PRODUÇÕES LITERÁRIAS DEDICADAS À FORMAÇÃO

DE REVOLUCIONÁRIOS MARXISTAS QUE ATUAM NO DOMÍNIO DO DIREITO, DO ESTADO E DA JUSTIÇA DE CLASSE

 

KARL MARX E FRIEDRICH ENGELS SOBRE O DIREITO E O ESTADO, OS JURISTAS E A JUSTIÇA

 

 

O Manifesto Filosófico da Escola Histórica do Direito :

 

Crítica ao Jusnaturalismo e ao Positivismo

No Domínio do Direito   

 

KARL MARX[1]

 

Concepção e Organização, Compilação e Tradução

 Emil Asturig von München, Agosto de 2006

 

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A opinião vulgar concebe a Escola Histórica do Direito enquanto reação ao espírito frívolo do século XVIII.  A difusão desse ponto de vista situa-se em relação inversa à sua verdade.

 

O século XVIII gerou, sobretudo, apenas um produto cujo caráter essencial é a frivolidade, sendo que esse produto singularmente frívolo é a Escola Histórica do Direito.

 

A Escola Histórica do Direito fez do estudo das fontes o seu schibboleth, exacerbou sua veneração destas até ao extremo, de modo a encorajar o navegante a velejar não na corrente, mas sim rumo à fonte de sua corrente.

 

Essa Escola julgará, portanto, ser prudente que remontemos à sua própria fonte, i.e ao Direito Natural, de Gustav Hugo. [2]

 

A filosofia da Escola Histórica do Direito precede ao seu desenvolvimento. Por isso, procurar-se-à debalde por filosofia, em seu próprio desenvolvimento. Uma ficção que transitava no século XVIII concebeu o estado natural enquanto verdadeiro estado da natureza humana.  Quis-se ver com os olhos do corpo a idéia do ser humano e criaram-se seres humanos naturais, papagênos, cuja ingenuidade desdobrava-se até à sua pele recoberta de penas.[3]

 

Nos últimos decênios do século XVIII, surgiram premunições acerca das sabedorias primitivas dos povos naturais e, de todos os cantos da terra, ouvimos caçadores de passarinhos imitando, estridentemente, as melodias dos cantos dos iroqueses, dos índios etc., defendendo a opinião de que, com essas artes, os próprios pássaros seriam atraídos para as armadilhas.

 

Todas essas excentricidades fundavam-se no pensamento correto de que as situações cruas constituem afrescos holandeses ingênuos das verdadeiras situações. O homem natural da Escola Histórica do Direito, que ainda não foi lambido por nenhuma cultura romântica, é o próprio Gustav Hugo.

 

Seu manual de Direito Natural é o velho testamento da Escola Histórica do Direito.[4]

     

A opinão de Herder que afirma serem os seres humanos naturais poetas e os livros sagrados dos povos naturais, livros poéticos, não nos barra o meio do caminho, apesar de Hugo lançar mão da prosa mais trivial e mais vulgar, pois, tal como todo século possui sua própria natureza, produz também ele mesmo seus seres humanos naturais característicos.[5]

  

Por isso, se Hugo não versifica, finge, porém, fazê-lo, sendo que a ficção é a poesia da prosa que corresponde à natureza prosaica do século XVIII.

Na medida em que chamamos o Sr. Hugo de patriarca e criador da Escola Histórica do Direito, estamos agindo em consonância com o próprio sentido desta, tal como demonstra o seu programa de homenagemdedicado ao mais famoso jurista histórico, precisamente no jubileu de Hugo

 

Ao concebermos o Sr. Hugo como uma criança do século XVIII, procedemos, até mesmo, no espírito do próprio Sr. Hugo, tal como ele mesmo o comprova, ao reivindicar-se discípulo de Kantdeclarando ser seu Direito Natural uma cria da Filosofia Kantiana. 

 

Tomemos seu Manifesto no que concerne a esse ponto. Hugo falseia o seu mestre Kant, ao afirmar que, por não podermos conhecer o verdadeiro, deixamos passar, conseqüentemente, o falso como sendo o plenamente válido, na medida em que apenas esse último existe.  Hugo é um cético em face da essência necessária das coisas, para ser um Hoffmann em face do fenômeno casual dessas coisas mesmas.[6]

 

Por essa razão, não procura, absolutamente, demonstrar que o positivo seria racional.  Procura demonstrar que o positivo seria irracional. De todos os lugares do mundo, arrasta motivos, com destreza arrogante, visando a alcançar a evidência de que nenhuma necessidade racional anima as instituições positivas, p.ex. a propriedade, a Constituição do Estado, o casamento etc. , animado pela idéia de que estas contraditariam até mesmo à razão, podendo-se, no máximo, palavrear seja a seu favor como contra elas.  De nenhum modo, pode esse método ser censurado por sua causal individualidade.  Trata-se aqui, muito mais, do método de seu princípio, do método irreservado, ingênuo, grosseiro da Escola Histórica do Direito.

 

Se o positivo deve valer, porque é positivo, então devo provar que o positivo não vale porque é racional.

E como poderia fazê-lo, de maneira mais evidente, se não através da comprovação de que o irracional é positivo e o positivo é irracional, que o positivo não existe por causa da razão, mas sim apesar da razão ? Se a razão fosse o critério do positivo, o positivo não seria o critério da razão :. 

 

Though this be madness, yet there is method in 't.”

 

(No vernáculo :  Apesar disso ser uma loucura, há, porém, um método nisso)[7]

 

 

Hugo profana, por isso, tudo aquilo que é sagrado para o ser humano jurídico, moral e político. Despedaça, porém, tais santidades apenas para poder apresentar-lhes o serviço histórico das relíquias. Ultraja-as diante dos olhos da razão, com vistas a, ulteriormente, honrá-las diante dos olhos da história, honrando também, ao mesmo tempo, os olhos históricos.

 

Tal como o seu princípio, também a argumentação de Hugo é positivista, i.e. acrítica.

Hugo não reconhece nenhuma diferenciação. Toda e qualquer existência é para Hugo uma autoridade, toda autoridade, um motivo.

 

Desse forma, são citados, então, em um único parágrafo, Moisés e François- Marie VoltaireSamuel Richardson e Homero, Michel de Montaigne e Amnon, o Contrat social” de Rousseau e De Civitate Dei” de Santo Agostinho.

 

Também assim, de modo nivelador, procede-se com os povos.

O siamês, que considera como sendo a eterna ordem natural o fato de seu rei mandar costurar a boca de um linguareiro e cortar um orador desastrado até às orelhas, é, segundo Hugo, tao positivo quanto o inglês, que conta entre os paradoxos políticos o fato de um rei promover, arbitrariamente, a emissão monetária de um lote de um centavo. 

 

O maluco desavergonhado, o conci, que sai correndo pelado por aí, cobrindo-se, no máximo, de lama, é tão positivo como o francês que não apenas se veste, senão ainda o faz de modo elegante. O alemão, que educa sua filha como a pequena flor da família, não é mais positivo do que o fascínora que a assassina, para safar-se à prestação do dever de alimentá-la. Em suma : o eczema é tão positivo quanto a pele.

 

Em um lugar, é isso que é positivo, em outro, aquilo.  Uma coisa é tão irracional quanto a outra : submeta-se, pois, àquilo que é positivo, em seus quatro pilares.

Hugo é um cético acabado. O ceticismo do século XVIII contra a razão do existente surge, perante Hugo, enquanto ceticismo contra a existência da razão.

 

Hugo adopta o iluminismo, não entrevendo no positivo nada mais de racional, fazendo-o, porém, apenas para poder não ver no racional mais nada de positivo. 

 

Entende que a aparência da razão teria sido substraída ao positivo, a fim de que reconhecessemos o positivo sem a aparência da razão.

Opina que teriam sido colhidas as falsas flores do rosário, para que carregássemos verdadeiros rosários sem flores.  

Em relação aos demais iluministas do século XVIII, Hugo comporta-se tal qual, por exemplo, a dissolução do Estado Francês, na lânguida côrte do regente, em relaçao à dissolução do Estado Francês, na Assembléia Nacional.  

Em ambos os lados, dissolução ! 

 

Ali, surge aquela como frivolidade displicente que compreende e satiriza a falta de idéias oca dos estamentos existentes, porém apenas para, uma vez abandonados todos os laços racionais e morais, impulsionar  o jogo dessa dissolução  com os escombros apodrecidos, empurrados e dissolvidos por esse próprio jogo. 

Trata-se do apodrecimento do mundo de outrora que se regojiza de si mesmo.

Pelo contrário, na Assembléia Nacional surge a dissolução enquanto separação do novo espírito das velhas formas que não mais eram mais merecedoras e capazes de o conter.

 

É, pois, a auto-estima da nova vida que despedaça o despedaçado, que condena o condenado.

Se é, por isso, necessário considera-se justamente a Filosofia de Kant como sendo a teoria alemã da Revolução Francesa, cabe considerar-se o Direito Natural de Hugo como sendo a teoria alemã do Ancién Régime Francês 

 

Reencontramos em Hugo toda a frivolidade daqueles roués (EvM.: libertinos), o ceticismo vulgar que, agindo insolentemente contra as idéias e com plena devoção em face das coisas palpáveis, pressente sua sagacidade apenas quando assassina o espírito no positivo, para, então, apossar-se do puramente positivo enquanto resíduo e permanecer confortavelmente nessas situações selvagens.

Mesmo quando Hugo considerar o peso dos motivos, entenderá, com instinto infalivelmente seguro, ser inquietante para a razão o racional e o moral contido nas instituições.

Apenas o bestial parece ser inofensivo à sua razão.

Porém, ouçamos nosso iluminista do ponto de vista do Ancien Régime !

É imperioso ouvir-se do próprio Hugo as concepções de Hugo.

A todas as suas combinações pertence algo em comum : ele mesmo o diz.

 

 

SOBRE A INTRODUÇÃO

  

"O único traço jurídico-diferenciador do ser humano é sua natureza animal."

 

 

SOBRE O CAPÍTULO DA LIBERDADE

 

"Já isso mesmo representa uma limitação à liberdade" (sc. à essência racional), "uma vez que não se pode deixar de ser, ao bel prazer, uma essência racional, i.e. uma essência que pode e deve agir racionalmente."

 

A escravidão nada muda na natureza animal e racional do escravo e de outros homens. Os deveres de consciência permanecem sendo todos.  A escravidão não é apenas fisicamente possível, senão ainda o é em sentido racional e, em toda pesquisa, que nos ensina o contrário, há de sucumbir qualquer tipo de mal entendido. Ela não é evidentemente peremptória, em sentido jurídico, i.e. não decorre nem da natureza animal, nem da natureza racional, nem da natureza civil. O fato de que ela pode ser Direito provisório tão bem como qualquer outra coisa admitida pelo adversário engendra a comparação, efetuada com o Direito Privado e com o Direito Público."

 

Prova : “Na estima da natureza animal, encontra-se, ostensivamente, mais assegurado contra a carência aquele que pertence a um rico. Este perde algo com aquele, que tem sua necessidade tutelada, se comparado com o pobre que utiliza seu concidadão, na medida em que algo deva ser nele utilizado etc.”

 

O Direito de maltratar e mutilar escravos nada é de essencial e, caso também este seja exercido, não é muito pior do que aquilo que os pobres permitem que ocorra consigo mesmos, sendo que, relativamente ao corpo, não é tão mal quanto a guerra da qual os escravos, enquanto tais, devem permanecer livres, por todos os lados. Até mesmo a beleza é encontrada muito mais junto a uma escrava mediana do que junto a uma donzela pedinte.”

 

(Ouçam os velhos !)

 

Para a natureza racional, a escravidão possui em relação à pobreza a vantagem de que o proprietário aplicará muito mais na educação de um escravo, que demonstra possuir capacidades, já em virtude da economia bem concebida, do que é o caso em relação a uma criança mendincante. Em uma Constituição, precisamente o escravo permanece poupado de pressões de gêneros muito numerosos. É o escravo mais infeliz do que o prisioneiro de guerra, a quem não se trata absolutamente de dar mais cobertura, enquanto que, por um período de tempo, ela é por ele responsável ? É ele mais infeliz do que o prisioneiro submetido a trabalhos forçados de construção, para o qual o governo designou um supervisor ?”

 

 

Prossegue ainda a discussão de saber se a escravidão, em si mesma, é vantajosa ou desvantajosa à procriação.”

  

 

SOBRE O CAPÍTULO DO CASAMENTO

 

“Na contemplação filosófica do Direito Positivo, o casamento já havia sido considerado, freqüentemente, como muito mais essencial e muito mais conforme à razão do que parece de fato sê-lo, em um exame inteiramente livre.”

 

Com efeito, a satisfação do impulso sexual no casamento convém ao Sr. Hugo.

Ele deduz, até mesmo, uma moral salutar a partir desse fato :

 

Disso se deveria entrever, tal como a partir de outras incontáveis relações, que nem sempre é imoral tratar o corpo de um homem como meio para o atingimento de um objetivo, tal como erroneamente esse conceito foi entendido, inclusive também por Kant, provavelmente.”

 

Porém, a santificação do impulso sexual mediante a exclusividade, a repressão desse impulso mediante leis, a beleza moral que idealiza o mandamento natural em um momento de ligação espiritual  - a essência espiritual do casamento : tudo isso, propriamente, é para o Sr. Hugo o que há de iniquietante no casamento.

 

Entretanto, antes de que continuemos a perseguir sua frívola falta de pudor, ouçamos, por um instante, o alemão histórico, em face do filósofo francês.

 

"C'est en renoncant pour un seul homme à cette réserve mystérieuse, dont la règle divine est imprimée dans son coeur, que la femme se voue à cet homme, pour lequel elle suspend, dans un abandon momentané, cette pudeur, qui ne la quitte jamais; pour lequel seul elle écarte des voiles qui sont d'ailleurs son asile et sa parure. De là cette confiance intime dans son époux, résultat d'une relation exclusive, qui ne peut exister qu'entre elle et lui, sans qu'aussitôt elle se sente flétrie; de là dans cet époux la reconnaissance pour un sacrifice et ce mélange de désir et de respect pour un être qui, même en partageant ses plaisirs, ne semble encore que lui céder; de là tout ce qu'il y a de régulier dans notre ordre social.”

 

(No vernáculo : É renunciando, em benefício de um único homem, a essa reserva misteriosa, cuja regra divina encontra-se imprimida em seu coração, que a mulher se devota a esse homem, para o qual ela suspende, em um abandono momentâneo, esse pudor que não a abandona jamais ; para o qual apenas despe os véus que são, ademais, seu asilo e seu ornamento. Daí, surge essa confiança íntima em seu esposo, resultado de uma relação exclusiva que não pode existir senão entra ela e ele, sem que ela se sinta, imediatamente, envergonhada; daí, resulta nesse esposo o reconhecimento em favor de um sacrifício e essa mistura de desejo e de respeito por um ser que, mesmo dividindo seus prazeres, não parece ainda senão os ceder. Daí, surge tudo que há de regular em nossa ordem social.)

 

Portanto, eis aí o filósofo liberal francês Benjamin Constant ! [8]

  

E, agora, ouçamos o alemão histórico, servil :

 

“Muito mais inquietante é já a segunda relação, uma vez que, fora do casamento, não é permitida a satisfação desse impulso ! A natureza animal é contrária a essa limitação. A natureza racional é-o ainda mais, porque  ... (advinhem o por quê ?!) um ser humano haveria de ser quase omnisciente para prever o resultado que disso adviria, já que isso significa, pois, tentar a Deus, se nos obrigamos a satisfazer um dos mais poderosos impulsos da natureza apenas quando possa ocorrer com uma outra pessoa determinada !”

 

O livre sentimento do belo, em consonância com a sua natureza, deve ser reprimido e, o que dele dependente, inteiramente separado.”

 

Vejam a que escola foram nossos jovens alemães ! 

 

Contra a natureza civil embate-se essa instituição na medida em que ..., finalmente, a polícia assume uma tarefa quase que irrealizável !”       

 

Filosofia desajeitada, por não tratar de nenhuma dessas considerações relacionadas com a polícia !

 

Tudo o que ocorrerá, em conseqüência das prescrições adicionais do Direito do Casamento, ensina-nos que o casamento - admitam-se, nele, os fundamentos que se quiser - permanece sendo uma instituição muito imperfeita.”

Essa restrição do impulso sexual no casamento possui, porém, também, suas importantes vantagens, na medida em que, através dela, são evitadas doenças costumeiramente contagiosas. O casamento poupa ao governo muitíssimos contratempos. Por fim, intervem, então, ainda a consideração tão absolutamente importante de que, aqui, o jurídico-privado é já agora, por uma vez, o individual-costumeiro.

Fichte afirma : a pessoa solteira é um ser humano apenas pela metade. Por isso, provoca-me profundo pesar (sic Hugo) ter de considerar uma tão bela expressão - que defrontaria também ao percorrer Cristo, Fénélon, Kant, Hume - nada senão um monstruoso exagero.”    

 

Quanto à monogamia e à poligamia, dependem elas, evidentemente, da natureza animal do ser humano.”!!     

 

 

 

SOBRE O CAPÍTULO DA EDUCAÇÃO

 

Sobre o tema em realce, ficamos sabendo, desde logo : 

 

“... que a arte da educação“ (i.e. a educação na família) “não tem menos a opor às relações jurídicas que com ela se relacionam do que a arte de amar tem a opor ao casamento.”  

A dificuldade, devido a que se pode educar tão somente em uma tal relação é, aqui, em verdade, desde muito não tão preocupante como no contexto da satisfação do impulso sexual, em razão também do fato de se permitir transferir a educação, mediante contrato, a um terceiro. Portanto, quem sente um tão grande impulso poderia muito facilmente vir a satisfazê-lo, apenas que, evidentemente, não precisamente com a pessoa determinada que ele desejou para si. Nada obstante, também já se opõem à razão o fato de que alguém, ao qual certamente jamais seria confiado uma criança, poder educar e excluir outros da educação, por força de uma tal relação.

Finalmente, intervém, então, também aqui uma coação, em parte na medida em que, no Direito Positivo, não se permite absolutamente, com freqüência, ao educador abandonar essa relação, em parte na medida em que se coage o educando a permitir educar-se precisamente por esse educador.”

A realidade dessa relação assenta-se, na maioria das vezes, sobre o mero acaso do nascimento, que se deve reportar ao pai, através do casamento. Esse modo de surgimento não é, evidentemente, muito racional, em razão também do fato de que, aqui, intervém, costumeiramente, uma predileção que, porém, intervém já como obstáculo a uma boa educação. Que essa educação não é, então, absolutamente necessária, vê-se a partir do fato de que também crianças são, de fato, educadas cujos pais já faleceram."       

 

 

SOBRE O CAPÍTULO DO DIREITO PRIVADO

 

No § 107, somos instruídos de que “a necessidade do Direito Privado é, em geral, resultado de uma suposição.”

 

 

SOBRE O CAPÍTULO DO DIREITO DO ESTADO

 

“É um dever sagrado da consciência moral obedecer à autoridade que tem o poder nas mãos.”

 

No que concerne à distribuição do Poder de Governo, nenhuma única Constituição é, em verdade, peremptoriamente, jurídica. Porém, provisioriamente jurídica é cada uma delas que distribui o Poder de Governo, como bem quiser.”  

 

E, então, Hugo não provou que o ser humano pode também derrubar o último grilhão da liberdade : nomeadamente aquele de ser uma essência racional

 

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Esses poucos excertos do Manifesto Filosófico da Escola Histórica do Direito bastam, creio eu, para prolatar uma sentença histórica sobre essa Escola, colacando-a no lugar das imaginações ahistóricas, dos sonhos sentimentais indeterminados e das ficções intencionais.  Esses excertos bastam para decidir a questão de saber se os seguidores de Hugo possuem a vocação de serem os legisladores do nosso tempo.

 

No entanto, essa rude árvore genealógica da Escola Histórica do Direito foi obnubilada, ao longo do tempo e da cultura, pela obra esfumaçada da mística, retalhada fantasticamente pelo romantismo, inoculada pela especulação, sendo que os seus muitos frutos eruditos foram sacudidos da árvore, secos e conservados, faustosamente, no grande armazém da erudição alemã.

Porém, é necessário, em verdade, apenas pouca crítica para serem reconhecidos, atrás de todas as frases modernas perfumadas, os velhos antolhos sujos do nosso iluminista do Ancien Régime e, atrás de toda a unção efusiva, sua licensiosa trivialidade.    

Se Hugo afirma:

 

"O traço jurídico-diferenciador do ser humano é sua natureza animal."

 

Então : o Direito é Direito animal, tal como assim o dizem os pensadores modernos eruditos sobre o Direito áspero, ostensivamente animal”, mais ou menos orgânico”. Pois, no organismo, a quem é que vem logo à mente também o organismo animal ? 

 

Se Hugo afirma que, no casamento e nas outras instituições ético-jurídicas, não existe nenhuma razão, os senhores modernos afirmam que essas instituições não são, em verdade, nenhuma construção da razão humana, senão cópias de uma razão “positiva” superior e, assim, procedendo através de todos os demais artigos.

 

Apenas um resultado é por todos declarado, de modo igualmente áspero: o Direito do Poder Arbitrário.

As teorias jurídicas e históricas de Haller, Stahl, Leo e outras de semelhante orientação podem ser concebidas apenas enquanto codices rescripti (EvM.: enquanto códigos de resposta, para servir de bula) do Direito Natural de Hugo, as quais fazem novamente emergir, de maneira legível, depois de algumas operações da arte crítica de recorte, o velho texto original, tal como demonstraremos ulteriormente, no momento adequado.[9]   

 

Tanto mais inúteis permanecem todas as artes de embelezamento, quando possuimos ainda em mãos o velho Manifesto o qual é, apesar de tudo, muito inteligível, ainda que não seja muito inteligente.

 

 

 

EDITORA DA ESCOLA DE AGITADORES E INSTRUTORES

“UNIVERSIDADE COMUNISTA REVOLUCIONÁRIA J. M. SVERDLOV”

PARA A FORMAÇÃO, ORGANIZAÇÃO E DIREÇÃO MARXISTA-REVOLUCIONÁRIA

DO PROLETARIADO E SEUS ALIADOS OPRIMIDOS

MOSCOU - SÃO PAULO - MUNIQUE – PARIS



[1]Cf. MARX, KARL H. Das philosophische Manifest der historischen Rechtsschule (O Manifesto Filosófico da Escola Histórica do Direito)(Abril - Agosto de 1842), in : Karl Marx & Friedrich Engels Werke(Obras de Marx e Engels), Vol. 1, Berlim : Dietz Verlag, 1973, pp. 78 e s. O presente escrito de Marx, traduzido agora, muito possivelmente, pela primeira vez, para um idioma neo-latino, foi redigido entre abril e início de agosto de 1842 e publicado, originariamente, na "Gazeta Renana", Nr. 221, em 9 de agosto de 1842.  Cumpre observar que o presente texto de Marx foi, à época de sua primeira publicação, inteiramente censurado na parte intitulada "Sobre o Capítulo do Casamento".

[2] Indicação de Emil Asturig von München : Acerca do tema, vide HUGO, GUSTAV VON. Lehrbuch des Naturrechts als einer Philosophie des positiven Rechts, besonders des Privatrechts (Manual do Direito Natural como uma Filosofia do Direito Positivo, em especial do Direito Privado)(1819), Eingeleitet von Theodor Viehweg (Prefaciado por Theodor Viehweg), Glashütten im Taunus : Auvermann, 1971, pp. III e s.; IDEM. Domitii Ulpiani Fragmenta libri regularum, vulgo tituli ex corpore Ulpiani, Gottinga, 1788, pp. 5 e s.; IDEM. Lehrbuch der Rechtsgeschichte bis auf unsere Zeiten (Manual da História do Direito até os Nossos Tempos), Berlim : Myllius, 1790, pp. III e s.; IDEM. Ius civile anteiustinianaeum, Tomos 1 e 2, Berolinum : Mylius, 1815, pp. 3 e s.; IDEM. Lehrbuch eines civilistischen Cursus (Manual de um Curso Civilista)(1792-1821), Berlim : Mylius, 1820-1832, pp. 3 e s.; IDEM. Chrestomathie von Beweisstellen für das heutige Römische Recht (Cretomatia de Pontos de Prova do Direito Romano da Atualidade), Berlim : Mylius, 1820, pp. III e s.;  IDEM. Lehrbuch der Digesten, mehr nach Drittheilen und Partes als nach Büchern und Titeln und des Constitutionen Codex (Manual do Digesto, mais em Terças Partes e Partes do que em Livros e Títulos, e do Código das Constituições), Berlim : Mylius, 1815, pp. III e s.; IDEM. Lehrbuch der Geschichte des Römischen Rechts (Manual da História do Direito Romano), Berlim, Mylius, 1815, pp. III e s.; IDEM. Lehrbuch der Geschichte des Römischen Rechts, bis auf Justinian (Manual da História do Direito Romano até Justiniano), Tomos 1 e 2, Berlim, Mylius, 1824, pp. III e s.; IDEM. Lehrbuch der Geschichte des Römischen Rechts seit Justinian oder der juristischen und meist civilistischen gelehrten Geschichte (Manual da História do Direito Romano desde Justiniano ou Manual da História Jurídica e da História Civilista mais Erudita), Berlim, Mylius, 1818, pp. III e s.; IDEM. Lehrbuch des heutigen römischen Rechts (Manual do Direito Romano Atual), Berlim, Mylius, 1826, pp. III e s.; IDEM. Civilistisches Magazin (Revista Civilista)(1790-1837),Tomos de 1 a 6, Berlim : Mylius, 1823-1837, pp. 3 e s.

Enquanto um dos mais importantes discípulos de Gustav von Hugo e paredro ideológico da Escola História do Direito vide, também, SAVIGNY, FRIEDRICH CARL VON. Das Recht des Besitzes. Eine civilistische Abhandlung (O Direito da Posse. Um Tratado Civilista)(1803), Viena : Gerold, 1865, pp. 5 e s.; IDEM. Vom Beruf unserer Zeit für Gesetzgebung und Rechtswissenschaft (Sobre a Vocação de nosso Tempo para a Legislação e a Ciência do Direito), Heidelberg, 1814, pp. 5 e s.; IDEM. Grundgedanken der Historischen Rechtsschule (Pensamentos Fundamentais da Escola Histórica do Direito)(1814-1840), Franfurt a.M. : Klostermann, 1948, pp. 3 e s.; IDEM. Geschichte des römischen Rechts im Mittelalter (História do Direito Romano na Idade Média)(1815-1831), Tomos de 1 a 7, Heidelberg : Mohl, 1834-1851, pp. 3 e s.; IDEM. Über den römischen Colonat und über die römische Steuerverfassung unter den Kaisern (Sobre o Colonato Romano e Constituição Tributária Romana sob os Imperadores), Berlim : Königl. Akad d. Wiss., 1823, pp. 5 e s.; IDEM. System des heutigen römischen Rechts (Sistema do Direito Romano da Atualidade), (1840-1849), Tomos de 1 a 9, Berlim : Veit, 1840-1851,pp. 7 e s.; IDEM. Juristische Methodenlehre nach der Ausarbeitung des Jakob Grimm (Doutrina do Método Jurídico Segundo a Elaboração de Jakob Grimm), Stuttgart : Koehler, 1951, pp. 7 e s.; IDEM. Politik und neuere Legislationen. Materialien zum "Geist der Gesetzgebung" (Política e Legislação Mais Nova. Materiais sobre o "Espírito da Legislação"), Frankfurt a.M. : Klostermann, 2000, pp. III e s.; IDEM. Vorlesung über juristische Methodologie 1802-1842 (Aulas sobre Metodologia Jurídica de 1802 a 1842), Frankfurt a.M. : Klostermann, 2004, pp. 5 e s. 

[3] Anotação de Emil Asturig von München : Uma clássica imagem do papagêno - que surge na ária "der Vögelfänger bin ich ja (Sou eu sim o Caçador de Passarinhos)" - ,  é-nos fornecida pela famosíssima ópera, em dois atos, Zauberflöte (A Flauta Mágica), de Mozart e Schikaneder, freqüentemente encenada em todos os países do mundo contemporâneo. Vide MOZART, WOLFGANG AMADEUS / SCHIKANEDER, EMANUEL.  Die Zauberflöte (A Flauta Mágica), in : Mozarts Opern (Óperas de Mozart), ed. Forschungsinstitut für Musiktheater der Universität Bayreuth (Instituto de Pesquisa de Teatro Musical da Universidade de Bayreuth), Munique : Piper, pp. 273 e s.

[4] Indicação de Emil Asturig von München: Nesse sentido, vide, sobretudo, HUGO, GUSTAV VON. Lehrbuch des Naturrechts als einer Philosophie des positiven Rechts, besonders des Privatrechts (Manual do Direito Natural como uma Filosofia do Direito Positivo, em especial do Direito Privado)(1819), Eingeleitet von Theodor Viehweg (Prefaciado por Theodor Viehweg), Glashütten im Taunus: Auvermann, 1971, pp. III e s.

[5] Indicação de Emil Asturig von München : Sobre o tema, vide, sobretudo, HERDER, JOHANN GOTTFRIED. Abhandlung über den Ursprung der Sprache (Tratado sobre a Origem da Língua)(1772), Munique - Viena : Hanser, 1978, pp. 5 e s.; IDEM. Ideen zur Philosophie der Geschichte der Menschheit (Idéias sobre a Filosofia da História da Humanidade)(1784-1791),  Darmstadt : Messer, 1966, pp. 3 e s. 

[6] Anotação de Emil Asturig von München : Marx refere-se, aqui, a Ernst Theodor Amadeus Hoffmann (E.T.A. Hoffmann),  renomando escritor, compositor, crítico de música, desenhista e  mordaz caricaturista do romantismo alemão, renomadíssimo devido a inúmeras produções de novelas fantásticas e de terror, bem como  em razão de seu pronunciado humor sarcástico. Foi também jurista e juiz prussiano. Acerca do tema, vide WEINHOLZ, GERHARD. E.T.A. Hoffmann. Dichter, Psychologe, Jurist (E.T.A. Hoffmann. Poeta, Psicólogo, Jurista), Essen : Die Blaue Eule, 1991, pp. III e s.

[7] Indicação de Emil Asturig von München : Vide SHAKESPEARE, WILLIAM. The Tragedy of Hamlet (A Tragédia de Hamlet)(1601-1603), Ato 2, Cena 2, Polonius, New York: Gordion Pr., 1976, p. 35.

[8] Indicação de Emil Asturig von München : Vide CONSTANT DE REBEQUE, HENRI-BENJAMIN. Journal intime de Benjamin Constant et lettres à sa famille et à ses amis (Jornal Íntimo de Benjamin Constant e Cartas à sua Família e a seus Amigos), Paris: P. Ollendorf, 1895, pp. 3 e s.; IDEM. Oeuvres Complètes (Obras Completas)(1774 - 1830), Tomos de 1 a 8, Tübingen : Niemeyer, 1998 - 2005, pp. 3 e s.

[9] Indicação de Emil Asturig von München : Vide HALLER, KARL LUDWIG VON.  Handbuch der allgemeinen Staaten-Kunde (Manual Geral da Ciência dos Estados) Winterthur : Steiner, 1808, pp. 3 e s.; IDEM. Restauration der Staats-Wissenschaft oder Theorie des natürlich-geselligen Zustands der Chimäre des künstlich-bürgerlichen entgegengesezt (Restaração da Ciência do Estado ou Teoria da Condição Natural-Sociável Oposta à Quimera do Civil-Artifical)(1816 - 1834), Tomos de 1 a 6, Winterthur : Steiner, 1820 - 1835, pp. III e s.; IDEM. Melanges de Droit Public et de haute politique (Mescla de Direito Público e de Alta Política), Tomos 1 e 2, Paris : Vanton, 1830, pp. 5 e s.; STAHL, FRIEDRICH JULIUS. Die Philosophie des Rechts nach geschichtlicher Ansicht (A Filosofia do Direito segundo a Visão Histórica)(1830-1837), Tomos de 1 a 3, Darmstadt : Wiss. Buchgemeinschaft, 1963, pp. 3 e s.; IDEM. Grundriss zu Vorlesungen über Philosophie des Rechts (Compêndio de Aulas sobre a Filosofia do Direito), Munique : Mohr, 1829, pp. 5 e s.; LEO, HEINRICH.  Allgemeine Staatengeschichte (História Geral dos Estados), Tomos de 1 a 3, Hamburg : Friedrich Perthes, 1829, pp. III e s.; IDEM.  Studien und Skizzen zu einer Naturlehre des Staates (Estudos e Esboços de uma Doutrina Natural do Estado), Halle, Anton, 1833, pp. 1 e s.; IDEM. Lehrbuch der Universalgeschichte (Manual da História Universal), Tomosde 1 a 10, Halle : Anton, 1835-1842, pp. 3 e s.; IDEM.  Geschichte der französischen Revolution (História da Revolução Francesa), Halle : Anton, 1842, pp. III e s.; IDEM. Vorlesungen über die Geschichte des deutschen Volkes und Reiches (Aulas sobre a História do Povo Alemão e do Império), Halle : Anton, 1854, pp. 5 e s.