a formação de um movimento proletário autônomo, a fundação de um partido independente da classe trabalhadora e a dinamização de uma frente ampla de luta contra a reação feudal-européia. Sob a direta influência de Marx e Engels – com quem travou estreita amizade - , Weydemeyer rompeu com o “Verdadeiro Socialismo”, passando a defender, a partir de 1845, o Socialismo Científico. A seguir, tornou-se membro da Liga dos Comunistas e, entre 1849 e 1851, foi seu principal dirigente em Frankfurt a.M.. Participou ativamente da Revolução de 1848 e 1849, exercendo, entre 1849 e 1850, a função de redator responsável do “Neue Deutsche Zeitung (Novo Jornal Alemão)” e de colaborador da “Neue Rheinische Zeitung (Nova Gazeta Renana)”. Expulso do solo alemão em 1851, emigrou para os EUA, onde criou e atuou em diversos jornais que difundiram intensamente o marxismo revolucionário. Em 1852, fundou a primeira organização marxista em solo norte-americano. Promoveu a campanha eleitoral de Abraham Lincoln, enquanto parte de sustentação da tática de abolição da escravidão e formação de um proletariado moderno nos EUA. Ingressou, em 1860, no exército dos Estados nortistas. Durante a Guerra de Secessão dos EUA, Weydemeyer exerceu, inicialmente, durante 1862, o posto de Tenente-Coronel do Regimento de Artilharia dos Voluntários de Missouri, responsável pelo combate às guerrilhas confederadas e, a partir de setembro de 1864, atuou como Coronel do 41° Batalhão de Infantaria de Voluntários do Missouri, responsável pela defesa de St. Louis. Sabe-se que, durante o exercício de suas funções militares, distribuia aos combatentes e trabalhadores cópias do Informe Inaugural da Associação Internacional dos Trabalhadores, encabeçada por Marx e Engels. Foi, também, um dos mais notáveis correspondentes de Engels, em questões militares. Em 1865, trabalhou para o “Daily St. Louis Press (Imprensa Diária de St. Louis)”, publicando artigos sobre a fundação e a política da I Internacional. Em 1865, sua corporação militar foi dissolvida. Em 1866, foi eleito fiscal tributário municipal, responsável pela coleta de impostos daqueles que haviam-se enriquecido à custa dos esforços bélicos abolicionistas. Esse cargo exerceu, então, até a sua morte.  Morreu de cólera, em St. Louis, aos 48 anos.

[2] Trata-se, aqui, do Capítulo V de MARX, KARL. Der Achzehnte Brumaire des Louis Bonaparte (O 18 Brumário de Luís Bonaparte)(Dezembro 1851 - Março 1852), in : Marx und Engels Werke (Obras de Marx e Engels), Vol. 8, Berlim : Dietz, pp. 196 e s.

[3] Assinalo que Karl Peter Heinzen (1809 – 1880) foi um jornalista e escritor tedesco-norte-americano de linhagem radical-democrática. Foi expulso de sua Universidade por defender suas idéias políticas. Havendo servido nas fileiras militares da Hollanda e da Prússia e, a seguir, atuado como fiscal da fazenda prussiana, foi expulso de suas funções públicas e do próprio país, em 1844, por causa de suas convicções radical-democráticas. A partir de 1843, colaborou para a “Rheinische Zeitung (Gazeta Renana)”. Em 1847, defendeu, porém, nas páginas do jornal “Deutsch-Brüsseler Zeitung (Jornal Alemão de Bruxelas)“, posições ostensivas de repúdio à luta dos comunistas, travada em prol de uma unificação democrática da Alemanha. Retornando, porém, à Alemanha, por ocasião da Revolução de 1848 e 1849, apoiou a Insurreição Armada de Baden, organizando pelotões militares, provenientes da França e da Suíça. Derrotada esta, emigrou para os EUA, onde se tornou redator e editor de diversos jornais, em particular o “Pionier (Pioneiro)” de Boston. Acerca do tema, vide, sobretudo, ENGELS, FRIEDRICH. Die Kommunisten und Karl Heinzen (Os Comunistas e Karl Heinzen), in: ibidem, Vol. 4, 1962, pp. 309 e s.; MARX, KARL. Die moralisierende Kritik und die kritisierende Moral (A Crítica Moralizadora e a Moral Crítica), in: ibidem, Vol. 4, 1962, pp. 331 e s.

[4] Vide RICARDO, DAVID. On the Principles of Political Economy, and Taxation (Sobre os Princípios da Economia Política e da Tributação)(1817), Londres : Murray, Hildesheim : Olms, 1977, p. V.  

[5] Acerca do tema, vide, especialmente, CAREY, HENRY CHARLES. Essay on the Rate of Wages with an Examination of the Causes of the Differences in the Condition of the Labouring Population Throughout the World (Ensaio sobre o Nível dos Salários com um Exame das Causas das Diferenças das Condições da População Trabalhadora em Todo o Mundo)(1835), Filadélfia : Carey, Lea & Blanchard, New York : AMS Pr., 1970, pp. 7 e s.