PRODUÇÕES LITERÁRIAS DEDICADAS À FORMAÇÃO
DE REVOLUCIONÁRIOS MARXISTAS QUE ATUAM NO DOMÍNIO DO DIREITO,
DO ESTADO E DA JUSTIÇA DE CLASSE
PEQUENOS ENSAIOS SOBRE MARXISMO E DIREITO, SOCIEDADE E ESTADO NA REVOLUÇÃO
ESTADO DE DIREITO E JUSTIÇA DE CLASSE
RELATÓRIO DE UMA PALESTRA REALIZADA
EM UMA ASSEMBLÉIA DE MASSAS NA CIDADE DE STUTTGART, ALEMANHA
KARL P. A. LIEBKNECHT[1]
Concepção e
Organização, Compilação e Tradução
Emil Asturig
von München, Novembro de 2006
Para Palestras e
Cursos sobre o Tema em Destaque
Contatar emilvonmuenchen@web.de
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Geral
http://www.scientific-socialism.de/PECapa.htm
Companheiras e
companheiros do Partido !
Devo começar de maneira um pouco seca.
Quando se fala de Justiça de Classe,
deve-se, em primeiro lugar, falar do Estado.
Nós, marxistas, entendemos sob o conceito de Estado não
meramente uma organização de seres humanos que se encontram ligados pela
descendência, pela nacionalidade ou pelo local comum de residência.
Em nossa concepção, o Estado pressupõe, antes de
tudo, o fato de que, no interior das organizações de seres humanos, existem
diversas camadas que possuem distintos interesses.
No conceito de Estado, já está incluído o conceito de Justiça
de Classe.
Encontramos sociedades de classes já mesmo nos períodos
mais remotos do desenvolvimento da humanidade.
Desde há tanto tempo, possuímos também um Estado.
Esse Estado é organizado no sentido daquela parte da
população que possui a maior influência.
Em um primeiro aspecto, vale o princípio da maioria
democrática que significa a submissão de uma minoria numérica.
Porém, a dominação pode ser exercida não apenas através
da maioria numérica, senão ainda através da maioria com poder visível que
pode também tornar uma minoria mais forte do que a maioria da população.
A superioridade econômica de uma minoria da população
pode conduzir a que uma domine sobre uma maioria.
Poder-se-ia perguntar : por que a maioria não se
apropria, simplesmente, da posse da minoria ?
Porém, sabemos que, em certos períodos da história, é
necessário - e, até mesmo, é uma lei natural - o fato de que uma maioria seja
governada pela minoria, no interesse do continuado desenvolvimento da
humanidade.
Assim, também, o capitalismo foi algo inteiramente útil
para o continuado progresso da humanidade, não tendo sido, pois, criado
por uma invenção demoníaca de homens maliciosos, senão surgiu como uma
necessidade do desenvolvimento econômico.
E, apenas sobre suas ruínas podemos continuar a
construir.
Entretanto, através dos diversos meios especiais de
violência, do poder do Estado, a minoria assegura para si sua dominação :
mediante a Legislação,a Escola, a Igreja,
a Polícia, a Justiça e o Militarismo.
Se concebermos diante de nossos a última época da
nossa história ocidental-européia, verificamos que, no quadro da dissolução do Estado
Feudal e Absolutista, irrompe uma luta tal como, hoje, tem lugar na Rússia.
O absolutismo conhece, em e para si, apenas
a vontade do dominador que, naturalmente, submete-se, de fato, a determinadas
influências.
Eis aqui o Estado de Polícia, no sentido
mais próprio do termo, no qual também o Poder Judiciário do mesmo
exerce uma vontade que maneja os demais meios de poder tal qual, p.ex., o Poder
de Polícia.
Polícia e Justiça constituem uma unidade.
Nas lutas constitucionais modernas
situa-se, em primeiro plano, a luta pela "Separação dos
Poderes", i.e. sobretudo a separação dos Poderes
Legislativo, Executivo e Judiciário.
Ao lado da luta pelo Poder Legislativo, com
vistas à criação de um Parlamento, impulsiona-se a luta pela
modificação da relação, existente entre o Poder Judiciário e
a Administração (Executivo), visando à separação
dessas ambas funções e à independência da Justiça em face do
Executivo.
A Administração e a Polícia
permanecem atribuídas ao Governo enquanto um meio de poder imediato que o
habilita a decretar, no momento adequado, em diversos domínios, acerca do que
entende ser o bem.
Junto ao Poder Judiciário Independente,
isso é colocado de maneira diversa.
Nele, o Estado eleva-se, em certo sentido, para além de
si mesmo.
O Poder Judiciário constitui a função mais
sublime do Estado, porque o próprio Estado - e, na verdade, também seu Poder
Legislativo - submete-se a esse Poder, criado por ele mesmo.
Pelo menos, isso deve ser assim.
Nos Estados Unidos da América, uma lei,
declarada sem validade pela Suprema Corte Judiciária, é
considerada, simplesmente, como eliminada.
O juiz situa-se, em certa dimensão, acima do próprio
Estado.
A essa ilustre função do juiz correspondeu o fato de que,
em períodos culturais precedentes, o estamento dos juízes, inteiramente
santificado, era circundado por uma inviolabilidade totalmente especial.
Os velhos romanos conheceram, além do Direito,
produzido pelo legislador, um Direito que os juízes criavam através de suas
sentenças.
E, de fato, em todos os tempos, os juízes determinaram o
conteúdo das leis, sobretudo e principalmente, mediante interpretação, no ato
de aplicação destas, conseguindo, assim, em ampla medida, formar
continuadamente e degenerar as condições formais, sob as quais os povos
viveram.
Nesse sentido, o juiz exerce um tipo de função
legislativa, tal como não menos o faz a Polícia, no domínio de
sua competência.
Vocês vêem a partir daí como é infinitamente a luta
pela independência da Justiça.
Paralelamente, porém, a luta consiste em submeter a Administração
da Polícia, todo o Executivo e, em verdade, o próprio Governo, os
Ministros, no exercício de seu ofício, ao controle de juízes independentes,
mediante uma assim denominada Jurisdição Administrativa,
mediante Cortes Judiciárias do Estado (para os Ministros
competentes etc.), com o que é colocado em questão o próprio Parlamento.
Um Estado no qual se almeja tudo isso é denominado Estado
de Direito.
Porém, como se encontra a situação entre nós, na
Alemanha, no que concerne ao Estado de Direito ?
Em uma contemplação mais aproximada, opinamos que
precisamos apenas nos coçar e já aparece inspecionando, por todos os
cantos e becos, o Estado de Polícia.
Temos um mal verniz de Estado de Direito, pintado
sobre o Estado de Polícia e, além disso, apenas sobre algumas
partes do Estado de Polícia.
No Império Alemão, não existe nenhum
indício de responsabilidade ministerial que estivesse submetida a uma Corte
Judiciária do Estado.
Todas nossas tentativas de aqui criar alguma coisa nesse
sentido falharam e também, nos Estados Alemães singulares, não existe
praticamente nada disponível a esse respeito, menos ainda na Prússia
e na Saxônia.
Uma Jurisdição Administrativa
existe, evidentemente, nos Estados Alemães singulares, sendo que, na maioria
das vezes, ela aspira por sê-lo.
Isso demonstrei em outra sede.
Particularmente importante é o fato de que, na Prússia,
por ex., o próprio Poder Judiciário é simplesmente privado da
revisão da constitucionalidade das leis, o que representa, diretamente, uma
castração da Justiça.
Porém, mesmo à parte esse aspecto, vivemos
ainda, no mínimo, em três quartos, se não em nove décimos, em um Estado
de Polícia.
Se aqui ou ali, não sentimos desse modo,
devemo-lo à nossa deficiente sensibilidade.
Somos, precisamente, até mesmo educados de modo policial.
Se recebemos uma pequena concessão qualquer que se pareça
com uma liberdade, triunfamos.
Alegramo-nos, tal como se fosse uma doação de clemência,
se nos é permitido fazer aquilo de que nem sequer se fala, em outros lugares.
Ficamos agradecidos pela mais ínfima liberdade de
movimento que nos é concedida, pois sentimos a sujeição, a tutoria, enquanto
estado de normalidade.
Podemos apenas sentir, com grande dificuldade, quão
freqüentemente o Estado de Polícia ainda intervém em nosso Estado
de Direito, porque estamos em estado letárgico, por força
do costume.
Todo o sistema escolar, o sistema policial, o sistema
habitacional e o sistema de extradição submetem-se, ao lado de muitos outros,
praticamente de modo exclusivo, à disposição policial.
Não existe praticamente nenhum remédio jurídico digno de
menção contra a extradição de nosso companheiro Quelch.[2]
Não formulo aqui nenhuma censura, porque tal
resistência não ocorreu.
Talvez tenha sido inteiramente prudente e compreensível.
Porém, isso demonstra que pele de rinoceronte ainda todos
nós possuímos nessa questão.
Na Inglaterra ou na França,
essa resignação surda teria sido impossível.
É extraordinariamente bom podermos ter a ocasião de estudar,
nesse congresso, o temperamento de nossos companheiros franceses.
No Direito, no Estado Prussiano, as funções da Polícia
são descritas, p.ex., da seguinte forma :
"A manutenção da tranqüilidade, da segurança
e da ordem pública, bem como a prevenção de todos os perigos que
ameaçam o público ou um de seus membros é ofício da Polícia."
Nisso se enquadra tudo o que possa ocorrer.
A Polícia é a autoridade que tudo abarca,
que tudo envolve.
Na medida em que não esteja expressamente previsto em lei
ser o Poder Judiciário competente, domina a Polícia.
Apenas o resto bastante escasso fica para a Justiça.
Tanto assim permanecemos parados no campo do Estado
de Polícia Feudal-Absolutista.
Na Prússia, tal como particularmente entre
nós, isso conduz evidentemente ao fato de que a Polícia é
omnisciente.
Na Polícia Prussiana, o ideal da
omnisciência materializou-se sobre a terra.
Tratando-se, então, de declarações testemunhais de
autoridades policiais ou de apresentação de pareceres, acerca dos quais os próprios
letrados e professores quebram suas cabeças, prostram-se também os juízes, até
mesmo com grande freqüência, diante da mais elevada sabedoria das declarações
policiais.
Essa omniscência da Polícia, caracterizadora de nosso sistema
judiciário, deve ser por nós reverenciadamente reconhecida nolens volens.
Entre nós, é excessivamente correto falar,
simplesmente, de "Sua Majestade, o Policial".
Em Cottbus, instituiu-se, há algum tempo,
uma Escola de Polícia, dado que adquiriram repercussão,
aparentemente, algumas dúvidas acerca dessa omnisciência.
Em alguns meses, creio eu, o policial deve lá tudo
aprender sobre o que necessita.
Afirmo-lhes que nenhuma universidade do mundo
proporciona uma mais rica eficiência do que essa Escola de
Polícia.
Todos os professores da Alemanha,
considerados em seu conjunto, não podem saber mais do que ali
"aprende" uma autoridade policial prussiana.
A "Polícia" exerceu, na Prússia,
uma influência inteiramente extraordinária sobre a conformação fática do Direito
de Associação.
Mulheres, jovens trabalhadores, aprendizes etc. não
podem, tal como se sabe, tomar parte, entre nós, em assembléias e reuniões de
associações políticas.
Então, porém, com o tempo, também os partidos burgueses adquiriram
um grande interesse na participação de mulheres na vida política.
Assim, uma flora multicor, composta por inúmeras damas,
passou a assistir, de maneira imperturbada, às conhecidas assembléias circenses
da altamente política União dos Fazendeiros.
Isso provocou, porém, um certo escândalo.
Então, uma associação social-democrática organizou uma
festividade com baile e, como dançar, desde o tempo em que o mundo existe,
pressupõe a participação das mulheres, deveriam, evidentemente, também mulheres
participar desse evento.
Porém, também esse Direito Natural foi
subtraído aos Social-Democratas, pois o prazer de dançar foi considerado como
"reunião" de uma associação política !
A participação de mulheres foi simplesmente interditada.
Provavelmente, supôs a excelsa Polícia que
as mulheres iriam dançar as danças de guerra social-democráticas.
Em verdade, foi possível conduzir a Câmara de
Apelação do Tribunal a um ponto de vista mais racional, porém a Polícia
e o Tribunal de Alçada Administrativo endureceram em sua
concepção de que dançar é uma reunião.
Toda a questão descambou, discricionariamente, em um
ridículo venenoso.
Então, o Ministério Interior "salvou"
a situação.
Em um requerimento, formulado por mim, procurou
por um compromisso : ordenou aos órgãos policiais fosse permitida a
participação de mulheres nas assembléias e reuniões de associações políticas,
desde que as mulheres fossem acomodadas em recintos separados do prédio.
Tal como em uma sinagoga ...
Essa é a conhecida "Portaria do Segmento".[3]
Assim, atingiu-se, na prática, uma considerável expansão
do Direito da Associação.
Para fazê-lo, porém, o Ministério não
possui Direito algum.
Apenas a legislação teria sido competente para tanto.
Não se quer, porém, largar completamente das mãos a arma
da lei reacionária, com vistas a, em caso de necessidade, recorrer-se a ela.
Alcançamos aquele tantinho mais de liberdade apenas
porque os partidos burgueses não podem mais viver sem essa mesma liberdade,
considerando-se, pois, não as necessidades do proletariado, senão aquelas
das classes dominantes.
Esse é o Estado Capitalista de Polícia.
Mais ainda : a Polícia intervém também no
sistema judiciário, em todos os cantos e becos, de modo decisivo.
Recordo-lhes o Delito de Resistência contra o
poder do Estado.
A jurisprudência sobre esse tema reside, preponderamente,
nas mãos da Polícia.
Os Tribunais negam-se a interferir no omnipotente Poder
de Polícia e ousam examinar, apenas em dimensão inteiramente limitada, a
legalidade do exercício oficial, mesmo sendo esse exercício tão injusto e
brutal.
Basta, por todos os lados, verificar apenas, de modo
puramente formal e extrínseco, se a Polícia agiu no quadro de sua
competência.
Aos olhos de nossos Tribunais, a Polícia é,
na maioria das vezes, intocável e santificada.
Sob os vivos gritos de repúdio, o orador cita um
caso de seu escritório que ilustra dramaticamente isso e demonstra
quão ridícula e desprezivelmente a Polícia considera, com a aprovação
dos Tribunais, a liberdade pessoal do cidadão do Estado.
Na Prússia e em quase toda a Alemanha,
as assembléias públicas sujeitam-se ao controle e à supervisão policial.
Na Saxônia, é pior ainda.
Se, nesse momento, eu estivesse falando na Saxônia,
uma autoridade policial iria agora gritar-me : "Modere-se !"
Na Saxônia, a autoridade policial pode também subtrair a
palavra do orador, na Saxônia, na Prússia e em
outros lugares, também dissolver a assembléia.
Qual é a conseqüência, se ocorre a última dessas coisas
aqui mencionada ?
Ainda que a dissolução seja tão injustificada, ainda que
represente uma tão nítida violação do Direito de Reunião, cada um
dos presentes deve imediatamente abandonar a sala.
Se alguém hesita em fazê-lo, incorre em uma sensível
penalidade e, se o juiz tem de apreciar a questão, não possui o Direito de
examinar a justificação concernente à dissolução.
A atribuição de dissolução pertence à competência da Polícia
e basta !
A ordem do policial é para o Tribunal tal
qual o é o amém para a Igreja.
E isso por força de Direito.
Um perigo monstruoso assalta à luta sindical através da
omnipotência da Polícia.
O piquete de greve é o cerne, a coluna
vertebral do Direito de Coalizão.
Ele representa, de início, o meio de tornar realidade
esse Direito.
Precisamente por essa razão, é Direito de
Coalizão, obviamente e de modo especial, desagradável para os
empresários e por estes particularmente odiado.
Uma vez, porém, que não se o pode, simplesmente, em si e
por si mesmo, proibir, por via policial, recorre a Polícia a outros meios,
colocando-se naturalmente do lado dos empresários, com grande
entusiasmo.
Por todos os lados, muito provavelmente também em Württemberg,
existem disposições de Polícia, segundo as quais as autoridades policiais
podem, no "interesse da segurança e da fluência do tráfego, bem como
da manutenção da ordem", expulsar as pessoas que se encontram
nas ruas.
A autoridade diz, então, simplesmente, ao piqueteiro : "Saia
dessa rua !"
Se a pessoa em questão não vai embora, resulta, então,
uma "expulsão violenta, na certa."
No que concerne à questão relativa a saber em que
dimensão tal fato se submete ao exame do Poder Judiciário, se a
medida realmente foi tomada no interesse da ordem e da segurança, percorremos,
na Prússia, um verdadeiro martírio.
Todas as penalidades cauterizadas pela Polícia
foram, originalmente - e, em verdade, durante anos - suspensas pelos Tribunais,
visto que resultava plenamente evidente que o piquete não havia perturbado ou
ameaçado nem a ordem nem o tráfego.
Até mesmo os custos da defesa foram impostos, não
raramente, à caixa do Estado.
Com isso, porém, não estava satisfeita a Procuradoria
do Estado, atrás da qual se encontrava a Polícia.
Esta começou a desencadear uma tempestade contra a Câmara
de Apelação do Tribunal e, verdadeiramente, com uma perserverância que
seria digna de um outro caso qualquer.
E, exitosamente !
A Câmara de Apelação recuou, gradativamente, a passo e
passo, e chegou, finalmente, à sentença : o
policial possui o Direito de estabelecer uma medida, no interesse da ordem e do
tráfego, quando entende que seja esta aconselhável.
Entretanto, ninguém sabe o que se passa na cabeça de um
homem.
Não posso olhar no interior de seu coração.
Se o policial diz : "Providencie para ir embora
daqui" e, então, pergunto a ele, "o que é que se passa
na sua cabeça", será isso, pois, facilmente, concebido
como uma ofensa.
No melhor dos casos, recebo a seguinte resposta : "Porque
é que lhe importa saber o que se passa na minha cabeça?"
Pois, então : ou acredito que o policial possui um "entendimento"
correto e obedeço à sua ordem, i.e. abandono, pura e simplesmente, o
piquete, ou, então, não acato sua ordem, porque não acredito na correção de seu
"entendimento", arriscando-me à prisão e à punição.
Em ambos os casos, tateio no escuro.
O piquete atingiu o seu fim e a Polícia, o seu objetivo.
Não se trata isso, virtualmente, de uma ofensa,
desfechada contra um "povo livre" ?
Essa prática vigorou, na Prússia, durante
vários anos.
Apenas recentemente, a Câmara de Apelação do
Tribunal permitiu-se negociar novamente uma pequena concessão.
Diz-se, agora, que a autoridade tem de ter possuído um
certo fundamento para sua preocupação, para seu "entendimento".
Ao policial, sofregamente atuante a serviço do
empresário, esse substrato não falta jamais, obviamente.
O simples fato de os fura-greves dirigirem-se a ele,
i.e. o mínimo nível da atividade piqueteira, é designado como "perturbação"
e adotada como pretexto para a intervenção.
Ademais, o tráfego dos fura-greves encontrar-se-ia
inteiramente bloqueado e, não fosse assim, o piquete resultaria feito de
maneira ilusória.
O orador cita, sob aplausos e bom humor dos
ouvintes, casos de seu escritório que ilustram esse procedimento.
Não se trata de contos de fadas e comédias.
O que lhes conto é a verdade e a realidade da cultura
prussiana do século XX.
O Estado Burguês de Direito vela
também por uma certa tutela em face do arbítrio policial através da instituição
de uma Jurisdição Administrativa, que vocês efetivamente também
possuem em Württemberg.
Trata-se, porém, de uma Jurisdição muito
estranha.
Os juizes são, por assim dizer, independentes.
Sentem-se, porém, até mesmo muito excessivamente como
executores do poder do Estado.
Como são levantadas as provas ?
Em nossos processos cíveis e penais, todas as testemunhas
devem ser ouvidas, de modo juramentado.
O que existe em um arquivo qualquer por aí, o juiz,
segundo dispõe a lei, não pode levar em consideração.
Porém, no processo administrativo, aparece, regularmente,
na mão do magistrado que instrui o procedimento, um documento no qual se
encontram relatórios de autoridades policiais etc.
Esse documento é lido em voz alta e tudo vale como
verdade, plenamente incontestável !
Isso é assim, mesmo quando a Polícia surge
como parte adversária, no processo !
Assim, escancaram-se as portas ao arbítrio,
sendo toda e qualquer garantia eliminada.
Todo o sentimento de segurança do cidadão do Estado tem
de esvanecer, dessa forma.
O orador reporta-se aos processos que foram
instruídos no caso da Organização da Juventude de Könisberg.[4]
Naquela ocasião, o Tribunal exigiu de mim,
em primeiro lugar, que eu provasse não se ocupar a associação da
juventude com questões políticas, ao passo que, diversamente, porém, representa
um princípio de Direito o de que o acusador deve proporcionar a
prova do ato.
Então, quando, porém, formei a prova em destaque, o Tribunal
declarou simplesmente : "Não existe nenhum pretexto para uma adicional
produção de provas."
Com isso, um dos Direitos Constitucionais
mais fundamentais de inúmeros cidadãos do Estado Prussiano foi,
em sua base e em seu fundamento, categoricamente atropelado.
Nesses casos, tornamo-nos indefesos, pois não existe nenhuma
instância que se coloque acima de um tal Tribunal.
As garantias que essa Jurisdição Administrativa
devem oferecer descansam sobre pés de barro, de tal sorte que delas se pode
praticamente estar desprovido.
Podemos saudá-las, no máximo, na medida em que nos
fornecem valioso material para a agitação.
Em Württemberg, pode ser que, nessa
matéria, algo esteja melhor.
Qual é a situação, porém, da quarta parte ou da décima
parte de nossos casos que podemos designar como Estado de Direito
?
Aqui, evidentemente, nesse contexto, devemos
desconsiderar o capítulo especial da Justiça Militar
!
Encontram-se criadas no Estado de Direito
garantias apropriadas ?
Vejamos, inicialmente, o tema da "Independência
do Estamento dos Juízes !"
Se o juiz tem de se postar acima do Estado, então tem de
ser, naturalmente, "independente".
Possuímos, porém, essa independência ?
Examinemos, primeiramente, a independência externa.
O juiz é, diz-se dessa maneira, "irremovível".
Mediante lei, regula-se, porém, como e em que
circunstâncias pode o juiz ser removido.
Isso precisamente já é suficiente !
Também, em lei, encontra-se, efetivamente, regulado
como alguém pode ser condenado por delito de Alta Traição.
Assim igualmente, é possível que alguém seja condenado.
Se, na lei, regula-se como o juiz pode ser removido, o
caminho para a remoção já está praticamente indicado.
Entre nós, ninguém tem também o Direito de ser empregado
assalariado.
Eu mesmo vivenciei essa situação !
O advogado é obrigado, tal qual o juiz, a cumprir, de
antemão, o seu período de estágio judiciário.
Solicitei minha admissão como estagiário, depois da
execução de meu exame final do curso do Direito, junto aos Tribunais
Estaduais de Alçada.
Esses Tribunais repudiaram-me, lançando mão
de todos os tipos de pretextos.
Já havia tratado de dizer adeus à minha carreira jurídica
quando, finalmente, o antigo Ministro da Cultura, von Falk,
Presidente do Tribunal de Alçada de Hamm, admitiu-me como estagiário,
em um pequeno esconderijo de Westfalen.
Além disso, vocês conhecem a história dos parágrafos dos
juízes assessores.
O juiz assessor possui o Direito de ser assessor, porém
não terá nenhum Direito de tornar-se, por exemplo, juiz de carreira.
Se um juiz assessor é, então, politicamente suspeito,
pode ficar tão velho como Metusalém que continuará sendo
assessor.
E o que sucede com a independência, se alguém se torna
efetivamente juiz ?
O juiz não quer, em verdade, permanecer para sempre no
escalão mais inferior.
Pretende, pois, ser um pouco promovido, ao que
corresponde, paralelamente, uma elevação de vencimentos.
Isso não é alcançável, porém, por si mesmo.
O juiz a ser promovido necessita ser recomendado por seus
superiores.
Qual superior, entretanto, proporá à sua autoridade
hierárquica mais elevada, p. ex., um social-democrata, tendo em conta que
aquele mesmo pretende tornar-se Presidente do Tribunal Estadual ?
Quem pretende ser promovido - e isso todos o desejam - é
de boa conveniência ser refinadamente silencioso, i.e. não ser
independente, senão, pelo contrário, ser justamente dependente.
Pode-se também ser removido, pode-se ser, friamente,
isolado.
Esses casos existem, sabidamente, de modo copioso.
No caso de juízes que cometeram a monstruosidade de terem
exarado sentenças de liberdade, sendo, por isso, louvados talvez pela
Social-Democracia, temos podido ver, quase regularmente, como desapareceram, em
algum lugar, depois de um certo tempo, em meio a uma sombria decadência.
Basta pensar nos Diretores de Tribunais Estaduais,
Srs. Schmidt e Denso, bem como no Conselho da Câmara de
Apelação do Tribunal, Sr. Havenstein.
Esse último havia contribuído para que
fossem proferidas algumas sentenças toleráveis pela Câmara de
Apelação.
Havenstein conquistara, também, em certa medida, a confiança dos trabalhadores.
Porém, não durou muito e Havenstein
desapareceu.
Evidentemente, possuímos também outras casos de remoção.
Talvez vocês ainda se recordem do belo Processo
Plötzensee, no qual me foi imposta uma peca pecuniária de 500 marcos
alemães.
Nessa ocasião, o Diretor do Tribunal Estadual,
Sr. Opperman, desempenhou um importante papel.
Vocês conhecem, certamente, o nome Opperman.
Sempre que se menciona o nome Brausewetter
há de se mencionar também o nome de Opperman.
Opperman teve conflitos não apenas comigo.
Esse homem foi também promovido, sendo que acabou sendo
empurrado para cima.
Tornou-se Conselheiro do Tribunal Imperial e, por um
triz, tornar-se-ia um dos julgadores, no Processo de Alta
Traição, movido contra mim.
Assim, são as coisas, companheiros !
Finalmente, temos também a correição, cujo instrumento
mais poderoso constitui a exoneração do cargo.
O pressuposto da correição é o de o funcionário
público ter-se tornado indigno do respeito e da reputação que seu ofício
exige.
O que isso significa, demonstra-o a Lex Arons.[5]
Na Prússia, não é possível nem
sequer que um social-democrata seja membro de uma Comissão
de Ensino e, em verdade - tal como recentemente decidiu nosso
próprio Ministro da Cultura -, ministrar aulas de educação
física, quando mais não seja !
Por fim, reflitam acerca do destino daquele médico
da Caixa do Sistema Ferroviário de Wiesbaden que votou
a favor da Social-Democracia, no quadro de uma eleição de segundo turno.
Pensem no Caso Schäufele, ocorrido na
vizinha província modelo !
Até mesmo os advogados, os quais não são nem mesmo
funcionários públicos, vêm sendo arrancados para fora dos colarinhos, por
motivos políticos.
Prova : o Caso Stadhagen.
Segundo opinião muito bem fundada e difundida, toda a
campanha de acusação por alta traição, desencadeada contra mim,
objetiva também, em verdade e em primeira linha, eliminar-me do exercício da
advocacia.
Para mim, é indubitável que esse pensamento oculto
existe.
Se já se procede assim contra advogados, quem seria tão
ingênuo a ponto de acreditar que um social-democrata ou alguém parecido viria a
ser tolerado como juiz ?
Um social-democrata torna-se, logo de antemão, indigno de
respeito aos olhos do Governo.
Se, por acaso, alguma vez, um juiz viesse
a tornar-se social-democrata, poderia estar certo de que não duraria
48 horas para que o tornassem "inofensivo".
Deveria um social-democrata poder tornar-se um juiz das
autoridades públicas imperiais ?
Isso está longe de suceder-nos.
Todo ministro fica com os fios do cabelo arrepiados
quando, a milhões de milhas de distância, pensa em coisa semelhante.
Porém, que a exoneração do cargo representa para um juiz
uma inteira aniquilação de sua existência, um fantasma assustador e perverso,
isso resulta plenamente evidente.
Por último, examinemos a coroação do edifício da
independência.
Quase todos nossos juízes são, mais ou menos, oficiais da
reserva e, com isso, submetidos, em grande medida, à disciplina militar, ao
controle e à regulamentação !
O déspota do militarismo, inimigo do povo, agita o seu
cedro também sobre a Justiça Burguesa "Independente".
Assim, posso sumariar meu pensamento com as seguintes
palavras :
Junto aos juízes, eruditos e de carreira, a independência
formal, externa, encontra-se também apenas garantida enquanto dela
fazem um "uso racional".
Coisa semelhante ocorre com o cidadão do Império
Alemão e com o Direito de eleger-se o Parlamento Imperial.
Vendo-se mais minuciosamente, não resta praticamente nada
da independência externa.
Porém, ainda pior é a situação da independência
interna dos juízes.
Estirou-se um verdadeiro arame farpado em torno do ofício
judiciário.
De início, através do longo tempo de formação que, na
maioria das vezes, é apenas concluído aos 27 anos de idade.
A seguir, mediante o tempo dilatado de espera não
remunerada dos assessores.
Também não desconhecemos o fato de que os soldos dos
nossos juízes não são, absolutamente, elevados.
Até mesmo, muitos membros pertencentes aos círculos
burgueses, dotados de mais baixos rendimentos, que seriam até mesmo
capazes de julgar com independência, são, por isso mesmo, repelidos
do ofício judiciário.
Assim, fato é que quase nenhum outro profissional,
além daqueles das camadas abastadas, alcança o ofício judiciário, e o que isso
significa não careço de analisar mais profundamente.
Conhecemos o caráter de nossa sociedade enquanto
sociedade de classes.
Sabemos que os possuidores exercem a dominação, que
formam a oligarquia, conservadora em suas mãos do poder do Estado, e
sabemos que as classes dominantes são aquelas cujos Direitos encontram-se
ameaçados pela classe proletária.
Com isso, chegamos a um domínio particularmente
restrito de nossa Justiça.
Certamente, encontramos inúmeros equívocos também na
condenação judiciária de pessoas burguesas.
Nosso ordenamento processual-penal não presta,
precisamente, para nada.
Devemos recordar apenas a superioridade da Procuradoria
do Estado em face do acusado e da defesa, superioridade essa que imprime um
selo especial à nossa Justiça.
A posição inquisitorial do Presidente, os
inquéritos preliminares e sigilosos, o instituto do Juiz de Investigação,
a regulamentação da prisão para apuração - tudo isso representa graves
deficiências do processo alemão-imperial.
Essas deficiências são, em si e por si mesmas,
apropriadas para brutalizar o acusado enquanto puramente acusado.
Isso também é uma parte da razão de Estado
!
Se se trata, então, porém, de pessoas e coisas de outras
esferas de interesses e de vida, estranhas ao juiz, a situação é, naturalmente,
bem particular e bem mais séria.
Os juízes não são, nesse caso, em via de regra, capazes
de julgar devidamente.
Tratando-se de trabalhadores, organizados política e
sindicalmente, bem como de seus respectivos interesses, surgem os mais
complicados obstáculos no caminho rumo a uma apreciação serena e
objetiva.
O juiz entende tudo, obviamente, do ponto de vista de sua
classe particular.
Não possui, precisamente em noventa e nove porcento dos
casos, nem sequer uma percepção clara acerca dos costumes de vida extrínsecos
da outra classe.
Vivenciamos muito freqüentemente o fato de que, se alguém
do povo fala, sem preconceitos, diante de um Tribunal todas as agruras que
sente - o que o juiz considera como descaramento -, é ameaçado com
punições legais, sendo que, finalmente, estas lhes são impostas.
O juiz não entende tudo isso de modo melhor,
pois defronta-se, de maneira incompreensível, com o jeito de ser peculiar
de tais pessoas.
Porém, possuímos também juízes leigos.
Esse também é um capítulo especial.
Até há pouco tempo, na Alemanha, os
proletários foram excluídos, quase por princípio, do ofício dos juízes vogais
assistentes e jurados.
Nosso sistema judiciário, não por acaso, concede essa possibilidade,
sete vezes sete, de maneira bíblica.
E isso ocorre não apenas no que concerne aos juízes
assistentes, senão, mais ainda, no que respeita aos jurados.
Trabalhadores não são convocados.
Particularmente, quanto aos jurados, estes
são inteira e completamente excluídos.
Escolhe-se, para jurados, apenas a "elite".
Assim, sucede que aos tribunais de jurados e de juízes
vogais assistentes não se atribui nenhuma titulaçãozinha de qualidade
melhor do que aquela que possuem os tribunais de juízes eruditos de
carreira.
Os juízes vogais assistentes e os jurados são, também,
igualmente, membros das classes possuidoras.
Em face dos juízes leigos que, na maioria das vezes, não
conhecem suficientemente as prescrições legais de modo a sentirem-se por elas
vinculados, defronta-se o acusado com o egoísmo brutal e poderoso de
classe mais freqüentemente ainda do que junto aos juízes eruditos de
carreira.
O fato de que os juízes leigos não são, em absolutamente
nada, melhores do que os juízes eruditos demonstra a circunstância de
que as mais cruéis sentenças que, até o presente momento, foram exaradas contra
os trabalhadores - tais quais a Sentença de Löbtauer e
a Sentença de Köslin - são produtos dos tribunais de jurados,
pelo menos em 75 porcento.[6]
Nos últimos tempos, impulsiona-se um movimento para
admitir também os que pertencem à classe trabalhadora como juízes leigos.
Muitos poderiam dizer :
"- Vejam, esse é o "espírito
democrático" dos nossos tempos."
Oh, não !
A coisa toda não se revela dessa forma.
Nisso aí não há nenhum indício de espírito democrático !
É apenas a questão monetária que conduz nossa classe
dominante à indulgência.
A sóbria verdade é a de que se pretende baratear os
custos da jurisdição leiga, sendo que há falta de pessoal suficiente.
Os possuidores reclamam contra o fato de terem de prestar
sozinhos esse serviço.
Quer-se, também, lançar mais esse fardo
burguês-estatal sobre as costas das amplas massas.
Essa é a quintessência do cãozinho
poodle de Goethe.
Em regra, a quintessência do poodle é um
Mefistófeles, com pés de cavalo.
Porém, não se fala absolutamente sobre a hipótese de que,
por exemplo, os membros da classe proletária poderiam obter peso
preponderante nos tribunais leigos.
Além disso, filtra-se também, i.e. : os proletários são
ainda suficientemente bons apenas precisamente como tapa-buracos.
A despeito de sermos, por princípio, muito adeptos dos
tribunais de jurados e, em geral, da atuação dos leigos no âmbito do Poder
Judiciário, temos de constatar, porém, que os tribunais de leigos,
em sua atual composição, não são menos tribunais de classe do que
os tribunais eruditos.
Sobre o fundamento dos tribunais de classe
erige-se, porém, a Justiça de Classe.
Como se manifesta a Justiça de Classe ?
Temos um Estado cujo Poder de Governo encontra-se nas
mãos das classes possuidoras.
O Tribunal é, em grande medida, dependente desse Estado e
compõe-se de juízes eruditos e leigos que pertencem às classes possuidoras.
Suponhamos que se trate de uma audiência sobre
perturbação da tranqüilidade pública, rebelião, tumulto, alta traição.
Os juízes possuem, evidentemente, o sentimento pessoal de
que o Estado encontra-se em perigo, bem como a aspiração instintiva de ter a
obrigação de salvar o Estado.
Esse estado de espírito torna-os parciais e incapazes de
contemplar a questão com plena tranqüilidade, claridade e objetividade.
O orador recorda os processos de perturbação da
tranqüilidade pública dos últimos anos e, em particular, os Casos Löbtau e de
Köslin.
Esses e os Processos de Perjúrio de Essen e Güstrow
são, até o presente momento, os casos mais truculentos, na nova Alemanha.
Aqui, acumulam-se, no juiz, motivos da razão política de
Estado e de solidariedade de classe com o empresariado.
Interesse e importante é o Parágrafo 153 do
Ordenamento sobre a Indústria.[7]
Esse parágrafo é, em si mesmo, muito duro, pois conhece
apenas, em geral, penas de prisão.
Em virtude dessa orientação mais mesquinha e inócua, não
se pode estabelecer penas pecuniárias !
Semelhante dureza possui, evidentemente, sua razão
suficiente no fato de que o Parágrafo 153 do Ordenamento da Indústria
relaciona-se puramente com a proteção do empresariado e dos fura-greves, i.e.
constitui, por assim dizer, uma Lei de Classes destilada.
Diante dos maiores barbarismos e atrocidades, até mesmo
em casos de excessos morais, é possível e bastante freqüente cogitar de penas
pecuniárias.
Porém, segundo o Parágrafo 153, o malfeitor
deve sumir para dentro da caçapa.
Se um piqueteiro diz a um fura-greve :
"- Estimado companheiro, você pertence ao
nosso sindicato. Como pode querer vir trabalhar aqui ?"
E o fura-greve replica, rudemente :
" - O que é que você tem a ver com isso
?", sendo que o piqueteiro observa, então,
em uma irrupção de ressentimento :
"- Você não tem mesmo vergonha na cara,
não é ?"
Sabem com o que sai lucrando, então, o piqueteiro ?
Com 14 (quatorze) dias de prisão, companheiros !
Esse é literalmente um caso que tenho em meu escritório.
Nossa Justiça Capitalista situa-se sob o
signo da canonização e da mistificação do piqueteiro.
Tendo-se em conta esse culto do piqueteiro, as pessoas
querem freqüentemente subtrair-se a essa execração.
A palavra terrorismo há de surgir em todas as sentenças,
nas quais se trate de procedimentos sobre greves de qualquer modalidade.
Essa palavra pertence ao patrimônio de ferro de nossa Justiça.
Quão assiduamente proclamam os Tribunais
que há de se por um fim ao terrorismo dos trabalhadores organizados.
É "dever do Estado" tutelar os
que desejam trabalhar.
Argüi, junto à Câmara de Apelação do Tribunal,
que, caso isso, se tratasse de um dever do Estado, haveria, então, de estar,
porém, em algum lugar, positivado em leis.
Esse não é, entretanto, o caso.
As leis e, em particular, a Constituição,
demonstram, muito mais, a falta de juridicidade de uma tal proteção
particular.
A Câmara de Apelação do Tribunal declarou,
porém, simplesmente, que se trataria, precisamente, no mínimo, de um dever
moral do Estado, o de proteger especialmente o fura-greve e, com isso, basta.
Agrega-se ainda aos delitos de suposta coerção e injúria,
cometidos contra os fura-greves, pessoas essas últimas desejosas de trabalhar,
o famoso Parágrafo da Extorsão e sua ainda mais renomada
aplicação, a qual prematuramente alcançou o mais sagaz aguçamento em
nossa Justiça de Classe, na medida em que emprega a razão
de Estado, no interesse das classes economicamente
dominantes.
A extorsão é um dos delitos mais repugnantes que se
possa imaginar.
O extorsionário é, na realidade, um homem vil !
Sobre este recai a pesada acusação de que explorou o
estado de necessidade e a situação de coação de uma outra pessoa, a fim de
obter privilégios materiais.
Tomem, agora, em consideração o caso em que os trabalhadores,
empregados por um certo empresário, não estejam satisfeitos com o seu
salário, ou o caso em que o empresário lhes queira pagar menos salário do que
aquele pago até então.
Os trabalhadores levantam, porém, sua reivindicação
salarial e afirmam :
"Se você não nos pagar o salário, não podemos
continuar trabalhando. Paralisaremos o trabalho."
Companheiros !
Isso configura extorsão, segundo a invariável
jurisprudência dos últimos anos.
O Tribunal do Império assevera :
" - Se os trabalhadores não continuarem a
trabalhar, não poderá o empresário continuar trabalhando. Este é obrigado a
deixar toda a fábrica paralisada."
Os trabalhadores valem-se, portanto, do estado de necessidade
do empresário, com a finalidade de obter salários mais elevados, i.e. aferir um
privilégio patrimonial ilegal.
Isso que digo está, ponto por ponto, de acordo com aquilo
que o Tribunal do Império consolidou mediante jurisprudência.
Porém, como transcorre a coisa toda, em sentido inverso ?
O que acontece se o empregador afirma :
" - A partir de agora, vocês receberão 5
centavos a menos de salário por hora e, caso não estejam satisfeitos com
isso, posso demitir-lhes."
Uma vez demitidos, os trabalhadores são lançados na rua,
permanecendo, então, totalmente despojados, lesados de modo infinitamente
mais sério do que o empresário, quando paralisa as máquinas por algumas
semanas.
Sem embargo, companheiros, isso não
configura qualquer extorsão que seja !
Segundo a visão dos tribunais, o empresário age sempre
de boa fé !
Efetuamos tentativas de intervir contra os empresários,
porém tais tentativas fracassaram.
Sim, companheiros, essa é a Justiça de Classe.
Nesse contexto, posso fornecer-lhes algumas notícias
acerca de meu Proceso de Alta Traição.
Vocês sabem precisamente que escrevi um livro sobre Militarismo
e Anti-Militarismo, livro este redigido muito prudentemente.
Um livro do qual - tal como posso, desde logo,
assegurar - não subtrairei uma só palavra e acerca do qual posso, já no dia de
hoje, garantir ao futuro juiz do Tribunal do Império que sua
sentença não surtirá, em relação à minha atividade anti-militarista,
aquele êxito que provavelmente constitua o principal objetivo de sua decisão.
Ordenou-se a apreensão do livro em tela.
Esse fato não é propriamente ruim, sendo que isso ocorre
até mesmo freqüentemente, sobretudo entre nós.
Não fiquei muito surpreendido com esse fato.
Logo a seguir, recebi também a visita de uma autoridade
pública.
Disse ao homem que a representava :
" - Bom dia. O Sr. quer, então,
possivelmente, levar-me preso."
Fiquei, porém, inteiramente, surpreendido sim com o
fato de que não quis levar-me consigo.
Companheiros ! Já me encontro precavido em relação a
tudo.
Conheço nossa Justiça demasiadamente bem
para que não houvesse de acautelar-me com todas as coisas.
Afirmam que cometi Alta Traição.
Nisso se inclui a idéia de que alguém planejou ou
preparou, em um dado momento, não por demais distante, um determinado ato que
tem por objetivo a derrubada violenta de nossa Constituição ou de
uma de suas partes integrantes.
Minha Alta Traição deve ter almejado
eliminar o Exército Regular que constituiria um fundamento de
nossa Constituição.
Querem tornar, portanto, nosso Exército Regular
intocável, sacrossanto, apesar de que seja atacado, não apenas pelos
social-democratas, como sendo uma ignomínia cultural.
Mais ainda : não se acredita que aspiro
à eliminação de nossa forma de organização militar apenas
ulteriormente.
Acerca disso, sou, porém, cauteloso e racional.
Reconheço inteiramente que lamento não ser
possível ir mais rapidamente.
Os dominadores têm, entretanto, muito mais medo do que
precisam ter, para o atual momento.
Acreditam que, de um momento para o outro, poderia advir
um colapso.
Eis aí uma consciência perversa !
E o que sucede com a violência para a eliminação do Exército
?
Sobre isso, não mencionei uma palavra em meu livro.
O que assinalei foi o fato de que, na população,
existem diversas classes cujos interesses se confrontam, que a classe
trabalhadora é a classe mais numerosa, tanto na população quanto no Exército,
e que essa classe torna-se e tornar-se-á cada vez mais claramente
consciente de seus interesses.
Companheiros !
No momento em que todos os trabalhadores adquirirem sua
consciência de classe, nosso Exército, em si mesmo, entrará
em colapso.
Isso foi o que afirmei.
Não se trata aqui, porém, de nenhuma violência
!
A conscientização da classe trabalhadora não consiste em
nenhum meio de violência.
Porém, os dominadores procuram pela "violência",
enquanto fato gerador da Alta Traição !
Que fazer ? De onde se tirar e não roubar ?
Sendo assim, tentam salvar-se a si mesmos.
Inicialmente, o Supremo Procurador do Império
afirmou que fomentei o plano de instigar a França a desferir
um ataque contra a Alemanha e, em verdade, com o auxílio da Social-Democracia
de ambos esses países.
Nessa oportunidade favorável, haveria eu, de minha
parte, de ter pretendido aniquilar o Exército.
O documento no qual o Supremo Procurador do Império
formula essa ousada afirmação constituirá ainda uma fonte de prazer hilariante
para as futuras gerações.
Evidentemente, o libelo não podia manter essa
posição.
Chamei, com todo o respeito, a atenção do Juiz do
Inquérito para o fato de que todo o meu livro tratava precisamente
acerca das possibilidades e meios de impedir uma guerra, a ser
travada especialmente entre a França e a Alemanha,
bem como obstar todas as atividades de violência, praticadas por esses países,
consideradas em geral.
Agora, descobre-se algo diferente.
Afirmam que devo estar perseguindo o objetivo de tomar em
minhas mãos a produção de armamentos e abastecer os trabalhadores com armas,
formando-os e exercitando-os no uso delas, com vistas a, com esse Exército
Proletário, golpear a parte fiel remanescente do exército
regular, para a sua total desgraça.
Trata-se aqui de uma autêntica fantasia, retirada a
partir da Revolução Russa de 1905.
Não sei dizer por que meios o Exército Regular
tomou conhecimento desse meu plano fúnebre.
Não quero trair o segredo de saber
se acalento esse plano, talvez, em meu coração de conspirador, porém,
em meu livro nada existe, nesse sentido.
Às vezes, ele parece conter algo que nele não se
encontra absolutamente.
Quero permanecer cortês e declarar minhas
felicitações ao Supremo Procurador do Império por sua
imaginação extraordinária.
Presentemente, a sessão de abertura do senado do Tribunal
do Império encontrou, em sua resolução, ainda um terceiro método para
me esmagar.
Três diferentes sendeiros para o atingimento de um único
objetivo, demonstrando-se a todos e cada um que apenas um objetivo havia
sido colocado : "Condenar a qualquer custo", para,
apenas posteriormente, iniciar-se com a procura de um caminho para o
alcance desse objetivo.
O Conselheiro Secreto de Guerra, Sr.
Romen, o velho renomado assassino de socialistas - que
soube também encontrar, de modo magnífico, o caminho para proteger seu
próprio irmão da expiação de uma pena de prisão, cominada em virtude de injúria
-, escreveu, no jornal "Tag (O Dia)", um artigo contra
o Anti-Militarismo e, em particular, contra mim.
No Parlamento do Império, o Ministro
da Guerra, o Sr. Von Einem, levantou-se contra a minha Propaganda
Anti-Militarista.
Imediatamente a seguir, a Procuradoria do Império
interveio contra mim.
Tudo isso se contextualiza não apenas em sentido
temporal.
Celebraram um acordo, precisamente nos círculos de
autoridade, acerca do fato de que a Campanha Anti-Militarista
haveria de ser sustada.
Então, tornou-se ou torna-se necessário encontra um
caminho que possa ser percorrido.
Já haviam erigido duas forças contra mim.
Por duas vezes, porém, a corda esgarçou.
Agora, pergunta-se se a terceira corda irá resistir ?
Não me entrego, porém, a nenhuma ilusão.
Em caso de necessidade, será encontrada a quarta corda de
estrangulamento.
Sinto-me já inteiramente no papel do enforcado.
Essa acusação representa, politicamente, para mim e para
o Anti-Militarismo, que reiteradamente refiro, um verdadeiro presente
dos deuses.
Ela pode apenas nos servir e apenas prejudicar os
outros.
Agora, passo à formulação de algumas observações de
caráter geral.
A Justiça de Classe exprime-se em quatro
(4) sentidos :
1)
Preambularmente, expressa-se na própria condução
do processo judicial.
Todos os dias, presenciamos a circunstância de que
acusados dos "melhores estamentos", ao surgirem diante do Tribunal,
com um bom traje, são tratados, já na audiência, de modo inteiramente
distinto daquele com o qual se trata os pobres diabos, trabalhadores
ou "canalhas" da Social-Democracia.
Isso é Justiça de Classe !
2)
A seguir, então, ela se manifesta na contemplação
unilateral do material do processo judicial e na apreciação parcial da
situação fática.
Essa é, talvez, a parte mais importante da Justiça
de Classe !
Obviamente, existem muitíssimas exceções entre os juízes.
Isso não ignoro.
Conheço, especialmente em Berlim, também
algumas forças muito competentes em que se pode depositar a mais plena
confiança.
Porém, onde seriamente entra em jogo, a Justiça
de Classe jamais fracassou.
Não defendo a concepção de que os juízes pervertem, por
exemplo, o Direito, consciente e maldosamente.
Certamente, juízes desse último gênero também existem.
Desses, entretanto, não nos ocupamos.
Pois, não é a existência da exceção de indivíduos
criminosos, senão a regra, i.e. o caráter de classe dos juízes, o
que adquire, socialmente, importância.
Os juízes agem, em geral, com a melhor das consciências,
porém no marco das melhores das consciências não logram nada fazer senão Justiça
de Classe !
Não são capazes de conceber a situação fática
corretamente.
Compreendem tudo, de modo diverso.
Aos seus olhos, tudo adquire um
significado distinto.
O orador comprova essa afirmação com
uma série de exemplos da prática social efetiva dos processos
judiciários.
Os juízes não possuem sensibilidade para com um
acusado proletário, precisamente porque vivem, pensam e sentem, em um
outra dimensão.
O que não presenciamos em nossos processos sobre questões
de imprensa !
Que absurdo de interpretações !
O orador recorda o Processo da Ilha do
Imperador.
É característico o modo segundo o qual se procedeu,
outrora, visando a deduzir, das notícias do "Vorwärts
(Avante!)" uma injúria à Sua Majestade, o Imperador.
Pensem, a seguir, no "Processo das Manchetes",
movido contra o "Leipziger Volkszeitung (Diário Popular de
Leipzig)", em razão de dois artigos intitulados : "Böhme
e Liman" e "Die Leipziger Justiz auf der
Anklagebank" (A Justiça de Leipzig no Banco de Réus)", consistiu
meramente em um informe acerca do curso de um processo judicial.
Nesse último caso, a manchete haveria, em verdade, de
anunciar : "a Justiça trunca, de maneira pior do que
o acusado o faz, razão porque os papéis estão, em certa medida,
trocados."
Exigi a leitura, em voz alta, do artigo em questão, para
demonstrar esse fato.
Porém, o Tribunal de Leipzig rejeitou,
sumariamente, meu pedido.
Apenas a "manchete" foi lida e, por
causa desse título suspenso no ar ("Die Leipziger Justiz auf der
Anklagebank" (A Justiça de Leipzig no Banco de Réus)"), nosso
companheiro de Partido, Herre, teve de mofar durante dois
meses na cadeia.
Nada obstante, é assim que se interpreta, quando se
é inimigo político.
Um proletário jamais teria senteciado dessa forma.
Isso é Justiça de Classe !
3)
Entretanto, a Justiça de Classe externa-se
também na interpretação das leis.
Também essa última atividade é fortemente influenciada
pelo ponto de vista de classe dos juízes.
A jurisprudência dos Parágrafos de Extorsão
que, além disso, é extremamente distinta para empregadores e empregados,
fornece-nos o mais inequívoco exemplo.
Isso é Justiça de Classe !
4)
A Justiça de Classe manifesta-se,
igualmente, no descomunal rigor das penas contra os odiados política e
socialmente e, sobretudo, contra os social-democratas.
Já me referi ao Processo de Köslin.
Naquela ocasião, no quadro da greve dos pedreiros
de Kolberg, um trabalhador, já porém penalmente reincidente, respondeu
a um policial que conclamava os grevistas a irem para casa :
"Por que deveríamos nós ir para casa.
De igual maneira, os fura-greves também poderiam
dirigir-se para as suas casas."
Isso custou ao homem três anos de penitenciária.
Há dois anos, em uma cidadezinha da Turíngea,
chamada Hildburghausen, em que se situa uma faculdade de
tecnologia na qual, evidentemente, estudam os que pertencem aos "melhores
estamentos", ocorreu uma "Revolta dos Estudantes",
visto que um estudante de tecnologia - alías por boas razões - foi preso por
um policial.
Os estudantes de tecnologia reuniram-se nas ruas,
agrediram as autoridades policiais, empreenderam um ataque contra a delegacia
de polícia, golpearam vidraças.
Bombeiros e policiais militares precisaram ser acionados,
sendo que, apenas depois de muito esforço, conseguiu-se limpar o local.
Diversos estudantes de tecnologia foram acusados.
Um deles defendi, então, na cidade de Meiningen.
Eles todos, considerados em seu conjunto, foram castigados
com penas pecuniárias de aproximadamente apenas 100 marcos alemães, por cabeça.
Com isso, não afirmo que a Sentença de Meiningen
tenha sido equivocada.
Foi correta.
Erradas, inteiramente duras e parciais, são apenas as
sentenças de perturbação da tranqüilidade pública, proferidas contra os
trabalhadores organizados.
Em Köslin, a hidra da greve encontrou-se
por detrás dos acusados.
Os juízes foram parciais.
Isso é Justiça de Classe !
A Justiça de Classe é implementada contra
o proletariado odiado não apenas através da interpretação de leis especiais :
ela se apresenta não somente no extraordinário rigor em relação aos
trabalhadores, senão também na grandiosa clemência e na
compreensão benevolente, concedidas aos pertencentes das classes dominantes,
se estes se tornam, por alguma vez, objeto de apreciação do Poder
Judiciário.
Citei provas disso.
O julgamento indulgente dos excessos das autoridades
policiais e dos empresários que se chocam contra as leis sócio-políticas,
apresenta-se aqui de modo particularmente característico.
A Justiça de Classe reina por todos os
lados no Estado de Classe.
Dirijamo-nos para o assim-chamado "país mais
livre do mundo", para os Estados Unidos da América.
É surpreendete o que assistimos no Processo
Haywood ![8]
Um dirigente dos trabalhadores é pura e simplesmente
acusado de assassinato, com o objetivo de neutralizá-lo, tornando-o inofensivo.
Uma testemunha que pertence à escória da humanidade é
arranjada, apenas para conduzir à guilhotina um inimigo político, um dirigente
da classe trabalhadora.
Justiça de Classe também nos Estados Unidos da América !
Ela é omnipresente, precisamente porque é Justiça
de Classe, porque é a Justiça do ubíquo Estado de Classe.
Também a nossa luta, que, hoje, impulsionamos contra
a Justiça de Classe, não será eliminada pela Justiça de
Classe.
Esta outoga àquela, porém, pequenas concessões, em última
instância, por temor e horror da classe trabalhadora e a fim de que o povo
trabalhador não se torne por demais selvagem e tempestuoso.
De toda sorte, o mais importante para nós
permanece sendo a conscientização das massas e essa conscientização,
devemos fomentá-la com energia.
Devemos conscientizar o povo acerca do fato de que o
Estado contemporâneo é um Estado de Classe e que, por
consegüinte, a Justiça contemporânea, que se encontra nas mãos dos inimigos do
proletariado, é Justiça de Classe.
Havemos de conscientizar o povo de que condições de
liberdade podem ser apenas atingidas se todos os trabalhadores permanecerem unanimemente
juntos e, com todas as forças, trabalharem por uma transformação de nossa
sociedade de classes em uma sociedade socialista.
Nossa companheira, que se apressou a vir da Índia,
esse maravilhoso país, ao nosso Congresso Internacional,
declarou, ontem, em sua maneira simples e descomplicada :
"O que é o socialismo, senão a própria
Justiça " ?
Companheiros e companheiras do Partido !
Essa é uma profunda verdade !
A Justiça é apenas possível através da
eliminação do Estado de Classe pela Social-Democracia.
Assim, concluo solicitando a vocês que mantenham sempre
em conta o fato de que não podemos esperar nossa salvação da voluntária
magnanimidade dos dominadores ou da amável adaptação dos Governos do
Estado de Classe.
A consolidação do Poder Proletário : essa é
a nossa salvação !
O meio mais importante para isso é, aqui novamente :
ganhar os trabalhadores para que ingressem nas nossas organizações, para
que ingressem no nosso Partido !
Sobretudo nessas sedes, devem ser formados e
amadurecidos para travarem a luta tempestuosa de libertação do proletariado e
de toda a humanidade em face dos grilhões, impostos pelo capitalismo e pelo Estado
de Classe.
EDITORA DA
ESCOLA DE AGITADORES E INSTRUTORES
“UNIVERSIDADE
COMUNISTA REVOLUCIONÁRIA J. M. SVERDLOV”
PARA A
FORMAÇÃO, ORGANIZAÇÃO E DIREÇÃO MARXISTA-REVOLUCIONÁRIA
DO
PROLETARIADO E SEUS ALIADOS OPRIMIDOS
MOSCOU - SÃO
PAULO - MUNIQUE – PARIS
[1] Cf. LIEBKNECHT,
KARL. Rechtsstaat und Klassenjustiz. Bericht über einen Vortrag in
einer Massenversammlung in Stuttgart (Estado de Direito e Justiça de Classe.
Relatório de uma Palestra Realizada em uma Assembléia de Massas em Stuttgart)
(23 de Agosto de 1907), in : Karl Liebknecht. Gesammelte Reden und
Schriften (Karl Liebknecht. Discursos e Escritos Completos), Vol. 2 :
De Fevereiro de 1907 a Fevereiro de 1910, Berlim : Dietz, 1960, pp.
17 e s.
[2] Indicação de Emil Asturig von
München : Nessa passagem, Karl Liebknecht refere-se
à extradição de Harry Quelch, executada, em 22 de agosto de 1907,
pelo Governo do Estado de Württemberg, situado no sul da Alemanha. Quelch,
importante personalidade política da época, foi representante da Federação
Social-Democrática da Inglaterra junto ao Congresso Socialista
Internacional, realizado entre 18 e 24 de agosto de 1907, em
Stuttgart. O motivo jurídico de sua extradição está relacionado com o fato de Quelch,
no terceiro dia do mencionado congresso, haver designado a II
Conferência da Paz de Haia com a seguinte expressão muito corrente
entre os socialistas britânicos de então : "a thief's supper",
i.e. "uma ceia de ladrões".
[3] Indicação de Emil Asturig von München : Observe-se que,
na literatura jurídico-política alemã, designa-se como "Portaria do
Segmento" a lendária medida estabelecida pelo Ministro do Interior
da Prússia, Hammerstein-Loxten, de 1902, que permitiu a
permanência de mulheres em assembléias políticas desde que acomodadas essas
últimas em uma parte especial da sala, i.e. no "Segmento das
Mulheres".
[4] Indicação de Emil Asturig von
München : Importa destacar, de passagem, que, em 28 de fevereiro
de 1906, a Associação dos Aprendizes e Trabalhadores Jovens de Könisberg
foi proibida, em razão de pretensamente fomentar a atividade política e
tendências social-democráticas. Foram instaurados diversos processos em
que membros dessa associação foram condenados ao pagamento de multas
pecuniárias e de privação de liberdade. O presidente da associação em tela foi
apenado, p.ex. com 4 meses e 15 dias de prisão.
[5] Indicação de Emil Asturig von
München : Observe-se, por oportuno, que a LexArons
estabeleceu, a partir de 1898, a submissão dos professores de universidade
livres docentes, não remunerados e, até então, não atuantes como funcionários
públicos, ao poder disciplinar do Estado Prussiano. Essa alteração legislativa
dirigiu-se particularmente contra a Social-Democracia e foi, pela primeira vez,
utilizada contra o livre docente social-democrático de Física, de nome Arons.
Arons foi expulso da Universidade de Berlim, em 20 de
janeiro de 1900, por causa de sua filiação à Social-Democracia.
[6] Indicação de Emil Asturig von
München : Cumpre assinalar que a Sentença de Löbtauer -
esse último nome designador de uma localidade situada em Dresden -
foi proferida em fevereiro de 1899. Por meio da sentença em realce, 9
trabalhadores mineiros foram condenados ao cumprimento de uma pena de
penitenciária e de prisão que, em seu total, somava 61 anos, simplesmente
porque protestaram contra o fato de que, em uma mina vizinha, trabalhava-se
muito além da jornada de trabalho convencionada. No presente caso, foram também
registradas agressões, depois de ter o proprietário da mina realizado disparos
aleatórios com um revólver de percussão. Quanto à Sentença de Köslin, coteje-se
as próprias considerações formuladas por Karl Liebknecht, nas
páginas a seguir.
[7] Indicação de Emil Asturig von
München : Quanto à disciplina do Ordenamento sobre a
Indústria da Alemanha, assinalo que os seus parágrafos 152 e 153
prescreviam, à época, expressamente o seguinte : "Parágrafo 152. Ficam
suprimidas todas as proibições e prescrições penais contra agentes de
indústria, auxiliares industriais, companheiros de corporação de ofício ou
trabalhadores de fábrica em razão de acordos e associações, destinadas à
obtenção de condições de trabalho e salário, em particular por meio de
suspensão do trabalho ou demissão de trabalhadores. Para todo e qualquer
membro fica sendo livre o afastamento de tais acordos e associações. Do
retro-exposto não se processará ação ou exceção." E a
seguir : "Parágrafo 153. Quem forçar ou procurar forçar outra pessoa,
mediante emprego de coação física, ameaças, lesões de honra e declarações de
descrédito, a participar de tais acordos (§152) ou seguí-los, bem
como impedir ou procurar impedir outra pessoa mediante meios análogos,
será condenado com pena de prisão de até três meses, desde que não se
preveja penalidades mais rigorosas pelas Leis Penais em geral."
[8] Indicação de Emil Asturig von
München : Cumpre destacar que Liebknecht refere-se
aqui ao processo judicial movido contra W. D. Haywood, influente
dirigente da Associação dos Mineiros do Oeste dos EUA, co-fundador,
em 1905, da organização operária, denominada Trabalhadores Industriais do
Mundo (IWW), membro do Partido Socialista dos EUA e
co-fundador, em 1920, do Partido Comunista dos EUA. Em 1906,
no Estado do Colorado, W. D. Haywood foi lançado ao cárcere,
juntamente com C. H. Moyer e G. Pettibone, de
maneira plenamente ilegal, vindo a ser indiciado por assassinato do
ex-governador do Estado de Idaho, Steunenberg, com provas
colhidas junto a testemunhas compradas. Esse processo foi encerrado, a seguir,
em 1907, com sentença de absolvição dos acusados.