PRODUÇÕES LITERÁRIAS DEDICADAS À FORMAÇÃO
DE REVOLUCIONÁRIOS MARXISTAS QUE ATUAM NO DOMÍNIO DO
DIREITO, DO ESTADO E DA JUSTIÇA DE CLASSE
INTRODUÇÃO À OBRA
“PEQUENOS ENSAIOS SOBRE
MARXISMO E DIREITO, SOCIEDADE E ESTADO NA REVOLUÇÃO”
O Poder Judiciário no
Estado Burguês
e a Perspectiva dos
Tribunais da Revolução de Outubro
EMIL ASTURIG VON MÜNCHEN
Para Palestras e
Cursos sobre o Tema em Destaque
Contatar emilvonmuenchen@web.de
Novembro de 2000
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Geral
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II.
O PODER JUDICIÁRIO ENQUANTO INSTITUIÇÃO
TIPICAMENTE BURGUESA
II.A. Organização
Institucional dos Estados Escravistas da Antigüidade.
II.B. Fragmentação
das Atribuições Públicas dos Estados Feudais Estamentais
e o Tribunal da
Santa Inquisição
II.C. Os Direitos
de Soberania dos Estados Monárquico-Absolutistas
II.D. A Divisão dos Poderes no Quadro
da Revolução Burguesa da Inglaterra
II.E. A Tripartição de Poderes no Prelúdio
da Revolução Burguesa de 1789:
O Surgimento do Poder Judiciário
II.F. O Poder Judiciário no Quadro
do Fortalecimento da Burocracia e da Força Militar
dos Estados Burgueses dos séculos
XVIII e XIX
II.G. O Poder Judiciário enquanto Guardião da Constituição dos
Estados Burgueses Imperialistas
III.
OS TRIBUNAIS POPULARES ELETIVOS,
I.E. TRIBUNAIS ELETIVOS DOS OPERÁRIOS, SOLDADOS E
CAMPONÊSES DA REVOLUÇÃO DE OUTUBRO :
ALTERNATIVA REVOLUCIONÁRIA
À JUSTIÇA DE CLASSE BURGUESA E ÀS REFORMAS DO PODER
JUDICIÁRIO
III.B. O Estado em face das Revoluções Proletárias
III.C. O Estado Proletário e os Tribunais Populares
Eletivos, i.e. Tribunais Eletivos
dos Operários, Soldados e Camponeses da Revolução de
Outubro
III.D. A Função Revolucionária dos Tribunais Populares Eletivos
da Revolução de
Outubro
III.E. Os Tribunais Populares Eletivos da Revolução de
Outubro
e a Ascensão do
Burocratismo Soviético Stalinista
O PODER JUDICIÁRIO NO ESTADO BURGUÊS
E A PERSPECTIVA DOS TRIBUNAIS DA
REVOLUÇÃO DE OUTUBRO
I.
INTRODUÇÃO
Além dos problemas resultantes dos enfrentamentos entre as
classes sociais que perpassam a existência dos Estados Burgueses e das demais
instituições das sociedades capitalistas contemporâneas é possível
constatar-se, presentemente, a intensificação
de um fenômeno peculiar que desponta, com toda agudez, na América Latina, bem
como em outros países do mundo : nomeadamente os acesos entrechoques e os
diversos conflitos travados entre os poderes jurídico-públicos dos Estados
Burgueses, associados à sua crescente corrupção e tráfico de influências.
Tal fenômeno aprofunda a crise dos Estados Burgueses e das
instituições dos regimes democráticos, erigidos sobre a exploração econômica e
o despotismo capitalista em face da classe trabalhadora e dos demais
socialmente oprimidos, impondo a todos os juristas socialistas-revolucionários
a necessidade de reexame do papel do Poder Judiciário, com vistas a apontar uma
alternativa para a constituição de uma nova Justiça de Classe, formada pelas
massas trabalhadoras e exploradas.
Exemplos recententes da situação política existente em
diversos países do mundo depõem, precisamente, nesse sentido :
·
na França, o escândalo de corrupção envolvendo diretamente o Presidente
do Conselho Constitucional, Roland Dumas, nomeado em 24 de feveiro
de 1995 por François Mitterrand, e os subseqüentes protestos públicos de
diversos setores da sociedade francesa, forçaram-no a comunicar, no último 1°
de março de 2000, sua demissão do posto máximo do Poder Judiciário Francês
(agora denominado de Pouvoir Hautain, i.e. o Poder Presunçoso),
abrindo uma profunda crise de credibilidade no seio do órgão supremo
jurisdicional desse país;[1]
·
na Alemanha, o mais renomado Presidente do Tribunal
Constitucional da Alemanha (Bundesversfassungsgericht) da década de 90
do século XX, Roman Herzog, diretamente nomeado, a seguir, pelo antigo
chanceler da corrupção e da unificação imperialista das duas Alemanhas, Helmut
Kohl, para o cargo de Presidente da República Federal da Alemanha,
surgiu, nos últimos anos, enigmática e surpreendentemente, perante o
cenário público alemão, em virtude de suas estreitas ligações doutrinárias e
profissionais com o recentemente falecido e mais célebre Professor de Direito
Constitucional da Alemanha do pós-guerra, Theodor Maunz, esse último, após sua
morte, identificado publicamente como fiel colaborador acobertado e inspirador
intelectual enrustido da reogarnização das forças neo-nazistas alemãs e
européias da atualidade;[2]
·
na Itália, as confrontações no interior do Poder Judiciário e
da Procuradoria da República Italiana demonstram que os juízes e procuradores
da Operazione
Mani Pulite Nr. 1(Inchiesta Mani Pulite), considerados como heróis
nacionais na luta contra a criminalidade organizada e petrificada no aparelho
de Estado Italiano, graças à colossal influência da Cosa Nostra dos Corleoni,
da Camôrra de la Campania, da ‘Ndragheta Calabrêsa, da Banda dei Sardi, da
Banda della Uno Bianca sobre a burocracia estatal italiana, são os agentes mais
suspeitos e corruptos da Operazione Mani Pulite Nr.2;[3]
·
na Venezuela, o governo de Hugo Chavez embateu-se,
recentemente, contra o Congresso Nacional Venezuelano, conduzindo ao fechamento
desse último para dar lugar a uma Assembléia Nacional Constituinte,
impulsionadora de processos de punição e exoneração de dezenas de juízes
corruptos venezuelanos;
·
na Colômbia, ministros de governo surgem acusando a Procuradoria
do Estado de infiltração guerrilheira;
·
no Equador, processos judicias contra o ex-presidente Mahuad,
impulsionaram a insurreição popular que veio a desencadear a sua derrubada.
·
No Brasil, reiterados conflitos entre os Poderes da República
apontam para o descrédito do Executivo Federal Brasileiro, encabeçado por Fernando
H. Cardoso, vencido pelo desemprego galopante e pelo agravamento da
crise social, ao mesmo tempo em que constantes desentendimentos internos entre
órgãos estatais e instituições públicas brasileiras corroem e desagregam a base
neoliberal de sustentação política presidencial.
O Poder Judiciário Brasileiro, presidido
por Carlos
Velloso, enfrenta-se agora com uma dramática dinâmica de
enfraquecimento existencial e convive com o descrédito da Justiça Burguesa
Brasileira.
Esse descrédito possui suas raízes na
hipertrofia do poder econômico das grandes empresas capitalistas instaladas no
Brasil, bem como no poder dos proprietários prediais e latifundiários, todos
esses ostensivos dominadores da atuação funcional do Judiciário Brasileiro
através de múltiplos laços umbilicais de influência política e econômica.
Nesse contexto, tal descrédito é
aprofundado, presentemente, antes de tudo, pela alarmante corrupção e pelo
tráfico de influência que embasa o vegonhoso aumento de sôldo dos juízes
brasileiros.
Como se isso não bastasse, o Poder
Legislativo do Brasil precipita-se em batalhas campais travadas entre os
presidentes de suas duas casas legislativas.
Nesse contexto de decomposição
progressiva das instituições públicas burguesas brasileiras, Antônio
Carlos Magalhaes surge assumindo posições inglórias, idênticas ao mais
repudiável e ignóbil coronelismo brasileiro.
Diante desse quadro, pretendemos
examinar, no presente texto, a
problemática do Poder Judiciário no seio do Estado Burguês contemporâneo,
apontando uma alternativa socialista-revolucionária às inúmeras e deploráveis
tentativas de reformá-lo e resituá-lo no quadro do sistema capitalista-burguês.
Para tanto, projetaremos nossa exposição em momentos
distintos, porém essencialmente interpenetrados e complementares :
·
o Poder Judiciário enquanto instituição burguesa ;
·
os tribunais populares eletivos, i.e. tribunais eletivos dos
operários, soldados e camponeses da Revolução de Outubro : alternativa
revolucionária à Justiça de Classe Burguesa e às reformas do Poder Judiciário.
II.
O PODER JUDICIÁRIO
ENQUANTO INSTITUIÇÃO TIPICAMENTE
BURGUESA
No quadro dos regimes democráticos erigidos sobre a
exploração assalariada e a dominação política do capitalismo contemporâneo, a
função pública de julgar segundo o Direito Burguês, i.e. a função
político-jurisdicional ou de dicção do Direito Burguês, é exercida sob a
surpreendente e enigmática forma orgânico-institucional de um poder de Estado.
Tal poder de Estado, denominado, correntemente, Poder
Judiciário (em francês : Pouvoir Judiciaire) ou Ramo Judicial
(em inglês : Judicial Branch) ou simplesmente Jurisdição (em alemão : Rechtsprechung),
encontrando sua raison d’être no exercício organicamente independente dessa
função político-jurisdicional, surge consagrado pelos mais diversos diplomas estatal-constitucionais
da atualidade como sendo, por sua própria natureza, um poder de Estado.
Tal poder de Estado aparece, além disso, supostamente
revestido de imparcialidade no julgamento dos casos a ele submetidos e, além
disso, como categoricamente independente em face dos demais poderes de Estado
contemporâneos, i.e. diante dos assim-denominados Poderes Legislativo e
Executivo.
Nesse sentido, os arts. 1° e 2° da Constituição Brasileira de 1988,
dispõem da seguinte forma :
“Art. 1°. A República Federativa do
Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito
Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito. (...)
Parágrafo Único. Todo poder emana do
povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos
termos dessa Constituição.
.................................................................................
Art. 2° São Poderes da União,
independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o
Judiciário.”[4]
Da mesma maneira, a Lei Fundamental da Alemanha, de 1949,
dispõe como segue:
“Art. 20 (Princípios Constitucionais;
Direito de Resistência)
(1)
A República Federal Alemã é um Estado
Federativo, Democrático e Social.
(2)
Todo poder do Estado emana do povo em eleições.
Ele é exercido pelo voto nas eleições, aprovações e mediante órgãos
particulares do Poder Legislativo, do Poder Executivo e do Poder Judiciário.
(3) O Poder Legislativo é vinculado à ordem constitucional, os
Poderes Executivo e Judiciário à lei.”[5]
No mesmo sentido, a atual Constituição da Federação Russa,
de 1993, expressando juridicamente o processo de dissolução da antiga URSS e
de restauração de um Estado Burguês-Capitalista Russo, estabelece :
“Artigo 1°.
A Federação Russa, i.e. a Rússia, é um
Estado de Direito, Federativo e Democrático, dotado de forma republicana de
governo.
.......................................................................
Artigo 10°
O poder do Estado da Federação Russa é
exercido com fundamento na divisão entre Legislativo, Executivo e Judiciário.
Os órgãos dos Poderes Legislativo,
Executivo e Judiciário são independentes.”[6]
O Poder Judiciário, ladeado, dessa maneira, por esses outros
dois poderes de Estado, i.e. o Executivo e o Legislativo, surge, pois, na
atualidade, em um contexto de tripartição jurídico-institucional.
À primeira vista, o poder do Estado Burguês da atualidade
aparenta, dessa forma, estar dividido, sob o aspecto orgânico, em Poder
Legislativo – esse subdividido internamente em duas casas parlamentares ou
congressuais, i.e. Assembléia e Senado -, Poder Executivo – esse outro
subdivido internamente em órgãos de Governo e de Administraçao Pública – e,
finalmente, Poder Judiciário – esse último repartido em inúmeras instâncias
jurisdicionais.
Mesmo sob o aspecto jurídico das funções materiais de Estado,
aparenta o Estado Burguês estar ainda plenamente distribuido, evitando
supostamente a concentração de poder nas mãos de um único déspota totalitário :
a função de produção de políticas públicas e normas jurídicas estaria
distribuída seja através do Legislativo – produtor de leis, leis-medidas e
resoluções parlamentares -, do Executivo – autor de regulamentos e medidas
provisórias -, como do Judiciário – produtor de seus próprios regimentos
internos e julgador de dissídios coletivos -, ao passo que a função de
aplicação dessas mesmas políticas públicas e normas jurídicas também resultaria
repartida, antes de tudo, entre o Judiciário e o Executivo, porém presente, em
certos casos especiais, também no Legislativo.
Defendendo as qualidades naturais e eternas da separação e
divisão dos poderes, a doutrina jurídico-ideológica burguesa procura
obscurecer, em cada página de sua infindável literatura doutrinária, a natureza
mais autêntica da dominação política do Estado Burguês.
Em seu mister de assegurar a exploração e a repressão da
classe trabalhadora e dos demais socialmente oprimidos, tal dominação política
burguesa manifesta-se nos mais diversos campos das atividades humanas das
sociedades capitalistas contemporâneas, em particular no âmbito
ideológico-doutrinário, no domínio jurídico-institucional, bem como no setor
das corporaçoes militares e burocráticas do funcionalismo do Estado.
Sob uma perspectiva dialético-materialista, cumpre assinalar,
assim, que a tão conclamada consagração constitucional das trois puissances ou dos drei
Gewalten (i.e. das três potências ou três poderes) nada mais visa senão
repartir a dominação jurídico-institucional burguesa contida no pouvoir
d’Etat ou no Staatsmacht (poder do Estado), entre
órgãos estatais denominados Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário,
reponsáveis pela produção e aplicação de políticas públicas e normas jurídicas.
A dominação militar e burocrática do Estado Burguês, em sua
essência una e indivisível, entendida como o poder estatal efetivo e soberano par
excellence, permanece, em princípio, intocada e unificada nas mãos da
burguesia, sendo colocada a serviço de seus mais profundos interesses materiais
de exploração econômica do trabalho assalariado.
Sob esse último aspecto, o Estado Burguês, concebido enquanto
máquina estatal da burguesia dedicada à organização da violência suprema de
cunho burocrático e militar estatal, tendo como objetivo fundamental a garantia
da exploração e da opressão da classe trabalhadora e das massas oprimidas no
quadro das sociedades fundadas nas economias capitalistas de mercado, não está
colocado à disposição para divisão entre órgãos de poderes distintos e
independentes.
O poder de organização da violência do Estado Burguês, em essência
uno e indivisível, tal como um produto mais autêntico de toda e qualquer
sociedade dividida em antagonismos de classe inconciliáveis, colocando-se
aparentemente acima da sociedade cindida em classes hostis e dela,
historicamente, alienando-se sempre mais, surge, nesse caso, com a missão
estratégica de atenuar os enfrentamentos sociais – na medida em que não os pode
jamais suprimir -, mantendo-os nos limites da ordem, considerada
ideologicamente como eterna e natural, porém, em verdade, vinculada aos interesses
histórico-materiais da burguesia.[7]
Nesse sentido, o enquadramento dessa força pública militar
especial e dessa burocracia estatal, sob o aspecto jurídico-institucional, no quadro
tanto do Governo como da Administraçao Pública do Poder Executivo, tanto no
âmbito do Poder Judiciário como do Legislativo do Estado Burguês - e, portanto, no interior do “Estado de
Direito”, tal como o Direito Burguês costuma situá-las - pouco pode alterar o
fato de essa máquina de violência e repressão física das classes exploradoras e
essa burocracia administrativa de Estado ser colocada, sob o ângulo da
dominação burocrático-militar da burguesia, a serviço de seus interesses
materiais, posicionando-se, na prática, muitas vezes, acima do próprio “Estado
de Direito” e dos três Poderes erigidos no plano jurídico-institucional.
Para a manutenção de sua dominação política de classe, a
burguesia necessita conservar sempre em suas mãos a unidade e a indivisibilidade
do poder do Estado Burguês relacionado com a organização da violência militar e
da burocracia estatal-profissional, o que se torna clarevidente nas situações
de instauração de regimes ditatorias burgueses.
Nada obstante, em momentos não tão candentes de sua luta
contra o proletariado e os demais oprimidos, opta a burguesia,
preferencialmente, por instaurar regimes democrático-burgueses e divulgar
ilusões constitucionais de defesa das instituições democráticas e dos direitos
sociais, bem como do princípio jurídico-constitucional da divisão dos poderes,
o que, muitas vezes, faz obscurecer perante os olhos das massas exploradas o
verdadeiro caráter de seu despotismo de classe.
Tais poderes jurídico-institucionais de Estado surgem, então,
dinamizados por órgãos estatais distintos, aparentemente independentes e
limitadores dos abusos dos demais.
Na verdade, em tempos de “paz social”, todos os três poderes
de Estado destinam-se a assegurar, harmonicamente, a exploração econômica e a
dominação ideológica da classe trabalhadora e dos demais socialmente oprimidos,
apoiando-se, quando necessário, na violência organizada de Estado, na coerção e
na repressão estatal, veiculada pelos seus mais característicos apêndices
oficiais : a polícia, as prisões, os instituitos penais e de coerção, o
exército permanente etc.
Diversamente, em tempos de crise, os três poderes, entendidos
como órgãos da dominaçao jurídico-institucional da burguesia no quadro do seu
Estado de classe, i.e. como partes da dominação política de classe da
burguesia, tendem a colidir na disputa pelo botim resultante do processo de
exploração dos trabalhadores e dos demais oprimidos.
No momento histórico da atualidade, buscando o projeto
neo-liberal e a sua contraparte mais autêntica, i.e. o projeto
social-democrático, assegurar a rapina desenfreada da classe trabalhadora,
torna-se freqüentemente inevitável que os diversos órgãos do Estado Burguês
entrem em conflito para resguardar seus próprios privilégios.
No contexto dos Estados Burgueses, o princípio da tripartição
dos poderes, enquanto princípio jurídico-estatal e máxima da doutrina geral do
Direito Constitucional Burguês, haveria de surgir e permanecer, entretanto,
revestido de suprema hierarquia e corrente atualidade para a disciplina jurídica
estatal das sociedades capitalistas.
Entre as inúmeras construções teóricas
dedicadas à divisão, à separação, à distribuição, ao balanceamento, à
articulação dos poderes elaboradas por proeminentes pensadores da civilização
humana de todos os tempos, apenas a concepção formulada por Charles
Louis de Secondat, Baron de la Brède et de Montesquieu, que dividiu,
pela primeira vez, o domínio jurídico-institucional do Estado em Poderes
Legislativo, Executivo e Judiciário, adquiriu significado primordial e
incontrastável para a disciplina do Estado Burguês de nossos dias.[8]
As outras concepções de divisão dos poderes parecem ter sido
superadas pela visão pretendidamente mais coerente e racional da tripartição de
poderes do Barão de Montesquieu, sendo ela considerada pela doutrina
burguesa e social-reformista moderna como a teoria que abarcou a verdadeira
essência da instituição estatal, por dotar-se do caráter de única e definitiva
concepção adequada e natural à correta e ponderada repartição do domínio político
no Estado atual.
Investigando-se o transcurso histórico das sociedades de
classes, que atravessa a civilização da humanidade desde a Antigüidade até o
presente momento, é possível, precisamente, constatar-se que a
institucionalização da função de julgar ou jurisdicional nas alturas de um
Poder Judiciário de Estado, supostamente imparcial, neutro e independente,
composto por juízes vitalícios, irremovíveis e com sôldos irredutíveis,
apresenta-se como um produto autêntico e exclusivo das Revoluções Burguesas que
percorreram a Europa a partir do século XVII.
Os principais mentores de tais revoluções procuraram,
entretanto, de maneira essencialmente formal, adaptar em um novo contexto
eminentemente burguês-republicano, porém também monárquico-constitucional -
despido entretanto dos estamentos da sociedade feudal tardia -, a doutrina
relegada pelo Barão de Montesquieu.
Apesar da mais densa e vulgar ideologia jurídico-burguesa que
subjaz à concepção relativa à natureza do Poder Judiciário, considerado como
neutro, imparcial e independente, mesmo alguns juristas alemães burgueses,
dotados de alto potencial crítico e investigativo, não puderam deixar de
suspeitar que tal função público-jurisdicional, por seu próprio caráter
conteudístico de atividade de interpretação e aplicação do Direito vigente em
dada sociedade, pertenceria, fundamentalmente, ao domínio da administração
público-estatal e não a um setor que se pudesse, por sua própria natureza,
consagrar-se como um poder jurídico-institucional de Estado, tido por sua
própria natureza e conveniência como independente e imparcial.
Entre tais juristas, destacou-se Georg Jellinek, de
orientação neo-kantista, que, enquanto Professor de Direito de diversas
universidades da época monárquico-prussiana e monárquico-austríaca, encontrava
motivos de sobra para criticar a versão burguesa-republicana da tripartição de
poderes, elaborada a partir da doutrina
do Barão
de Montesquieu.
Nesse sentido, escreveu Jellinek, investigando o percurso
histórico da formação dos poderes de Estado :
“Na história, houve épocas em que o
Poder Legislativo foi totalmente desconhecido. Somente em culturas
relativamente avançadas, surgiu o direito legislativo, ao lado do direito
consuetudinário. Porém, também hoje, o poder legislativo representa uma função intermediadora.
O Poder Judiciário revela-se,
igualmente, dotado de uma tal função.
Em processos incipientes de
desenvolvimento social, pode transcorrer muito tempo sem que exista nenhum
impulso para a instituição de juízes.
Porém, a administração – que contém em
si o governo – há de ser sempre realizada.
Sem ela, o Estado não pode existir nem
sequer por um momento.
Déspostas sem lei e sem juízes são, no
mínimo, imagináveis.
Estado sem administração significaria, entretanto,
uma anarquia.
A administração é, portanto, a função
mais abrangente.
Todos os preparativos de legislação são
de sua competência.
A atividade é por ela apoiada, assim
como a execução da sentença de direito é por ela assegurada.
Também, historicamente, a administração
surge como função fundamental.
A legislação advém tão somente
posteriormente à administração, dela se apartando.
A atividade judiciária, limitada de
início a uma dimensão estreita, apenas ganha um espaco mais amplo com o
crescente desenvolvimento do Estado.”[9]
Em seu As Próximas Tarefas do Poder Soviético, publicado
em 1918, poucos meses após a Revolução de Outubro, plenamente
atento e consciente dessa problemática jurídica concernente à natureza da
função jurisdicional no quadro das atividades do Estado, Lenin teve a oportunidade
de formular a seguinte análise, no quadro de construção do primeiro Estado
Proletário Internacionalista :
“Na medida em que a principal tarefa do
poder do Estado se torna não a repressão militar, mas sim a administração, a
forma fenomênica típica da repressão e da coação passa a ser o tribunal, ao
invés do fuzilamento sumário.
Também nesse sentido, as massas
revolucionárias percorreram o caminho certo, depois de 25 de Outubro de 1917, e
comprovaram a vitalidade da revolução, quando começaram a criar seus próprios
tribunais operários e camponeses, antes mesmo, da promulgação de qualquer tipo
de decreto sobre a dissolução do aparato judiciário burocrático-burguês.
Porém, nossos tribunais revolucionários
e nosso tribunais populares são demasiada e incrivelmente débeis.
Sente-se que o ponto de vista popular,
herdado do tempo do julgo dos capitalistas e dos proprietários, acerca do
tribunal enquanto algo burocrático e estranho, ainda não foi definitivamente
superado.
Falta o reconhecimento suficiente acerca
de que o tribunal é um órgão para a incorporação, sem exceção, da população
pobre precisamente na administração do Estado, ( pois a atividade judiciária é
uma das funções da administração do Estado ).
Falta o reconhecimento suficiente acerca
do fato de que o tribunal é uma ferramenta para a educação da disciplina.
Falta o reconhecimento suficiente do
fato simples e manifesto de que, se a principal desgraça da Rússia é a fome e o
desemprego, esses maus não podem, de nenhuma forma, ser vencidos por impulsos
momentâneos, mas sim apenas através de uma disciplina e de uma organização
multifacetária e abrangente, levada adiante por todo o povo, a fim de aumentar
a produção de pão para os homens e de pão para a indústria (combustível),
gerando-o no tempo devido e repartindo-o corretamente.
Falta, pois, o reconhecimento de que
pelos sofrimentos da fome e do desemprego é culpado todo aquele que viola a
disciplina do trabalho em certa fábrica, em determinada economia, em dada
matéria.
Falta o reconhecimento de que é
necessário saber-se descobrir aqueles que se fazem culpados por essa razão e
colocá-los diante dos tribunais, para que sejam impiedosamente punidos.”[10]
Vale destacar que, segundo a concepção de Lenin,
a atividade judiciária haveria de ser considerada, no quadro de um
Estado revolucionário dos trabalhadores, como uma das funções da Administraçao
do Estado, sendo precisamente os tribunais dos operários, soldados e camponeses
ferramentas da disciplina proletária.
No quadro da luta revolucionária proletária e de construção
de um Estado da classe trabalhadora, tal posicionamento de Lenin opõe-se claramente
à doutrina que defende a institucionalização da função de julgar em um Poder
Judiciário, tal como o conhecemos no quadro dos Estados burgueses da
atualidade, supostamente dotado de imparcialidade e independência.
Adiante, procuraremos elucidar sob que condições
precisamente, no curso do desenvolvimento histórico, o Poder Judiciário
encontrou seu surgimento e fortalecimento no quadro dos Estados erigidos pelas
Revoluções Burguesas, ocorridas após o século XVII, para então dedicarmo-nos, a
seguir, ao estudo do exercício da função jurisdicional no contexto do Estado
Proletário Russo, dirigido por Lenin.
II.A.
ORGANIZAÇÃO INSTITUCIONAL
DOS ESTADOS ESCRAVISTAS
DA ANTIGÜIDADE
Concepções de divisão jurídico-institucional do poder do
Estado, no quadro de sociedades cindidas em antagonismos inconciliáveis de
classes, podem ser encontradas, originariamente, nas doutrinas acerca dos
Estados da Antigüidade.
A idéia de divisão da dominaçao jurídico-institucional,
contida no poder do Estado, em órgãos funcionais distintos é, com efeito, tão
antiga quanto a própria noção de Estado.
Nesse sentido, a análise acerca do princípio jurídico-burguês
da divisão dos poderes possui, em linhas gerais, como objeto primitivo e
pré-diluviano de investigação os tantos fenômenos institucionais de Estado que
a história conheceu, i.e. a poliz grega, a civitas romana, a commonwealth
britânica e, particularmente, o Etat francês, esse último conducente
à versão burguesa de Estado conhecida comumente nos dias de hoje.
Em situações de exceção e de estado de necessidade,
afirmava-se já na Antigüidade ser necessário suspender a vigência do princípio
jurídico de funcionamento de diversos órgãos públicos e transferir,
temporariamente, a responsabilidade indivisa pelo destino do Estado a um único
órgão de Estado, na maioria dos casos o imperador ou o Chefe de Estado, que a
haveria de exercer de maneira absoluta.[11]
Afastada tal hipotése excepcional, as sociedades de classe da
Antigüidade, conformadas por regimes monárquicos ou republicanos escravistas,
confrontaram-se com a questão de saber como a concentração ilimitada do poder
em um único órgão jurídico-institucional de Estado poderia ser evitada,
permitindo-se a participação no exercício jurídico-institucional do poder de
diferentes instâncias políticas, representativas de diversas frações da classe
dominante.
Diversos teóricos políticos de então partiram da análise dos
órgãos do Estado de sua época histórica correspondente, procurando descrever as
distintas atividades estatais por eles exercidas.
Através de um método jurídico de crescente abstração teórica,
procuraram elaborar, então, uma doutrina geral a partir das atividades
concretizadas organicamente pelo Estado.
Nesse contexto, a Antigüidade conheceu, inicialmente, a
primeira célebre divisão jurídico-institucional do poder do Estado nas obras do
filósofo aristocrático-escravista grego Platão.
Em sua obra de mocidade, denominada República, Platão,
concebendo o Estado sob o domínio do que deveria ser a idéia da boa ordem das
sociedades escravistas e da prosperidade do público e do privado, concebeu o
poder estatal como sendo fundado e ordenado pela atuação de três estamentos
sociais :
a.
o estamento dos homens sábios, que havia de se ocupar do
governo do Estado ;
b.
o estamento dos guerreiros, responsável pelas atividades
militares ;
c.
o estamento dos homens inclinados à busca da riqueza,
incumbido da prática do comércio e da indústria.[12]
Sentindo-se assaltado pela decadência da democracia grega
posterior à era de Péricles, Platão entendia que o estamento dos
guerreiros representaria aquele estamento do Estado a ser submetido às mais
amplas limitações, não devendo ter acesso amplo à propriedade privada, bem como
a valores de ouro e prata.
Essas limitações deveriam, segundo Platão, assegurar a ordem
e a justiça do Estado grego escravista contra militares aspirantes a uma maior
parcela de poder político.[13]
Os guerreiros, não gozando da possibilidade de dispor de
recursos materiais amplos, o que pressupostamente impossibilitaria a usurpação
do poder, permitiriam aos sábios dirigir o Estado de modo equilibrado e
moderado, para o bem de todos os cidadãos gregos – o que supunha
necessariamente a exclusão participativa do povo, i.e. dos pequenos mercadores
e dos escravos.
Posteriormente, em sua obra da maturidade, Platão,
convencido de que a sabedoria apenas poderia surgir junto a pouquíssimos
dirigentes de Estado, concebeu – não sem
relutância – o Estado das Leis como uma forma relativamente melhor de governo.[14]
Em lugar do sábio dominador, deveria surgir, então, a lei,
enquanto norma impessoal e genérica, lamentavelmente incapaz de reconhecer
plenamente a diversidade natural das qualidades inerentes aos homens.
Mesmo Zippelius
teve a oportunidade de observar acerca do tema :
„Enquanto modelo de Estado das Leis, Platão projeta um Estado
agrário que se auto-abastece.
O poder político reside nas maos dos 5.040 proprietários
fundiários.
Eles elegem o Conselho que conduz a supervisão
superior dos negócios de Estado.
Os escravos realizam o trabalho do campo, os pequenos
mercadores realizam o comércio e a indústria.
Ambos não possuem direitos políticos.”[15]
Fundado em sua concepçao aristocrático-escravista, Platão
identificou, concretamente, na positividade da constituição de Esparta
a causa do fortalecimento de seu domínio.
Analisando a divisão jurídico-institucional do poder do
Estado com base na verificação dos órgaos estatais efetivamente existentes, Platão
constatou surgir, ao lado dos dois
Reis espartanos, a Gerúsia, i.e. o Conselho dos
Anciãos, misto de órgão legislativo e consultivo de Estado.
O poder da Gerúsia estaria limitado pela
atuação dos Éforos, i.e. dos cinco magistrados aristocráticos, eleitos
anualmente, que haveriam de contrabalançar a autoridade dos Reis
e da Gerúsia.
O sistema de Platão, fundado antes de tudo na
análise dos órgãos de Estado, pretendeu legitimar duas formas
jurídico-institucionais do domínio político dos proprietários latifundiários :
a forma da imposição de sua ordem de classe – representada pela monarquia – e a
forma de sua liberdade social, incorporada pela Gerúsia e pela atuação
dos Éforos.[16]
Através da atuação desses órgãos estatais no quadro de um
único sistema de dominação política de classe, tornar-se-ia possível, segundo Platão,
promover-se um certo equilíbrio político que assegurasse a ordem dos
proprietários fundiários e de escravos da Antigüidade.
Esse modelo jurídico-institucional de atenuação e de
limitação dos embates entre classes sociais antagônicas permite já reconhecer
os traços originais dos futuros sistemas constitucionais burgueses, dotados de
divisao da dominaçao jurídico-institucional do poder estatal.
O célebre mentor ideológico de Alexandre Magno, Aristóteles de
Estagira foi, por assim dizer, o autor da segunda célebre concepção de
divisao jurídico-institucional do poder do Estado.
Em sua teoria das três partes do poder estatal, Aristóteles
descreveu as grandezas fundamentais típicas das constituições da Antigüidade,
conforme à seguinte divisão :
a.
o Conselho de Deliberação sobre Matérias Comuns ;
b.
o Principado ou a Magistratura ;
c.
a Justiça.[17]
Aristóteles, diferentemente de Platão, dedicou-se ao estudo da
divisão das funções, das atividades, das matérias ou dos negócios do Estado,
partindo da análise das três grandezas orgânicas reais e históricas de seu
tempo.[18]
Entretanto, a existência dessas três partes
jurídico-institucionais divisórias do poder do Estado das sociedades gregas
escravistas não corresponde precisamente, entretanto, à idéia contemporânea de
tripartição do poder do Estado, na medida em que essa última, tal como veremos,
foi concebida tendo como base órgãos vinculados ao exercício parcial de funções
estatais materiais genéricas, i.e. o Poder Legislativo, enquanto órgão de
exercício parcial da função material normativa (i.e. responsável pela produção de
leis, leis-medidas e resoluções parlamentares – porém não de regulamentos), o
Poder Executivo, enquanto órgão governamental e administrativo reponsável pelo
exercício parcial da função material normativa (i.e. responsável pela produção
de regulamentos ou, dado o caso, de medidas provisórias ou decretos-leis –
porém não de leis), e ainda da função material administrativa de aplicação das
leis – excluindo-se a atividade jurisdicional -, e, por fim, o Poder
Judiciário, enquanto órgão independente voltado ao exercício da função
administrativa de aplicação de normas jurídicas em casos exclusivos de
jurisdição.
Com efeito, a análise de Aristóteles não conduzia a uma
classificação eminentemente abstrata e essencialmente interno-segmentadora das
funções realizadas pelos órgãos estatais, para daí alcançar sua configuração
essencial, mas sim partia da verificação efetivamente real de tais atividades
estatais formulando, a partir daí, sua doutrina da divisão da dominação
jurídico-institucional do poder estatal.
Nesse quadro, afirmou corresponder aos órgãos estatais do
Estado escravista grego certas atribuições funcionais materiais, exercidas não
de maneira essencialmente parcial e segmentada.
As matérias que competiam ao βουλευομενον
περι των
χοινον, i.e. ao Conselho Deliberativo
sobre Matérias Comuns, tais como as decisões soberanas sobre a deflagração de
guerra, graves delitos apenados com morte, exílio ou confiscação, a escolha de
autoridades e juízes etc. ultrapassavam, claramente, as competências inseridas
nas funções parlamentares ou congressuais do Poder Legislativo contemporâneo.
Além disso, tratava-se, então, de um Estado escravista, porém
marcado pela democracia direta dos cidadãos gregos e dirigido pelos senhores
fundiários e de escravos, em que todos esses podiam, dada a circunstância,
deliberar juridicamente sobre quaisquer das matérias de Estado.
Além disso, as democracias diretas gregas da Antigüidade
submetiam a freqüentes renovações os mandatos eletivos ou sorteados das
autoridades públicas.
No sentido contemporâneo da ideologia jurídico-burguesa,
pode-se afirmar que o βουλευομενον
legislava, decidia e julgava matérias de diversas natureza, segundo sua
importância política, e, além disso, exercia consideráveis funções de governo e
de administração, na medida em que dispunha acerca da política de defesa das
cidades-Estado, mediante normas regulamentoras e medidas jurídicas.
As matérias de sua competência correspondiam apenas ao
círculo das questões atribuídas à parte superior e dominante do poder das
cidades-Estado escravistas da Grécia antiga, i.e. ao χυριον,
ou ainda à Curia.
Tais materias tornavam-se, por si mesmo, as mais importantes
do Estado de então.
A seguir, Aristóteles identificou no
Principado ou na Magistratura as atribuições de comando e de decisão,
contemplando nessas últimas a presença da χυρια
αρχή, i.e. o traço característico do poder supremo.
Por fim, o poder de julgar representava o conteúdo
preponderante, porém não exclusivo, das atividades realizadas pela διχαζον,
i.e. a Jurisdição.
Os tribunais deveriam ser, segundo Aristóteles, dividos pela
natureza dos casos a serem julgados, sendo os mandatos dos cidadãos gregos
conduzidos aos órgãos jurisdicionais estabelecidos por eleições ou sorteio.
Enquanto Demóstenes e Eurípedes empreendiam a
defesa da democracia grega em face dos eminentes ataques militares do Rei
Filipe da Macedônia, tal teoria de divisão jurídico-institucional do
poder estatal, formulada por Aristóteles, não o impediu de
permanecer fiel à sua concepção política de que a monarquia hereditária
representaria a melhor forma de constituição do Estado, quando inspirada pelo
espírito aristocrático.[19]
Seria, portanto, precipitado concluir que a teoria da divisão
jurídico-institucional do poder do Estado de Aristóteles tenha servido
de modelo para a moderna doutrina da tripartição de poderes, simplesmente pelo
fato de que, em sua concepção original, o Estado grego escravista surgia
composto por três grandezas orgânicas distintas.
A superficial identificação ou mesmo aproximação do
pensamento relativo à divisão da dominação jurídico-institucional estatal de Aristóteles
com a teoria dos três poderes do Barão de Montesquieu, produzida no
século XVIII, no préludio das Revoluções Burguesas da Europa Continental, pode
apenas servir aos intuitos jurídico-ideológicos burgueses de fazer crer às
massas populares que, por sua própria natureza histórica imutável, o poder
supremo, eterno e venerável do Estado há de ser partilhado, em sentido
jurídico-institucional, sempre em três partes para que haja lugar um sistema de
poderes ordenado e democrático.[20]
Nesse sentido, mesmo os juristas burgueses mais analíticos,
como é o caso de Karl Loewenstein, tiveram olhos para perceber o grande
contraste que estrema o conteúdo e o método de análise da doutrina das três
grandezas jurídico-institucionais de Aristóteles da tripartição de
poderes do Barão de la Brède et de Montesquieu :
“Existem teóricos do Estado que
pretendem ter encontrado já na Politeia de Aristóteles o cerne da moderna
separação de poderes ...
Porém, a compreensão mesmo da distinção
de categorias não pode ser comparada com a exigência atual da separação no seu
exercício, a qual se pretende extrair daquelas categorias.
A partir da exposição que se segue dos
locais mencionados resulta que Aristóteles tentou – e isso já é em si um
trabalho considerável – elaborar uma análise das atividades do Estado em
conformidade com sua substância objetiva.
Nada em seu trabalho permite concluir –
seja a observação empírica, seja a exigência teórica – que essas três funções
parciais deveriam ser atribuídas a três órgãos ou pessoas distintas.
Precisamente nisso reside o significado
ideológico da doutrina da separação de poderes no moderno constitucionalismo
liberal.
O constitucionalismo da Antigüidade nao
se vinculou ao conceito da separação de poderes.”[21]
No que concerne às doutrinas de divisão da dominação
jurídico-institucional contida no poder dos Estados da Antigüidade, cumpre
ainda assinalar que o grande jurista romano Marco Túlio Cícero, através
das palavras de Cipião, contidas em De Re Publica, dá-nos apenas a
conhecer que concebia a existência de três formas políticas de Estado
distintas, i.e. a democracia, a monarquia, a aristocracia.[22]
Em conformidade com seu método lógico-analítico
essencialmente eclético, Cícero demonstrava que o Estado
romano escravista deveria dividir-se em órgãos que incorporassem a expressão
dessas três formas políticas estatais, sendo que nenhuma dessas formas,
considerada isoladamente, poderia ser consagrada como a mais adequada.
Para o mais célebre jurista de todos os tempos, o melhor
Estado estaria dotado de uma constituição formada pela mescla dessas três
formas políticas mencionadas.[23]
II.B.
FRAGMENTAÇÃO DAS ATRIBUIÇÕES PÚBLICAS
NOS ESTADOS FEUDAIS ESTAMENTAIS E O
TRIUBUNAL DA SANTA INQUISIÇÃO
A efetiva fragmentação das forças políticas no curso da Idade
Média projetou-se, profundamente, sobre as concepções de poder do Estado
da nobilidade feudal, fundado esse último na exploração de servos da
gleba e escravos.
Príncipes, barões, condes, bispos, abades, senhores feudais e
eclesiásticos em geral exerciam uma quantidade considerável de funções
públicas, denominadas regalias, exercutando, assim, diversas atividades de
índole estatal com base em seu próprio poder fundiário.[24]
Em níveis hierárquicos a eles subordinados, surgiam diversos
tipos de órgãos para os ramos específicos das tarefas de administração.
Tais ramos da administração eram divididos, entretanto, de
maneira puramente aleatória, tendo como critério a própria conveniência de
divisão dos órgãos.
Onde se concentravam diversas matérias em um determinado ramo
administrativo, subdividia-se, dado o caso, o próprio órgão administrativo
competente em questão, mediante a criação de diversos departamentos e
instâncias.
Já ao final da Idade Média, começou-se a conceber o
poder do Estado através de certa relação estamental havida entre imperator
e populus, esse último fazendo-se representar através da votação
dos príncipes eleitores.
Precisamente nesse sentido, Marsilius di Padua, Magister
Artium da Universidade Sorbonne, perseguido, a seguir, pela Santa
Inquisição, concebeu, no início do século XIV, a existência de órgãos legislativo e
executivo, em consonância com a diferença formulada entre principatus e populus.[25]
Na obra Defensor Pacis, o critério
diferenciador dos órgãos de Estado não repousava, entretanto, em distinção
abstrata, mas sim na própria existência, efetivamente real e histórica, de diferentes
organismos de poder da monarquia e da nobreza.
Uma instituição especial de cunho judiciário, surgida na Idade
de Média, em cujo contexto imperou desbragadamente o poder ideológico
cristão-eclesiástico, irradiado a partir do Estado da Igreja Romana, foi
indubitavelmente o Tribunal da Santa Inquisição.
Destaque-se, retrospectivamente, que, o resultado político
final da intensíssima perseguição dos cristãos em solo europeu havia sido, em
313, a promulgação do Edito da Tolerância, pelo Imperador
Romano Diocleciano, que reconheceu, então, oficialmente o cristianismo
e concedeu proteção do poder do Estado Romano aos seus seguidores.[26]
A partir de então, a Igreja Romana e, em
particular seus bispos, assumiram um papel sempre crescente na política do Estado
e dos imperadores de então.
Já no período dos primeiros quatro Concílios Ecumênicos
(Nícia, em 325, Constantinopla, em 381, Efeso, em 431 e Calquedão, em 451),
i.e., já ao tempo de vida do grande teólogo do mundo cristão-romano, o Bispo
Aurelius Augustinus, a Igreja Romana surgia como a
segunda maior proprietária de terras no interior do Império Romano em
franco processo de dissolução, sendo que já se tornara, então, praticamente
impossível que o Estado Escravista Romano dinamizasse qualquer
política de natureza pública ou privada sem contar com o expresso apoio dos
bispos cristães-eclesiásticos.
Sua riqueza resultava, sobretudo, das doações e outras formas
de transferências de propriedade, operadas da parte dos imperadores romanos
cristianizados.
Em 391, verificou-se um grande triunfo da Igreja
Romana, quando o Imperador Constantino declarou o
cristianismo religião de Estado, tornando-o obrigatório para todos.
Grande parte das polêmicas emergentes até então dentro e fora
da Igreja Romana – como p.ex. a concernente à tentativa de
definição da pessoa do Deus-Homem e do mistério da incarnação –
era resolvida no quadro de Concílios Ecumênicos, concebidos pelos
bispos e pelo Papa como uma forma de equacionamento pacífico das
divergências teóricas e práticas já havidas entre as principais personalidades
do mundo eclesiástico romano, como Aurelius Augustinus, Salviano de
Marselha, os maniqueístas, os arianos – seguidores do Padre Arius
-, os pelagianos – defensores das idéias do Monge Pelagius -, os
donalistas – adeptos do Bispo Donatus -, os defensores crentes e
pagãos da tradição greco-romana etc.
Precisamente nesse sentido, é possível compreender-se o
significado da promulgação do Credo de Nícia.
Destruído o Império Romano do Ocidente, teve início
o processo de cristianização dos povos germânicos invasores, logo nos primeiros
anos da Idade Média Baixa, seja no continente europeu, seja sobre
o solo britânico-insular.[27]
Nesse novo quadro, a dinastia merovíngea e, em particular, Carlos
Magnus surgem, ao longo dos séculos VIII a X, como os maiores expoentes
do fenômeno histórico de conversão violenta, a ferro e fogo, ao cristianismo da
grande maioria dos povos germânicos.
Sob a égide da maioria preponderante das diversas legislações
dos reinos germânicos de então, surge a Igreja Romano-Cristã como
religião de Estado e obrigatória para todos os habitantes.[28]
Seria necessário, porém, esperar-se até o século XIII para
que, no quadro do implacável aguçamento da luta religiosa-ideológica entre
valdenses, maniqueístas, albigeneses, arianos, donalistas, catarenses,
pelagianos, franciscanos – seguidores de Francisco de Assisi -,
dominicanos – adeptos de Domingo de Guzman da Espanha - e tantas
outras ordens eclesiásticas de base, bem como em meio à crise provocada pelas
conquistas territorias do excomungado Imperador do Sacro-Império
Romano-Germânico Frederico II, representante da dinastia dos Staufer,
a Igreja Romana reagisse procurando recuperar seu poder
ideológico abalado, mediante a instituição de um Tribunal para
Erradicação de Heresias.[29]
Em 1231, i.e. durante a vida do mais célebre Professor
Eclesiástico, Tomás de Aquino, a Santa Inquisição foi
instituída, mediante Decreto, promulgado pelo Papa Gregório
IX, enquanto instituição permanente da Igreja Cristã Romana, encarregada
de promover a apuração dos crimes religiosos de heresia.[30]
Apoiada em sua estrutura centralista-burocrática existente no
século XIII, foi possível aos bispos e aos papistas declararem ser passíveis de
correção ético-moral todos aqueles cujas crenças e práticas desviassem
suficientemente da ortodoxia romano-cristã.
As heresias, i.e. do latim haeresis, as seitas,
as correntes fideístas, haviam de ser perseguidas e condenadas, sendo que, de
início, seus adeptos seriam punidos seja com repreensões públicas, em casos de
arrependimento expresso, seja com prisão perpétua, em caso de se demonstrarem
renegados, seja ainda com pena de morte, em casos de contumácia expressa.
De toda sorte, eram as autoridades públicas do Estado
Feudal Estamental as que permaneciam encarregadas de proceder à
execução das sentenças proferidas pelo Tribunal da Santa Inquisição, a
menos que cumprisse aplicar a pena em questão no interior dos limites da
jurisdição exercida pelo Estado da Igraja Romana.
Além disso, o Papa Gregório IX desencarregara,
expressamente, em seu Decreto de 1231, os bispos e arcebispos de
ocuparem-se das funções de inquisidores judiciários, ao mesmo tempo em que
transferiu o exercício de tal competência para os frades mendicantes, integrantes
da Ordem Dominicana, fundada por Dominigo de Guzman da
Espanha (1170 – 1221).
Entretanto, essa medida não impediu que, posteriormente,
muitos outros eclesiásticos, seja os provindos de outras ordens religiosas, seja
os aderentes do clero secular romano-cristão, viessem a exercer a função de
inquisidores.
Já na última década do século XIII, o Tribunal da Santa
Inquisição havia-se tornado uma instituição ativa em todos os países
europeus, funcionando diretamente sob as instruções do Papa, e
contando com aparelhos burocráticos especiais no interior dos Estados
Feudais encarregadas de dar cumprimento as sentenças lavradas pelo Santo
Juízo.
O inquisidor que atuava nos autos exercendo, ao mesmo tempo,
a função de juiz, podia processar qualquer pessoa. Permitia-se-lhe colher
depoimentos de excomungados, hereges, pagãos, criminosos, pessoas de notória
má-reputação e de todos aqueles que julgasse conveninete.[31]
Alguns frades dominicanos inquisidores interrogavam populações
inteiras.
Por sua vez, o acusado ou, dado o caso, a acusada havia de
testemunhar contra si mesmo, não possuindo o Direito de avistar ou questionar o
seu acusador, consultar-se com um advogado, sendo que mesmo a existência de
relação de parentesco não impedia que alguém depusesse contra o acusado.
Esse último devia ser interrogado na presença de, no mínimo,
duas testemunhas.
Meios diversos eram empregados, a fim de obter-se a confissão
do acusado, a ser produzida em conformidade com o libelo de acusação,
previamente lido em voz alta por ocasião de uma grande audiência pública
inaugural.
A despeito de não existir, positivado no Direito
Canônico Cristão, qualquer previsão jurídica de emprego de torturas
físicas no procedimento de inquérito a ser efetuado, já a partir de meados do
século XIII, essas eram largamente utilizadas.
Em caso de confissão, o penitente havia de arrenpender-se de
joelhos, colocando sua mão direita sobre a Bíblia, segurada pelo
inquisidor.
Das sentenças exaradas pelo Tribunal da Santa
Inquisição não cabia apelação.
As penas variavam amplamente, podendo ir desde a determinação
de freqüência de igrejas, peregrinações forças, arrastamento da cruz da infâmia
por vários locais até mesmo à prisão perpétua ou de morte – em caso de negativa
de abjuração -, mediante queima em fogueira pública, erigida por autoridades
públicas do Estado Feudal Estamental, na hipótese de ocorrer
exterioremente aos limites do Estado da Igreja Romana.
Muitas das condenações fixavam sentenças de prisão que eram,
porém, comutadas, posteriormente, em penas de espécies diferentes.
De toda sorte, as condenações judiciárias-eclesiásticas que
cominavam penas de prisão possuiam com conseqüência civil sempre a confiscação
dos bens do acusado, executada em proveito da Igreja Cristã-Romana.
Nos casos em que o acusado houvesse morrido antes mesmo de
poderem ser instituídos os autos do Tribunal da Santa Inquisição, seus
restos mortais deveriam ser exumados e, em caso de condenação, queimados em
praça pública.
No entanto, os inúmeros abusos cometidos pelo Tribunal
da Santa Fé conduziram a clamores de reforma do Direito Canônico
Cristão, sendo que, já no século XIV, autoridades públicas do Estado
Feudal Estamental passaram a intervir comumente nos processos de
erradicação de heresias, integrando-se nas atividades de julgamento, exercendo
atribuições de diversas naturezas.[32]
No fim do século XV, sob a coroa de Fernando e Isabel
de Castilla, a Inquisição Espanhola tornou-se
essencialmente independente da orientação da Igreja Romano-Cristã,
passando a ocupar-se intensamente do julgamento também de supostas heresias
cometidas por muçulmanos, judeus e intelectuais iluministas, considerados todos
como portadores de “sangre impura”.
Passou-se, então, em território espanhol, a empregar-se,
massivamente, “la garrucha, la toca y el potro” como métodos
judiciariamente admissível, para a obtenção de confissões.
Os assim conhecidos como Los Autos de Fe
consagraram-se um capítulo especialmente de torturas sangüinolentas na história
dos julgamentos promovidos pelos defensores da ortodoxia cristã, visando a “salvar
las almas de los herejes.”
O primeiro dessa nova versão espanhola dos Autos de Fe
ocorreu em 16 de agosto de 1486, na cidade de Toledo, quando
todos os acusados que possuíam idades entre 13 e 86 anos foram condenados à
morte, por meio de fogueira pública.
Sob a Coroa Espanhola, muitas condenações
resultavam também em escravidão, a ser prestada “en los galleys”.
Los Autos de Fe eram concebidos com o objetivo de
inspirar temor e prostração pela Santa Inquisição que se valia de
processos públicos espetaculares, visando a exibir seu poder sobre as massas
populares. Os dias de julgamento eram, em alguns casos, considerados dias de
celebração e veneração religiosa.
Como forma de servir de meio de resistência e contra-reforma
contra os hussitas, luteranos, calvinistas e rosicrucianos, a Santa
Inquisição veio a ser fundamentalmente reestruturada em 1542 pelo Papa
Paulo III, tendo suas competências fortalecidas e extendidas, visando
até mesmo a opor-se às falsas doutrinas da moderna ciência natural burguesa.[33]
Porém, no norte da Europa, nos países escandinavos, a Inquisição
foi consideravalemente mais branda, sendo que sobre o solo da Inglaterra
jamais veio a ser instituída.
Em 1616, a Santa Inquisição, composta por um
grupo internacional de consultores, especialistas em teologia e Direito
Canônico Cristão, promulgou um parecer normativo estabelecendo que
seria plenamente “estúpido e absurdo em filosofia”, “formalmente herege e
finalmente errôneo, em sentido fideísta”, a tese de que o sol
encontrar-se-ia no centro do universo, movendo a terra incessantemente à sua
volta ...
Esse parecer normativo fez com que a renomada obra de Copérnico,
intitulado De Revolutionibus Orbium Coelestium viesse a
ser colocado no Índice dos Livros Proibidos, ao mesmo tempo em
que levou Filippo Giordano Bruno à morte e à abjuração expressa
de Galileo Galilei, a despeito de sua declaração “eppure si
muove”...
Apenas nas primeiras décadas do século XIX, tornou-se
possível verificar uma mudança de orientação da Igreja Romano-Cristã em
relação à sua luta contra o copernicismo e os heliocentrista.
II.C.
OS DIREITOS DE SOBERANIA
DOS ESTADOS MONÁRQUICO-ABSOLUTISTAS
A doutrina dos Estados monárquicos absolutistas é
característica de um momento histórico em que as classes sociais em luta –
sobretudo a nobreza feudal e a burguesia ascendente – possuem forças quase que
iguais, sendo que o poder estatal de então, na qualidade de aparente mediador,
adquire momentaneamente, uma certa autonomia em face de ambas essas classes em
luta.[34]
Nesse contexto, foram concebidas apenas distinções de
atividades estatais oriundas dos assim-denominados poderes privativos dos
príncipes soberanos ou monarcas.
O célebre jurista francês, Jean Bodin, elaborou,
assim, a teoria dos direitos de soberania ou majestáticos, dividindo
juridicamente o poder do Estado a partir de um ângulo material concreto de suas
inúmeras atividades.
Tais direitos eram contemplados segundo uma série enumerativa
e sistemática, considerada como natural e eterna, sendo todos exercidos pelo
poder de decisão supremo e centralizado do monarca.
Confirmando o caráter indivisível do novo conceito de
soberania monárquica que então surgia, Bodin, negando a possibilidade da
coexistência de órgãos jurídico-institucionais do Estado distintos e
independentes, sustentava que quem possuisse um imperii socium estaria
privado do poder supremo.
O príncipe soberano seria, então, a imagem de Deus entre os
homens.[35]
A concepção dos direitos de soberania de Bodin correspondia às
relações político-estatais francesas do período histórico do monarquismo
absolutista, em um momento em que o monarca libertava-se das prentensões do
poder eclesiástico.
Da mesma forma procedeu, o preceptor de Carlos II, Thomas
Hobbes, pretendendo deduzir dos objetivos da ordem estatal britânica os
direitos essencialmente privativos do soberano.[36]
Fundado em seu parecer antropológico sintetizado na sentença homo
homini lupus, resultante de suas trágicas experiências relacionadas com
a Guerra
dos Trinta Anos e as primeiras turbulências republicanas
revolucionárias inglesas, Hobbes afirmou que o Leviathan,
o deus mortal, o bíblico monstro gigantesco, que representa o Estado dirigido
de modo absolutista pelo dententor do poder supremo, seria o único meio de
proteger os homens contra os ilimitados arbítrios individuais egoísticos de
cada um.
Após enumerar os fundamentos do poder da Commonwealth, Hobbes empreendeu
uma divisão dos direitos e das faculdades exercidas exclusivamente pelo poder
soberano.[37]
II.D.
A DIVISÃO DOS PODERES
NO QUADRO DA REVOLUÇÃO BURGUESA DA
INGLATERRA
A doutrina da divisão jurídico-institucional do poder do Estado
que repartiu as funções estatais segundo a formação de distintos órgãos
políticos emergiu dotada de inigualável importância com os primeiros albores da
classe burguesa ascendente em face da monarquia, da nobreza e do clero feudal.
Suas origens alcançam o século XVII.
As experiências que a burguesia inglesa empreendeu, ainda sob
o manto religioso, no contexto conducente à Revolução Gloriosa,
através da consolidação do domínio jurídico-institucional do Parlamento Inglês,
estimularam a produção intelectual e a prática política de distinguir diversos
domínios jurídicos de atividade do poder estatal.[38]
O Instrument of Government de Oliver Cromwell, positivado
em 1653, surge, por assim dizer, como o paradigma embrionário de uma tentativa
prática de divisão jurídico-institucional de poderes, no contexto das então
modernas Revoluções Burguesas.
O modo de reflexão e os métodos de trabalho das ciências da
natureza, sobretudo a descoberta de novas leis físicas em contraste com as
supertições feudais, tornaram-se modelo para burguesia ascendente no sentido de
aquisição de novos conhecimentos científicos aplicáveis ao processo de produção
capitalista.
Disso resultou a novidadeira compreensãoo da lei, enquanto
norma genérica, abstrata, estabelecida de modo eterno e imutável pelo
parlamento do Estado, em conformidade com a ordem da razão universal e natural.[39]
A universalidade e a igualdadade formal contida no espírito e
nos institutos do Direito Burguês em surgimento pressupunha, por outro lado, a
desigualdade econômico-material dos cidadãos, a apropriação privada dos meios
sociais de produção, a legitimação da violação da igualdade na repartição
efetiva dos bens sociais de consumo, i.e. um Direito simplesmente igual, ao
invés de um Direito desigual, de modo a viabilizar não apenas as diferenças de
riqueza, senão ainda a exploração capitalista do homem pelo homem em um
processo de acumulação capitalista.[40]
Ainda nesse momento histórico, a Coroa, entendida enquanto
órgão de Estado, apresentava-se como indispensável à garantia da ascensão da
classe burguesa ao poder.
Porém, entendia-se que apenas a disciplina de suas
atribuições estatais criaria a possibilidade de limitação do absolutismo
monárquico, com vistas à consolidação das liberdades dos cidadãos burgueses,
concebidas essas últimas no contexto da novidadeira doutrina burguesa britânica do
Direito Natural, elaborada e defendida pela esquerda puritana quacre.
Essa última portava como principais eixos teóricos a
reconfiguração doutrinária dos conceitos de liberdade, igualdade e soberania
popular, no sentido religioso-puritano e jurídico-ideológico burguês.
A totalidade do povo, entrevisto como um povo composto
eminentemente por cidadãos burgueses, passava agora a ser concebida como uma
associação inteiramente voluntária, fundada em um contrato social volitivo
pactuado supostamente por indivíduos considerados como originariamente livres e
iguais, i.e. um original agreement voluntariamente celebrado.
O poder supremo do Estado passava a encontrar, assim, seu
fundamento de validade na vontade geral dos cidadãos burgueses, proprietários
livres e juridicamente iguais.
Opondo-se às teorias do Estado monárquico-absolutista,
contidas no Leviathan, de Thomas Hobbes of Malmesbury, no Patriarcha,
de Robert
Filmer, e no pensamento dos teólogos protestantes, emergiu a doutrina
burguesa britânica do Direito Natural, ainda mesclada com
profundas concepções teológicas.
Tal doutrina estruturou-se, inicialmente, com as formulações
inovadoras de John Lilburn(+1650), com a Lei da Liberdade de Gerard
Winstanley(+1652), e a Oceana de James Harrington(1611-1677),
com as Conversações de Mesa de John Selden(1584-1654), e a Areopagitica
de John Milton(1608-1674), com as Análises sobre a Direção do
Estado de Algernon Sydney(1622-1683), e o Esboço da Direção do Estado da
Província da Pennsilvania de William Penn(1644-1718).[41]
Segundo tais doutrinas, a vontade geral da associação
voluntária dos indivíduos burgueses egoístas haveria de ser reconhecida como o
fundamento jurídico do poder do Estado.[42]
Ela delegaria o exercício do poder a um único ou a muitos
representantes, incumbidos de administrá-lo em confiança.
Para todos os órgãos de Estado a garantia da liberdade
individual, da igualdade formal, da vida de cada um, entre outros valores
jurídicos, concebidos agora segundo a ótica burguesa, deveria de ser o
princípio máximo de Direito.
No asseguramento dessa garantia residiria os limites naturais
e eternos às atribuiçoes das autoridades de Estado.
Arbítrio e incondicional submissão do indíviduo burguês à Coroa
seriam fenômenos a excluir-se de antemão.
Porém, para a conformação jurídico-institucional do poder do
Estado, não bastariam apenas periódicas eleições e votações, expressivas da
vontade popular dos novos cidadãos burgueses : a divisão do poder do Estado em
sentido jurídico-institucional deveria surgir enquanto limitação adicional ao
exercício das atribuições do monarca e da nobreza, e decorrer, necessariamente,
da primazia da lei parlamentar, i.e. da legalidade do Estado.
Pelos representantes dos novos direitos burgueses passou-se a
acentuar, então, gradativamente, a superiodade da lei sobre o poder monárquico,
esse último devendo assumir a posição de um poder encarregado do dever de
dar-lhes cumprimento.
Com o fortalecimento do Parlamento Inglês decorrente da
insurreição dos católicos e puritanos britânicos que, com base no English
Convenant juraram defender sua liberdade política e religiosa contra o
absolutismo de Carlos I, surgia esse
órgão legislativo de Estado já contando com decisiva atuação política da
burguesia, ao lado da nobreza e do clero, no âmbito de um Estado monárquico.
Os parlamentares britânicos, reunidos de 1640 a 1653,
atacaram, de início, profundamente o absolutismo monárquico e condenaram o Ministro
Starfford e o bispo anglicano Laud à morte.
Quando os cavaleiros de Carlos I bateram-se contra os Roundheads,
o Protetor da República Inglesa, Oliver Cromwell, à frente dos Costelas
de Ferro, venceu-os na batalha de Naseby.
Prêso e vendido ao Parlamento Inglês, Carlos I foi por esse
julgado e conduzido ao patíbulo, acabando decapitado em praça pública, em 1648.[43]
A idéia de divisão e de balanceamento de poderes passaria a
representar, desde então, um tema jurídico de primordial importância para a
conformação do constitucionalismo burguês britânico.[44]
Rapidamente alcançou-se uma clara diferenciaçao entre as
atribuições do protector e do parlament.
Essas atribuições foram, então, positivadas em virtude das
grandiosas transformações constitucionais que não mais se assentavam na
recepção do Direito feudal anterior.
O Instrument of Government de 1653 dispôs, então, da seguinte
forma:
“I.Que a autoridade legislativa suprema
na República da Inglaterra (...) deve estar e residir em uma pessoa, e nas mãos
do povo reunido no Parlamento (...)
II.Que o exercício da principal
magistratura e da administração do governo (...) deve competir ao Lord
Protetor.”[45]
Com a morte de Oliver Cromwell em 1658, o Parlamento
Inglês, revigorado após sua dissolução no período ditatorial cromwelliano, restabeleceu
a monarquia de Carlos II, dando criação aos dois grandes partidos britânicos
de então : os tories, i.e. os burgueses conservadores, e os whigs,
i.e. os burgueses liberais, defensores da soberania do Parlamento
Inglês.
Coube aos whigs, descontentes com o reinado de
Jaime
II, chamar da Holanda o Stathouder Guilherme de Orange, i.e.
o Chefe da República da Holanda.
Refugiando-se Jaime II na França, o Parlamento Inglês
deu a Guilherme de Orange a Coroa, instituindo um regime
monárquico-constitucional, no quadro de um Estado Aristocrático-Burguês.
Após essa assim-denominada Revolução Gloriosa de 1688, que
derrotou, definitivamente, a dinastia dos Stuarts, a Bill of Rights foram
delimitadas as prerrogativas do Rei, fortalecendo-se as do
Parlamento Inglês.
Desde então, o governo de Estado passaria a ser exercido por
um Primeiro
Ministro, responsável perante o Parlamento, escolhido, em um primeiro
momento, entre os notáveis do partido dominante.
No ano de 1690, o mundo ocidental conheceu, então, além da
legitimação jurídico-teórica dos propósitos da Revolução Gloriosa, uma
brilhante expressão da nova doutrina aristocrático-burguesa da divisão jurídico-institucional
do poder do Estado, contida na célebre obra de John Locke, intitulada Two
Treatises of Civil Government(Dois Tratados acerca do Governo Civil).
Baseando nas idéais políticas dos whigs, Locke
examinou o novo Estado Britânico seja desde uma perspectiva relacionada
com seus órgãos estatais, denominando-os Poderes Legislativo e Executivo (Legislative
and Executive Powers), seja desde um ângulo de suas funções materiais
concretas, contemplando a existência dos assim-denominados Poderes Federativo e
de Prerrogativa (Federative and Prerogative Power).
O Poder Judiciário, enquanto terceiro poder constituído,
pretendidamente imparcial e independente, foi desconhecido por Locke.
O terceiro poder de Estado, concebido na perspectiva material
concreta das atividades funcionais do Estado, representava para Locke
um poder para declarar a guerra e a paz, bem como para tratar das
alianças e dos negócios externos, denominado por ele Federative Power.[46]
Além disso, Locke atribuiu ao Chefe do Executivo
determinadas atribuiçoes reservadas, incorporadas no Poder de Prerrogativa –
esse último tradicional do Direito revolucionário britânico
aristrocrático-burguês, sendo, entretanto, tais atribuiçoes
submetidas a limitações, não consideradas como encroachments.
Segundo Locke, devendo os Poderes
Legislativo e Executivo serem exercidos por órgãos estatais distintos – i.e.
pelo Parlamento e pela Coroa -, os Poderes Executivo, o Federativo e o de
Prerrogativa haveriam de estar costumeiramente unidos nas mãos do Chefe do
Executivo.
Nesse quadro, os Poderes Federativo e de Prerrogativa –
diferentemente do Poder Executivo – não haveriam de ser dirigidos,
estritamente, por leis positivas, devendo ser exercidos segundo o livre
arbítrio de seu titular.[47]
Nada obstante, todos esses poderes referidos pelo célebre
pensador de Wrington eram por ele considerados como Fiduciary Powers, i.e.
como poderes fiduciários ou de confiança.
Em princípio, todos eles estariam subordinados ao Poder
Legislativo, considerado enquanto o órgão de Estado que, em última instância,
representaria, juridicamente, o poder supremo da Commonwealth.
O povo, eminentemente composto de cidadãos burgueses,
delegaria, por sua vez, em confiança, ao Poder Legislativo certas atribuições,
plenamente revogáveis, na hipótese de o seu exercício resultar em manifesta
decepção popular.
Em seus comentários à Constituição da Inglaterra, Friedrich
Engels, assinalou que o equilíbrio dos poderes da monarquia
constitucional representava, em verdade, o temor da humanidade diante de si
mesmo, e desvendou o significado efetivo da teoria aristocrático-burguesa da
divisão da dominação jurídico-institucional do poder do Estado com as seguintes
palavras:
“O primeiro princípio da monarquia
constitucional é aquele relacionado com o equilíbrio.
Esse princípio é a expressão mais
acabada do medo da humanidade diante de si mesmo.
Não quero discorrer acerca da
irracionalidade ridícula, da total inexecutabilidade desse princípio, quero apenas
investigar se ele é concretizado na Constituição da Inglaterra (...)”[48]
Sem dúvida, nessa citação de Engels resulta
efetivamente claro que esse grande pensador revolucionário proletário tinha
perfeito conhecimento das formulações jurídico-ideológicas do
constitucionalismo burguês britânico, como também da grande propaganda política
desencadeada por Henry St. John, Viscount of Bolinbroke, que, em favor de um
reinado conservador e fortalecido contra o domínio parlamentar já consolidado
dos whigs,
fazia ecoar aos quatros ventos do Império Britânico a defesa das
virtudes aristocrático-burguesas do ”equilibrium of powers” : garantia
de freios políticos recíprocos, controles recíprocos, check and balances.
Bolinbroke logrou mesmo elaborar uma teoria de tripartição
jurídico-institucional de poderes, em que a Coroa, a Câmara
dos Lors e a Câmara dos Comuns seriam capazes de
produzir as virtudes de um governo moderado.[49]
Diante de todo esse contexto, escreveu, então, Engels,
de maneira meridianamente precisa, destacando a crescente consolidação
da dominação do poder do Estado nas mãos da burguesia inglesa :
„O poder
da Coroa reduz-se, na prática, a zero e se um fato notório em todo mundo ainda carece
de prova, então já pode servir como prova o fato de que, desde há mais de cem
anos, toda a luta contra a Coroa deixou de existir, que mesmo os cartistas
democrátas-radicais sabem empregar seu tempo em algo melhor do que nessa luta
...
Se o
escárnio que se acumula continuadamente sobre a Câmara Alta há mais de cem anos
tornou-se gradativamente parte integrante da opinião pública, se esse órgão do
Poder Legislativo é considerado, em geral, como uma casa de inválidos para
homens de Estado desgastados, que o oferecimento de uma pária é considerada por
todo membro ainda não esgotado da Câmara Baixa como uma ofença, então pode-se
facilmente entrever em que nível de respeito se encontra o segundo dos Poderes
do Estado estabelecido pela Constituição.
Na realidade, a atividade dos Lords na
Câmara Alta rebaixou-se a uma mera formalidade, sem maior importância ...“[50]
II.E.
A TRIPARTIÇÃO DE PODERES
NO PRELÚDIO DA REVOLUÇÃO BURGUESA DE
1789 :
O SURGIMENTO DO PODER JUDICIÁRIO
Apesar de a doutrina de John Locke ter adquirido
significativa importância para a elaboração das teorias burguesas subseqüentes
sobre a divisão jurídico-institucional do poder do Estado – nomeadamente
através de sua grande influência exercida sobre a disciplina constitucional dos
EUA
- cumpre destacar que seu pensamento doutrinário repartia apenas as
diferentes funções de Estado entre tão somente dois órgãos estatais, atuantes
de maneira independente.[51]
Assinale-se, adicionalmente, que na concepção
aristocrático-burguesa do célebre revolucionário de Wrington, a Coroa,
enquanto chefe dos Poderes Executivo, Federativo e de Prerrogativa,
surge, ainda, como o principal órgão de Estado, apesar de todas as limitações a
que estava submetida mediante lei e, em certos casos, apesar de sua vinculaçao à
lei.
Em um contexto histórico em que a burguesia, lutando
crescentemente contra a realeza e a nobreza, procurava assegurar sua dominação
política, conquistando para si o poder supremo do Estado, teve surgimento a
doutrina aristocrático-burguesa da tripartição da dominaçao
jurídico-institucional do poder do Estado elaborada pelo Barão de la Brède et de
Montesquieu em sua principal obra intitulada De l’Esprit des Lois(Sobre o
Espírito das Leis), surgida em 1748.[52]
Se a bandeira religiosa havia tremido pela última vez na Inglaterra,
no século XVII, a visão jurídico-burguesa do mundo totalmente purificada de
elementos teológicos haveria de emergir na França, menos de cinqüenta depois.[53]
Karl Marx e Friedrich Engels sublinharam, em A Ideologia Alemã, de
maneira eminentemente crítica, as seguintes considerações acerca de tal
concepção relativa à consagração dos assim-denominados poderes de Estado,
enunciada agora como uma “lei eterna” :
“As
concepções da classe dominante são, a cada momento, as concepções dominantes
(...)
As concepções dominantes nada
mais são do que a expressão ideal das relações materiais dominantes, i.e. das
relações materiais concebidas como pensamentos. (...)
Os indivíduos que constituem a classe dominante possuem,
entre outras coisas, também consciência e, por isso, pensam.
Na medida em que dominam como classe e determinam todo o
âmbito de uma época histórica, é evidente que o façam em toda a sua extensão e,
conseqüentemente, entre outras coisas, dominem também como pensadores, como
produtores de concepções, que regulem a produção e a distribuição das idéias de
seu tempo e que suas idéias sejam, por isso mesmo, as idéias dominantes da
época.
Por exemplo : em uma época e em um país
em que o poder real, a aristocracia e a burguesia lutam pelo domínio, onde o
domínio se encontra pois dividido, surge como idéia dominante a doutrina da
divisão dos poderes, que agora surge enunciada como uma “lei eterna.”[54]
Com efeito, ao longo
dos séculos subseqüentes, a teoria da tripartição de poderes de Charles
de Montesquieu tornou-se concepção dominante, mesmo no quadro dos
posteriores Estados Burgueses democráticos-republicanos, mesmo depois de
abolidos os órgãos de Estado representadores das forças políticas monárquicas,
aristocráticas e clericais.
Embora Montesquieu
tivesse desenvolvido seu pensamento relativo à divisão dos poderes
tendo como base a Constituição da Inglaterra, onde “a liberdade política aí aparecia
como em um espelho”, a Europa Continental não foi decisivamente
influenciada pela doutrina britânica de divisão jurídico-institucional do poder
do Estado de John Locke : a “lei eterna” teria como respaldo teórico
incontrastável a formulação doutrinária original de autoria do Barão
de Montesquieu.
Montesquieu
viveu, precisamente, no final da época de ouro do Estado
absolutista francês e formulou seus pensamentos a partir de uma perpectiva
aristocrático-burguesa, a seguir consolidada, no terreno político, através da
força política dos Girondinos.
Para Montesquieu,
todo homem seria levado a pretender conquistar e ampliar seu poder,
dele necessariamente abusando, caso não encontrasse limites para essa sua
assim-considerada tendência natural.
Partindo dessa
premissa, entendia que era imprescindível que, pela própria disposição das
coisas, o poder freasse o poder.
A concentração
ilimitada do poder seria, então, incompatível com a pretensa liberdade natural,
originariamente adquirida pelos homens.
Em conformidade
com suas premissas ideológicas jus-naturalistas, Montesquieu defendeu a
divisão da dominação jurídico-institucional do Estado entre diferentes órgãos
estatais, entre si independentes e incumbidos cada qual do exercício de certa
função estatal, entrevista como parcela de determinada função material geral,
eminentemente distinta das demais.[55]
A função
legislativa surgia, aos olhos de Montesquieu, como a primeira função
de Estado : aquela cujo exercício permitiria fazer as leis por um certo tempo
ou para a eternidade, emendá-las ou abrogá-las.
Após nomear la
puissance exécutrice des choses qui dépendent du droit de gens(i.e. o poder
executivo das coisas que dependem do Direito Público Internacional), enumerando
enquanto seu conteúdo concreto às atribuições de deflagrar a guerra e celebrar
a paz, Montesquieu – diferentemente de John Locke – decidiu-se
simplesmente por associá-la à puissance exécutrice des choses qui
dépendent du droit civil(i.e. ao poder executivo das coisas que dependem do
Direito Civil), denominando, então, tanto uma como outra,
sinteticamente, de puissance exécutrice de l’Etat, i.e. como Poder Executivo do
Estado.
Com essa sua
formulação inovadora, o Federative Power de John
Locke, enquanto o terceiro poder de Estado, deixava simplesmente de
existir enquanto tal, sendo que o segundo poder passava a ser, exclusivamente,
o Poder Executivo.
Para Montesquieu,
todas as funções de governo – quer as domésticas, quer as
internacionais – estariam situadas no domínio desse novo Poder Executivo.
Uma terceira
função foi, então, entrevista, de maneira distinta, por Montesquieu, a puissance
de juger, sendo que a expressao puissance judiciaire não veio a ser
por ele utilizada.
A função de
julgar surgiu, na obra de Montesquieu, como emanação do poder político
executivo interno, dedicado aos julgamentos dos crimes e disputas judiciais.
Segundo a
concepção de Montesquieu, a divisão jurídico-institucional do poder do
Estado nas três diferentes funções por ele concebidas, não garantiria,
entretanto, o ideal de liberdade do indivíduo e não impediria o avanço do
Estado na esfera individual, se o responsável pelo exercício dessas funções
permanecesse sendo um único ou um mesmo órgão de Estado que as acumulasse.
Para a garantia
da liberade política da sociedade françesa marcada então pela ascensao política
da burguesia, seria necessário, segundo o Barão de Montesquieu, um sistema
jurídico-institucional refinado de controles e balanceamentos, i.e. um sistema
de check
and balances, em que as três funções estatais por ele concebidas fossem
exercidas por três distintos órgãos de Estado, independentes entre si, porém
não inteiramente separados.
Na ótica
essencialmente aristocrático-burguesa de Montesquieu, profundamente atenta às
efetivas grandezas políticas de sua época histórica, a Coroa deveria formar o
Poder Executivo.
No âmbito desse
poder, ocorreria a adoção de rápidas decisões, que, na maioria das vezes,
tornavam inviável uma intervenção direta do órgão legislativo do Estado.
Esse Poder
Executivo Monárquico seria, além disso, responsável pela convocação e
estipulação do tempo de funcionamento do Poder Legislativo, o qual, na
concepção do Barão de la Brède et de Montesquieu, deveria ter uma atuação
permanente e ininterrupta.[56]
O Poder
Legislativo seria composto, então, pela nobreza e pelo clero – reunidos em uma
Câmara Alta -, e pela burguesia, atuante em uma Câmara Baixa.
Para Montesquieu,
se a nobreza – privilegiada pelo nascimento, riqueza e honra – viesse a ser
confundida com os cidadãos burgueses e pequeno-burgueses, i.e. o povo de seu
tempo histórico, a liberdade geral passaria a significar a sua servidão.
A nobreza
haveria, pois, de formar um órgão estatal legislativo diferenciado, tal como um
Senado, revestido do direito de impedir os empreendimentos do órgão legislativo
burguês.[57]
Em conformidade
com o pensamento de Montesquieu, os poderes de Estado deveriam permanecer
consideravelmente divorciados, porém não absolutamente atomizados, de modo a produzirem
uma certa situação institucional por ele definida como de equilíbrio.
O Poder
Legislativo nao poderia, assim, exercer funções executivas, nem impedir o
cumprimento dessas funções.
Competia-lhe,
entretanto, la faculté d’examiner a forma e o modo, segundo os quais o
Poder Executivo daria cumprimento às leis.[58]
O Chefe do Poder
Executivo nao deveria possuir nenhuma participação preponderante no processo
legislativo, porém nele poderia intervir através da faculté d’empêcher, quando
apusesse seu veto contra determinada lei, jamais porém com a faculté
de proposer et de statuer.[59]
Montesquieu foi
plenamente claro em assinalar que não subsistiria nenhuma liberdade política se
o Poder de Julgar nao fosse instituído orgânica e independentemente, de maneira
diferenciada dos Poderes Executivo e Legislativo.
Segundo ele, a
função jurisdicional deveria ser exercida por pessoas oriundas das distintas
classes sociais, as quais, em distintos períodos do ano, formariam
respectivamente tribunais ou o corpo dos nobres reunido para julgar seus pares,
com duração fixada segundo as exigências da necessidade.[60]
Montesquieu
propôs, nesse contexto, julgamentos por classes sociais,
a fim de, segundo ele, evitar-se julgamentos injustos :
“Os grandes estão sempre expostos à
inveja e se eles fossem julgados pelo povo poderiam estar em perigo e não
gozariam de qualquer privilégio, o qual possui o menor dos cidadãos em um
Estado livre, i.e. o de ser julgado por seus pares.
É necessário, entao, que os nobres sejam
chamados não diante dos tribunais ordinários da Nação, mas sim diante dessa
parte do corpo legislativo que é composta pelos nobres.”[61]
As referência do
Barão
de Montesquieu ao Poder de Julgar são, além do que aqui já foi exposto,
extremamente escassas.
O Poder de
Julgar surge aos olhos de Montesquieu extremamente debilitado
e designado como sendo, de certa forma, nulo e invisível :
“Dessa forma, o Poder de Julgar, tão
terrível entre os homens, não estando vinculado nem a um certo estado, nem a
uma certa profissão, torna-se, por assim dizer, invisível e nulo.
Nao se possui, continuadamente, nenhum
juiz diante dos olhos e teme-se a magistratura, porém nao os magistrados.”[62]
As palavras
multívocas e obscuras de Monstequieu que afirmavam ser o
poder de julgar pour ainsi dire invisible et nulle, revelam o embaraço desse
jurista françês em situar o Poder Judiciário que entrevia ao lado dos poderes
jurídicos mais claramente atuantes, o Executivo Monárquico e o Legislativo
Aristocrático-Burguês.
O célebre jurista
burguês Maurice Hauriou também identificou, ainda que superficialmente,
esse surgimento esquálido do Poder Judiciário, destinado a existir apenas
esporadicamente, estando divido entre nobres e burgueses em julgamentos de
pares, ele mesmo como objeto de disputas entre a aristocracia e a burguesia :
“Ele (o Poder Judiciário) é “terrível
entre os homens”, i.e. ele é terrível como poder sobre o justiciável, mas é
nulo como eficácia em face dos poderes políticos do Estado, visto que ele nao
possui o poder de impedir sua ação.”[63]
Acerca do tema,
escreveu ainda o célebre jurista burguês alemão, de orientação nazista, Ernst
Forsthoff :
“Tanta maior desvêlo, porém, Montesquieu
dedica à ordem da relação dos poderes entre si.
Ela é o próprio cerne da teoria tão
grosseiramente designada com a palavra de divisão dos poderes.
De início, ele exclui o Poder
Judiciário. Esse último não se reveste politicamente de pêso e, em certo
sentido, é inexistente.
Por essa razão, ele não carece também de
uma moderação.
Tanto mais, entrentato, disso carecem os
outros dois.
Montesquieu volta-se, com semelhante
penetração, contra a dominação seja do Poder Legislativo seja do Poder
Executivo.”[64]
II.F.
O PODER
JUDICIÁRIO
NO QUADRO DO
FORTALECIMENTO DA BUROCRACIA
E DA FORÇA
MILITAR DOS ESTADOS BURGUESES
DOS SÉCULOS
XVIII E XIX
A essa altura de
nossa exposição, cumpriria indagar, em vias de conclusão do primeiro ponto de
nossa exposição, se, ao longo dos últimos duzentos anos de exploração e
dominação das instituições capitalistas e de seu Estado burguês, teria o Poder
Judiciário, após seu esquálido surgimento, permanecido como um poder “invisible
et nulle”, tal como concebido por Montesquieu, ou adquirido uma
presença jurídico-institucional mais determinante e ativa, enquanto Justiça
Burguesa ?
Teria o Poder
Judiciário reduzido-se a uma mera formalidade, convertido-se em uma casa de
inválidos, tornado-se uma pária, tal como foi o decadente destino da Câmara dos
Lords Britânicos, tal como bem assinalou Engels na citação que reproduzimos
acima ou, pelo contrário, adquirido a posição de uma burocracia de funcionários
exclusivamente burguesa, composta por juízes de carreira, vitalícios,
inamovíveis, dotados de sôldos irredutíveis, colocando-se não mais intermediariamente
entre a dominação jurídico-institucional do Executivo Monárquico e do
Legislativo Parlamentar-Burguês ?
Teria o Poder
Judiciário deixado de ser “invisível e nulo” ou permanecido apenas como „a
boca que pronuncia as palavras da lei, um ser inanimado que não lhes poderia
moderar nem sua força nem seu rigor”, tal como dizia Montesquieu?[65]
A elevação da
função jurisdicional à qualidade de um poder de Estado na obra do Barão
de la Brède et de Montesquieu – i.e. como o terceiro poder na
tripartição da dominação jurídico-institucional do poder do Estado -, não foi
marcada, tal como visto, por sua altivez em face dos Poderes Legislativo e
Executivo.
Pelo contrário,
tal função de julgar surgiu aos olhos de Montesquieu marcada por sua falta de
continuidade existencial, divida entre nobres e burgueses em julgamentos de
pares, não sendo incorporada concentradamente em uma única grandeza
jurídico-institucional.
Nesse seu
primeiro momento histórico de vida, o Poder Judiciário emergiu de modo
extremamente debilitado, não tendo sido projetado juridicamente por Montesquieu
para existir nem seguer de modo permanente.
Esse é o Poder
Judiciário anterior à e no quadro da Revolução Burguesa de 1789.
Isso não impediu
que a Grande Revolução Francesa pretendesse suprimir de todo Estado
do mundo civilizado, existente no contexto histórico da época, sua natureza
jurídico-constitucional, caso não assegurasse o princípio da repartição dos
poderes entre diferentes órgãos estatais, ao lado da garantia dos Direitos do
homem e do cidadão burgueses.[66]
Com efeito, o
artigo XVI da Déclaration des Droits de l’Homme et du Citoyen(Declaração dos Direitos
do Homen e do Cidadão), de agosto de 1789, inspirada na doutrina de Montesquieu
e na força política dirigente dos Girondinos, em um momento em que
governava a grande burguesia francesa que pretendia conciliar a revolução com
as instituiçoes jurídico-institucionais monárquicas e aristocráticas, dispôs
expressamente :
“Artigo XVI. Toda sociedade na qual a
garantia dos direitos não é assegurada nem a separação dos poderes determinada
não possui nenhuma Constituição.”[67]
Após a eclosão
dessa grande revolução, inspirada, progressivamente, na obra clássica de Jean-Jacques
Rousseau, intitulada Du Contrat Social ou Principes de Droit
Politique(Do Contrato Social ou Princípios de Direito Político), a
posição do Poder Judiciário no contexto da tripartição equacionada por Montesquieu
haveria de modificar-se considerável e gradativamente.
Porém, as novas
doutrinas jurídico-burguesas de Direito do Estado, ainda que imprimindo uma
nova dimensão jurídico-política à teoria da tripartição de poderes de Montesquieu,
não tiveram como objetivo colocar nenhuma concepção inteiramente nova em seu
lugar.
Entretanto,
aquele balance de pouvoirs constituído no pensamento de Montesquieu
através da participação de diferentes classes sociais na dominação
jurídico-institucional veiculada pelo poder do Estado, pareceu aos seus
sucessores intelectuais como crescentemente irrealizável e incompatível com a
prevalência dos ideais burgueses e a abolição radical dos restos das sociedades
feudais.
Já a doutrina da
democracia ou - como a denominavam os teóricos do século XVIII – a doutrina da
soberania popular, de Rousseau assentou-se, resolutamente,
sobre o princípio da unificaçao de todos os poderes jurídico-institucionais nas
mãos do povo, composto majoritariamente por cidadãos burgueses e
pequenos-burgueses, criticando amargamente a divisibilidade do poder soberano
do Estado :
“Pela mesma razão que a soberania é inalienável,
ela é indivisível. (...)
Mas, nossos políticos, não podendo
dividir a soberania em seu princípio, dividem-na em seu objeto.
Eles a dividem em força e em em vontade;
em Poder Legislativo e Poder Executivo; em Direitos; em Direitos de impostos, de
justiça e de guerra; em administração interior e em Poder de tratar com o
estrangeiro : tanto mais confundem todas as suas partes, quanto mais as
separam.
Fazem do soberano um ser fantástico e
formado de pedaços relacionados, tal como se eles compusessem um homem com
vários corpos, dos quais um teria os seus olhos, outro um braço, um outro ainda
seus pés e nada de diferente. (...)
Esse erro decorre de não se ter noções
exatas sobre a autoridade soberana e de tomar por partes dessa autoridade o que
não representa senao suas emanações.”[68]
Entretanto, tal
convicção não impediu Rousseau de recomendar distinguir-se
entre Poder Executivo e Legislativo :
“Aquele que faz a lei sabe melhor do que
ninguém como ela deve ser executada e interpretada.
Parece, entao, que não se poderia ter
uma melhor constituição do que no caso em que o Poder Executivo estivesse
juntado ao Poder Legislativo.
Porém, é isso mesmo que torna esse
governo insuficiente em certos aspectos, visto que as coisas que devem ser
distinguidas não o são e sendo o príncipe e o soberano a mesma pessoa não
formam, por assim dizer, senão um governo sem governo.
Não é bom que aquele que faz as leis as
execute, nem que o corpo do povo desvie sua atenção das vistas gerais para
dirigí-la aos objetos particulares.”[69]
O aprofundamento
da tormenta revolucionária, protagonizada pelo jurista incorruptible, aboliu, a
seguir, resolutamente, os traços de convívio da burguesia ascendente com os
poderes monárquicos e aristocráticos, jogando por terra o cenário sócio-histórico
conhecido pelo Barão de Montesquieu.
Sob a influência
de Robespierre,
a puissance
irrésistible du torrent révolutionnaire(o poder
irresistível da torrente revolucionária) de fins do século XVIII, haveria de abrir o
caminho da consagração da doutrina da tripartição de poderes de Montesquieu,
entretanto com a relevantíssima modificação concernente ao caráter
eminentemente burguês de todos os poderes jurídico-institucionais imagináveis
do Etat
français, cada vez mais centralizado :
“Qual é o objetivo que perseguimos ? O
gozo pacífico da liberdade e da igualdade (...)
Nós queremos substitutir (...) todos as
virtudes e os milagres da República a todos os vícios e a todos os ridículos da
Monarquia.
Domem, pelo terror, os inimigos da liberdade
e terão razão como os fundadores da República.
O governo da Revolução é o despotismo da
liberdade contra a Tirania.”[70]
A seguir, no
quadro de incessantes revoluções burguesas e restaurações monárquicas, insurreições
proletárias e golpes de Estado ditatoriais, que percorreram toda a Europa
durante o século XIX, o resultado marcante desses movimentos foi, sem dúvida, o
fortalecimento da burocracia e da força militar dos Estados Burgueses,
abrindo-lhes a via para a sua atual configuração imperialista.
Em o 18
Brumário de Luís Bonaparte, Marx observa com precisa clareza o
fenômeno de que agora tratamos :
“Esse Poder Executivo, com sua enorme
organização burocrática e militar, com seu mecanismo estatal complicado e
artificial, com um exército de empregados de meio milhão, ao lado de um outro
exército de meio milhão de soldados, esse corpo parasitário espantoso que
envolve como um invólucro o corpo da sociedade francesa e lhe obstrui todos os
poros, constituiu-se no período da monarquia absoluta, i.e. ao cair do sistema
feudal, cuja queda ajudou a tornar mais rápido esse processo.
A primeira revolução francesa
desenvolveu a centralização e, ao mesmo tempo, teve de desenvolver a amplitude,
os atributos e os instrumentos do Poder de Governo.
Napoleão conduziu à perfeição esse
mecanismo do Estado.
A Monaquia Legítima e a Monarquia de
Julho nada lhe acrescentaram, a não ser uma maior divisão do trabalho (...)
A República Parlamentar, enfim, viu-se
forçada a reforçar na sua luta contra a revolução, juntamente com as medidas de
repressão, os instrumentos e a centralização do poder do Estado.
Todos as reviravoltas políticas não
fizeram senão aperfeiçoar essa máquina, ao invés de despedaçá-la.(...)
Os partidos que sucessivamente lutaram
pelo poder consideraram a posse desse enorme edifício do Estado com o botim
principal do vencedor.”[71]
Nesse curso
histórico geral de fortalecimento e aprimoramento da organização burocrática e
militar do Estado Burguês, bem como no quadro da afirmação cada vez mais
intensa dos ideais burgueses, a situação de convívio político entre Legislativo
Democrático-Burguês e Executivo Monárquico, verificada ao longo de quase todo o
século XIX na Europa, foi sendo paulatinamente superada.
No entanto,
enquanto se verificou esse dualismo fundamental entre o componente monárquico e
o componente democrático-burguês na partilha dos poderes
jurídico-institucionais do Estado da primeira metade do século XIX, o Poder
Judiciário permaneceu como que à parte dessa principal polarização política.
Nesse quadro, o
passo mais significativo, empreendido pela burguesia européia ascendente contra
as forças monárquicas restauracionistas, foi o de lutar em favor de uma certa
neutralidade do Poder Judiciário, através da consagração da independência dos
juízes, bem como de suas principais garantias de vitaliciedade, inamovibilidade
e irredutibilidade de salários, desvinculando-os de seus laços com o Executivo
Monárquico, mantendo-os ausentes de sua principal confrontação com esse último
poder de Estado.
Nesse sentido,
escreve o jurista-historiador alemão Karl Kroeschell :
“Um importante objetivo
jurídico-político de luta tornou-se, finalmente, no século XIX, também a
independência do Judiciário.
O Código Geral Fundiário Prussiano de
1794 tinha ainda designado a função jurisdicional dos tribunais como direito de
soberania inalienável do Rei.
Porém, ao seu redator, Svarez, pareceu
tal pretensão de poder do Rei já uma intervenção ilegítima na administração da
Justiça.
A essa posição iluminista-liberal
ligou-se, no início do novo século, ao novo senso comum científico do estamento
dos juristas.
Também juristas conservadores não
estavam mais dispostos a conceder ao Monarca um direito de confirmação ou
suspensão das sentenças ou mesmo a destituição e deslocamento de varas dos
juízes.”[72]
A Europa do
século XVIII e XIX não possuía, nomeadamente, para o Poder Judiciário nenhum
classe social própria, que reinvidicasse especificamente o seu apoderamento.[73]
Nesse contexto, já
significava uma certa vitória para a burguesia em vias de consolidação de seu
despotismo de classe fazer permanecer o Poder Judiciário, praticamente, fora
das missões dominantes de conformação da dominação política do Estado do início
do século XIX.
O juiz do século
passado aparentava ser, assim, um autômato da subsunção.[74]
O Poder
Judiciário independente caracterizava-se, antes de tudo, por seu status
negativus, estando timidamente vinculado à legislação positiva e
marcado pelo fato de que deveria surgir plenamente emudecido em face dos
embates existentes entre os dois poderes jurídicos-institucionais efetivos de
Estado.
Entretanto, já
na segunda metade do século XIX, quando as forças burguesas francesas pareciam já haver
eliminado o componente jurídico-institucional monárquico de Estado, tendo pela
frente agora a necessidade de reprimir com suas instituições sociais e seu
aparelho de Estado as aspirações de seu novo inimigo de classe, i.e. o
proletariado revolucionário em surgimento, o exercício da função jurisdicional
tornou-se politicamente irrenunciável e sua crescente atuação infirmou o fato
de que ele poderia até mesmo sucumbir, em virtude de sua nulidade e
invisibilidade, no sentido doutrinário utilizado por Montesquieu.
Lenin teve a
oportunidade de observar que o fim do século XIX e o início do século XX
consagrou, nos países mais industrializados, além do fortalecimento
generalizado do aparelho militar e burocrático do Poder Executivo, a
consolidação de um Poder Legislativo Parlamentar, tantos nos países
republicanos, tais como a França, os EUA e a Suiça, como nos monárquicos, de
que eram exemplos a Alemanha e a Inglaterra e, até certo ponto, a Itália e os
países escandinavos.
Esse período
abriria o caminho para uma luta pelo poder dos diversos partidos burgueses e
pequenos burgueses, que buscavam então repartir entre si o botim dos cargos
estatais, mantendo ilesas as bases do sistema capitalista.[75]
Não estando
subordinado ao Executivo e ao Legislativo, poderes esses mais expostos à luta de
classes travada agora preponderantemente entre a burguesia e o proletariado,
poderes esses mais sujeitos às transformações e instabilidades eleitorais
marcadas pelo fortalecimento dos partidos revolucionários da classe
trabalhadora, o Poder Judiciário iniciava o seu processo de consolidação
burocrático-burguesa, às sombras dos acontecimentos políticos.[76]
Nesse domínio,
pôde o Poder Judiciário desenvolver, gradativamente, novas formas de ligação
burocrática com a burguesia, na medida em que no seio dos Poderes Legislativo e
Executivo se consolidava, gradativa e progressivamente, o caráter
democrático-burguês da representaçção popular.
Assim, o Poder
Judiciário adquiriu, crescentemente, o caráter de poder jurídico-institucional
de Estado, no sentido mais próprio e essencial dessa expressão, situando-se em
uma posiçao burocrático-conservadora em face dos demais poderes de Estado
Burguês cuja direção política era exposta, agora, crescente e alargadamente, às
disputas dos partidos políticos de massas.
O fortalecimento
dessa burocracia judiciária, fomentada estimulantemente pela burguesia
dominante, ofereceu pressupostos satisfatórios para que fosse formado e
selecionado, rigorosamente, um corpo elitista de juízes educados no mais
restrito positivismo jurídico, bem como estruturado um sistema de funcionamento
orgânico peculiar, composto por funcionários estatais disciplinados e atuantes
preponderantemente segundo a própria normatividade regimental interna desse
novo Poder Judiciário colocado estritamente ao serviço dos mais decisivos
interesses do Direito Burguês do século XX.
II.G.
O PODER
JUDICIÁRIO ENQUANTO
GUARDIÃO DA
CONSTITUIÇÃO DOS ESTADOS BURGUESES IMPERIALISTAS
No quadro do imperialismo, enquanto fase suprema do capitalismo,
i.e. sobretudo após a I Guerra Mundial, o Poder Judiciário
viria a assumir os contôrnos de uma não
apenas sólida e mas também petrificada formação burocrático-conservadora de juízes de carreira do Estado Burguês, ligada
à necessidade objetiva e aos interesses materias do capitalismo dominante.
Tais juízes de
carreira, vitalícios, inamovíveis, dotados de irredutibilidade salarial e de noblesse
de la robe(nobreza da toga), surgiriam, então, excluidos de qualquer
processo democrático-burguês eletivo e desprovidos de qualquer
representatividade em face da classe trabalhadora e das massas oprimidas das
sociedades burguesas-capitalistas contemporâneas.
Por sua vez, as garantias
jurídico-constitucionais de suposta independência, imparcialidade, inamovibilidade
no exercício da função de julgar,
irredutibilidade salarial, consagradas praticamente em todos os Estados
Burgueses ao longo do século XX, adquiriram o preciso objetivo de obscurecer,
diante dos olhos da classe da trabalhadora e demais segmentos socialmemte
explorados pelo despotismo capitalista, o caráter crescentemente político
assumido pelo Poder Judiciário na interpretação e aplicação da ideologia contida no
ordenamento jurídico burguês da atualidade.
Esse novo contexto, solidificou-se no quadro
dos Estados Burgueses Imperialistas da primeira metade do século XX, i.e. nos EUA e
nos Estados Europeus, quando o Poder Judiciário emergiu, ostensiva e
progressivamente, como o Guardião da Liberdade ou da Constituição,
i.e. como o Guardian of Liberty ou o Hüter der Verfassung, enquanto
burocracia estatal burguesa conservadora e independente, fundada no exercício
da função de julgar as normas e medidas jurídicas
produzidas pelos Poderes Legislativo e Executivo.
Em verdade, tal fenômeno histórico começou,
historicamente, a adquirir forma já com a criação e fortalecimento da Supreme Court dos EUA que conduziu,
rapidamente, já em 1803, sob a presidência do Chief Justice John
Marshall(Presidente da Corte Suprema dos EUA), à consagração, no caso Marbury v. Madison, do Direito de
controle constitucional das leis e de aplicação unicamente daquelas leis que fossem consideradas como conformes à Constituição
dos EUA.[77]
Porém, teria sido apenas nas primeiras
décadas do século XX, com o advento do capitalismo imperialista e de sua agonia
mortal, que se generalizaria a concepção
jurídico-burguesa de que atuações políticas e normativas descontroladas do
Legislativo e do Executivo, dominados pela componente
democrático-representativa do Estado, poderia produzir grandes perigos para os
valores essenciais e sagrados da economia de mercado capitalista.
O respeito dos direitos capitalistas de
liberdade e propriedade permaneceria sem efeito caso não existisse uma instituição de controle da vigência dos valores constitucionais
burgueses.[78]
Nesse contexto
histórico de formação do capitalismo imperialista, o Poder Judiciário passaria
a assumir, crescentemente, não apenas a atribuição de julgar litígios,
aplicando as leis vigentes aos casos concretos, senão ainda a de rever
juduciariamente a constitucionalidade das próprias leis, regulamentos e demais
atos jurídicos (Judicial Review), produzidos pelos agora mais debilitados
órgãos representativos da democracia burguesa dos Estados capitalistas
imperialistas.
Esse último e atual estágio alcançado
pelo Poder Judiciário desembocou, em território Europeu, na célebre polêmica
dos anos 20 e 30 do século XX, travada entre Hans Kelsen e Carl
Schmitt, acerca da Poder Judiciário enquanto Guardião da Constituição.[79]
Sob a égide da débil e enfraquecida República
Imperial de Weimar, perpassada pelos enfrentamentos havidos entre a
burguesia reacionária e o proletariado alemão, tornou-se bastante característica a importância
transcendental adquirida pelo Poder Judiciário.
A partir de 1925, o Tribunal do Império Alemão
(Reichsgericht) assumiu a função de
examinar a constitucionalidade das normas e medidas jurídicas produzidas pelos
dois outros poderes de Estado, i.e. o Legislativo e o Executivo.
Além disso, nas
decisões desse tribunal formulavam-se proposições jurídicas que vinculavam as
cortes judiciárias, os juizados de primeiro grau – tal como verdadeiras súmulas
vinculantes - e, além disso, até mesmo, em certos casos, o legislador ordinário
Nessa conquista
de crescente espaço no quadro da dominação jurídico-institucional, após o
fortalecimento das atribuições do Tribunal do Império Alemão, a Corte
do Tribunal do Estado do Império Alemão (Staatsgerichsthof für das Deutsche
Reich) não se intimidou em pronunciar-se acerca dos conflitos políticos
de classe da atribulada vida da República Imperial de Weimar, atuando
como se fosse um verdadeiro sustentáculo supremo do Direito e da dominação
burocrática e militar do Estado Burguês Imperialista da Alemanha.[80]
A Corte
do Tribunal do Estado para o Império Alemão assumiu como principal
competência a função de pronunciar-se jurisdicionalmente nas disputas de
Direito havidas entre o Império e os Estados federados, bem como naquelas
havidas entre esses últimos.
Aqui, o Poder
Judiciário passava a poder reagir, de maneira clara, contra as debilidades
democrático-burguesas dos Poderes Legislativo e Executivo, adquirindo o status de
uma burocracia burguesa-estatal conservadora, capaz de estabelecer certos
limites da ordem política do Estado Burguês.
Por força da
possibilidade aberta de controle judiciário da constitucionalidade do Direito
Burguês, expandiu-se, no século XX, crescentemente, a justicialidade sobre as
funções exercidas pelos Poderes Legislativo e Executivo.
Tal controle de
defesa das garantias fundamentais da liberdade e propriedade capitalista,
passou a ser efetivamente dinamizado durante o período histórico da emergência
dos Estados Social-Intervencionistas Burgueses, subseqüente à Grande
Depressão Mundial de 1929.[81]
O caráter
novidadeiro de notória e crescente politização dessa nova versão de Poder
Judiciário foi observada por diversos juristas burgueses da primeira metade do
século XX e, da maneira mais clara e polêmica, pelo célebre jurista do nazismo
e do imperialismo capitalista alemão, Carl Schmitt.[82]
Derrotados os
regimes totalitários raciais, o período posterior à II Guerra Mundial consagraria
na doutrina européia a vitória das teses defendidas por Hans Kelsen – em verdade,
agora uma cópia alemã do pensamento jurídico-constitucional de John
Marshall da Corte Suprema Norte-Americana dos EUA - sobre a doutrina de
Carl
Schmitt, essa última de linhagem pequeno-burguesa nazista e mais
conforme ao imperialismo alemão do início e meados do século XX, no sentindo de
consolidar-se o Poder Judiciário como o mais autêntico Guardião da Constituição dos
Estados Burgueses Imperialistas.
Ness período do
após-guerra, em face da crescente expansão dos Estados Soviéticos
Burocratizados na Europa do Leste e na Ásia Continental, o capitalismo
imperialista ocidental procurou dogmatizar e supra-historicizar a doutrina da
divisão dos poderes de Montesquieu, situando-a agora no
âmbito do ideologia jurídico-burguesa do assim-denominado Estado de Direito, Social e
Democrático, tendo como o paradigma o sistema republicano congressual
dos EUA.
Já não se
tratava de uma simples e fiel restauração da velha fórmula
aristocrático-burguesa da separação ou divisão dos poderes, existente à época
do Barão
de la Brède et de Montesquieu, em cujo contexto o Poder Judiciário
surgia, por assim dizer, invisible et nulle.
Em face da nova
realidade do capitalismo imperialista, comandado sobretudo pelas forças
materiais do imperialismo norte-americano, a tripartição de poderes haveria de
ser reconfigurada diversamente, tendo agora como principal reduto burocrático
de defesa jurídico-constitucional dos direitos de liberdade e propriedade
capitalistas o Poder Judiciário, Guardião da Constituição.
Nesse novo
momento histórico, o Judiciário, reformulado em sua essência e autoridade
jurídico-institucional, haveria de cumprir, no exercício de sua função
político-burguesa de hermenêutica jurídica, o importante papel de guardião da
ordem constitucional dos Estados Burgueses Imperialistas da atualidade.[83]
Dessa mesma
forma, certos princípios jurídico-constitucionais de grande importância para a
dominação jurídico-institucional do poder do Estado Burguês haveriam de ser
protegidos através dessa atividade jurídico-hermenêutica de natureza
político-burguesa, impulsionada pelo Poder Judiciário contra as maiorias
democrático-burguesas cambiantes.[84]
Nesse quadro, é
que, por exemplo, o atual Tribunal Constitucional da Alemanha pronunciou-se
sobre a inconstitucionalidade de certos partidos políticos – como, em 1956,
relativamente ao Partido Comunista da Alemanha -, o reenvio de tropas militares
alemães em operações imperialistas externas no curso dos anos 90, a proibição da
consigna de esquerda Tucholsky “Soldatos Alemães são Assassínos”,
a perseguição militar dos agentes do antigo serviço secreto da antiga Alemanha
Oriental, o emprego de violência policial aberta nos bloqueios e manifestações
de rua, as limitações constitucionais ao direito de aborto das mulheres etc.[85]
Nesse quadro, é
que, por exemplo, a Corte Suprema dos EUA, ainda sob a presidência do
republicano-reaganiano Chief of Justice William H. Rehnquist - que
a comanda já a 14 anos ininterruptos -, segue restabelecendo seus
posicionamentos mais extremamente reacionários de defesa da lei e da ordem do
capitalismo imperialista norte-americano.
Os
posicionamentos da Corte Suprema dos EUA, comandadas por Rehnquist tratam de
reverter, sistemativamente, as antigas posições mais propriamente
sociais-liberais burguesas da presidência judiciária, de 16 anos, de Earl
Warren, da década de 50 e 60, responsável essa última pelas decisões
relacionadas com a luta dos Direitos Civis dos negros norte-americanos, o fim
da segregação racial nas escolas federais (Brown v. Board of Education of Topeka,
Kansas), o direito de consulência advocatícia e de proteção do acusado,
em casos criminais, em face de abusos policiais.
III.
OS TRIBUNAIS
POPULARES ELETIVOS,
I.E. TRIBUNAIS
ELETIVOS DOS OPERÁRIOS, SOLDADOS E CAMPONESES
DA REVOLUÇÃO DE
OUTUBRO : ALTERNATIVA REVOLUCIONÁRIA
À JUSTIÇA DE
CLASSE BURGUESA E ÀS REFORMAS DO PODER JUDICIÁRIO
O surgimento dos
tribunais populares eletivos, i.e. tribunais eletivos dos operários, soldados e
camponeses, no quadro da Revolução de Outubro, pode ser apenas devidamente
compreendida tendo-se em conta a perspectiva doutrinária marxista acerca do
Estado.
Sendo assim,
dedicamos os primeiros itens da presente parte, à exposiçao do significado
político-teórico e prático-social do Estado, para então, a seguir,
voltarmo-nos, propriamente, à análise da gênese, composição e funções dos
tribunais da Revolução de Outubro.
II.A.
SURGIMENTO E
SIGNIFICADO
DO ESTADO NA
CONCEPÇÃO MARXISTA
Em sua obra
intitulada A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado, Friedrich
Engels teve a oportunidade de precisamente assinalar, desde uma
perspectiva histórico-materialista, que o Estado é um produto de certa
sociedade situada já em determinado estágio de desenvolvimento, o qual a conduz
a uma contradição insolúvel, em razão de antagonismos inconciliáveis de classes
inimigas que é incapaz de eliminar.
Para que esses
antagonismos de classe não distruam o organismo social em uma luta estéril,
surge a necessidade de um poder que se coloque, aparentemente, acima da
sociedade como um todo, dela se distanciando progressivamente, cujo mister é o
de atenuar e manter os conflitos de classe nos limites da “ordem” : esse poder,
segundo Engels, é o Estado.[86]
Na concepção
marxista, o Estado surge, então, como um poder para a dominação da classe
economicamente mais forte, um instrumento de opressão de uma classe por outra,
poder esse criador de uma ordem legalizadora e consolidadora da opressão de
classe, destinada a moderar, a frear, a atenuar, os conflitos entre as classes
sociais.[87]
A classe
economicamente dominante adquire, assim, um instrumento que lhe permite se
tornar politicamente dominante, mantendo submetidas e exploradas as classes
oprimidas.
Um dos
principais sinais distintivos do Estado em formação passa a ser, então, segundo
Engels,
a instituição de uma força pública militar, autônoma e especial, que
não coincide mais diretamente com a população, organizada espontâneamente
enquanto poder armado.
Essa força
militar particular, composta por destacamentos especiais de homens armados,
i.e. exército permanente e polícia, tendo à sua disposição prisões, institutos
penais de coerção e órgãos de burocracia estatal de todos os gêneros, passa a
ser indispensável na medida em que a sociedade já se encontra divida em classes
sociais hostis, cujos interesses materiais, insuscetíves de serem conciliados,
não permitem mais a existência de uma organização armada de toda a população.
Além disso, a
formação histórica do Estado traz como característica marcante o recolhimento
de impostos e a consolidação de uma dívida pública, sendo que o funcionalismo estatal,
dotado de garantias jurídicas de inviolabilidade, tende, cada vez mais, a
emergir como um corpo orgânico da sociedade situado acima da própria sociedade.[88]
O Estado passa a
ser, assim, o representante oficial de toda a sociedade, sua síntese em um
corpo visível, porém o é enquanto Estado da classe dominante que se apresenta
por si mesma como representante de toda a sociedade.[89]
Assim surgiu, na
Antigüidade, o Estado dos cidadãos patrões de escravos, na Idade Média, o
Estado da nobreza feudal, no nosso tempo, o Estado da burguesia.
Nesse preciso
sentido, segundo Engels, não apenas o Estado Antigo e o Estado Feudal eram
instrumentos de exploração dos escravos e servos, mas também o moderno Estado
Representativo Burguês constitui-se em instrumento para a exploração do
trabalho assalariado por parte do capital :
“Na República Democrática” – observa Engels – “a riqueza exercita o seu
poder indiretamente, mas de maneira tanto mais segura. Em primeiro lugar,
através da corrupção direta dos funcionários (América), em segundo lugar, com a
aliança entre governo e bolsa (França e América).”[90]
Em conformidade
com sua concepção histórico-materialista do Estado, Engels assinalou que,
tendo havido sociedades primitivas que não careceram da instituição de um
aparelho estatal, o advento de um novo estágio de desenvolvimento da produção
social deveria fazer com que a existência das classes sociais não apenas viesse
a desaparecer, senão ainda que se tornasse um autêntico obstáculo à produção
comum.
Com o desaparecimento
dos antagonismos de classe e o surgimento de uma associação livre e igual de
produtores, deixaria de existir, inelutavelmente, o Estado, sendo a inteira
máquina estatal relegada ao museo da antigüidade, juntamente com a roda de fiar
e o machado de bronze.[91]
Tal processo
pressupõe, entretanto, o apoderamento do poder do Estado pelo proletariado, sua
transformação em classe dominante, sua conquista da soberania proletária e, em
um primeiro momento, a conversão dos meios de produção social em propriedade
estatal.
Tal apoderamento
significa, precisamente, portanto, o despedaçamento, a demolição, die
Sprengung,
i.e. a explosão, a supressão, a extinção, o fazer saltar pelos ares do
Estado Burguês por obra da revolução proletária, bem como sua substituição por
um Estado Proletário, um Estado das grandes massas oprimidas, i.e um Estado de
novo tipo.
Nesse contexto
revolucionário, a substituição do Estado Burguês despedaçado pelo Estado
Proletário não é possível sem a violência empreendida no sentido do exercício
da função revolucionária do proletariado.[92]
Tirando a
conclusão efetiva dessas premissas, Karl Marx assinalou, então, em sua Crítica
ao Programa de Gotha, que entre a sociedade capitalista e a sociedade
comunista, existe um período de transformação revolucionária de uma em outra,
um período de transição, no qual o Estado não poderia ser outro senão a Ditadura
Revolucionária do Proletariado.[93]
Emergindo do
seio do capitalismo, trazendo os vestígios da velha sociedade de cujo âmbito
procede, essa Ditadura pode conduzir, segundo Marx, à primeira fase,
i.e. à fase inferior do comunismo, ou, como se diz comumente, ao socialismo.
Nessa primeira
fase, se o Direito Proletário passa a reger as relações de propriedade dos
meios sociais de produção, consagrando sua estatização, o Direito Burguês, que
pressupõe a desigualdade material dos homens, segue existindo como regulador no
domínio da repartição dos bens de consumo e necessários à vida, segundo o
seguinte princípio jurídico-burguês : “para igual quantidade de trabalho, igual
quantidade de produtos”.[94]
Assim, o
socialismo não pode ainda realizar a justiça material e a igualdade real, na
medida em que seguem existindo as injustas diferenças de riqueza, embora não
seja mais possível, sob seu domínio, perpetrar-se a exploração capitalista do
homem pelo homem.
Apenas na fase
mais elevada da sociedade comunista - ou, como se diz habitualmente, no quadro
do comunismo -, quando resulta eliminada à subordinação do homem à divisão do trabalho,
bem como o contraste entre trabalho físico e trabalho intelectual, deixando o
trabalho de ser um meio de subsistência para tornar-se a primeira necessidade
de vida, apenas então o horizonte do Direito Burguês pode ser totalmente
superado no domínio da repartição dos produtos econômicos, podendo os homens
trabalharem para a sociedade sem qualquer Direito e sem qualquer norma
jurídica, segundo o seguinte princípio comunista de convivência social : “de
cada um segundo sua capacidade, a cada um segundo sua necessidade.”[95]
Procedendo dessa
forma, o proletariado dá início, entretanto, a um processo de supressão de si
mesmo enquanto classe, abrindo a perspectiva de abolição de toda diferença e
antagonismo de classe e, por consegüinte, de extinção do Estado Proletário
enquanto tal e, por consegüinte, da Soberania proletária, enquanto forma
política desse Estado, rumo a uma sociedade comunista.
No curso da
consolidação da sociedade comunista, já não existiriam as forças burguesas e
latifundiárias a serem oprimidas, que tornam indispensáveis uma força
repressiva particular exercida contra elas pelas grandes massas oprimidas, i.e.
um Estado Proletário, e consequentemente - acrescentamos nós -, na medida em
que desaparecesem progressivamente as diferenças de riqueza e as desigualdades
materiais, seria possível caminhar-se rumo à própria extinção de toda e
qualquer forma de Direito ou fenômeno jurídico-normativo.
Nesse quadro, o
primeiro ato com o qual o Estado se apresenta efetivamente como autêntico representante
de toda a sociedade, i.e. através da tomada de posse de todos os meios de
produção em nome da sociedade, já deve representar, segundo Engels,
o seu último ato independente enquanto Estado.
No lugar do
governo sobre as pessoas, tende a surgir a administração sobre as coisas e a
direção consciente dos processos produtivos.[96]
Sendo assim, é
correto afirmar que o Estado não é abolido – tal como o afirmam os anarquistas,
porém sim que ele se extingue.[97]
III.B.
O ESTADO EM FACE
DAS REVOLUÇÕES PROLETÁRIAS
Em face dessa
concepção histórico-materialista do Estado, cabe anotar que toda revolução
proletária que logre abalar ou destruir esse poder do Estado Burguês, já
permite entrever que a classe exploradora dominante pretenderá, sempre e
necessariamente, desde que possível, reconstruí-lo, a fim de poder melhor
serví-la em seus propósitos de dominação política.
Nesse sentido, Karl
Marx e Friedriech Engels esforçaram-se por elaborar, ao longo de mais
de cinqüenta anos de investigações revolucionárias, uma concepção clara e
precisa das tarefas do proletariado revolucionário em face do fenômeno estatal.
Já em sua obra a
Miséria
da Filosofia, produzida entre dezembro de 1846 e abril de 1847, Karl
Marx afirmou que a tarefa central da classe
trabalhadora seria a de lutar por estabelecer uma associação livre e igual de
produtores que excluisse as classes sociais e seus antagonismos.
Uma vez
estabelecida esse nova situação social, já deixaria de existir o poder político
propriamente dito, já que esse último é a síntese oficial das contradições de
classes na sociedade civil.[98]
Com a publicação
do Manifesto
Comunista, escritos por Marx e Engels em novembro de
1847, resultou nitidamente claro que a fase geral de desenvolvimento do
proletariado, conduzida no quadro de uma guerra civil mais ou menos oculta,
haveria de explodir em uma revolução aberta que teria como objetivo a derrubada
violenta da burguesia e o estabelecimento de seu próprio domínio político
proletário.[99]
O primeiro passo
da revolução proletária deveria ser, assim, a elevação do proletariado em
classe dominante, conquistando sua democracia, servindo-se de sua supremacia
política para arrancar da burguesia, pouco a pouco, todo o capital e concentrar
todos os instrumentos de produção nas mãos do novo Estado Proletário, i.e. do
proletariado mesmo, organizado enquanto classe dominante, aumentando com a
máxima rapidez possível a massa das forças produtivas.
Nesse sentido, o
Estado, para Marx e Engels, no quadro irrupção da revolução proletária,
seria, pois, o próprio proletariado organizado enquanto classe dominante e
opressora da antiga classe exploradora no poder, i.e. a burguesia.
Tratar-se-ia,
pois, agora de um Estado em via de extinção, organizado de forma a ser colocado
a serviço da repressão da imensa maioria do povo contra a ínfima minoria dos
modernos escravistas, i.e. os proprietários fundiários e capitalistas, com o
objetivo de introdução de medidas transicionais rumo a uma sociedade
socialista.[100]
Detalhando ainda
mais precisamente sua concepção acerca do Estado em face da revolução
proletária, Karl Marx elaborou, em sua obra o 18 Brumário de Luís Bonaparte, redigida
entre dezembro de 1851 e março de 1852, o balanço histórico das primeiras
revoluções proletárias européias de 1848 a 1851.
Nessa sede, Marx assinalou
que a revolução do proletariado, trabalhando metódica e progressivamente, teria
empurrado, inicialmente, o Poder Legislativo para poder derrubá-lo, seguindo,
então, imediatamente, adiante em sua luta contra o Poder Executivo, a fim de
reduzí-lo a sua expressão mais pura, isolá-lo, levantando-se diante desse
último entrevisto como o único obstáculo, concentrando contra ele todas as
forças de destruição da revolução.[101]
A partir daqui,
passou a tornar-se mais claro o posicionamento de que as revoluções do
proletariado deveriam destruir, despedaçar, demolir a máquina estatal burguesa,
o poder do Estado Burguês.
Esse ponto
decisivo da revolução proletária, Lenin viria a considerar,
posteriormente, como o traço prinicipal e fundamental da doutrina de Marx sobre
o Estado (glavnoe, ocnovnoe v utchenii marksizma o gosudarstve), traço
esse plenamente desnaturado e esquecido pelos teóricos sociais-democrátas mais
célebres da II Internacional.[102]
Em sua carta de
5 de março de 1852, dirigida a Joseph Weydemeyer, Marx assinalou,
então, que sua contribuição particular e inovadora para a doutrina da luta de
classes foi, efetivamente, o de
esclarecer que, estando as classes sociais ligadas a determinadas fases de
desenvolvimento histórico da produção econômica, a luta travada entre elas
haveria de conduzir, inevitavelmente, à Ditadura Revolucionária do Proletariado, entendida
essa última tão somente como uma passagem rumo à supressão de todas as classes
e o estabelecimento de uma sociedade sem classes.[103]
Tal colocação
destacou, claramente, a imprescindibilidade de edificação de um Estado
democrático de novo gênero – i.e. um Estado para os proletários e não para os
proprietários capitalistas em geral -, e, essencialmente, ditatorial de novo
gênero, para o abatimento e a aniquilação completa da burguesia.[104]
Na Comuna
de Paris, Karl Marx entreviu, a seguir, uma experiência histórica de
incomparável relevância, a primeira tentativa de revolução proletária voltada à
destruição do Estado Burguês, um passo adiante na revolução proletária mundial,
um passo muito mais significativo do que uma centena de programas e de
formulações teóricas.
A luta
revolucionária da Comuna justificou a única grande, profunda e
essencial alteração, empreendida conjuntamente por Marx e
Engels, em sua doutrina dialético-materialista sobre o Estado, tendo
como base a experiência revolucionária dos communards parisiens, a qual foi
incorporada, em 24 de junho de 1872, à nova edição alemã do Manifesto
do Partido Comunista.[105]
Segundo Marx e
Engels, esse manifesto havia resultado envelhecido no preciso e
particular aspecto de que a classe operária não se poderia limitar a apenas
apoderar-se, pura e simplesmente, de uma máquina estatal já pronta e colocá-la
em movimento para os seus próprios fins : seria indispensável para o
proletariado precisamente despedaçar, i.e. zerbrechen, a máquina militar e
burocrática do Estado, sendo essa a condição preliminar de toda e qualquer
revolução proletária e popular.[106]
Entretanto, a
experiência da Comuna de Paris concedeu a Marx e Engels a possibilidade de
estudarem abrangentemente um novo e grandioso processo revolucionário
proletário em curso, conduzindo-os a sintetizarem suas conclusões na obra
redigida por Marx em abril e maio de 1871, intitulada a Guerra
Civil na França.[107]
Nessa sua obra, Marx assinalou
que a Comuna de Paris foi a antítese direta do Estado Imperial Francês, a
forma positiva de uma República que não apenas havia de eliminar a forma
monárquica do domínio da classe burguesa, senão ainda o próprio domínio burguês
de classe.[108]
A Comuna
de Paris substituiu, portanto, a máquina estatal burguesa que havia
despedaçado, com uma democracia republicana proletária de índole
socialista-revolucionária e internacionalista, com instituições públicas
baseadas, portanto, sobre princípios organizativos inteiramente diversos.
O Estado Burguês
foi transformado em qualquer coisa que já não era propriamente um Estado, i.e.
tratava-se de um certo Estado porém do tipo de Comuna, segundo Engels,
algo como um Gemeinwesen, estando dotado agora da
tarefa de reprimir a resistência permanente de uma ínfima minoria de
exploradores burgueses-capitalistas.[109][110]
Segundo Marx,
o primeiro decreto da Comuna foi a supressão do exército permanente
e a sua substituição pelo povo armado, i.e. por uma força geral da maioria do
povo – dos operários e camponeses -, e não mais uma força particular colocada a
serviço da classe economicamente exploradora.
A polícia foi
despida de suas atribuições político-burguesas e transformada em um instrumento
da Comuna,
sendo o mandato de seus membros revogáveis a qualquer tempo.
A Comuna
foi composta por conselheiros municipais eleitos por sufrágio universal
nos diversos departamentos de Paris, sendo seus representantes
naturalmente operários, dotados de mandatos revogáveis.
O mesmo afirmou Marx ter
sido válido para os funcionários de todas os demais ramos da administração
pública.
Todos os
funcionários judiciários foram despidos de sua sediciosa independência, devendo
prestar contas à Comuna de suas atividades jurisdicionais.
Juízes,
procuradores e demais funcionários judiciários passavam agora a dever ser
eleitos, estando seus mandatos sujeitos à revogação a qualquer tempo.
Nesse quadro de
absoluta elegibilidade e revogabilidade a qualquer momento de todos os
funcionários communards, sem qualquer exceção, todos os cargos do serviço
público haviam de ser prestados na base de salários de operários.
Destruindo-se,
assim, as duas maiores fontes de despesas estatais burguesas – i.e. as despesas
com o funcionalismo estatal e o exército permanente – a Comuna concretizou,
efetivamente, as frases publicitárias propagandeadas incansavelmente pela
burguesia relativas a um governo barato e à redução dos gastos públicos.[111]
Mais do que isso
: a Comuna
deixou de ser um Parlamento de Estado e assumiu a forma de um órgão
efetivamente de trabalho, legislativo e executivo ao mesmo tempo, fortalecendo
a unidade nacional e a liberdade municipal local, contra as tendências federalistas.[112]
Assim, a Comuna
apresentou, concretamente, a via para suprimir os sistemas de governo
parlamentaristas e presidencialistas, venais e corruptos, demontrando que não
se tratava de destruir as instituições representativas e a elegibilidade, mas de
transformá-las em organismos de trabalho efetivo, i.e. em orgarnismos não de
debates acerca de ilusões políticas e de engôdos populares, mas sim de trabalho
revolucionário proletário, concentrando em suas mãos as atividades efetivas
relacionadas com o exercício de funções executivas de administração, controle,
registro, supervisão, contabilidade etc.[113]
Escrevendo sobre
a Comuna
de Paris, Marx enfatisou :
“O seu verdadeiro segredo foi este: a Comuna
foi um governo da classe operária, o produto da luta da classe dos produtores
contra a classe apropriadora, a forma política finalmente descoberta, na qual
se podia cumprir com a emancipação econômica do trabalho.”[114]
A seguir, no
quadro do surgimento dos Estados Burgueses Imperialistas, Lenin observou que os
armamentos estatais de terra e de mar haviam sido reproduzidos em proporções
inacreditáveis em todos os países do globo, sendo que a I Guerra Mundial Imperialista travada
para a definição do domínio da Inglaterra ou da Alemanha sobre o mundo e para a
repartilha das colônias entre elas e seus associados, conduziu à formação de
poderes estatais vorazes, que ameaçavam engolir todas as forças da sociedade.
O imperialismo
enquanto época do capital financeiro e dos grandes monopólios capitalistas,
época na qual o capitalismo monopolista se transforma em capitalismo
monopolista de Estado, determinou a extraodinária consolidação da máquina de
repressão estatal burguesa, bem como o inaudito crescimento de seu aparelho
militar e burocrático para acentuar a opressão do proletariado em todos os
países do mundo.[115]
Diante desses
fatos, Lenin, em O Estado e a Revolução, escrito em
agosto de 1917, assinalou que, com a deflagração da I Guerra Mundial Imperialista, a
reserva de Marx, contida no 18 Brumário de Luis Napoleão, concernente
a necessidade de despedaçamento da máquina militar e burocrática do Estado
Burguês apenas no quadro das revoluções proletárias do continente Europeu,
também estava, essencialmente, envelhecida.
A Inglaterra
e os EUA,
últimos representantes da liberdade anglo-saxônica - consagradora da ausência
de um militarismo e de uma burocracia administrativa já existente nos Estados
Burgueses da Europa Continental -, haviam emergido as mesmas instituições
militaristas e burocráticas características da violenta dominação burguesa.
A partir de
então, a condição preliminar de toda e qualquer revolução proletária nesses
dois países passava a ser, igualmente, a ruptura e destruição de suas máquinas
estatais burguesas engendradas para reprimir as classes subalternas
violentamente.[116]
Tal contexto,
coloca, em escala incomparavelmente mais ampla, a atual tarefa de concentração
de todas as forças da revolução proletária para a destruição do poder dos
Estados Burgueses Imperialistas da atualidade.
III.C.
O ESTADO
PROLETÁRIO
E OS TRIBUNAIS
POPULARES ELETIVOS,
I.E. TRIBUNAIS
ELETIVOS DOS OPERÁRIOS, SOLDADOS E CAMPONESES
DA REVOLUÇÃO DE
OUTUBRO
No quadro da Revolução
de Outubro de 1917, o Partido Bolchevique, fundando-se na
concepção de Marx e Engels acerca do Estado, procurou aplicar, na prática, o
programa de demolição e despedaçamento do Estado Burguês-Latifundiário,
encabeçado por Kerensky, lutando pela edificação de um novo poder proletário e
camponês, revolucionário e internacionalista, baseado na força militar dos
trabalhadores armados e no impulsionamento de medidas de transição ao
socialismo.[117]
Esse novo poder
proletário e camponês encontrou sua forma de dominação política proletária-ditatorial
nos Soviets
dos Deputados dos Operários, Soldados e Camponeses, constituídos como
veículos da ditadura de milhões e milhões de trabalhadores e explorados,
conclamados a participar voluntariamente nas execuções das tarefas de direção e
administração do Estado.
O novo Estado
Soviético, encabeçado por Lenin, pretendeu organizar a grande
indústria e toda a economia nacional russa, situadas em um estágio de
desenvolvimento relativamente atrasado, partindo daquilo que o capitalismo
russo já havia precedentemente criado, para então, a partir daí, lançar as
bases de uma disciplina proletária rigorosa forjada nas experiências
revolucionárias proletárias havidas precedentemente no continente europeu.[118]
Nesse sentido,
a Revolução de Outubro inspirou-se,
particularmente, nos ensinamentos da Comuna de Paris, sobretudo no campo
de organização do poder soviético, aspirando, entretanto, ao fortalecimento
proletário-ditatorial desse poder, de modo a lograr reprimir completamente a
poderosa resistência burguesa contra-revolucionária, manifestada militarmente
em escala nacional e internacional, bem como almejando o aniquilamento da
exploração do homem pelo homem e divisão da sociedade em classes hostis.[119]
Segundo Lenin,
teria sido, com efeito, necessário que a Comuna de Paris houvesse cumprido,
com mais rigor, a tarefa de quebra da resistência burguesa, e por não tê-lo
feito com suficiente resolução determinou a causa de sua própria derrota.[120]
Nas palavras de Trotsky,
tratava-se de edificar um Estado forte, sem Mandarins, um poder
armado sem Samurais.[121]
No que concerne
à política bolchevique em face do Poder Judiciário Russo, a orientação
de destruição e desbaratamento da Justiça Burguesa surgia, conseqüentemente,
como parte integrante inseparável do objetivo estratégico de demolição do
Estado Burguês-Latifundiário Russo em seu conjunto.
Acerca do antigo
Poder
Judiciário Russo, totalmente destroçado com a Revolução de Outubro, Stutchka teve
a ocasião de escrever em seu célebre artigo Tribunal Velho e Novo, publicado
em 3, 4 e 5 de janeiro de 1918 no Pravda de Petrogrado :
“Na realidade, o Tribunal constituia,
depois do exército permanente e da polícia burocrática, a mais sólida defesa do
sistema burguês-fundiário.
Sob o ângulo de uma pretensa defesa do
Direito e da justiça, o Poder Judiciário, dito independente do Estado Burguês,
representava, entretanto, o mais sólido órgão do sistema capitalista e dos
interesses das classes possuidoras.
Não apenas porque os tribunais eram
agentes diretos do Estado e do poder estatal, instrumentos de assujeitamento
das classes oprimidas, mas também porque eles, por sua situação social,
pertenciam à classe dos opressores.
Eles entendiam o Direito e a justiça,
bem como a liberdade e a igualdade, tal como os declaravam os interesses da sua
classe.”[122]
A Revolução de Outubro, impulsionada pelos Sovietes de Trabalhadores, Soldados e
Camponeses, sob a direçao política do Partido Bolchevique,
culminou com a supressao, o despedaçamento, a aniquilaçao violenta do Estado Burguês-Latifundiário
Russo, e, por consegüinte, também de seu Poder Judiciário, com o objetivo de
dar início ao processo de transformaçao dos meios sociais de produçao em
propriedade estatal, dirigido por novas instituiçoes proletárias e camponesas.
Nesse contexto,
Stutchka
expressou, da seguinte forma, a concepçao dos revolucionários
bolcheviques de Outubro acerca do significado da doutrina da divisao dos
poderes :
“O princípio da divisao dos poderes tem para nós, como
para a vida real, valor apenas de um princípio de divisao técnica do trabalho.
O poder, no caso concreto o poder soviético, deve ser
naturalmente um poder unitário que inclua em si mesmo seja o Poder Legislativo,
seja o Poder Executivo, seja, enfim, o Poder Judiciário.
Estamos em favor de um poder popular e, na nossa
República, esse poder popular concretiza-se apenas nos Soviets dos Deputados
dos Operários, dos Soldados e dos Camponeses.”[123]
Nesse
contexto, teve lugar, em 22 de novembro (5 de dezembro) de 1917, sob o governo
de Lenin,
a emanação do primeiro ato normativo do Estado Soviético concernente à
organização judiciária.
Promulgado
sob a forma de um decreto acerca dos tribunais, estabelecido e assinado pelo Conselho
dos Comissários do Povo – integrado à época por Lenin, Schlichter, Trotsky,
Schliapnikov, Stálin, Avilov e Stutchka -, esse primeiro ato normativo
passou a ser conhecido, historicamente, como o Decreto Nr. 1 sobre o Tribunal.[124]
A
redação de tal decreto contou com um primeiro projeto redigido por P. I.
Stutchka e M. J. Kotslovskii, e era composto por uma introdução e nove
artigos. Sob a influência de Lenin, o projeto em questão foi, a
seguir, modificado algumas partes.
O
Decreto Nr. 1 sobre o Tribunal aboliu integralmente, em seu Art. 1°, os velhos órgãos judiciários em
funcionamento no quadro dos regimes czarista e burguês de Kerensky, instituindo
novos tribunais populares eletivos, em cujo âmbito os mandatos dos juízes
eleitos nos Soviets eram revogáveis a qualquer tempo.
Com
efeito, o Art. 1° do Decreto Nr. 1 sobre o Tribunal em
tela dispôs expressamente :
“O
Conselho dos Comissários do Povo decreta :
1.)
Suprimir as instituições judiciárias em
geral, existentes até o presente momento : os tribunais regionais, as câmaras
judiciárias e o Senado de Governo com todos os seus departamentos, os tribunais
de guerra e de marinha dotados de todos os nomes, e também os tribunais
comerciais, substituindo todas essas instituições
por tribunais formados na base de eleições
democráticas. (...)”[125]
Apresentamos,
a seguir, os traços essenciais do novo sistema judiciário eletivo instituído
pela Revolução de Outubro :
I.
A Revolução de Outubro suprimiu, em primeiro
lugar, o Senado de Governo (Provitelstvennyi Senat), órgão honorário,
instituído por Pedro I, em 1711, enquanto suprema instância judiciária,
administrativa e de supervisão do Poder Judiciário Russo, que, em fins
do século XIX, se tornou o órgão judiciário supremo competente pelo julgamento
de delitos cometidos contra o Estado.[126]
Os
membros desse Senado de Governo eram, anteriormente, escolhidos pelo Czar entre
os altos funcionários do Estado Absolutista Russo.
A Revolução de Fevereiro de 1917 manteve,
substancialmente, intacto esse supremo órgão supremo jurisdicional russo.
O Senado
de Governo, afirmando situar-se acima da política, não hesitou,
entretanto, em declarar a legitimidade do novo poder de Estado surgido com a Revolução de Fevereiro de 1917, por contar
esse último com a investidura do poder supremo do Czar Nicolau II, e proclamar,
a seguir, tratar-se a Revolução
de Outubro de 1917 de um infâme delito.
Suprimido
o Senado
de Governo, os dirigentes da Revolução
de Outubro consideraram altamente desnecessário instituir um novo órgão
central de uniformização da interpretação e de controle judiciário das normas
jurídicas soviéticas.
Segundo
bem assinalou Stutchka acerca desse tema :
“Em princípio, consideramos supérflua a existência de um
órgão central de controle e interpretação uniformizadora das leis e, em última
instância, bater-nos-emos, com todas as forças, contra a instituição de um
Senado do tipo da Suprema Corte dos EUA, competente até mesmo para julgar a
constitucionalidade dos atos legislativos.”[127]
Ao
longo do ano de 1918, passou-se, então, a cogitar-se acerca da criação
provisória de um Tribunal Supremo (Vysschii Sud) composto por especialistas
eleitos nos Soviets, dotado apenas de limitada competência recursal máxima,
porém jamais revestido da função de realizar o controle de constitucionalidade
das normas jurídicas soviéticas.[128]
II.
A Revolução de Outubro promoveu, além disso, a
supressão (unichtojenia) também de todos os órgãos e instâncias
judiciárias inferiores, i.e. tribunais e varas judiciárias, considerando-os
como andares subalternos do aparato judiciário em cujo vértice localizava-se o Senado
de Governo.
Por
consegüinte, todos os juízes do antigo Poder Judiciário Russo foram afastados,
ainda que se reconhecesse existir entre eles certos especialistas capazes e
sinceramente dedicados à causa da Revolução
de Outubro.[129]
III.
Nesse
mesmo sentido, resultaram, igualmente, abolidos os Tribunais de Paz (Mirovoi Sud),
cujos magistrados eram extraídos de eleição indireta realizada na antiga Duma
de
Petrogrado.
Segundo
Stutchka,
nenhum dos juízes desses tribunais resolveu-se a cumprir com seus deveres após
a eclosão da Revolução de Outubro.[130]
IV.
No
lugar dos tribunais burgueses abolidos, surgiu, então, o Tribunal Popular Eletivo
(Vybornyi Narodnyi Sud), formado por integrantes das fileiras dos
proletários e dos camponeses revolucionários.
A esse Tribunal
competia o exame de relações humanas costumeiras e comuns.[131]
Nesse
contexto, foram instituidos os Tribunais Locais (Mestnyie Sudi)
enquanto instâncias inferiores, situadas próximas das necessidades das
populações da periferia, devendo compor-se sempre de, no mínimo, três juízes
eleitos diretamente nos Soviets – com possibilidade de
ampliação para nove ou doze juízes, na medida em que as condições
econômico-financeiras o viessem a permitir em um futuro próximo.
Desses
três juízes eleitos, um deles surgia como um juiz local permanente (postoiannyi
mectnyi sudia), dotado, porém, de mandato revogável a qualquer tempo,
sendo os outros dois assistentes ordinários (dve otcherednyie zasedatieliei),
propostos em cada sessão judiciária segundo lista especial existente nos
tribunais ordinários.[132]
Na
medida em que se tratavam de juízes eleitos e revestidos de mandatos revogáveis
a qualquer tempo, todos eles estavam compromissados a, desde que necessário,
prestarem contas de suas atividades e eram responsáveis perante os Soviets.
De
início, o valor de alçada dos julgamentos civis efetuados por esses tribunais
locais não podia ultrapassar o valor máximo de 3.000 mil rublos e sua
competência permitia-lhes fixar tão somente penas de privação da liberdade não
superiores a dois anos.[133]
Para
causas mais complexas e economicamente mais valiosas, previu-se, então,
inicialmente, a criação de um Tribunal Regional Eletivo (Vyibornyi
Okrujnyi Syd) e, para aquelas concernentes a delitos penais mais
graves, um Tribunal de Jurados Populares (Sud Narodnyrr Zacedatelei), sendo
esse último integrado apenas por operários e camponeses. Tanto o primeiro como
o segundo desses tribunais deveriam representar, ainda, as instâncias
inferiores de uma instância especial de cassação, composta por juízes
escolhidos entre os membros eleitos dos tribunais regionais, organizada essa
última não em nível nacional, mas sim em escala regional.[134]
Os Tribunais
Locais eram desprovidos de especialistas e compostos massivamente por
operários e soldatos eleitos nos Sovietes, particularmente porque os
juristas burgueses não pretenderam apresentar suas candidaturas.
De toda
sorte, os dirigentes da Revolução
de Outubro partiam do princípio de que se as normas jurídicas fossem
compreendidas apenas por juristas especialistas seriam, em verdade, lamentáveis
e gravemente deficientes, contrastando notoriamente com a consciência revolucionária do
Direito.[135]
Em
causas jurídicas que requeriam uma compreensão intelectual inacessível aos
juízes populares eletivos de determinado Tribunal Local, previa-se,
entretanto, a possibilidade de convocação de especialistas técnicos.
Em
relação aos Tribunais Locais, a instância superior era constituida pelo Conselho
de Juízes Populares (Soviet Narodnyirr Sydiei), composto em número não
inferior a três juízes.
Em
essência, esse tribunal superior funcionava como um órgão de cassação, em casos
limitados, abrogando sentenças prolatadas pelos tribunais locais, na medida em
que existisse eventualmente flagrante injustiça em determinado julgamento ou
violações substanciais do Direito da Revolução
de Outubro.
Sendo
assim, o Conselho de Juízes Populares não possuia competência para
pronunciar nova sentença nos casos precedentemente julgados, embora pudesse, em
casos penais, diminuir a pena imposta ou mesmo declarar a absolvição.
Nesse
sentido, o Art. 2 do Decreto Nr. 1 sobre o Tribunal
estabeleceu, de maneira cristalina, que as sentenças e as decisões prolatadas
pelos Tribunais Locais eram definitivas, não existindo possibilidade
de impugná-las através do mecanismo de apelação (i.e. v apeliatsionnom poriadke)
às instâncias superiores.[136]
V.
Em
conformidade com esse quadro, resultou abolida, igualmente, a Procuradoria
do Estado (Sledstvennaia Vlast), concebida pelos revolucionários de Outubro
enquanto dócil instituição monopolizadora das atividades inquisitoriais
da fazenda pública, composta por jovens instrutores judiciários carreiristas.[137]
Em seu
lugar, surgiu, provisoriamente, uma instrutoria preliminar para questões
criminais (predvaritelnoe sledstvie po ygolovnym delam), situada mais nas
proximidades do povo oprimido e confiada ao exercício dos Tribunais Locais, considerados
esses últimos como muito mais conhecedores da vida social de uma circunscrição
territorial em específico.[138]
VI.
Destruiu-se,
igualmente, o velho monopólio burguês-estatal da Promotoria do Estado
(Obvinitelia), única interessada em impulsionar as acusações criminais
no interesse da opressão das classes exploradoras.
Suas
funções foram confiadas a todas instituições públicas e a todos cidadãos,
tornados agora livres para cumprir os papéis de acusadores e defensores (v
roli obvinitelei i zaschschitinikov) de todas pessoas privadas e
funcionários do novo Estado revolucionário junto aos tribunais populares
locais, relativamente a qualquer delito imaginável.[139]
VII.
A Revolução de Outubro suprimiu ainda a livre profissão
da Advocacia
(Svobodnoia Professia Advokatura), e, nesse sentido, tanto as ordens da
Advocacia
Juramentada (Priciajnoi Advokatur) quanto as associações de Advocacia
Particular (Tchastnoi Advokatur), tendo-se em conta que o processo de
nivelamento dos grandes e pequenos rendimentos não poderia deixar intacto o
estamento privilegiado dos juristas.
No
período posterior à Revolução de Outubro, os
profissionais liberais do Direito revelaram-se, quase sem exceção, como um
inimigo de classe do governo dos operários, soldados e camponeses. [140][141]
VIII.
Cumpria
aos Soviets
de Deputados Operários, Soldatos e Camponeses indicar, adicionalmente,
comissários populares especiais para a Justiça, responsáveis pela custódia de
arquivos - elaborados sob sua direção -, bem como encarregados da preservação
do patrimônio das instituições judiciárias.[142]
IX.
Além
disso, a Revolução de Outubro rechaçou,
categoricamente, o conceito jurídico-burguês de delito político, porém não
renunciando a combater, a ferro e fogo, a contra-revolução em todas as suas
formas fenomênicas.
Assim,
criando especialmente Tribunais Revolucionários dos Operários e
Camponeses (Rabothie i Krestianskie Revoliutsionnyi Tribunal), os
revolucionários de Outubro afirmaram, precisamente, que não se os estava
instituindo para o apenamento de delitos políticos, mas sim para a organização
da luta contra as forças contra-revolucionárias, mediante medidas de defesa da
revolução e de suas conquistas (dlia borbi protiv kontrrevolutsionnyirr sil
v vidarr priniatia mer orhranitchenia ot nirr revolutsionii i eio zavoevanii).[143]
Esses Tribunais
Revolucionários eram compostos por um presidente e seis assistentes
ordinários, eleitos nos Soviets das cidades ou das regiões.
Concebidos
enquanto instrumentos de luta contra as forças contra-revolucionárias, esses
tribunais representavam órgãos de instrução pública, dotados de funções de
denúncia e de punição.
Eles
haveriam de conformar uma instituição típica da época de transição, sendo que a
própria contra-revoluçao determinaria o grau de severidade da repressão e do
terror proletários.[144]
X.
Se o
projeto original de Stutchka e Kotslovskii postulava a proibição de
os tribunais inferiores das localidades aplicarem leis promulgadas pelos governos
derrubados, a redação final do decreto em questão, adotando o posicionamento de
Lenin,
consagrou, em seu artigo 5°, o princípio de que essas leis podiam ser
por eles aplicadas desde que não houvessem sido expressamente abrogadas pelos
novos decretos da Revolução de Outubro e
não contradissessem a moral revolucionária (i.e revoliutsionoe
sovest) e a consciência revolucionária do Direito (i.e. revoliutsionnoe
pravosoznanie).[145]
Nesse
sentido, dispôs expressamente o Art. 5° em destaque :
“5.) Os
tribunais locais decidem os casos em nome da República Russa, aplicando em suas
decisões e sentenças as leis dos governos derrubados tão somente quando essas não
tiverem sido abolidas pela revolução e não contradigam a moral revolucionária e a
consciência revolucionária do Direito”.
Por
obra direta de Lenin, acrescentou-se minuciosamente a esse Art. 5 em
referência uma glosa, na forma de um parágrafo explicativo, explicitando-se da
seguinte forma :
“Observação. Como abolidas são consideradas todas as leis que contradigam os decretos do Comitê
Executivo Central dos Soviets de Deputados Operários, Soldatos e Camponeses e
os decretos do Governo Operário e Camponês, bem como o programa mínimo do
Partido Social-Democráta da Rússia e do Partido Social-Revolucionário.”[146]
Esse
contexto condizia com o fato de que, no período imediatamente posterior à Revolução de Outubro, inexistia um Direito
material revolucionário sistematicamente positivado que pudesse orientar os
novos tribunais populares eletivos.
Nesse
mesmo sentido, os revolucionários de Outubro entendiam que seria de toda
forma absurdo sonhar com uma estabilidade da legislação escrita em um momento
de tão grandes abalos político-sociais.
Nesse
sentido, Lenin teve a oportunidade de observar, no V. Congresso dos Sovietes de
Deputados Operários, Soldados e Camponeses de Toda Rússia, de 4 a 10 de Julho
de 1918 :
“Porém, realmente lamentável é o revolucionário que, no
momento da mais dura luta, respeita a inviolabilidade da lei.
As leis possuem em um período de transição apenas um
significado provisório. E se uma lei entrava o desenvolvimento da revolução,
ela deve ser abolida ou aprimorada.”[147]
Dando
especial ênfase ao sentido e ao significado da moral revolucionária e da
consciência
revolucionária do Direito no contexto de um período transitório de
transformações revolucionárias, em que o Estado assume a forma de uma ditadura
revolucionária do proletariado, Lenin destacou, em março de 1919 :
“Quando a Revolução de Outubro derrubou os velhos
burocrátas, pode fazê-lo porque ela havia criado os Soviets.
Ela repudiou os velhos juízes e transformou o tribunal em
um tribunal popular.
Porém, um tribunal pode-se facilmente criar.
Para tanto não se carece do conhecimento das velhas leis.
É necessário apenas deixar se levar pelo sentimento da
justiça.
Nos tribunais, o burocratismo foi fácil de ser
liquidado.”[148]
Permanentemente
preocupado em fixar os fundamentos do novo Direito Proletário Revolucionário, Lenin, dirigindo-se
a Kurski,
Comissário
do Povo da Justiça que substitui Stutchka, demonstrou compreender
profundamente a essência do Direito Burgûes, sabendo apontar,
com perspicácia, uma alternativa concreta capaz de superá-lo :
“Nós nao reconhecemos nada de “privado”.
Para nós, tudo, no domínio da economia, é de natureza
jurídico-pública, e não privada.
Permitimos apenas o capitalismo de Estado.
Conseqüentemente, devemos fazer uso ampliado da
ingerência estatal nas relações “jurídico-privadas”, alargando o Direito do
Estado de dissolver contratos “privados”.
No que concerne às “relações de Direito Civil”, devemos
aplicar não o Corpus Iuris Romani, mas sim nossa consciência revolucionária do
Direito, sistematicamente, insistentemente, rigorosamente, demonstrando em uma
série de processos paradigmáticos como deve-se proceder com compreensão e
energia.”[149]
Stutchka
observou que, ao longo
dos mêses subseqüentes à Revolução
de Outubro, a fórmula contida no Art. 5 do Decreto Nr. 1 sobre o Tribunal passou
a ser corrente e até mesmo os adversários originais da explosão revolucionária
de Outubro
vieram a reconhecer que a revolução não condenaria e não absolveria seus
inimigos com base em leis escritas e oficialmente aprovadas.[150]
A
seguir, legitimando esse novo sistema judiciário eletivo, introduzido pelo Decreto
Nr. 1 sobre o Tribunal, a Constituição
da República Soviética Russa, de 10 de Julho de 1918, i.e. a Constituição de Lenin, a Constituição da Guerra Civil, adotada pelo V. Congresso dos Soviets
de Toda Rússia, presidido por J. M. Sverdlov, determinou no âmbito
da Parte III relativa à Estrutura do Governo Soviético, a
competência do Congresso dos Soviets e do Comitê Executivo Central de Toda a Rússia
para estabelecerem a legislação federal e regularem o sistema judicial proletário
revolucionário, dispondo da seguinte forma :
Art. 24. O Congresso dos Soviets de Toda Rússia é a
autoridade suprema da República Soviética Federativa Socialista Russa.
..........................................................................
Art. 31. O Comitê Executivo Central de Toda a Rússia é o
órgão supremo legislativo, administrativo e de supervisão da República
Soviética Federativa Socialista Russa.
..........................................................................
Artigo 49. Sob a jurisdição do Congresso dos Soviets de
Toda a Rússia e do Comitê Executivo Central encontram-se todas as matérias de
importância estatal, tal como :
..........................................................................
n. a legislação federal, o sistema e os procedimentos
judiciários, a legislação civil e criminal etc.;[151]
Em meio
ao aprofundamento do processo revolucionário russo no interior de todo país, ao
longo dos anos de 1918 e 1919, consagrando o poder dos operários e camponeses
pobres e trabalhadores, Lenin, preocupado em precisar a
concepção classista acerca da formação dos tribunais eletivos da Revolução de Outubro, bem como o significado
e extensão da consciência revolucionária do Direito, propôs fosse inserido no
primeiro parágrafo do ponto sobre o tribunal do Projeto do Programa do PC
da Rússia(B), as seguintes considerações :
“No caminho rumo ao comunismo, através da ditadura do
proletariado, o Partido Comunista, desaprovando as consignas democráticas, elimina
inteiramente também aqueles órgãos da dominação burguesa como os tribunais da
velha estrutura, substituindo-os por tribunais de classe dos operários e
camponeses.
Depois de o proletariado ter tomado todo o poder em suas
mãos, ele coloca no lugar da velha fórmula ambígua “Eleição dos Juízes pelo Povo” a
consigna de classe “Eleição de Juízes dos meios dos Trabalhadores
apenas pelos os Trabalhadores”, concretizando-a em todo o campo
organizativo do sistema judiciário.
O Partido Comunista, que apenas elege no tribunal os
representantes dos operários e dos camponeses que não empreguem nenhum trabalho
assalariado, não tirando do trabalho assalariado portanto nenhum lucro, não
estabelece nenhuma distinção relativa às mulheres.
Ele iguala em todos os direitos ambos os sexos, seja na
eleição[MSOffice1] de
juízes seja no exercício das funções jurisdicionais.
Após ter abolido as leis dos governos derrubados, o
Partido lança aos juízes eleitos pelos eleitores soviéticos a consigna de
conferir validade à vontade do proletariado mediante a aplicação de seus
decretos e, na hipótese de inexistência de tais decretos ou em caso de lacunas,
de deixarem-se dirigir pela consciência socialista do Direito, sem levar em
consideração as leis dos governos derrubados.”[152]
III.D.
A FUNÇÃO
REVOLUCIONÁRIA
DOS TRIBUNAIS
POPULARES ELETIVOS
DA REVOLUÇÃO DE OUTUBRO
No III
Congresso dos Sovietes de Deputados Operários, Soldados e Camponeses de Toda
Rússia, realizado entre os dias 10 e 18 (23 e 31) de Janeiro de 1918, Lenin
observou, enfaticamente, que as mesmas providências adotadas pelo poder
soviético revolucionário em relação ao exército socialista haviam sido tomadas
relativamente a um outro instrumento ainda mais refinado e complexo da classe
dominante russa : o Tribunal Burguês.
Segundo
Lenin,
o Poder Judiciário surgindo sob a máscara de Guardião da Ordem representava, em verdade, um instrumento cego e
refinado para a opressão dos explorados, um instrumento para a defesa dos
interesses do capital.
Por
essa razão, a Revolução de Outubro decidiu-se
por remeter todos os tribunais burgueses ao ferro velho da história.
A
função revolucionária dos novos tribunais populares eletivos que substituiram o
Poder Judiciário Russo passaria a ser de elevada importância, quer no domínio
da destruição da resistência burguesa contra-revolucionária, quer na seara da
formação educacional e fortalecimento da disciplina proletária, quer no campo
da democratização do poder soviético, quer ainda no âmbito da NEP e no combate
ao burocratismo soviético.
Nesse
sentido, Lenin assinalou precisamente, em diferentes oportunidades :
“É possível alegar-se que nós, ao invés de reformarmos os
velhos tribunais, jogamo-los imediatamente no ferro velho.
Agindo dessa forma, abrimos porém o caminho para um verdadeiro
Tribunal Popular, não o fazendo, todavia, com tanto emprego de medidas de
violência, mas sim muito mais com o exemplo das massas, através da autoridade
dos trabalhadores.
Sem formalidades, transformamos o tribunal, atuante
enquanto um instrumento de exploração, em um instrumento de formação
educacional, erigido sobre a sólida base da sociedade socialista.
Não resta a menor dúvida, porém, que uma tal sociedade
não podemos obter em um único golpe. (...)
Não tenho nenhuma ilusão. Sei que ingressamos apenas no
período de transição ao socialismo, que não alcançamos ainda o socialismo.” [153]
No VII
Congresso do Partido Comunista da Rússia, realizado entre 6 e 8 de
março de 1918, em seu relatório sobre a revisão do programa e a mudança do nome
do partido bolchevique, Lenin teve a oportunidade de
declarar acerca da forma de constituição pessoal classista dos tribunais da Revolução de Outubro :
“Nós mesmos devemos nos tornar juízes.
Os cidadãos devem, em seu conjunto, participar do sistema
judiciário e da administração do país.
Para nós o importante é a incorporação de todos os
trabalhadores, sem exceção, na administração do Estado. (...)
Não se pode historicamente polemizar sobre o fato de que
a Rússia criou a República Soviética.
Nós dizemos : em cada contra-golpe, iremos aspirar (...)
ao poder dos sovietes, ao tipo de Estado soviético, um Estado do tipo da Comuna
de Paris.”[154]
Acentuando
suas idéias acerca da aniquilação do sistema judiciário burguês e de sua
substituição pelos tribunais populares eletivos, i.e. tribunais eletivos
compostos por operários e camponeses, Lenin precisou em seu Esboço
das Próximas Tarefas do Poder Soviético a função revolucionária
desses tribunais na luta pela destruição da resistência burguesa
contra-revolucionária e pelo fortalecimento da disciplina proletária :
“Na sociedade capitalista, o tribunal era
preponderantemente um aparato da repressão, um aparato da exploração
capitalista.
Por isso, o dever incondicional da revolução proletária não
foi o de reformar as instituições judiciárias (a essa tarefa limitaram-se os
cadetes e seus lacaios, os mencheviques e os sociais-revolucionários de
direita), mas sim o de completamente aniquilar, integralmente desbaratar, todo
o velho sistema judiciário e seu aparato.
Essa tarefa indispensável foi cumprida pela Revolução de
Outubro e, em verdade, exitosamente.
No lugar do velho tribunal, ela começou a criar um novo
tribunal, um Tribunal Popular, melhor dito, um Tribunal Soviético, erigido
sobre o princípio da participação na administração do Estado das classes
operárias e exploradas – e apenas dessas classes.
O novo tribunal é indispensável, antes de tudo, para a
luta contra os exploradores que procuram restabelecer seu domínio ou defender
seus privilégios, ou ainda para impor, subrepticiamente, essa ou aquela
partezinha de seus privilégios, reconquistando-os mediante fraude.
Além disso, compete aos tribunais uma outra tarefa, ainda
mais importante, se realmente se organizam segundo o princípio das instituiçoes
soviéticas : essa tarefa consiste em assegurar o mais rigoroso respeito à
disciplina e à auto-disciplina dos trabalhadores. (...)
Sem coação não pode ser realizada, de nenhuma maneira,
uma tal tarefa. Nós necessitamos do Estado, necessitamos da coação.
O órgão do Estado Proletário que exerce essa coação há de
ser os tribunais soviéticos. A estes compete a imensa tarefa de educar a
população para disciplina do trabalho. Para esse objetivo, fizemos
incomensuravelmente pouco, praticamente nada. Precisamos conseguir que tais
tribunais sejam organizados na dimensão mais ampla, expandindo suas atividades
sobre a inteira vida de trabalho do país.”
E, além
disso, destacando a forma de democratização do poder soviético através do
funcionamento dos tribunais populares eletivos, Lenin salientou, da
maneira mais clara e cristalina, no mesmo texto em destaque :
“Apenas tribunais desse gênero podem cumprir tais
tarefas, pressupondo-se que as massas mais amplas da população operária e
explorada deles participem em uma forma democrática, em conformidade com o
princípio do poder soviético, de forma a fazer com que a disciplina e a
auto-disciplina não se tornem desejos vãos.
Apenas tribunais desse gênero saberão propiciar nossa
tomada do poder revolucionário do Estado, o que todos reconhecemos em palavras
quando falamos da ditadura do proletariado, mas em cujo lugar entretanto vemos
em torno de nós muito frequentemente algo extremamente flácido como uma papa.
De toda sorte, seria mais correto não comparar a situação
social em que nos encontramos com uma papa, senão com a refundição de metal
para a produção de uma firme ligadura de aço.”[155]
Precisando
suas idéias, Lenin destacou em A Revolução
Proletária e o Renegado Kautsky, de fins de 1918, o signado profundamente
revolucionário da elegibilidade dos juízes dos tribunais da Revolução de Outubro :
“Na Rússia, o aparelho do funcionalismo foi, pelo
contrário, totalmente despedaçado. Dele não se deixou pedra sobre pedra.
Os velhos juízes foram expulsos, o Parlamento Burguês,
desbaratado.
E, precisamente os trabalhadores e camponeses obtiveram
uma representação muito mais acessível.
Através de seus Soviets, os funcionários foram
substituídos, os seus Soviets foram colocados acima dos funcionários, por seus
Soviets os juízes são eleitos.
Apenas esse fato basta para que todas as classes
oprimidas reconheçam que o poder soviético, i.e. a forma dada à ditadura do
proletariado, é milhões de vezes mais democrática do que a república
democrático-burguesa.”[156]
No quadro
do ressurgimento do burocratismo pós-revolucionário, Lenin demonstrou,
claramente, conceber, ainda em 1921, os tribunais populares eletivos como
instrumentos de luta na “arte da guerra” contra esse tipo de
degeneração dos ideais da Revolução
de Outubro.
Em uma
de suas cartas a Kurski, então Comissário do Povo da Justiça, escreveu
Lenin,
da seguinte forma :
“Repassei-lhe através do Diretor do Gabinete do Conselho
dos Comissários do Povo, uma petição do Professor Graftio que contém documentos
incríveis acerca de casos de burocratismo. (...)
Tenho a impressão de que o Comissariado do Povo da
Justiça trata essa questão de modo puramente formal, i.e. de maneira
fundamentalmente falsa. É necessário :
1.
levar essa matéria diante dos tribunais ;
2.
lograr fazer com que os culpados sejam denunciados na
imprensa e recebam severas penas ;
3.
instruir os juízes através do Comitê Central a procederem
severamente contra o burocratismo ;
4.
convocar uma sessão com os juízes populares de Moscou,
membros dos tribunais etc., para elaborar medidas de lutas efetivas contra o
burocratismo. (...)”[157]
No
mesmo sentido, Lenin entendeu dever ser a função revolucionária dos tribunais
populares eletivos no combate ao burocratismo soviético crescente,
particularmente em relação ao célebre caso
concreto de Schlendrian-Lomov-Stiunkel, que Bogdanov procurava
acobertar.[158]
No
contexto do IX Congresso dos Soviets de Toda Rússia, Lenin ainda teve a
oportunidade de assinalar acerca dos tribunais da Revolução de Outubro, no quadro da NEP :
“Tomemos um negociante qualquer, que prática relações de
comércio sob o controle do Estado e do Tribunal.
Dispomos de tribunais proletários e nosso tribunais estão
capacitados a supervisionar cada empresário privado, a fim de que ele não
intérprete a lei em seu benefício, como é o caso nos Estados Burgueses.”
E, na
mesma ocasiao, Lenin acrescentou :
“O IX Congresso dos Soviets exige do
Comissariado do Povo da Justiça incomparavelmente maior energia em dois
sentidos :
Em primeiro lugar, os tribunais populares
da República devem acompanhar atentamente a atividade dos negociantes e
empresários privados.
Os tribunais não podem permitir que
as atividades desses últimos seja minimamente limitada, devem, entretanto e ao
mesmo tempo, punir severamente a sua mínima tentativa de esquivarem-se ao
estrito respeito das leis da República.
As mais amplas massas dos
trabalhadores e camponeses devem ser educadas a incorporarem-se rápida,
autônoma e energicamente nos tribunais, quando se tratar de velar pelo respeito
da legalidade.
Em segundo lugar, os tribunais
populares devem cuidar mais atentamente para que o burocratismo, o môfo do
funcionalismo e a má organização econômica sejam punidas judiciariamente.
São necessários processos desse
gênero : por um lado, com vistas a elevar o sentimento de responsabilidade em
face desse mau, que é tao difícil de combater em nossas condições, por outro,
para direcionar a atenção dos operários e camponeses a essa questão
extremamente importante e alcançar o objetivo prático de êxitos econômicos
maiores.” [159]
III.E.
OS TRIBUNAIS
POPULARES ELETIVOS
DA REVOLUÇÃO DE
OUTUBRO E A ASCENSÃO
DO BUROCRATISMO
SOVIÉTICO STALINISTA
No VIII
Congresso do Partido Comunista da Rússia, realizado entre 18 e 23 de março
de 1919, examinando o significado dos tribunais populares eletivos da Revolução de Outubro em face da questão do
burocratismo e da incorporação das amplas massas no trabalho dos Soviets,
Lenin
teve a oportunidade de assinalar criticamente :
“Na luta contra o burocratismo fizemos o que nenhum
Estado do mundo logrou ainda fazer. (...)
Tomemos como exemplo o sistema judiciário.
Aqui, a tarefa foi, no entanto, mais simples. Aqui, não
tivemos de criar nenhum novo aparato, pois todo e qualquer um pode pronunciar o
Direito, apoiando-se na consciência revolucionária do Direito das classes
trabalhadoras.
Falta muito ainda para levarmos ao fim essa questão,
porém, em uma série inteira de domínios, fizemos dos tribunais o que deveria
efetivamente ser feito.
Criamos órgãos em que podem se tornar juízes não apenas
homens senão também mulheres, bem como os elementos mais atrasados e sem
movimento. (...)
Combater o burocratismo completamente, até a vitória
total, é apenas possível, entretanto, se a grande população tomar parte na
administração.
Nas repúblicas burguesas, isso não apenas não era
possível : a própria lei impedia-o. (...)
Nós eliminamos esses obstáculos, porém ainda não
conseguimos que as massas trabalhadoras atuem conjuntamente na administração, pois,
além das leis, existe ainda o obstáculo do nível cultural, que não se sujeita à
nenhuma lei.
Esse baixo nível cultural faz com que os Soviets, que
segundo seu programa devem ser órgãos da administração através dos
trabalhadores, sejam órgãos da administração para os trabalhadores, i.e. uma
administração da camada avançada do proletariado, porém não uma administraçao
das próprias massas trabalhadoras. (...)”[160]
Percebendo,
além disso, os perigos relacionados com o ressurgimento da advocacia burguesa para
o fortalecimento do burocratismo do novo Estado Proletário Russo, Lenin
observou, claramente, em seu O Radicalismo de Esquerda :
“Nós suprimimos na Rússia a advocacia burguesa e nisso
tivemos total razão.
Porém, agora, sob o manto das “assistências jurídicas”
“soviéticas” ela renasce entre nós. (...)
Enquanto a burguesia não for derrubada e, além disso, a
pequena economia e pequena produção de mercadorias não desaparecerem
completamente, as condições burguesas, os hábitos burgueses e as tradições pequeno-burguesas
prejudicaram o trabalho proletário seja de fora como de dentro do movimento dos
trabalhadores. (...)
É necessário aprender-se a dominar e manejar todos os
domínios de atividade e de trabalho, bem como superar todas as dificuldades e
todas as práticas burguesas, tradições e costumes, em todas as partes, em todos
os lugares.”[161]
Em seu Sobre
o Imposto em Natura, obra redigida em 1921 que forneceu fundamento
teórico acabado à Nova Política Econômica (NEP), Lenin veio a observar
acerca do ressurgimento do burocratismo e suas causas econômicas, defendendo,
entretanto, ainda claramente o significado dos tribunais eletivos da Revolução de Outubro :
“Tomemos a questão do burocratismo e analisemo-la a
partir do lado econômico.
Em 5 de maio de 1918, o burocratismo não se encontrava
diante de nosso campo de visão.
Meio ano depois da Revolução de Outubro, depois de termos
destroçado o velho aparato burocrático de cima a baixo, não havíamos sentido
ainda esse mau.
Mais um ano se passou.
No VIII Congresso do Partido Comunista da Rússia (de 18 a
23 de março de 1919) foi adotado um novo programa partidário e nesse programa
falamos em admitir a existência desse mau. Diretamente, sem mascaramento,
falamos do ressurgimento parcial do burocratismo no interior da ordem
soviética, animados do desejo de revelá-lo, desmascará-lo, estigmatizá-lo,
despertando a idéia e a vontade, a energia e a ação, para a luta contra esse
mau.
Passaram-se mais dois anos.
No início de 1921, depois do VIII Congresso dos Soviétes,
onde foi tratada, em dezembro de 1920, a questão do burocratismo, bem como
depois do X Congresso do PC da Rússia, de março de 1921, o qual elaborou o
balanço das discussões relacionadas estreitamente com a análise do
burocratismo, vemos esse mau então mais clara, nitida e perigosamente diante de
nós.
Quais sao as raizes econômicas do burocratismo ?
Essas raizes são principalmente de dois tipos : de um
lado, a burguesia desenvolvida necessita, principalmente, de um aparato
burocrático contra o movimento revolucionário dos trabalhadores (em parte
também dos camponeses), em primeira linha um aparato militar, bem como
judiciário etc.
Esse aparato não, entretanto, existe junto a nós.
Junto a nós, os tribunais são tribunais de classe contra
a burguesia. Nosso exército é um exército de classe contra a burguesia.
O burocratismo não está no próprio exército, mas nos
departamentos relacionados com ele.
Junto a nós, a raiz econômica do burocratismo é uma outra
: a isolação, a fragmentação dos pequenos produtores, sua pobreza e falta de
cultura, a ausência de perspectivas, o analfabetismo, o volume insuficiente de
negócios entre a agricultura e a indústria, a ausência de uma conexão e
inter-condicionamento entre elas.”[162]
Nesse
mesmo quadro de progressivo e ameaçador ascenso do burocratismo, Lenin
iria destacar, enfaticamente, nos primeiros mêses de 1922, em sua
correspondência com A. D. Ziurupa, Presidente do Pequeno Conselho dos Comissários do Povo :
“Entre nós, subsiste, aparentemente, uma fundamental
divergência.
O mais importante, em meu modo de ver, é largar de
escrever decretos e ordens ( aqui só estamos indo da estupidez à idiotice ) e
colocar todo o pêso na escolha de pessoas e no controle da execução. (...)
Junto a nós, estão todos afundados no pântano nojento e
burocrático das “autoridades de Estado”.
Grande autoridade, espírito e habilidade são, pelo
contrário, necessários para a luta diária.
Autoridades de Estado, porém, são porcarias. Decretos são
porcarias.
Procuremos homens, controlemos o trabalho – nisso reside
tudo.” [163]
Em
plena coerência com sua “arte de guerra” contra o
burocratismo ascendente, Lenin não hesitou em acionar a
polícia secreta e todos os meios possíveis e imagináveis, com vistas a procurar
reverter o sufocamento da democracia dos operários e dos camponeses pobres e
trabalhadores que penetrava, agora, crescentemente a ordem soviética de
conjunto, bem como os tribunais populares, tal como se extrai de uma de suas
últimas cartas à Kurski :
“A antiga Tcheka de Moscou deu início, sob minha ordem, a
um inquérito relativo à negligência criminosa, môfo e passividade do
funcionalismo no Departamento de Ciência e Técnica, bem como no Comitê de
Sistemas de Descobertas.
Os resultados foram apresentados ao Tribunal
Revolucionário de Moscou, que, ao invés de investigar efetivamente essa
matéria, de avaliar e punir os culpados (e que nessas instituiçoes existem uma
porção de sábios imprestáveis, parasitas e semelhante gentalha, já foi
freqüentemente divulgado na imprensa nos artigos do comp. Soznovski e de
outros), portou-se de modo extremamente apadrinhador em relação aos acusados,
não surgindo sequer acusadores em juízo, sendo que, finalmente, a acusação foi
declarada como carente e todos os culpados foram absolvidos.
Agora, informaram-me que o Departamento de Govêrno de
Moscou da Administração Policial do Estado apresentou recurso contra a decisão
do Tribunal Revolucionário de Moscou junto à Divisão de Controle Judiciário do
Comissariado do Povo para a Justiça.
Peço-lhe que se informe pessoalmente sobre o caso,
dedicando-lhe a maior atenção (...)
É necessário instaurar-se, no Tribunal Revolucionário, um
processo político que deve revirar, minuciosamente, esse pântano “científico”
(para a impresa convocar o comp. Soznovski).
Nesse caso, eu requeiro uma severa repreensão para o
Tribunal Revolucionário de Moscou por inadmissível moderação e comportamento
burocrático formal.”[164]
Em uma
de suas derradeiras referências acerca dos tribunais eletivos da Revolução de Outubro, Lenin ainda pôde observar
no XI
Congresso do PC da Rússia, de 1922, em tom de admoestação e percepção
da crescente degeneração das instituições judiciárias soviéticas, de modo a
ressaltar o dever de responsabilidade e prestação de contas das atividades dos
juízes perante os Soviets :
“Em relação ao capitalismo de Estado, é necessário
saber-se o que se deve fazer no sentido de consignas de propaganda, bem como o
que deve ser esclarecido, a fim de que seja ele entendido praticamente.
Isso significa que o nosso capitalismo de Estado não é o
mesmo acerca do qual os alemães escreveram.
Ele é um capitalismo autorizado por nós. (...)
Se nós passamos da Tcheka de Toda Rússia para os
tribunais políticos de Estado, devemos dizer no Congresso dos Soviets que nós
não reconhecemos tribunais situados acima das classes.
Nós necessitamos de tribunais proletários eletivos e os
tribunais devem saber exatamente do que necessitamos.
Os membros do tribunal devem saber bem exatamente o que é
capitalismo de Estado.”[165]
Em seu
último pronuncionamento acerca do tema, Lenin escreveu, em maio de 1922 , à Kurski,
relativamente à reformulação do Direito Penal Proletário, ressaltando o dever de acolhimento continuado
da moral
revolucionária e da consciência revolucionária do
Direito pelos tribunais eletivos para assegurar-se a luta pela vitória
da Revolução de Outubro e contra o burocratismo
soviético crescente :
“Completando nossa conversação, envio-lhe o projeto de um
parágrafo suplementar para o Código Penal. (...)
O Tribunal não deve eliminar o terror – prometer isso
seria um auto-engano ou uma fraude -, mas sim fundamentá-lo, por princípio,
claramente, sem falsidade ou maquilagem, consagrando-o legalmente.
A formulação deve ser tão ampla quanto possível, pois
apenas a consciência revolucionária do Direito e a moral revolucionária colocam
as condições para uma aplicação mais ou menos ampla na prática.”[166]
Anos a
seguir, produzindo um balanço econômico-político acerca do burocratismo que
envolveu e degenerou acentuadamente o Estado Proletário Soviético,
atrasado e isolado, Léon Trotsky observou, de maneira clara, em sua A
Revolução Traída, redigida em
1936, que a União Soviética, enquanto
elo mais débil da cadeia do capitalismo mundial, havia validamente, com a Revolução de Outubro, dado os primeiros
passos no sentido de transitar para o estágio inferior do comunismo, i.e. para
a primeira fase da sociedade comunista, i.e. para o habitualmente chamado
socialismo.[167]
O
regime da União Soviética havia
logrado instaurar, dessa forma, não um regime socialista, mas sim um regime
preparatório de transição do capitalismo ao socialismo, dado que ele não se situava
nem sequer em um nível de desenvolvimento igual ou superior àquele alcançado
pelos países capitalistas ocidentais.
Mais
precisamente, Trotsky assinalou que a União
Soviética encontrava-se ainda longe de atingir mesmo o primeiro estágio
do socialismo, concebido enquanto um sistema equilibrado de produção e
distribuição, de vez que seu desenvolvimento socio-econômico ocorria não de
maneira harmoniosa, porém contraditoriamente, segundo sua própria lógica
peculiar.[168]
Segundo
Trotsky,
Lenin,
apoiando-se em Marx e Engels, havia admitido,
coerentemente, que o proletariado, tendo destruído o poder de Estado Burguês,
devendo o substituir por um Estado Proletário Revolucionário, daria início a um
processo de supressão de si mesmo enquanto classe dominante, abrindo a
perspectiva de abolição de todas as diferenças e antagonismos de classe, bem
como de extinção mesmo das instituições desse Estado, pertecente à grande
maioria de oprimidos enquanto tal.[169]
Tal
posicionamento favorável à liquidação de todo o burocratismo e parasitismo de
Estado, plenamente coerente com a concepção marxista e o regime instaurado pela
Comuna
de Paris – elegibilidade e revogabilidade a qualquer tempo de todos os
funcionários do Estado, sôldos de funcionários não superior aos salários dos
operários, participação das mais amplas massas no exercício das funções de
controle e supervisão das atividades públicas, todos podendo tornar-se
“burocrátas” e, portanto, ninguém tornando-se burocráta etc. - passou a
contrastar, diametralmente, com a política que passou a ser adotada,
sistematicamente, após a morte de Lenin, por Stálin e pelos idólatras
dos Soviets,
inspirados em seu culto de um Estado que não possuia a miníma intenção de
perecer e, pelo contrário, promovia o sistemático desarmamento da população.
A razão
da ascensão do burocratismo soviético situava-se, segundo Trotsky, antes de tudo
na subsistência de agudos antagonismos sociais insuperados que necessitavam ser
atenuados, ajustados, regulados, sempre em favor dos interesses da casta de privilegiados
e intelectuais, da oficialidade militar e do funcionalismo parasitário, que
chegava até mesmo a sabotar a economia nacional e tornar-se cada vez mais um
órgão da burguesia mundial no Estado Proletário Soviético.[170]
Tais
antagonismos eram produzidos, antes de tudo, pelos embates de tendências
socialistas - expressadas na defesa da propriedade estatizada, condizentes com
os princípios fundamentais do Direito Proletário – contra as tendências
capitalistas - manifestadas na subsistência da desigualdade
econômicamente-material do Direito Burguês subsistente, relativamente ao
processo de distribuição dos bens econômicos de vida.
Esses
embates projetavam-se no seio de todas as instituições do novo Estado
Proletário Revolucionário, que continha, dialeticamente em si mesmo, elementos
do Direito Burguês como também de um Estado Burguês sem burguesia (i.e.
burjuaznoe pravo, no daje i burjuaznoe gosudarstvo – bez burjuazii !).[171]
Precisamente
nesse sentido, Trotsky escreveu, de maneira perspicaz, acerca das contradições
relacionadas com a ascensão do burocratismo na União Soviética, apresentando novas preocupações para os
futuros processos revolucionários proletários :
“”Um Estado Burguês sem burguesia” provou ser
inconsistente com a genuina democracia soviética.
A função dual do Estado não pôde deixar de afetar sua
estrutura.
A experiência revelou o que a teoria foi incapaz de
claramente prever.
Se para a defesa da propriedade socializada contra a
contra-revolução burguesa um “Estado de trabalhadores armados” foi totalmente
adequado, uma questão bem diferente foi a de regular as desigualdades na esfera
do consumo.
Os desprovidos de propriedade não estão inclinados a
criar e defender essa regulação.
A maioria não pode preocupar-se com os privilégios da
minoria.
Para a defesa do “Direito Burguês”, o Estado Proletário
foi forçado a criar um tipo “burguês” de instrumento – i.e. a mesma velha
polícia, embora vestida com um novo uniforme.” [172]
Sendo assim,
para a defesa desse Direito Burguês, que subsistia e se afirmava em permanente
conflito com o Direito Proletário emergente no seio do Estado Soviético,
haveria de surgir uma burocracia parasitária, cada vez mais despótica na defesa
dos privilégios de uma minoria e atuando com métodos de terror, incapaz de
garantir uma genuina igualdade.
Referindo-se
às raizes do burocratismo da União
Soviética, Trotsky assinalou, então, de maneira crítica :
“As tendências de burocratismo que estrangulam o movimento
dos trabalhadores nos países capitalistas haveria de se apresentar, em todos os
lugares, mesmo depois de um revolução proletária.
Porém, é perfeitamente óbvio que quanto mais pobre é a
sociedade que sai da revolução tanto mais severa e mais nua haveria de ser a
expressão dessa “lei”, tanto mais cruas, as formas assumidas pelo burocratismo,
tanto mais perigosas, para o desenvolvimento do socialismo.
O Estado Soviético vê-se impedido não apenas de
extinguir-se, mas até mesmo de libertar-se do parasita burocrático, não em
razao dos “resíduos” das antigas classes dominantes, tal como declara a
doutrina ostensivamente policial de Stálin – pois esses “resíduos” são
impotentes em si mesmos.
Ele está impedido, isso sim, por fatores
incomensuravelmente poderosos, tais como a escassez material, o atraso cultural
e a dominação resultante do “Direito Burguês” que toca, da maneira mais
imediata e aguda, todo ser humano na atividade de assegurar sua existência
pessoal.”[173]
Nesse
contexto, a problemática teórica equacionada por Trotsky de maneira
criativa e reflexiva acerca do Direito, o Estado e os tribunais populares
eletivos a partir das experiências da Comuna de Paris e da Revolução de Outubro, ecoou, severamente, com
as seguintes palavras penetrantes e desafiadoras :
“Baseando-se inteiramente na teoria marxista da ditadura
do proletariado, Lenin não conseguiu, tal como dissemos, nem em sua obra maior,
dedicada à questão (O Estado e a Revolução), nem no programa do partido, sacar
todas as conclusões necessárias relativas ao caráter do Estado a partir do
atraso econômico e da isolação do país.
Esclarecendo o ressurgimento do burocratismo pela falta
de familiaridade das massas com a administração e por dificuldades especiais
resultantes da guerra, o programa prescreve meramente medidas políticas para a
superação das “distorções burocráticas” : eleições e revogação a qualquer tempo
de todos os plenipotenciários, abolição dos privilégios materiais, controle
ativo das massas etc.
Admitiu-se que, ao longo desse caminho, o burocrata,
deixando de ser um chefe, passaria a ser um simples agente técnico e, além
disso, temporário, sendo que o Estado desapareceria gradual e
imperceptivelmente de cena.
A óbvia subestimação das dificuldades pendentes é
esclarecida pelo fato de que o programa foi baseado completamente sobre a
perspectiva internacional : “A Revolução
de Outubro na Rússia realizou a ditadura do proletariado ... A era da revolução
comunista proletária mundial começou”.
Essas eram as linhas introdutórias do programa.
Seus autores não apenas não colocaram a si mesmos o
objetivo de construção do “socialismo em só país” – essa idéia não entrava,
então, na cabeça de ninguém e muito menos na de Stálin – como não tocaram a
questão relativa à que caráter o Estado Soviético assumiria, se forçado a
resolver, em isolação, por durante duas décadas, esses problemas econômicos e
culturais que o capitalismo avançado resolveu há muito tempo atrás.
A crise revolucionária do pós-guerra não conduziu à
vitória do socialismo na Europa. Os sociais-democratas salvaram a burguesia.
Aquele período, que Lenin e seus colegas encaravam como
um “período de respiro”, prolongou-se em uma inteira época histórica.
A estrutura social contraditória da União Soviética e o
caráter ultra-burocrático de seu Estado são as consequências diretas dessa
pausa única e historicamente “imprevisível”, que, ao mesmo tempo, conduziu os
países capitalistas ao fascismo e à reaçao pré-fascista.”[174]
Em face
desse contexto analítico, Trotsky levantou, em 1938, no Programa
de Transição, as seguintes
consignas, entre outras, de luta contra o burocratismo stalinista, deformador
das instituições do Estado Proletário, emergente com a Revolução de Outubro, destacando que apenas o levantamento
revolucionário das massas oprimidas poderia regenerar o regime soviético e
assegurar seu futuro desenvolvimento em direção ao socialismo :
·
Derrubada da Burocracia Termidoriana e da Aristocracia
Soviética com sua hierarquia e suas condecorações ;
·
Expulsão da Burocracia e da nova Aristocracia dos
Soviets. Nos Soviets só existe lugar para os representantes dos operários,
camponeses
trabalhadores e soldados ;
·
Luta pelo renascimento e pelo desenvolvimento da
Democracia Soviética ;
·
Reconstituição dos Soviets enquanto órgãos de classe e
democráticos ;
·
Fim da ficção do sufrágio universal à maneira de Hitler e
Goebbels;
·
Maior igualdade no salário, em todas as formas de
trabalho ;
·
Luta contra a desigualdade social e a opressão política ;
·
Revisão de todos os processos políticos forjados pela
Burocracia Termidoriana, com ampla publicidade e livre exame.
·
Abaixo a política internacional reacionária da Burocracia
;
·
Viva a política do internacionalismo proletário.[175]
Limitando-nos
aqui ao exame da ordem dos tribunais soviéticos, cumpre assinalar, por fim e
sem comentários adicionais, que a Constituição
da União das Repúblicas Socialistas
Soviéticas, de dezembro de 1936, i.e. a Constituição do Soviet Supremo de Stálin, a Constituição de Stálin e Vyshinskii, rompendo totalmente com
os princípios consagrados pela Revolução
de Outubro, estipulou, da seguinte forma, em seu Capítulo IX, relativo
aos Tribunais
e à Procuradoria
:
“Artigo 30. O órgão supremo da autoridade de Estado da URSS
é o Soviet Supremo da URSS.
...................................................
Artigo 102. Na URSS, a justiça é administrada pelo
Supremo Tribunal da URSS, os Supremos Tribunais das Repúblicas da União, os
Tribunais Regionais e os Tribunais das Repúblicas e Regiões Autonômas, os
Tribunais de Área e os Tribunais Especiais da URSS estabelecidos por decisão do
Soviet Supremo da URSS e os Tribunais do Povo.
...................................................
Artigo 105. O Tribunal Supremo da URSS e os Tribunais
Especiais da URSS são eleitos pelo Soviet Supremo da URSS para um mandato de
cinco anos.
Artigo 106. O Tribunal Supremo das Repúblicas da Uniao
são eleitos pelo Soviet Supremo das Repúblicas da União para um mandato de
cinco anos.
Artigo 107. Os Tribunais Supremos das Repúblicas
Autônomas são eleitos pelos Soviets Supremos das Repúblicas Autônomas para um
mandato de cinco anos.
Artigo 108. Os Tribunais Regionais e Territoriais, os
Tribunais das Regiões Autônomas e os Tribunais de Áreas são eleitos pelos
Soviets Regionais, Territoriais ou de Área dos Deputados do Povo Trabalhador
das Regiões Autônomas para um mandato de cinco anos.
Artigo 109. Os Tribunais do Povo são eleitos pelos
cidadãos do distrito sobre a base do sufrágio universal, direto, igual e
secreto, para um mandato de três anos.
...................................................
Artigo 112. Os juízes são independentes e sujeitos apenas
à lei.
Artigo 113. O Poder de Supervisão Supremo da estrita
execução das leis pelos Comissariados do Povo e as instituições a eles
subordinadas, como também pelos funcionários públicos e cidadãos da URSS, é
exercido pelo Procurador da URSS.
Artigo 114. O Procurador da URSS é apontado pelo Soviet
Supremo da URSS para um mandato de sete anos.
Artigo 115. Procuradores das Repúblicas, Territórios e
Regiões, como também Procuradores das Repúblicas Autônomas e Regiões Autônomas,
são indicados pelo Procurador da URSS para um mandato de cinco anos.
Artigo 116. Procuradores de Área, Distrito e Cidade são
indicados, para um mandato de cinco anos, pelos Procuradores das Repúblicas da
União, estando sujeitos à aprovação do Procurador da URSS.
Artigo 117. Os órgãos da Procuradoria executam suas
funções independentemente de quaisquer órgãos locais, estando subordinados
apenas ao Procurador da URSS.”[176]
EDITORA DA ESCOLA DE AGITADORES E INSTRUTORES
“UNIVERSIDADE COMUNISTA REVOLUCIONÁRIA J. M. SVERDLOV”
PARA A FORMAÇÃO, ORGANIZAÇÃO E DIREÇÃO MARXISTA-REVOLUCIONÁRIA
DO PROLETARIADO E SEUS ALIADOS OPRIMIDOS
MOSCOU - SÃO PAULO - MUNIQUE – PARIS
[1] Com efeito, Roland
Dumas, antigo Ministro do Exterior da República Francesa, teria
recebido cerca de 25 milhões de dólares de comissão, através da funcionária Christine
Deviers-Joncourt da empresa oligopolista multinacional Elf-Acquitaine, por ocasião
da venda de fragatas Thomson ao governo de Taiwan em 1991. Nomeado por Mitterrand
como homem de confiança dos socialistas franceses para o cargo de Presidente
do Conselho Constitucional, o nome Roland Dumas passou a surgir, já
desde agosto de 1997, nos dossiers de operações da Elf-Acquitaine e nas
principais manchetes dos jornais franceses, provocando uma progressiva
desmoralização do Poder Judiciário Francês.
No quadro das apurações do affaire Roland Dumas, Christine
Deviers-Joncourt alegou que havia sido contratada propositadamente pela
Elf-Acquitaine,
com o objetivo de subornar Roland Dumas. Em 30 de abril de
1998, o Poder Judiciário Francês, em uma tentativa remoralizadora inédita,
determinou a reclusão domiciliar do Presidente de seu Conselho Constitucional, por
cumplicidade e malversação abusiva de bens sociais. Em 16 de março de 2000, os
advogados de Dumas alegaram judicialmente que, em razão de seus diversos
problemas de saúde e idade avançada, o antigo Presidente do Judiciário Francês
estaria incapacitado de defender-se de suas acusações. Presentemente, Dumas
brada, de maneira alucinada, contra uma suposta campanha de
“denegrimento de seu nome”, “alimentada pelo mundo mediático-judiciário”,
“conducente ao renascimento do fascismo francês”. Acerca do tema, vide LIBÉRATION,
L’Affaire Roland Dumas, Dossier, Paris, 1999.
[2] O fortalecimento
parlamentar do SPD e a subseqüente posse do
chanceler social-liberal burguês Gerhard Schröder confirmou a
nomeação de Jutta Limbach, ocorrida em Setembro de 1994, após longos mêses
de lutas partidárias, enquanto Presidente do Supremo Tribunal Federal da
Alemanha e juiza de estrita confiaça da fração burguesa, atualmente
governante na Alemanha. Acerca do tema, vide SÜDDEUTSCHE ZEITUNG, Dossier
Theodor Maunz, Munique, 1998.; HERTA DÄUBLER-GMELIN, Vita :
Detaillierter Lebenslauf, Berlim, 1998.
[3] A disputa entre as
diferentes frações da Magistratura Italiana, diversas
delas associadas à corrupção impulsionada pelas organizações mafiosas italianas,
outras mais ou menos com elas comprometidas, marcaram a dinâmica dessas
instituições públicas no curso dos anos 90. A descoberta de uma vasta rede de corrupção no quadro da Operazione
Mani Pulite Nr. 2 submeteu à crítica cerrada
os métodos de trabalho da Procuradoria de Milão – acusada de também estar
ligada com a máfia italiana, no caso auto-parc di Milano -, e em
particular colocaram em cheque o modo de atuação do Procurador Milanês, Antonio
Di Pietro, protagonista da Operazione Mani Pulite Nr. 1 e,
posteriormente, Ministro do Estado dos Trabalhos Públicos, até 14 de novembro
de 1996. Com efeito, o setor de juízes de La Spezia, juízes da Rivoluzione
Giudiziaria, passaram, a partir de então, a
atacar Di Pietro por não ter trazido à luz as orquestrações mafiosas
de um dos homens mais poderosos da Itália dos anos 90 : o banqueiro Pacini
Battaglia. Esse último, por sua vez, passou a
acusar Di Pietro de tê-lo saqueado financeiramente, em troca de
prometer orientá-lo, de modo acorbertado, nos depoimentos da comissão de
inquérito sobre as operações da empresa oligopolista italiana ENI. Acerca
do tema, vide ERIK PALENI, La Riforma della Giustizia, in : Rivista Elettronica di Diritto & Cultura, Nr. 5, Fev.
de 2000.; ANTONIO DI PIETRO & ANTONIO CARLUCCI, Grazie Tonino,
Milano, 1995, pp. 113 e s.; G. MONCALVO, Di Pietro. Il Giudice
Terremoto. L’Uomo della Speranza, Milano, 1996, pp. 11
e s.; OBSERVATIONS GEOPOLITIQUES DES DROGUES, Rapport Annuel : Italie,
Paris, 1995-1996.
[4] Cf. CONSTITUIÇÃO DA
REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL, de 5 de Outubro de
1988, Sao Paulo, 1988, p. 13.
[5]
Cf. GRUNDGESETZ FÜR DIE BUNDESREPUBLIK DEUTSCHLAND, vom 23. Mai 1949 (Lei
Fundamental da República Federal da Alemanha de 23 de maio de 1949), in : Grundgesetz mit Umsetzung des Maastricht-Vertrages (Lei
Fundamental com Aplicação do Tratado de Maastricht), Munique, 1992, p. 19.
[6] Cf. CONSTITUTSIA
ROSSIISKOI FEDERATSII, 12 Dekabria 1993 g. (Constituição
da Federação Russa de 12 de Dezembro de 1993), in : Iuriditcheskaia Litieratura
(Literatura Jurídica), Moscou, 1993, p. 7.
[7] Acerca da gênese, do
significado histórico e da função social do Estado, vide sobretudo FRIEDRICH
ENGELS, Der Ursprung der Familie, des Privateigentums und des Staates (A
Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado) (Maio 1884), in : Marx und Engels Werke (Obras de Marx e Engels), Berlim,
1962, Vol. XXI, pp. 165 e s.; VLADIMIR I. LENIN, Gosudarstvo i
Revolutsia. Utchenie Marksisma o Gosudarstve i
Zadatchi Proletariata v Revoliutsi (Estado e Revolucao. A Doutrina do Marxismo
sobre o Estado e as Tarefas do Proletariado na Revoluçao) (1917), Moscou, 1989,
pp. 6 et s.
[8]Tendo em conta o contexto mundial da literatura jurídico-burguesa
contemporânea, não predomina sob o aspecto terminológico qualquer orientação no
uso das expressões separação, divisão, distribuição, repartição de poderes.
Alguns pensadores preferem usar a expressão articulação de poderes para
exprimir que não se trataria de separar poderes, mas sim de articular as
funções do poder uno e supremo do Estado. Sobre esse
debate terminológico, vide sobretudo WILHELM HASBACH, Gewaltentrennung,
Gewaltenteilung und gemischte Staatsform (Separação de Poderes, Divisão de
Poderes e Forma Mista de Estado), in :
Vierteljahresschrift für Sozial- und Wirtschaftsgeschichte (Escritos
Quadrimestrais de História Econômica e Social), Vol. XIII, 1916, pp. 562 e s.; A. SAINT GIRONS, Essai
sur la Séparation des Pouvoirs, Paris, 1881, pp. 3 e s.; CHARLES EISENMANN,
L’Esprit des Lois et la Séparation des Pouvoirs, in : Mélanges Raymond Carré de
Malberg, Paris, 1933, pp. 165 et s. tb. in : Cahier de Philosophie Politique,
Bruxelles, 1985, pp. 35 e s.; IDEM, Le Système Constitutionnel de
Montesquieu et le Temps Présent, in : Actes du Congrès Montesquieu de
Bourdeaux, 1956, pp. 241 e s.; HANS PETERS, Die Gewaltentrennung in
moderner Sicht (A Separação de Poderes em uma Visão Moderna), in:
Arbeitsgemeinschaft für Forschung des Landes Nordrhein-Westfalen (Grupo de
Trabalho de Pesquisa do Estado de Nordrhein-Westfalen), Caderno 25, Köln, 1954,
pp. 5 e s.; MICHEL TROPER, La Séparation des Pouvoirs et l’Histoire
Constitutionnelle Française, Thèse, Paris, 1967, pp. 3 et s.; IDEM,
Charles Eisenmann contre le Mythe de la Séparation des Pouvoirs, in : Cahiers
de Philosophie et Politique, 1985, pp. 67 e s.; ERNST VON HIPPEL,
Gewaltenteilung im modernen Staate (Divisão do Poder no Estado Moderno),
Berlim-Munique, 1949, pp. 7 e s.; OTTO KÜSTER, Das Gewaltproblem im
modernen Staat (O Problema do Poder no Estado Moderno), in: Archiv des
öffentlichen Rechts (Arquivo de Direito Público), Vol. LXXV,
pp. 397 e s.; MARTIN DRATH, Gewaltenteilung im heutigen Deutschen
Staatsrecht (Divisão do Poder no Direito Estado Alemao de Hoje), in: Faktoren
der Machtbildung (Fatores de Formação do Poder), Vol. II, 1952, pp. 99 e s.; HANS
BRILL, Gewaltenteilung im modernen Staat (Divisão de Poderes no Estado
Moderno), in : Gewerkschaftliche Monatshefte (Cadernos Mensais Sindicais), Vol.
VII, Frankfurt a.M., 1956, pp. 385 e s.; PETER SCHNEIDER, Zur
Problematik der Gewaltenteilung im Rechtsstaat der Gegenwart (Acerca da
Problemática da Divisão de Poderes no Estado de Direito da Atualidade), in :
Archiv des öffentlichen Rechts (Arquivo de Direito Público), Vol. LXXXII, 1957,
pp. 21 e s.; WERNER WEBER, Die Teilung der Gewalten als
Gegenwartsproblem (A Divisão de Poderes enquanto Problema da Atualidade), in :
Festschrift für C. Schmitt (Escritos em Homenagem à C. Schmitt), 1959, pp. 255
e s.; WERNER KÄGI, Von der klassischen Dreiteilung zur umfassenden
Gewaltenteilung (Da Tripartição Clássica à Abrangente Divisão de Poderes), in :
Festschrift für H. Huber (Escritos em Homenagem à H. Huber), Bern, 1961, pp.
151 e s. Em defesa da expressão balanceamento de poderes, vide sobretudo GEORG
JELLINEK, Allgemeine Staatslehre (Doutrina Geral do Estado) (1900), Berlim,
1920, pp. 613 e s.; IDEM, Eine Neue Theorie (Uma Nova Teoria), in :
Grünhuts Zeitschrift (Revista Grünhut), Vol. XXX, 1903, pp. 1 e s.; CARL
SCHMITT, Verfassungslehre (Doutrina Constitucional), Munique-Leipzig, 1928,
pp. 183 e 184.
[9] Cf. GEORG
JELLINEK, Allgemeine Staatslehre (Doutrina Geral do Estado)(1900), Berlim, 1920, Capítulo XVIII : As Funções do
Estado, p. 612.
[10]
Cf. VLADIMIR I. LENIN, Die nächsten Aufgabe der Sowjetmacht. Die
Internationale Lage der Russischen Sowjetrepublik und die Hauptaufgaben der
Sozialistischen Revolution. (A Próxima Tarefa do Poder Soviético. A Situação
Internacional da República Soviética Russa e as Principais Tarefas da Revolução
Socialista.) (Março e Abril de 1918), in : W. I. Lenin Werke (Obras de LENIN), Vol. XXVII, Berlim,
1962, pp. 256 e 257.
[11]
Vide CARL SCHMITT, Die Diktatur. Von den Anfängen des modernen
Souveranitätsgedanken bis zum proletarischen Klassenkampf (A Ditadura. Dos Inícios do
Pensamento Moderno de Soberania até a Luta de Classes do Proletariado)(1928), Berlim, 1989, pp. 11 e s.
[12] Acerca do tema, vide PLATON,
La République ou l’Etat, in : Oeuvres Complètes, Tome Septième, Paris, 1912, p.
VII e s., ou ainda PLATON, Politeia (O Estado),
in : Sämmtliche Werke (Obras Completas), Vol. III, Hamburg, 1958, pp. 71 e
s.
[13] Sobre a obra de
Platão, observou Zippelius : „Em face do povo comum, da classe possuidora mais
baixa, surgem os dois estamentos dirigentes do Estado, tal como o pastor em
face do gado, tal como, mais tarde, o clero em face dos laios. O povo deve trabalhar
até o esgotamento. Ele é conduzido. Também mentiras e
engôdos são válidos para esse fim. Parece, diz Platão, „que os governantes tem
de empregar muitas mentiras e engôdos para o bem do governo“, pois tal como
remédio essas coisas seriam extremamente necessárias.“ Vide
REINHOLD ZIPPELIUS, Geschichte der Staatsideen (História das Idéias do
Estado), Munique, 1989, p. 24.
[14] A esse respeito, vide PLATON,
Les Lois, in : ibidem, Tome Huitième, Paris, 1913, pp. VIII e s. ou ainda PLATON, Nomoi, in : ibidem,
Vol. IV, Hamburg, pp. 11 e s. Sobre o tema em destaque, observa Jellinek :
„No primeiro sistema da filosofia pós-socrática que marcou época, na doutrina
de Platão, a lei aparece como uma regra abstrata e, por isso mesmo, enrijecida,
que não pode ser justa, em razão de sua própria generalização uniforme nos
preenchimentos dos casos concretos, onde deve encontrar a realidade. Por isso, no melhor Estado não deve existir nenhuma lei
vinculante. A visão filosófica do dominador, criada a partir da idéia de
justiça, é que deve encontrar para cada caso individual a norma que lhe cabe.“ Vide
GEORG JELLINEK, Gesetz und Verordnung (Lei e Regulamento), Freiburg,
1887, p. 36.
[15]
Cf. REINHOLD ZIPPELIUS, ibidem, p. 26.
[16] Acerca do tema, vide PLATON,
Politeia (O Estado), in : Sämmtliche Werke(Obras Completas),
Vol. III, Hamburg, 1958, Cap. 5-11.
[17] Vide ARISTOTELES,
Πολιτιχον Δ. (Política), in : Aristotelis
Opera, ex. Rec. I. Bekkeri, Volumen Alterum, Berlim, 1960, pp. 1.297 e 1.298.
Vide tb. as traduções ARISTOTELES, Politik
(Política), Leipzig, 1943, especialmente Cap. 14: Acerca das Três Coisas, cuja
Instituição diferencia as Constituições e condiciona o Bem do Estado : o Poder
Consultivo, a Magistratura e a Justiça, pp. 150 e s., ou ainda ARISTOTELE,
La Politique, Tome I, Paris, 1962, especialmente IV-14: La Partie Délibérative
de l’État, IV-15: Le Pouvoir Exécutif, IV-16: Les Magistrats de l’Ordre
Judiciaire, p. 315 e s.
[18] Nesse
sentido, escreve Georg Jellinek : „ Tendo em conta as funções que exercem esses
três elementos da organização estatal, Aristóteles elabora uma divisão dos
negócios do próprio Estado : aos sujeitos separados devem corresponder funções
separadas. Não se conclui então, indo das funções para os órgãos, senão muito
mais, inversamente, indo dos órgãos para as funções.“ Vide
GEORG JELLINEK, Allgemeine Staatslehre (Teoria Geral do Estado)(1900),
1920, Berlim, p. 596.
[19]
Acerca do tema, vide HANS KELSEN, Die hellenisch-makedonische Politik
und die „Politik“ des Aristoteles (A Política Helênico-Macedônia e a „Política“
de Aristóteles), in : Aufsätze zur Ideologiekritik
(Ensaios para uma Crítica da Ideologia), Neuwied-Berlim, 1964, pp. 308 e s.
[20] Em contraste com esse
nosso posicionamento crítico, escreve Pereira Ribeiro em seu artigo :
“Aristoteles não chegou a formular uma teoria acerca da separação das funções
do Estado, mas já na Grécia Antiga, distinguiu que o governo se dividia em três
partes : a que delibera acerca dos negócios públicos ; a segunda, que exerce a
magistratura ( uma espécie de função executiva) ; e a terceira é a que
administra a justiça. Estas três partes do governo discriminadas por
Aristóteles guardam estreita semelhança com as modernas funções e ou poderes
Legislativo, Executivo e Judiciário. A importância dada ao funcionamento destas
"três partes do governo" é semelhante ao conferido aos três poderes,
modernamente, o seja, de elemento fundante de uma sociedade politicamente
organizada. Diz Aristóteles (p. 233) : "Há em todo governo três partes nas
quais o legislador sábio deve consultar o interesse e a conveniência
particulares. Quando elas são bem constituídas, o governo é forçosamente bom, e
as diferenças existentes entre essas partes constituem os vários governos(...)”
Vide LÚCIO R. PEREIRA RIBEIRO, Teoria da Separação dos Poderes, p. 233.
[21] Cf. KARL
LOEWENSTEIN, Verfassungslehre (Doutrina Constitucional), Tübingen, 1975, p.
34.
[22] Vide MARCO T.
CICERO, De Re Publica, Liber Primus, in : The Loeb Classical Library,
London, 1956, pp. 64 e s.
[23] Acerca da divisão do
poder do Estado na República Romana, vide sobretudo MONTESQUIEU,
Considération sur les Causes de la Grandeur des Romains et de leur Décandence,
in : Oeuvres Complètes, Paris, 1951, Vol. II, Chap. 11.;
IDEM, De l’Esprit des Lois, in : ibidem, Seconde Partie, Chap. XII e s.
[24] Acerca do tema, vide
p.ex. KARL KROESCHELL, Deutsche Rechtsgeschichte (História do Direito
Alemão), Darmstadt, 1989, Vol. I : Até 1250, especialmente : Os
Príncipes Imperiais e a Senhoria Fundiária, pp. 283 e s., Vol. II : de 1250 a
1650, especialmente : Príncipes e Império na Alta Idade Média, pp. 192 e s.; KARL
A. ECKHARDT, Die Gesetze des Karolingenreiches (As Leis do Império
Carolíngeo), in : Germanengesetze (Leis Germânicas), Weimar, 1953, pp. 32 e s.
[25] Vide MARSILIUS DI
PADUA, Defensor Pacis (O Defensor da Paz)(1324),
Madrid, 1989, pp. 53 e s.
[26] Acerca do tema, vide
p.ex. WILHELM BLUM & MICHAEL RUPP. Politische
Philosophen (Filósofos Políticos), München : Bayerische Landeszentrale
für pol. Bildung, 1992, pp. 60 e s.
[27]
No que concerne à legislação positiva anglo-saxônica do período da Idade
Média Baixa, vide, particularmente, DOMAS ÞE ÆÐELBIRHT CYNING ASETTE ON AGUSTINUS DÆGE (Leis que o Rei
Aethelbert Promulgou nos Dias de Augustinho) (601 – 604 bzw. 597 – 616),
(LXXVIII), in : Leges Anglo-Saxonum
(601—925), ed. K. A. Eckhardt (1958), S. 34.; DOMAS ĐE HLOÞHÆRE OND
EADRIC, CANTWARA CYNINGAS, ASETTON (Leis que Hlothere e Eadric, Reis de
Kent, Promulgaram) (685-686), (VI), in :
Leges Anglo-Saxonum (601—925), ed. K. A. Eckhardt (1958), S. 42.; Vgl. WIHTRÆDES
DOMAS CANTWARA CYNINGES (Leis de Wihtred, Rei de Kent) (695), (XIII), in :
Leges Anglo-Saxonum (601—925), ed. K. A. Eckhardt (1958), S. 52.; DOMAS ÐE
INE CYNCG GECEAS (Leis Promulgadas pelo Rei Ine) (688-695), (XIII), in :
Leges Anglo-Saxonum (601—925), ed. K. A. Eckhardt (1958), S. 140.; DOMAS ÐE
ÆLFRED CYNCG GECEAS (Leis Promulgadas pelo Rei Alfred) (871-900), (X.9), in
: Leges Anglo-Saxonum (601—925), ed. K. A. Eckhardt (1958), S. 60.; DOMAS ÐE
ÆLFRED CYNCG OND GUÐRUM CYNCG GECURON (Leis
Promulgadas pelos Reis Alfred e Guthrum) (921), (VII), in : Leges Anglo-Saxonum
(601—925), ed. K. A. Eckhardt (1958), S. 188.; EADWERDES GERÆDNESSE (Resoluções
de Eadward) (900- 925), (B - VI), in : Leges Anglo-Saxonum (601—925), ed. K. A.
Eckhardt (1958), S. 202.
[28] Acerca do tema, vide PACTVS LEGIS SALICAE. Legvm
Sectio I. Legvm Nationvm Germanicarvm, Tomi IV, Pars I, (481 – 714), in : Monvmenta Germaniae Historica. Leges Nationvm
Germanicarum, ed. Societas Aperiendis Fontibvs Rervm Germanicarvm, Hannover : Impensis Bibliopolii Hahniani, 1957, S. 82.; LEX
RIBVARIA. Legvm Sectio I. Legvm Nationvm Germanicarvm, Tomi III, Pars II,
(634-764), in : Monvmenta Germaniae Historica. Leges
Nationvm Germanicarum, ed. Societas Aperiendis Fontibvs Rervm Germanicarvm,
Hannover : Impensis Bibliopolii Hahniani, 1956, S.
94.; LEGES ALAMANNORUM. Legvm Sectio I. Legvm Nationvm Germanicarvm,
Tomi V, Pars I, (613 – 623), in : Monvmenta Germaniae
Historica. Leges Nationvm Germanicarum, ed. Societas Aperiendis Fontibvs Rervm
Germanicarvm Medii Aevi, Hannover : Impensis
Bibliopolii Hahniani, 1888, S. 22.; LEX FRISIONUM. Legvm Sectio XII.
Fontes Iuris Germanici Antiqui in Usum Scholarum Separatim Editi, (802 – 890)
in : Monvmenta Germaniae Historica. Leges Nationvm Germanicarum, ed. Karl. A. Eckhardt und
Albrecht Eckhardt, Hannover : Hahnsche Buchhandlung, 1982, S. 46.; CONCILIA
AEVI KAROLINI. Legvm Sectio III. Concilia, Tomi II, Pars I, (796 – 829), in : Monvmenta Germaniae Historica. Leges
Nationvm Germanicarum, ed. Societas.; CAPITVLARIA
REGVM FRANCORVM. Legvm Sectio II. Capitvlaria Regvm Francorvm, Tomvs I,
(803 – 850), in : Monvmenta Germaniae Historica. Leges
Nationvm Germanicarum, ed. Societas Aperiendis Fontibvs Rerum Germanicarvm
Medii Aevi, Hannover : Hahnsche Buchhandlung, 1883, S.
122 u. 124.
[29] Acerca do tema, vide vide p.ex. WILHELM BLUM & MICHAEL RUPP. Politische
Philosophen (Filósofos Políticos), München : Bayerische Landeszentrale
für pol. Bildung, 1992, pp.
76 e s.
[30] A respeito do tema,
BERNARD HAMILTON. The Medieval Inquisition (A
Inquisição Medieval), New York: Holmes & Meier, 1981, pp. 3 e s.
[31] Vide JOHN A.
O'BRIEN. The Inquisition (A Inquisição), New York: Macmillan; London: Collier
Macmillan, 1973, pp. 11 e s.
[32] Vide EDWARD
PETERS, Inquisition (A Inquisição), New York: Free
Press; London: Collier Macmillan, 1988, pp. 13 e s.
[33] Acerca do tema,
vide JOHN TEDESCHI, The Prosecution of Heresy: Collected Studies on the
Inquisition in Early Modern Italy (O Processamento da Heresia
: Estudos Selectos sobre a Inquisição na Alvorada da Itália Moderna),
Binghamton, NY: Center for Medieval and Early Renaissance Studies, 1991, pp. 3
e s.
[34]
Vide FRIEDRICH ENGELS, Der Ursprung der Familie, des Privateigentums und
des Staates (A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado) (Maio
1884), in : Marx und Engels Werke (Obras de Marx e Engels), Berlim, 1962, Vol. XXI, pp. 167 e s.
[35] Vide JEAN BODIN
ANGEVIN, Les Six Livres de la République(1576), in : Corpus des Oeuvres de
Philosophie en Langue Française, Lyon, 1986, especialmente Chap. X : Des Vrayes
de Souveraineté, pp. 295 e s.
[36] Vide THOMAS HOBBES
OF MALMESBURY, Leviathan : or Matter, Form and Power of a Commonwealth,
Ecclesiastical and Civil (Leviathan : ou Matéria, Forma e Poder Eclesiástico e
Civil do Estado)(1651), Vol. III, London, 1966, especialmente Ch. XVIII : Of the Rights of Sovereigns by Institution (Dos
Direitos dos Soberanos por Instituição), pp. 159 e s.
[37]
Vide IDEM, ibidem, pp. 165 e s.
[38]
Acerca do tema, vide CARL SCHMITT, Verfassungslehre (Doutrina
Constitucional), Munique-Leipzig, 1928, pp. 183 e s.; HEINE O. BRAUN,
Politische Philosophie (Filosofia Política), Hamburg, 1991, pp. 130 e s.; REINHOLD
ZIPPELIUS, Geschichte der Staatsideen (História das Idéias do Estado),
Munique, 1989, p. 83.
[39] O conceito de lei
surgido com a moderna doutrina burguesa inglesa do Estado continha uma noção
mais rigorosa do que a lei positiva de conteúdo plenamente volitivo,
característica dos Estados capitalistas imperialistas do século XIX e XX. Nesse sentido, vide FRIEDRICH v.d. HEYDTE,
Einführung in Vom Geist der Gesetze (Introdução ao Espírito das Leis), Berlim,
1950, p. 29.
[40]
A esse respeito, vide KARL MARX, Kritik des Gothaer Programms (Crítica
do Programa de Gotha), in : Marx und Engels Werke
(Obras de Marx e Engels), Berlim, 1962, Vol. XXIX, pp. 28 e s.
[41]
Vide E. KLIMOWSKY, Die englische Gewaltenteilungslehre bis Montesquieu
(A Doutrina da Divisão dos Poderes até Montesquieu), Berlim-Leipzig, 1927, pp.
7 e s.; FRIEDRICH v.d. HEYDTE, ibidem, pp. 26 e s.
[42]
Nesse sentido, vide KARL MARX, Zur Judenfrage (Acerca da Questão Judía)
(1843-44), in: Marx und Engels Werke. Gesamtausgabe MEGA (Obras de Marx e
Engels: Edição Completa MEGA), Berlim, 1982, Vol. II, p. 158. Nesse sítio, Karl Marx sublinha
: „O Direito do homem de propriedade privada é, portanto, o Direito de gozar de
seu partrimônio e dele dispor, arbitrariamente (à son gré), sem relacionar-se
com outros homens, independentemente da sociedade, é o Direito do próprio uso. Tanto aquela liberdade
individual como essa aplicação do uso da mesma constituem os fundamentos da
sociedade burguesa. Ela permite a todo homem encontrar em
outro homem não a concretização, porém
muito mais o limite de sua liberdade.
Ela proclama,
sobretudo, porém o Direito do homem „de jouir et de disposer à son gré de ses
biens, de ses revenus, du fruit de son travail et de son industrie “(de gozar
et de dispor a seu grado de seus bens, de seus rendimentos, do fruto de seu
trabalho e de sua indústria).
[43] Vide JEAN A.
MAUROIS, Histoire de l’Angleterre, Paris, Tome V, 1962, pp. 167 e s.
[44] Vide CARL SCHMITT,
Verfassungslehre (Doutrina Constitucional), Munique-Leipzig, 1928, pp. 183 e s.; IDEM, Die Diktatur. Von
den Anfängen des modernen Souveranitätsgedanken bis zum proletarischen
Klassenkampf (A Ditadura. Dos Inícios do Pensamento Moderno de Soberania até a Luta
de Classes do Proletariado)(1928), Berlim, 1989, pp.
103 e s.; FRIEDRICH v.d. HEYDTE, ibidem, p. 27. De modo nitidamente
superficial e sem a precisa percepção da essência da problemática do
balanceamento de poderes que perpassou o constitucionalismo burguês britânico
do século XVII e XVIII, vide EROS R. GRAU, O Direito Posto e o Direito
Pressuposto, Sao Paulo, 1996, pp. 168 e s.
[45]
Cf. GEORG JELLINEK, Gesetz und Verodnung (Lei e Regulamento), Freiburg,
1887, pp. 48 e s.
[46] Vide JOHN LOCKE,
The Second Treatise of Government. An Essay Concerning the True Original Extent, and End of Civil Governement (O Segundo Tratado do
Governo. Um Ensaio sobre a Verdadeira Extensão Original e o Fim do Governo
Civil) (1690), in : Two Treatises of Government of
John Locke, Cambridge, 1967, §§ 134 e s.
[47]
Vide IDEM, ibidem, §§ 159, 160, 162.
[48]
Cf. FRIEDRICH ENGELS, Die Lage Englands (A Situação da Inglaterra),
especialmente II: Die Englische Konstitution (II: A Constituição Inglesa), in :
Marx & Engels Werke (Obras de Marx & Engels), Vol. I, Berlim, 1961, p.
572.
[49]
Nesse sentido, vide HENRY ST. JOHN, VISCOUNT OF BOLINBROKE, The Idea of
a Patriot King (A Idéia de um Rei Patriótico)(1738), in: FRIEDRICH v.d. HEYDTE,
Einführung in Vom Geist der Gesetze (Introdução ao Espírito das Leis), Berlim,
1950, pp. 15 e s.
[50]
Cf. FRIEDRICH ENGELS, Die Lage Englands (A Situaçao da Inglaterra),
especialmente II: Die Englische Konstitution (II: A Constituiçao Inglesa), in :
Marx & Engels Werke (Obras de Marx & Engels), Vol. I, Berlim,
1961, p. 572 e 573.
[51] No momento da
independência dos EUA, adquirida em 1776, os representantes da burguesia
norte-americana inspiraram-se no sistema da divisão
dos poderes existente na Inglaterra no início do século XVIII, contido em
linhas gerais na Bill of Rigths, baseando-se para tanto na leitura dos textos de
Locke
e de Montesquieu.
Nesse quadro, o Rei Britânico, dirigente dos Poderes
Executivo, Federativo e de Pregorrativa, irresponsável perante o Parlamento,
haveria de ser substituído por um Presidente de Estado, eleito
exclusivamente com base no sufrágio universal dos cidadãos da nova República
Escravista dos EUA, com vistas a encabeçar essa nova versão norte-americana de
Poder Executivo. Esse Poder Executivo não deteria, entretanto, a prerrogativa
de promover a dissoluçao do Poder Legislativo que o deveria, teoricamente, contrabalançar.
Por outro lado, o Parlamento Inglês, detendo em suas mãos o Poder Legislativo,
haveria de ser substituído por um Congresso Nacional, composto por duas Câmaras, desprovido, entretanto, da atribuição de
promover a destituição do Presidente da República. Nesse contexto, a Declaração dos
Direitos de Vrigínia, de 1776, estabeleceu, em seu § 5°, que os Poderes
Legislativo e Executivo de Estado deveriam ser separados e distintos do Poder
Judiciário. A dinâmica da dominação política da burguesia dos
EUA confirmou, a seguir, um gradual fortalecimento do Poder Executivo
Presidencial, bem como o crescimento do aparelho
burocrático-administrativo colocado sob sua representação política, ao mesmo
tempo em que consolidou, rapidamente, a estruturação do Poder Judiciário
enquanto burocracia estatal de juízes guardiães da Constituição, já a partir de
1803. Acerca do tema, vide THE CONSTITUTION OF THE UNITED STATES OF AMERICA
FROM MARCH 4, 1789, Articles I e s., New York, 1969, pp. 97
e s.; PHILIPPE GEORGES, Organisation Constitutionnelle et Administrative
de la France, Paris, 1988, p. 22.; CARL SCHMITT, Verfassungslehre
(Doutrina Constitucional), Munique-Leipzig, 1928, pp. 185 et s.; DAVID P.
CURRIE, Die Verfassung der Vereinigten Staaten von Amerika (A Constituiçao
dos EUA), Frankfurt am Main, 1988, pp. 20 e s.
[52] Vide MONTESQUIEU,
De l’Esprit des Lois(1748), in Oeuvres Complètes, Paris, 1951, especialmente
Seconde Partie, Liv. IX, Chap. VI, pp. 396 e s.
[53] Acerca do tema, vide FRIEDRICH
ENGELS & KARL KAUTSKY, Juristensozialismus (O Socialismo dos Juristas)(1887), in: Marx und Engels Werke (Obras de Marx e Engels),
Vol. XXI, Berlim, 1961, p. 492.
[54]
Cf. KARL MARX & FRIEDRICH ENGELS, Die Deutsche Ideologia (A
Ideologia Alemã) (1845-1846), in : ibidem, Vol. III, p. 46.
[55] Segundo Montesquieu :
„ Il y a dans chaque Etat trois sortes de pouvoirs : la puissance législative,
la puissance exécutrice des choses qui dépendent du droit de gens, et la
puissance exécutrice de celles qui dépendent du droit civil. Par la première,
le prince ou le magistrat fait des lois pour un temps ou pour toujours, et
corrige ou abroge celles qui sont faites. Par la seconde, il fait la paix ou la
guerre, envoie ou reçoit des ambassades, établit la sûreté, prévient les
invasions. Par la troisième, il punit les crimes, ou juge les différends des
particuliers. On appellera cette dernière la puissance de juger, et l’autre
simplement la puissance exécutrice de l’Etat.“ Vide MONTESQUIEU,
ibidem, Seconde Partie, Liv. XI, Chap. VI, pp. 396 e 397.
[56] Vide IDEM,
ibidem, Seconde Partie, Liv. XI, Chap. VI, pp. 401 e 402.
[57] Vide IDEM,
ibidem, Seconde Partie, Liv. XI, Chap. VI, pp. 400 e 401.
[58] Vide IDEM,
ibidem, Seconde Partie, Liv. XI, Chap. VI, p. 403.
[59] Vide IDEM,
ibidem, Seconde Partie, Liv. XI, Chap. VI, p. 405.
[60] Vide IDEM,
ibidem, Seconde Partie, Liv. XI, Chap. VI, p. 398.
[61] Cf. IDEM,
ibidem, Seconde Partie, Liv. XI, Chap. VI, p. 397.
[62] Cf. IDEM,
ibidem, Seconde Partie, Liv. XI, Chap. VI, p. 398.
[63] Cf. MAURICE HAURIOU,
Principes de Droit Public, Paris, 1916, p. 38.
[64]
Cf. ERNST FORSTHOFF, Einführung in Montesquieus Vom Geist der Gesetze
(Introdução ao Espírito das Leis de Montesquieu), Vol. I, Tübingen, 1951, p. XXXI.
[65] Vide MONTESQUIEU,
ibidem, Seconde Partie, Liv. XI, Chap. VI, p. 404.
[66] Acerca do tema, vide KARL MARX, Zur
Judenfrage (Sobre a Questao Judía)(1843-44), in: Marx
und Engels Werke Gesamtausgabe MEGA
(Obras de Marx e Engels. Ediçao Completa MEGA), Berlim, 1982, Vol. II, pp. 158
e s.
[67] Apud WERNER WEBER,
Die Teilung der Gewalten als Gegenwartsproblem (A Divisão dos Poderes enquanto
Problema da Atualidade), in : Festschrift für C. Schmitt (Escritos de Homenagem
à Carl Schmitt), Berlim, 1959, p. 254.
[68] Cf. JEAN-JACQUES
ROUSSEAU, Du Contrat Social ou Principes du Droit Politique(1756), Paris,
1946, pp. 69 e 70.
[69] Cf. IDEM,
ibidem, p. 122.
[70] Cf. MAXIMILIAN
ROBESPIERRE, La Terreur et la Vertu, apud : Itinéraire d’un Tyran, in :
L’Histoire. Revue Mensuelle, Nr. 177, Mai 1994, Paris, p. 38.
[71] Cf. KARL MARX,
Der Achtzehnte Brumaire des Louis Bonaparte (O 18 Brumário de Napoleao
Bonaparte), in: Marx und Engels Werke (Obras de Marx & Engels), Berlim,
1961, Vol. VIII, pp. 196 e 197.
[72]
Cf. KARL KROESCHELL, Deutsche Rechtsgeschichte (História do Direito
Alemao), Vol. III :
Desde 1650, Darmstadt, 1993, especialmente : A Reforma da Administraçao da
Justiça, pp. 163.
[73] Acerca do tema, vide
WERNER KÄGI, Zur Entstehung, Wandlung und Problematik des
Gewaltenteilungsprinzips (Acerca do Surgimento, Transformação e Problemática do
Princípio da Divisão dos Poderes), Zürich, 1937, p. 45.;
MARTIN DRATH, Die Gewaltenteilung im heutigen Staatsrecht (A Divisão dos
Poderes no Direito do Estado Atual), in: Faktoren der Machtbildung (Fatores da
Formaçao do Poder), Vol. II, 1952, pp. 57 e s.; OTTO KÜSTER,
Das Gewaltproblem im heutigen Staatsrecht (O Problema do Poder no Direito do
Estado de Hoje), in : Archiv des öffentlichen Rechts (Arquivo de Direito
Público), Vol. LXXV, p. 406.; CARL SCHMITT, Verfassungslehre (Doutrina
Constitucional), Munique-Leipzig, 1928, pp. 185 e s.
[74]
Nesse sentido, ERICH KAUFMANN, Verwaltungsrecht (Direito
Administrativo), in : Stengel-Fleischmanns Wörterbuch
des Staats- und Verwaltunsrechts (Dicionário Stengel-Fleischmann de Direito do
Estado e da Administração), Vol. III, §5°, pp. 692 e s.
[75] Vide VLADIMIR I.
LENIN, Gosudarstvo i Revolutsia. Utchenie Marksisma o Gosudarstve i Zadatchi Proletariata v Revoliutsi (Estado e Revolução. A
Doutrina do Marxismo sobre o Estado e as Tarefas do Proletariado na Revolução)
(1917), Moscou, 1989, especialmente Cap. II.2 : O
Balanço de uma Revolução, pp. 27 e s.
[76] Acerca do tema, vide KARL
KROESCHELL, Deutsche Rechtsgeschichte (História do Direito Alemão), Vol.
III : Desde 1650, Darmstadt, 1993, especialmente : A
Reforma da Administração da Justiça, pp. 163 e s.; EMMERICH KERN,
Geschichte des Gerichtsverfassungsrechts (História do Direito Constitucional
dos Tribunais), Berlim-Munique, 1954, pp. 55 e s.
[77] Com efeito, John
Marshall é considerado o Great Chief Justice de todos os
tempos da Supreme Court, precisamente porque retirou-a de uma posição
esquálida e anômala no quadro do sistema de dominação política da burguesia
ascendente norte-americana, consolidando-a no exercício de sua função
jurisidicional em face dos Poderes Executivo e Legislativo, comandados então
pela orientação política pequeno-burguesa revolucionária de Thomas
Jefferson e dos jeffersonianos. Com Marshall surgiu,
precocemente, nos EUA a concepção
burguesa-burocrática conservadora - correspondente aos interesses da grande
burguesia norte-americana -, de que o Poder Judiciário deve modelar a
Constituição do Estado com a inteligência e a respiração de sua atividade
hermenêutica, defendendo a unidade nacional, bem como as garantias de
propriedade privada capitalista e segurança burguesa. Marshall defendeu, pela primeira vez
na história, a legitimidade constitucional da função do Poder Judiciário de
controlar leis federais e estaduais, pronunciando um
julgamento final acerca de sua constitucionalidade. Os principais posicionamentos teóricos de Marshall
acerca da nova função de controle de constitucionalidade do Poder
Judiciário podem ser encontrados, sobretudo, nas célebres decisões da Supreme
Court denominadas Marbury v. Madison, de 1803, e McCulloch
v. Maryland, de 1818. Por outro lado, o Presidente Thomas Jefferson e os
jeffersonianos foram os grandes antagonistas da Judicial Review e do que
denominavam Judicial Despotism, na medida em que acreditavam violar esse
procedimento de controle de constitucionalidade o próprio princípio da divisão
dos poderes, em razão da intromissão ilegitíma do Poder Judiciário no domínio
do Legislativo e do Executivo. Os jeffersonianos propunham, com efeito, que
cada um dos Poderes decidisse suas questões constitucionais por si mesmo, sendo
responsável por elas exclusivamente perante os
eleitores. Vide acerca do tema THOMAS JEFFERSON, The
Writings of Thomas Jefferson, New York, 1903-1904, Vols. XIV, p. 303, XV, p.
212, 277 e 451, XVI, p. 47 e 114.; ROBERT L. CLINTON, Marbury v. Madison
and Judicial Review, New York, 1989, p. 3 e s.; U.S. SUPREME COURT,
Members of the Supreme Court of the United States, New York, 1993, pp. 11 e s.
[78]
Acerca do tema, vide HENRY J. ABRAHAM, The Judicial Process,
Oxford-Cambridge, 1993, pp. 358 e s.; DAVID P. CURRIE, Die Verfassung
der Vereinigten Staaten von Amerika (A Constituiçao dos EUA), Frankfurt am
Main, 1988, pp. 20 e s.
[79]
Vide CARL SCHMITT, Das Reichsgericht als Hüter der Verfassung (O
Tribunal do Império enquanto Guardião da Constituição) in :
Verfassungsrechtliche Aufsätze aus den Jahren 1924-1954, Berlim, 1958, pp. 63 e
s.; tb. ERNST v. HIPPEL, Das richterliche Prüfungsrecht (O Direito de
Prova Judiciário), in : Handbuch des Staatsrechts (Manual de Direito do
Estado), 1932, pp. 546 e s.
[80]
Acerca do tema, vide FRITZ HARTUNG, Deutsche Verfassungsgeschichte vom
15. Jahrhundert bis zur Gegenwart (História Constitucional Alemã do Século XV
até o Presente), Stuttgart, 1950, especialmente § 62 : Die Entwicklung der
Reichsverfassung von 1919 bis 1933 (O Desenvolvimento da Constituição Imperial
de 1919 a 1933), pp. 329 e s.; ERNST RUDOLF HUBER, Reichsgewalt und
Staatsgerichtshof (Poder Imperial e Corte do Tribunal do Estado),
Berlim-Munique, 1932, especialmente Dokumentarischer Bericht über den Prozeß
contra Reich vor dem Staatsgerichtshof (Relatório Documentário sobre o Processo
contra o Império diante da Corte do Tribunal do Estado), pp. 5 e s.
[81] Esse aspecto
jurídico deve ser considerado, em primeiro lugar, desde uma perspectiva
histórica, tendo em conta a grande resistência dos juízes norte-americanos da Supreme
Court em face das políticas públicas social-intervencionistas,
impulsionadas pelo governo burguês de Franklin D. Roosevelt como forma de
remediar os efeitos catastróficos da Grande Depressão de 1929. A maioria conservadora da Supreme Court, comandada
pelo Chief
of Justice Charles Evans Hughes, votava, com efeito, sistematicamente,
contra as políticas contidas no New Deal, opondo-se até mesmo aos
votos bem fundamentados de Harlan Fiske Stone. Stone, entre
1941 e 1946, emergindo, então, como o sucessor rooseveltniano de Hughes,
na qualidade agora de Chief Justice da Supreme
Court, nada mais logrou senão formar uma minoria vigorosa de apoio ao
Estado Social-Intervencionista Burguês, comandado por Roosevelt. Acerca do tema, vide U.S. SUPREME COURT, Members of the Supreme
Court of the United States, New York, 1993, pp. 11 e s.
[82]
Vide CARL SCHMITT, Der Hüter der Verfassung (O Guardião da
Constituição), Tübingen, 1931, pp. 114 e s.; IDEM, Der Hüter der
Verfassung (O Guardião da Constituição) (1929), in: Archiv des öffentlichen
Rechts (Arquivo de Direito Público), Vol. LV, Caderno 2, pp. 160 e s.; IDEM,
Das Reichsgericht als Hüter der Verfassung (O Tribunal do Império enquanto
Guardião da Constituição) (1929), in : Verfassungsrechtliche
Aufsätze aus den Jahren 1924-1954, Berlim, 1958, pp. 63 e s.
[83]
Nesse sentido, vide indícios dessa temática em ADOLF ARNDT, Das Bild des
Richters (A Imagem do Juiz), Karlsruhe, 1957, pp. 8 e s.
[84]
Escrevendo sobre tema com os óculos da ideologia jurídico-burguesa, vide JUTTA
LIMBACH, Das Bundesverfassungsgericht als politischer Machtfaktor (O
Tribunal Constitucional Federal enquanto Fator Político de Poder), in :
Immatrikulationsfeier der Humboldt-Universität zu Berlim (Festa de Matrículas
da Universidade Humbolt de Berlim), Berlim, 1995, pp. 1 e s.; KONRAD HESSE,
Verfassungsrechtsprechung im geschichtlichen Wandel (Jurisprudência
Constitucional em Mudança Histórica), in: Juristische Zeitung (Jornal
Jurídico), 1995, pp. 265 e s.; CHRISTOPH GUSY, Das
Bundesverfassungsgericht als politischer Faktor (O Tribunal Constitucional
Federal como Fator Político) in : Europäische Gerichtsrechtzeitung (Jornal do
Direito dos Tribunais Europeus), 1982, pp. 93 e s.; PETER HÄBERLE,
Verfassungsgerichtsbarkeit zwischen Politik und Rechtswissenschaft
(Justicialidade Constitucional entre Política e Ciência Jurídica), Königstein,
1980, p. 59.; GERHARDT LEIBHOLZ, Der Status des
Bundesverfassungsgerichts (O Status do Tribunal Constitucional Federal), in :
Das Bundesverfassungsgericht 1951-1971, Karlsruhe, 1971, p. 32.
[85]
Vide HANS-JOCHEN VOGEL, Gewaltenvermischung statt Gewaltenteilung
(Intromissão de Poderes ao invés de Divisão dos Poderes), in
: Neue Juristische Woche (Nova Revista Jurídica), 1996, pp. 1.505 e s.; THOMAS
ELLWEIN, Der überforderte Staat (O Estado Sobrecarregado), Baden-Baden,
1994, p. 135.; LE MONDE, Le Secret de la Puissance Allemande, 23 de
Março de 1995, p. 20.
[86]
Vide FRIEDRICH ENGELS, Der Ursprung der Familie, des Privateigentums und
des Staates (A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado), in :
Marx und Engels Werke (Obras de Marx e Engels) (Maio 1884), Berlim, 1962, Vol. XXI, pp. 165 e s.
[87] Nesse sentido, vide
particularmente VLADIMIR I. LENIN, Gosudarstvo i Revolutsia. Utchenie
Marksisma o Gosudarstve i Zadatchi Proletariata v
Revoliutsi (Estado e Revolucao. A Doutrina do Marxismo sobre o Estado e as
Tarefas do Proletariado na Revoluçao) (1917), Moscou, 1989, especialmente Cap.
I.1 : A Sociedade de Classes e o Estado – O Estado,
Produto do Antagonismo Inconciliável entre as Classes, pp. 5 et s.
[88]
Vide FRIEDRICH ENGELS, ibidem, pp. 166 e s.
[89]
Vide IDEM, Anti-Dühring. Herrn Eugen Dühring’s Umwälzung der
Wissenschaft (Anti-Dühring. A Subversão da Ciência do Sr. Eugênio Dühring)
(Setembro 1876 – Junho 1878), in : Marx und Engels Werke (Obras de Marx e
Engels), Berlim, 1962, Vol. XX, pp. 261 e s.
[90]
Cf. IDEM, Der Ursprung der Familie, des Privateigentums und des Staates
(A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado) (Maio 1884), in :
Marx und Engels Werke (Obras de Marx e Engels), Berlim, 1962, Vol. XXI, pp. 165
e s.
ibidem,
p. 167.
[91]
Vide IDEM, ibidem, p. 168.
[92]
Nesse sentido, vide precisamente KARL MARX, Brief an L. Kugelmann (Carta
à L. Kugelmann) (12 de Abril de 1871), in: ibidem, Vol. XXXIII, p. 205.; FRIEDRICH
ENGELS, Anti-Dühring. Herrn Eugen Dühring’s Umwälzung der Wissenschaft
(Anti-Dühring. A Subversão da Ciência do Sr. Eugênio Dühring) (Setembro 1876 –
Junho 1878), in : Marx und Engels Werke (Obras de Marx e Engels), Berlim, 1962,
Vol. XX, p. 171.; VLADIMIR I. LENIN, Gosudarstvo i Revolutsia.
Utchenie Marksisma o Gosudarstve i Zadatchi
Proletariata v Revoliutsi (Estado e Revolução. A Doutrina do Marxismo sobre o
Estado e as Tarefas do Proletariado na Revolução) (1917), Moscou, 1989,
especialmente Cap. I.4 : A Sociedade de Classes e o
Estado - A „Extinção“ do Estado e a Revolução Violenta, pp. 16 e s.
[93] Vide KARL MARX,
Kritik des Gothaer Programms (Crítica do Programa de Gotha), in : ibidem, Vol. XXIX, pp. 28 e s.; VLADIMIR I. LENIN,
ibidem, especialmente Cap. 5.2 : Os Fundamentos Econômicos da Extinção do
Estado – Transição do Capitalismo ao Comunismo, pp. 87 e s.
[94] Vide KARL MARX,
ibidem, p. 30. Vide ainda VLADIMIR
I. LENIN, ibidem, especialmente Cap. 5.3. : Os
Fundamentos Econômicos da Extinção do Estado – A Primeira Fase da Sociedade
Comunista. No mesmo sentido, FRIEDRICH ENGELS,
Zur Wohnungsfrage (Acerca da Questão Habitacional), in: ibidem, Vol. XXVIII,
pp. 226 e 227.
[95] Vide KARL MARX, ibidem, p. 31. Vide
ainda VLADIMIR I. LENIN, ibidem, especialmente Cap. 5.4. : Os Fundamentos Econômicos da Extinção do Estado – A Fase
Superior da Sociedade Comunista.
[96] Vide KARL MARX,
Der politische Indifferentismus (O Indiferentismo Político)(Dezembro
de 1873), in: ibidem, Vol. XXXVIII, pp. 299 e s.; FRIEDRICH ENGELS, Von
der Autorität (Sobre a Autoridade) (Dezembro de 1873), in : ibidem, Vol. XXXVIII,
pp. 305 e s.
[97]
Vide FRIEDRICH ENGELS, Anti-Dühring. Herrn Eugen Dühring‘s Umwälzung der
Wissenschaft (Anti-Dühring. A Subversao da Ciência do Sr. Eugênio Dühring)
(Setembro 1876 – Junho 1878), in : Marx und Engels Werke (Obras de Marx e
Engels), Berlim, 1962, Vol. XX, p. 171.
[98]
Vide KARL MARX, Das Elend der Philosophie (A Miséria da Filosofia), in :
Marx und Engels Werke (Obras de Marx e Engels), Berlim, 1962, Vol. IV, pp. 63 e
s.
[99]
Vide KARL MARX & FRIEDRICH ENGELS, Manifest der Kommunistischen
Partei (Manifesto do Partido Comunista), in : ibidem, Vol. IV, pp. 473 e s.
[100] Vide VLADIMIR I. LENIN,
Gosudarstvo i Revolutsia. Utchenie Marksisma o Gosudarstve i
Zadatchi Proletariata v Revoliutsi (Estado e Revolucao. A Doutrina do Marxismo
sobre o Estado e as Tarefas do Proletariado na Revoluçao) (1917), Moscou, 1989,
especialmente Cap. II.I : O Estado e A Revolução. A
Experiência de 1848-1851 -
As Vésperas da Revolução, pp. 23 e s.
[101] Vide KARL MARX,
Der Achtzehnte Brumaire des Louis Bonaparte (O 18 Brumário de Luís Bonaparte,
in : Marx und Engels Werke (Obras de Marx e Engels),
Berlim, 1962, Vol. VIII, pp. 196 e s.
[102] Vide VLADIMIR I.
LENIN, ibidem, especialmente Cap. II.2 : O Estado
e A Revolução. A Experiência de 1848-1851 - O Balanço de uma Revolução, pp. 27 e s.
[103]
Vide KARL MARX, Brief an J. Weydemeyer (Carta à J. Weydemeyer), in :
Marx und Engels Werke (Obras de Marx e Engels), Berlim, 1962, Vol. XXVIII, pp. 507 e 508.
[104] Vide VLADIMIR I.
LENIN, Gosudarstvo i Revolutsia. Utchenie Marksisma o Gosudarstve i Zadatchi Proletariata v Revoliutsi (Estado e Revolucao. A
Doutrina do Marxismo sobre o Estado e as Tarefas do Proletariado na Revoluçao)
(1917), Moscou, 1989, especialmente Cap. II.2 : O
Estado e A Revolução. A Experiência de 1848-1851 - O Balanço de uma Revolução,
pp. 35 e s.
[105]
Vide KARL MARX & FRIEDRICH ENGELS, Vorwort zum Manifest der Kommunistischen
Partei – Deutsche Ausgabe 1872, Leipzig (Prefácio ao Manifesto do Partido
Comunista. Edição Alemã de 1872, Leipzig), in : Marx und Engels Werke (Obras de
Marx e Engels), Berlim, 1962, Vol. XVIII, pp. 92 e s.
[106]
Vide KARL MARX, Brief an L. Kugelmann (Carta à L. Kugelmann)(12 de Abril
de 1871), in: ibidem, Vol. XXXIII, p. 205.
[107]
Vide IDEM, Der Bürgerkrieg in Frankreich (A Guerra Civil na França), in
: ibidem, Vol. XVII, pp. 336 e s.
[108]
Vide IDEM, ibidem, pp. 337.
[109]
Vide KARL MARX & FRIEDRICH ENGELS, Die Partei und die Internationale
(O Partido e a Internacional) (5 de Maio de 1875), in : ibidem, Vol. XIX, pp. 6 e 7.
[110] Vide VLADIMIR I.
LENIN, Gosudarstvo i Revolutsia. Utchenie Marksisma o Gosudarstve i Zadatchi Proletariata v Revoliutsi (Estado e Revolucao. A
Doutrina do Marxismo sobre o Estado e as Tarefas do Proletariado na Revoluçao)
(1917), Moscou, 1989, especialmente Cap. III. 2: O
Estado e a Revoluçao. A Experiência da Comuna de Paris(1871).
A Análise de Marx – Com o que Substituir a Máquina
Estatal Despedaçada ?, pp. 40 e s.
[111]
Vide KARL MARX, Der Bürgerkrieg in Frankreich (A Guerra Civil na
França), in : ibidem, Vol. XVII, pp. 336 e 337.
[112]
Vide IDEM, ibidem, p. 338 e 339. Vide ainda FRIEDRICH ENGELS,
Kritik des Erfurter Programms (Crítica ao Programa de Erfurt)(1891), in:
ibidem, Vol. XXII, pp. 225 e s.
[113] Nesse sentido, vide
precisamente VLADIMIR I. LENIN, Gosudarstvo i Revolutsia. Utchenie
Marksisma o Gosudarstve i Zadatchi Proletariata v
Revoliutsi (Estado e Revolucao. A Doutrina do Marxismo sobre o Estado e as
Tarefas do Proletariado na Revoluçao) (1917), Moscou, 1989, especialmente Cap.
III.3 : O Estado e a Revolução. A Experiência da
Comuna de Paris(1871). A
Análise de Marx – A Supressão do Parlamentarismo, pp. 45 e s.
[114]
Cf. KARL MARX, Der Bürgerkrieg in Frankreich (A Guerra Civil na França),
in : ibidem, Vol. XVII, p. 341.
[115] Vide VLADIMIR I.
LENIN, ibidem, especialmente Cap. II.2 : O Estado
e A Revolução. A Experiência de 1848-1851 - O Balanço de uma Revolução, pp. 27 e s.
[116] Vide VLADIMIR I.
LENIN, ibidem, especialmente Cap. III.1 : O Estado
e a Revolução. A Experiência da Comuna de Paris(1871).
A Análise de Marx – Em que consiste o Heroísmo da
Tentativa dos Communards, pp. 36 e s.
[117] Acerca do tema, vide
as observaçoes de LEON TROTSKY, Predanaia Revoliutsia (A Revolução
Traída) (1936), especialmente
Ch. 3.1. Capitalismo e Estado – O Regime
de Transição, Moscou, 1991, pp. 39 e s.
[118] Acerca ao tema, vide VLADIMIR I. LENIN, Gosudarstvo i
Revolutsia. Utchenie Marksisma o Gosudarstve i
Zadatchi Proletariata v Revoliutsi (Estado e Revolução. A Doutrina do Marxismo
sobre o Estado e as Tarefas do Proletariado na Revolução) (1917), especialmente 5.3. Economitcheskie Osnovy Otmirania
Gosudarstva – Piervaia Faza Komunistitcheskovo Obschchestva (Os Fundamentos
Econômicos da Extinção do Estado – Primeira Fase da Sociedade Comunista),
Moscou, 1989, pp. 92 e s.; KARL MARX, Kritik
des Gothaer Programms, in : Marx und Engels Werke (Obras de Marx e Engels),
Berlim, 1962, Vol. XIX, pp. 31 e s.
Sobre o estágio relativamente atrasado do capitalismo russo, vide, p. ex., LÉON
TROTSKY, Permanent Revolution & Results and Prospects (1906/1930),
especialmente Ch. I. The Peculiarities of Russian Historical Development (As
Peculiaridades do Desenvolvimento Histórico Russo), London, 1931, pp. 5 e s.; IDEM,
Predanaia Revoliutsia (A Revoluçao Traída) (1936), Ch. 3.4. Capitalismo e Estado – „Escassez Generalizada e Polícia, pp. 45 e
s.
[119] Vide VLADIMIR I.
LENIN, ibidem, Cap. III.3 : O Estado e a
Revolução. A Experiência da Comuna
de Paris(1871). A Análise de
Marx – A Supressão do Parlamentarismo, pp. 50 e s.
[120] Vide IDEM,
ibidem, Cap. III.2 : O Estado e a Revolução. A
Experiência da Comuna de Paris(1871). A Análise de Marx – Com o que Substituir a Máquina Estatal
Despedaçada ?, pp. 42 e 43.
[121] LEON TROTSKY,
Predanaia Revoliutsia (A Revoluçao Traída) (1936), especialmente Ch. 3.2. Capitalismo
e Estado – Programa e Realidade, Moscou, 1991, pp. 41
e s.
[122] Cf. PIOTR I.
STUTCHKA, Staryi i Novyi Sud (Tribunal Velho e Novo) (1918), in : 13 Let Borbyi za Revoliutsionno-Marksistskyiu Teoriu
Prava (13 Anos de Luta pela Teoria do Direito Revolucionária Marxista), Moscou,
1931, Cap. II : Borba za Razruschenie Burjuaznovo Prava i Suda (Luta pela
Destruição do Direito e do Tribunal Burgueses), p. 7.
[123]
Cf. IDEM, ibidem, pp. 13 e 14.
[124] Algumas modificações
posteriores desse ato normativo, de caráter essencialmente suplementar,
surgiram, então, com o Decreto Nr. 2, de 7
de março de 1919, o Decreto Nr. 3, de 20 de julho de de 1918,
e, a seguir, como o Regulamento do Tribunal Popular da República Soviética da Federação Socialista Russa, de 30 de novembro de 1918.
Acerca do tema, vide DEKRET O SUDE (Decreto sobre o Tribunal) (Publicado
no Nr. 17 da Gazeta do Governo Operário e Camponês
Provisório de 24 de Novembro de 1917), in: Piotr Stutchka, 13 Let Borbyi za
Revoliutsionno-Marksistskyiu Teoriu Prava – Prilojenia (13 Anos de Luta pela
Teoria do Direito Revolucionária Marxista – Apêndice), Moscou, 1931, pp. 229 e
s.
[125] Cf. ibidem, Stat. 1°, p. 229.
[126] Acerca do tema, vide PIOTR
I. STUTCHKA, Staryi i Novyi Sud (Tribunal Velho e Novo)(1918),
in : ibidem, Cap. II : Borba za Razruschenie Burjuaznovo Prava i Suda (Luta
pela Destruição do Direito e do Tribunal Burgueses), pp. 7 e s.
[127] Cf. IDEM,
ibidem, p. 13.
[128] Vide IDEM,
ibidem, p. 13.
[129] Vide IDEM,
ibidem, p. 8.
[130] Vide IDEM,
ibidem, p. 9. Vide ainda DEKRET O SUDE (Decreto sobre o Tribunal)
(Publicado no Nr. 17 da Gazeta do Governo Operário e
Camponês Provisório de 24 de Novembro de 1917), in: ibidem, Stat. 2, p. 229.
[131] Vide PIOTR I.
STUTCHKA, ibidem, p. 12.
[132] Vide DEKRET O SUDE
(Decreto sobre o Tribunal) (Publicado no Nr. 17 da
Gazeta do Governo Operário e Camponês Provisório de 24 de Novembro de 1917),
in: ibidem, Stat. 2, p. 229.
[133] Vide ibidem, Stat. 2, p. 229.
[134] Vide PIOTR I.
STUTCHKA, Staryi i Novyi Sud (Tribunal Velho e Novo)(1918),
in : ibidem, Cap. II : Borba za Razruschenie Burjuaznovo Prava i Suda (Luta
pela Destruição do Direito e do Tribunal Burgueses), p. 13.
[135] Vide IDEM,
ibidem, p. 12. Vide tb. VLADIMIR I. LENIN, Brief an D. I. Kurski (Carta
à D. I. Kurski), in : W. I. Lenin Weke (Obras de V.I. Lenin), Vol. XXXVI (1900-1923),
p. 508.
[136] Vide DEKRET O SUDE
(Decreto sobre o Tribunal) (Publicado no Nr. 17 da
Gazeta do Governo Operário e Camponês Provisório de 24 de Novembro de 1917),
in: ibidem, Stat. 2, p. 229.
[137] Vide, ibidem, Stat. 3, p. 229.
[138] Vide PIOTR I.
STUTCHKA, Staryi i Novyi Sud (Tribunal Velho e Novo)(1918),
in : ibidem, Cap. II : Borba za Razruschenie Burjuaznovo Prava i Suda (Luta
pela Destruição do Direito e do Tribunal Burgueses), p. 14.
[139] Vide IDEM,
ibidem, p. 14.
[140] Vide DEKRET O SUDE
(Decreto sobre o Tribunal) (Publicado no Nr. 17 da
Gazeta do Governo Operário e Camponês Provisório de 24 de Novembro de 1917),
in: ibidem, Stat. 3, p. 229.
[141] Vide PIOTR I.
STUTCHKA, Staryi i Novyi Sud (Tribunal Velho e Novo)(1918),
in : ibidem, Cap. II : Borba za Razruschenie Burjuaznovo Prava i Suda (Luta
pela Destruiçao do Direito e do Tribunal Burgueses), p. 9.
[142] Vide DEKRET O SUDE
(Decreto sobre o Tribunal) (Publicado no Nr. 17 da
Gazeta do Governo Operário e Camponês Provisório de 24 de Novembro de 1917),
in: ibidem, Stat. 8, p. 230.
[143] Vide ibidem, Stat. 4, p. 230.
[144] Vide PIOTR STUTCHKA,
Staryi i Novyi Sud (Tribunal Velho e Novo)(1918), in :
ibidem, Cap. II : Borba za Razruschenie Burjuaznovo Prava i Suda (Luta pela
Destruição do Direito e do Tribunal Burgueses), pp. 11 e 14. Vide ainda acerca
dos Tribunais
Revolucionários dos Operários e Camponeses, VLADIMIR I. LENIN, Zum Dekret über die Revolutionstribunale
(Acerca do Decreto dos Tribunais Revolucionários) (30 de Março de 1918), in : W. I. Lenin Weke (Obras de V.I. Lenin), Vol. XXVII (De Fevereiro à Julho de 1918), p. 209.; IDEM,
Entwurf eines Beschlusses des Rats der Volkskomissare (Projeto de Resolução do
Conselho dos Comissários do Povo), (Março de 1918), in : ibidem, p. 210.; IDEM,
Brief an D. I. Kurski (Carta à D. I. Kurski) (8 de Maio de 1918), in ibidem, Vol.
XXXV (De Fevereiro de 1912 à Dezembro de 1922), p. 309.
[145] Vide DEKRET O SUDE
(Decreto sobre o Tribunal) (Publicado no Nr. 17 da
Gazeta do Governo Operário e Camponês Provisório de 24 de Novembro de 1917),
in: ibidem, Stat. 5. p. 230. Acerca do significado particular da consciência
revolucionária do Direito na obra de Stutchka, vide nossa traduçao de PIOTR
STUTCHKA, O Problema do Direito de Classe e da Justiça de Classe(1922), Sao
Paulo-Munique-Rio de Janeiro, 1999, especialmente : A Revoluçao Proletária e a
Lei Burguesa, pp. 23 e s., A Consciência Revolucionária do Direito, pp. 25 e s.
Vide tb. IDEM, Staryi i Novyi Sud (Tribunal Velho e Novo)(1918), in :
ibidem, Cap. II : Borba za Razruschenie Burjuaznovo Prava i Suda (Luta pela
Destruiçao do Direito e do Tribunal Burgueses), p. 11.
[146] Cf. ibidem, Stat. 5, p. 230. Acerca desse ponto, observou Stutchka
precisamente : „ Essa idéia não é minha, porém
considero-a tanto mais correta que cuidarei de defendê-la contra todos os seus
críticos. Como já escrevi diversas vezes, essa fórmula
pertence a V. I. Lenin. Deve-se recordar que, nessa época, participavam
do governo também os sociais-revolucionários de esquerda. Aparentemente, a mais
significativa de todas essas críticas foi a de que entre os programas de
ambos esses partidos subsistiam desacordos, exemplificativamente quanto à
questão acerca da nacionalização ou socialização da terra. Segundo Lenin,
„enquanto nós permanecermos no quadro da produção
mercantil e do capitalismo, a abolição da propriedade da terra representa uma
nacionalização da terra. A palavra „socialização“ expressa
apenas uma tendência, um desejo, de preparação da transição ao socialismo
(Lenin, Out. 1918, Vol XV, p. 519).“ (...) Para além desse desacordo, existem suficientes pontos
de convergência que conferem à codificaçao (compêndio) do Direito
revolucionário suficientes indicações para a aniquilação de volumes inteiros de
antigas leis e a sua substituição por um novo Direito escrito ou apenas
interior à consciência. Tome-se como exemplo a
abolição dos estamentos, a elegibilidade dos juízes, a separação da Igreja do
Estado, a plena liberdade de consciência, a jornada de trabalho de oito horas,
a confiscação das terras dos proprietários fundiários etc. Essas
reinvindicações do programa mínimo possuem ou não significado jurídico
determinado ?“ Vide IDEM, ibidem, p. 11.
[147] Cf. VLADIMIR I.
LENIN, V. Gesamtrussischer Kongress der Sowjets der Arbeiter-, Bauern-,
Soldaten und Rotarmistendeputierten (V. Congresso dos Soviets de Deputados
Operários, Soldados, Camponeses e Combatentes do Exército Vermelho) (De 4 a 10 de Julho de 1918), in : W. I. Lenin Weke (Obras de
V.I. Lenin), Vol. XXVII (De Fevereiro à Julho de 1918), p.
519.
[148]
Cf. IDEM, Bericht über die Aussen- und Innenpolitik des Rats der Volkskomissare.
Sitzung des Petrograder Sowjets (Relatório sobre a Política Externa e Interna
do Conselho dos Comissários do Povo. Sessão do Soviet de Petrogado) (12 de Março de 1919), in
: ibidem, Vol. XXIX (De Março à Agosto de 1919), p. 15.
[149] Vide IDEM, Notiz
für D. I. Kurski. (Nota para D. I. Kurski) (20 de Fevereiro de 1922), in :
ibidem, Vol. XXXVI (1900-1923), p. 550. Acerca do mesmo tema,
vide ainda IDEM, Brief an D. I. Kurski (Carta à D. I. Kurski) (28 de
Fevereiro de 1922), in : ibidem, Vol. XXXIII (De Agosto de 1921 à Março de
1923), pp. 186 e 187.
[150] Vide PIOTR I.
STUTCHKA, Staryi i Novyi Sud (Tribunal Velho e Novo)(1918),
in : ibidem, Cap. II : Borba za Razruschenie Burjuaznovo Prava i Suda (Luta
pela Destruição do Direito e do Tribunal Burgueses), p. 10.
[151] Cf. CONSTITUTION
OF THE RUSSIAN SOCIALIST FEDERATED SOVIET REPUBLIC, Adopted by the Fifth
All-Russia Congress of Soviets (Adotada pelo V Congresso dos Soviets de Toda
Rússia), Parte III Estrutura do Governo Soviético, Moscou, 10 de Julho de 1918.
[152]
Cf. VLADIMIR I. LENIN, Erster Absatz des Programmpunkts über das
Gericht. Entwurf des Programms
der KPR(B). (Primeiro
Parágrafo do Ponto do Programa sobre o Tribunal. Projeto do Programa do PCR(B))
(1919), in: W. I. Lenin Weke (Obras de V.I. Lenin), Vol. XXIX
(De Março à Agosto de 1919), p. 115.
[153]
Cf. IDEM, Bericht über die Tätigkeit des Rats der Volkskomissare 11(24)
Januar 1918. (Relatório acerca
das Atividades do Conselho dos Comissários do Povo de 11 (24) de Janeiro de
1918), in : ibidem, Vol. XXVI (De Setembro de 1917 à Fevereiro de 1918), Berlim,
1961, pp. 464 e s.
[154]
Cf. IDEM, Referat über die Revision des Parteiprogramms und die Änderung
des Namens der Partei vom 8. März 1918. (Relatório sobre a Revisão do Programa do
Partido e a Alteração do Nome do Partido, de 8 de Março de 1918), in: ibidem,
Vol. XXVII (De Fevereiro à Julho de 1918), p. 122.
[155]
Cf. IDEM, Urprünglicher Entwurf des Artikels „Die nächsten Aufgaben der
Sowjetmacht, diktiert am 28. März 1918, (Esboço Original do Artigo „As Próximas
Tarefas do Poder Soviético, Ditado em 28 de Março de 1918), in: ibidem, Vol. XXVII (De Fevereiro à Julho de 1918), pp. 207 e 208.
[156] Cf. IDEM,
Die proletarische Revolution und der Renegat Kautsky (A Revolução Proletária e
o Renegado Kautsky) (Outubro-Novembro de 1918), Título :
Bürgerliche und Proletarische Demokratie (Democracia Burguesa e Proletária), in
: ibidem, Vol. XXVIII (De Julho de
1918 à Março de 1919), p. 248.
[157] Cf. IDEM, Brief
an D. I. Kurski. (Carta à D. I. Kurski) (3 de Setembro de 1921), in : ibidem,
Vol. XXXV (De Fevereiro de 1912 à Dezembro de 1922), p. 497. No mesmo sentido, IDEM,
Brief an D. I. Kurski (Carta à D. I. Kurski) (17 de Janeiro de 1922), in :
ibidem, Vol. XXXV (De Fevereiro de 1912 à Dezembro de
1922), pp. 511 e 512.; IDEM, Zweiter Politischer Bericht des ZK. XI Parteitag der KPR(B) (Segundo Relatório Político do Comitê Central. XI Congresso do PC da
Rússia(B)) (de 27 de Março à 2 de Abril de 1922), in : ibidem, Vol. XXXIII (De Agosto de 1921 à Março de 1923), p. 278 e 284.
[158] Acerca desse tema,
vide IDEM, Brief an P. A. Bogdanow (Carta à P. A. Bogdanov) (23 de Dezembro de 1921), in
: ibidem, Vol XXXVI (1900-1923), p. 545.
[159]
Cf. IDEM, Über die Innen- und Aussenpolitik. IX Gesamtrussischer Sowjetkongreß (Acerca da Política
Interna e Externa. IX Congresso dos Soviets de Toda a
Rússia) (de 23 a 28 de dezembro de 1921), in : ibidem,
Vol. XXXVIII (De Agosto de 1921 a Março de 1923), p. 155.
[160] Cf. IDEM,
Bericht über das Parteiprogramm. VIII Parteitag der KPR(B)
(Relatório sobre o Programa do Partido. VIII Congresso do PC da Rússia(B)) (De 18 à 23 de Março de 1919), in : ibidem, Vol. XXIX
(De Março à Agosto de 1919), pp. 168 e 169.
[161]
Cf. IDEM, Der „linke Radikalismus“. Die Kinderkrankheit im Kommunismus
(O „Radicalismo de Esquerda“. A Enfermidade Infantil do Comunismo), Título :
Falsche Schlüsse aus richtigen Voraussetzungen (Falsas Conclusões tiradas a
partir de Pressupostos Corretos) (Junho
de 1920), in : ibidem, Vol. XXXI (De Abril a Dezembro de 1920), pp. 103 e 104.
[162]
Cf. IDEM, Über die Naturalsteuer. Die Bedeutung der neuen Politik und
ihre Bedeutung. (Acerca do Imposto em Natura. O Significado da Nova Política e
seu Significado) (21 de Abril de 1921), in : ibidem, Vol.
XXXII (De Dezembro de 1920 a Agosto de 1921), pp. 364 e 365.
[163] Cf. IDEM, Brief
an A. D. Ziurupa (Carta à A. D. Ziurupa) (21 de Fevereiro de 1922), in : ibidem, Vol. XXXVI
(1900-1923), p. 551.
[164]
Cf. IDEM, Brief an D. I. Kurski (Carta à D. I. Kurski) (12 de Abril de
1922), in : ibidem, Vol. XXXVI (1900-1923), pp. 563 e 564.
[165]
Cf. IDEM, Drittes Schlußwort zum politischen Bericht des ZK. XI
Parteitag der KPR(B). (Terceira Conclusao ao Relatório Político do Comitê Central do PC
da Rússia(B). XI Congresso do PC da
Rússia(B) (de 27 de Março à 2 de Abril de 1922), in : ibidem, Vol. XXXIII (De Agosto de 1921 à Março de 1923), p. 299.
[166]
Cf. IDEM, Brief an D. I. Kurski (Carta à D. I. Kurski) (17 de Maio de
1922), in : ibidem, Vol. XXXIII (De Agosto de 1921 a Março de 1923), pp. 344 e
345.
[167] Vide LEON TROTSKY,
Predanaia Revoliutsia (A Revoluçao Traída) (1936), especialmente Ch. 3.1. Capitalismo
e Estado – O Regime de Transição, Moscou, 1991, pp. 39
e s. Acerca do tema, vide ainda IDEM, Agonia Kapitalizma i Zadatchi IV
Internatsionala (A Agonia do Capitalismo e as Tarefas da IV Internacional),
especialmente A Situação da URSS e as Tarefas da Época de Transição, Paris,
1938, pp. 14 e s. Suplementarmente, vide acerca dessa temática KARL MARX,
Kritik des Gothaer Programms, in : Marx und Engels Werke (Obras de Marx e
Engels), Berlim, 1962, Vol. XIX, pp. 29 e s.; VLADIMIR I. LENIN,
Gosudarstvo i Revolutsia. Utchenie Marksisma o Gosudarstve i
Zadatchi Proletariata v Revoliutsi (Estado e Revolução. A Doutrina do Marxismo
sobre o Estado e as Tarefas do Proletariado na Revolução) (1917), especialmente 5.3. Economitcheskie Osnovy Otmirania
Gosudarstva – Piervaia Faza Komunistitcheskovo Obschchestva (Os Fundamentos
Econômicos da Extinção do Estado – Primeira Fase da Sociedade Comunista),
Moscou, 1989, pp. 92 e s.
[168] Vide LEON TROTSKY,
Predanaia Revoliutsia (A Revoluçao Traída) (1936), Moscou, 1991, especialmente Ch. 3.1. Capitalismo
e Estado – O Regime de Transição, pp. 39 e s. e,
ainda, Ch. 3.3. Capitalismo e Estado - O Duplo Caráter
do Estado dos Trabalhadores, pp. 43 e s.
[169] Vide IDEM,
ibidem, especialmente Ch. 3.2. Capitalismo e Estado – Programa e Realidade, p. 42.
[170] Vide IDEM,
ibidem, especialmente Ch. 3.2. Capitalismo e Estado – Programa e Realidade, p. 42. Vide ainda IDEM,
Agonia Kapitalizma i Zadatchi IV Internatsionala (A
Agonia do Capitalismo e as Tarefas da IV Internacional), especialmente A
Situação da URSS e as Tarefas da Época de Transição, Paris, 1938, pp. 14 e
s.
[171] Vide VLADIMIR I.
LENIN, Gosudarstvo i Revolutsia. Utchenie Marksisma o Gosudarstve i Zadatchi Proletariata v Revoliutsi (Estado e Revolução. A
Doutrina do Marxismo sobre o Estado e as Tarefas do Proletariado na Revolução)
(1917), especialmente 5.4. Economitcheskie Osnovy
Otmirania Gosudarstva – Vysschaia Faza Komunistitcheskovo Obschchestva (Os
Fundamentos Econômicos da Extinção do Estado – Fase Superior da Sociedade Comunista),
Moscou, 1989, p. 100.
[172] Cf. LÉON TROTSKY,
Predanaia Revoliutsia (A Revoluçao Traída) (1936), Ch.
3.3. Capitalismo e Estado - O Duplo Caráter do Estado
dos Trabalhadores, Moscou, 1991, p. 44.
[173] Cf. IDEM,
ibidem.
[174] Cf. IDEM,
ibidem, especialmente Ch. 3.4. Capitalismo e Estado – „Escassez Generalizada“ e Polícia, pp. 46.
[175] Cf. IDEM,
Agonia Kapitalizma i Zadatchi IV Internatsionala (A
Agonia do Capitalismo e as Tarefas da IV Internacional), especialmente A
Situação da URSS e as Tarefas da Época de Transição, Paris, 1938, pp. 15 e 16.
[176] Cf. CONSTITUTION
OF THE UNION OF SOVIET SOCIALIST REPUBLICS, Adopted December 1936 (Adotada
em Dezembro de 1936), Ch. IX : Os Tribunais e a Procuradoria, Moscou, 1938.