Texto de Autoria de
Portau Schmidt von Köln
Emil Asturig von München
A Enfermidade Gramsciana
no Movimento Trotskysta Contemporâneo
e nas Lutas de Emancipação do Proletariado
Polêmica Trotsky e Gramsci : Gramsci e Trotsky
O
SU-QI e a Corrente Franco-Gramsciana
de
Atualização, Correção
e
Superação do Marxismo
(O
Meta-Marxismo de Actuel Marx)
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A
compreensão da problemática relacionada com a lógica da cidadania
enquanto parâmetro de elaboração e conformação do programa político das seções
do Secretariado Unificado da Quarta Internacional (SU-QI) adquire
profunda e inquestionável importância nos nossos dias.[1]
Tal
problemática não pode ser concebida, entretanto, em toda a sua dimensão teórica
e implicações analíticas deixando-se de ter em conta a extensa penetração que o
sentido e o significado da ideologia gramsciana adquirem para o
delineamento da temática da cidadania na atualidade.
Com
efeito, tal demonstra o presente trabalho, o gramscismo
cadaveriza, nos dias de hoje, rápida e progressivamente, as concepções
intelectuais dos principais ideólogos e dirigentes políticos do
Secretariado Unificado da Quarta Internacional (SU-QI), precisamente na
medida em que essa organização internacional consolida sua estreita colaboração
e mercantilização de princípios doutrinários, consubstanciados na herança
proletário-revolucionária do trotskysmo, com aqueles dos meta-marxistas
franco-gramscianos de Actuel Marx e dos Espaces Marx, dedicados
a corrigir, atualizar e superar a doutrina de Marx e Engels, Lenin e
Trotsky, no sentido da ideologia idealista-gramsciana(-crociana),
revisionista e parasitária da tradição científico-socialista marxista-engelsiana,
essencialmente hostil ao trotskysmo e mais refinadamente adaptada à atmosfera
democrático-burguesa que domina e oprime intensamente as massas proletárias dos
países capitalistas-imperialistas, bem como, adicionalmente, aquelas dos
principais países situados na periferia da remundialização
capitalista-imperialista.
É,
efetivamente, correto afirmar-se que o SU-QI, abandonando o critério
classista de emancipação do proletariado em favor da utilização daquele
outro, vinculado à promoção da cidadania na formulação de seu
programa político, condena, inevitavelmente, as ações de luta dos trabalhadores
e demais socialmente oprimidos, no contexto do jugo despótico do capitalismo
remundializante, à mais total impotência estratégico-política, fomentando o
colaboracionismo de classes, os mitos e as ilusões jurídico-políticas
democrático-burguesas e constitucionais-parlamentares, as tentativas de gestão
democrática do sistema de exploração e opressão capitalista, em suma : a
própria preservação existencial dos atuais Estados e Ordenamentos
Jurídicos Burgueses.
Esse aspecto da
problemática relacionado com a lógica da cidadania foi apresentado,
recentemente, em seu aspecto histórico-sociológico e político-prático, por José
Welmovicki, em seu artigo intitulado O Discurso da Cidadania e a
Independência de Classe.[1]
Nessa sede,
assinala Welmovicki :
„Importantes dirigentes de correntes que reivindicam o
marxismo-revolucionário, como Catherine Samary e Jaime Pastor, ligados ao
Secretariado Unificado da IV Internacional, propõem uma „estratégia socialista
renovada“, baseada na colaboração de movimentos de cidadãos de distintas
origens (ecologistas, desempregados, feministas etc.) que conformem redes
européias e internacionais.“[2]
E, ao fim de seu
artigo em destaque, Welmovicki aduz :
„Qual o problema de fundo que a concepção da cidadania
omite ?
Que a sociedade é
divida em classes.
Que existem cidadãos proprietários dos meios de produção
e cidadãos despossuídos. ...
Omitir essa oposição em nome de uma pretensa igualdade de
todos a ser atingida dentro da sociedade atual desvia os explorados da busca necessária da unidade de classe para
acabar com a exploração. E os deixa à mercê do canto de sereia por uma
saída conjunta com seus exploradores sem radicalismo.
No movimento sindical, a ideologia da cidadania, em nome
de „abrir o sindicato à sociedade“, prega a colaboração entre trabalhadores e empresários.
É a idéia do sindicato cidadão, que deveria participar
lado a lado com os patrões na defesa do emprego, na luta contra a miséria, ou o
analfabetismo.
É o que vem fazendo a direção da CUT brasileira que, há muito
abandonou o discurso classista da década de 80 para adotar uma proposta de parcerias e programas integrados de
„inclusão social“.“[3]
Entretanto, o que
permanece ainda por examinar, é a elucidação da relação que a lógica
da cidadania, tal como referida pelos dirigentes e intelectuais do SU-QI,
de Actuel Marx e dos Espaces Marx, mantém com a ideologia
gramsciana, no sentido de confirmar a possibilidade de transformação
do Estado e do Direito Burgueses, através de sua mais ampla e ilimitada
democratização, como forma de ascender-se à Democracia Socialista e,
por essa via, ao socialismo, enquanto primeira fase ou fase inferior do
comunismo.
Nesse
sentido, a defesa do critério da cidadania, como
parâmetro de elaboração, estruturação e conformação do atual programa político
do Secretariado Unificado da Quarta Internacional (SU-QI), situa-se,
antes de tudo, na perpectiva da expansão máxima ou hiperbólica dos
direitos e liberdades jurídico-burguesas das massas populares, como
forma de bagatelizar, desvalorizar, subestimar e, finalmente, impedir a
deflagração de uma revolução violenta do proletariado para a destruição do Estado
Burguês e a imposição da Ditadura Revolucionária do Proletariado -
incorporadora da mais ampla e historicamente superior Soberania
proletária – pavimentando, em sentido diametralmente
contrário, a edificação da “Democracia Socialista como pressuposto e
condição para a transição rumo a uma sociedade realmente comunista” e,
nesse contexto, a solidificação de seus pressupostos estratégicos fundamentais
: a luta pela “Conquista da Hegemonia para a Democratização Radical da
Sociedade e Transformação do Estado, como forma de Passagem ao Socialismo” e
por “Uma Europa Social e Democrática e um Mundo dos Cidadãos”.
Sendo
assim, a abordagem da lógica da cidadania, tal como protagonizada
pelos ideólogos do SU-QI, de Actuel Marx e dos Espaces
Marx, será desenvolvida no presente subtítulo de modo mais particular,
e, posteriormente, de modo mais genérico, no Capítulo III.
O
presente texto já teve a oportunidade de salientar, em seu Capítulo I, à
guisa de exemplo, que uma das mais importantes consignas levantadas,
presentemente, pelo SU-QI é, precisamente, a da defesa
de “Uma Europa Social e Democrática dos Cidadãos”, protagonizada,
antes de tudo, nos dias de hoje, pelos parlamentares europeus da Ligue
Communiste Révolutionnaire (LCR), integrantes do grupo Esquerda
Unitária Européia-Esquerda Verde Nórdica(GUE-NGL) que atua no seio do Parlamento
da União Européia.
Essa „revira-volta
democrática radical“ seria a única capaz de dar corpo a uma „Europa
dos Cidadãos“, marcada, antes de tudo, pela „Cidadania Econômica
na Empresa“, onde se produziria um poder de trabalhadores, “condição
de eficácia indispensável para que os assalariados e as populações retomem o
controle de uma máquina econômica que opera contra seus interesses“.
Além
disso, o presente texto já teve a oportunidade de destacar que a Tendência
Democracia Socialista(DS), no quadro de seu „projeto socialista“,
em sua Tese 6 do documento Atualização do
Programa do Partido dos Trabalhadores, o qual assumiu tanta
importância teórica para as demais seções nacionais do SU-QI, no
que tange às suas discussões programáticas, a ponto de ser, por isso,
publicado, em abril de 2000, nas colunas do órgão político oficial dessa
organização internacional, i.e. a Revista INPREKORR, pronuncia-se
da seguinte forma acerca da luta pela cidadania, como forma de
alcançar mais controle sobre as atividades do Estado Burguês
Brasileiro e expandir a forma política desse mesmo Estado, i.e. a democracia
dos milionários, democracia essa efetivamente existente nesse país
situado na periferia do processo de remundialização do imperialismo capitalista
:
„TESE 6 : O SOCIALISMO ENQUANTO AUTO-GOVERNO SOLIDÁRIO DO
POVO ORGANIZADO.
Nosso programa democrático para o povo simples deve
orientar-se em uma concepção de socialismo que tenha por objetivo a apropriação
do controle dos mecanismos da direção econômica e política da sociedade pela
população organizada(p. 10).
Como perspectiva para a época atual e enquanto eixo para
um programa democrático do povo simples, nossas propostas devem nitidamente ser
mais limitadas : todas as formas de auto-administração e de controle social do
Estado e do mercado devem ser desenvolvidas.
Enquanto perspectiva de curto-prazo, não defendemos nem o
desaparecimento do Estado (no original alemão : Verschwinden des Staates) – o
que é notório – nem sua redução.
Defendemos sua transformação : ele deve ser controlado,
cada vez mais intensamente, por uma população organizada e consciente, que se
constitua, mais e mais, como público real.
Nesse sentido, defendemos um enfraquecimento do Estado
(no original alemão: Schwächung des Staates), i.e. seu enfraquecimento enquanto
aparato politicamente autônomo.
Nossa experiência dos últimos anos são extremamente
valiosas para uma concretização dessa perspectiva, porque existiram progressos
na participação do povo em diversas administrações municipais, em particular em
Porto Alegre, e devido a que esse processo pode ser agora expandido em nível do
governo do Estado do Rio Grande do Sul.
Essas experiências demonstraram que essa forma de
tratamento da questão do Estado é tanto democrática como eficiente. ....
Afirmamos que, sob o ponto de vista democrático, uma
redução do Estado (no original alemão : Reduzierung des Staates) e com isso uma
expansão dos mercados capitalistas não faz nenhum sentido. Na realidade, isso
conduziria a uma perda de possibilidades de decisão para o povo, i.e. a uma
perda de democracia.
Afirmamos, porém, também, que, sob o ponto de vista
democrático, um fortalecimento do Estado não faz nenhum sentido, se não se
fortalecerem os mecanismos de controle da sociedade sobre o Estado.
Se a expansão da atividade do Estado (no original alemão
: Ausweitung der Staatstätigkeit) ocorrer em combinação com um controle social
sobre suas atividades, desenvolveremos as formas que possibilitam aos cidadãos
e cidadãs alcançar mais controle sobre suas condições de vida ou, em outras
palavras, expandiremos a democracia.
Nesse sentido, a „expansão“ da atividade do Estado
contribui para o processo de seu desaparecimento (no original alemão : seines
Verschwindens), no longo prazo, i.e. para sua retração na sociedade
organizada ...
No quadro de um governo democrático do povo e no curso do
processo de transformação, surgirão as condições a fim de que possa ser
resolvido um grande problema ( se não o maior deles ) no qual esbarram as
iniciativas dos trabalhadores no domínio econômico regularmente, a saber : a
pressão de se adaptar aos dados do mercado, i.e. de fazer seu o modo de ver das
empresas(p.11).“[6]
Tomando-se
conhecimento, pura e simplesmente, a partir dos extratos retro-mencionados, das
fórmulas político-práticas, mais acessíveis, de „Sindicato Cidadão“, de
„Cidadania Econômica na Empresa“, de “Uma Europa Social e
Democrática e um Mundo dos Cidadãos”, de “desenvolver-se formas
que possibilitem aos cidadãos e cidadãs alcançar mais controle sobre suas
condições de vida ou, em outras palavras, expandir a democracia”, tal
como propagadas, incansativa e profusamente, pela direção do SU-QI e
por suas principais seções nacionais da atualidade, i.e. a Ligue
Communiste Révolutionnaire (LCR), da França, a
Tendência Democracia Socialista(DS), do Brasil, e Bandiera
Rossa(Rivista Marxista), da Itália, no seio das lutas do
proletariado e dos demais socialmente oprimidos pelo despotismo do capitalismo
imperialista remundializante da atualidade, ou mesmo contemplando-se,
superficial e corriqueiramente, a consigna central do momento dos Espaces
Marx, que permeia sua própria designação organizativa oficial, i.e. Espaces
Marx Réseau International. Pour Une Construction Citoyenne du Monde, i.e.
Espaços Marx Rede Internacional. Por uma Construção Cidadã do Mundo, servindo
de slogan convocatório de seu próximo encontro mundial a ter lugar em Paris,
Grande Halle de la Vilette, entre os dias de 30 de novembro e 2 de
dezembro de 2000, „Por uma Construção Cidadã do Mundo. Um Ano Após
Seattle“, não transparece, cristalinamente, aos olhos do leitor
interessado qual o sentido e significato teórico-doutrinários mais profundos e
político-estratégicos mais contundentes que o critério da tão decantada luta
pela cidadania assume nos contextos indicados.
Os
principais dirigentes e ideólogos do Secretariado Unificado da Quarta
Internacional(SU-QI) cumprem, em verdade, um serviço deplorável ao
introduzir tais palavras de ordem no seio das lutas proletárias de nossos dias
sem fazer qualquer referência mais clara ao preciso arcabouço ideológico que as
pretende fundamentar, i.e. a concepção de que o socialismo pode ser atingido, “sem
guerra de movimento“, „sem guerra de manobra“, „sem ataque frontal“, protagonizado
por Trotsky, „em um período em que esse é apenas causa de fiascos“,
sem a edificação, enfim, da Ditadura Revolucionária do Proletariado, incorporadora
da mais ampla e historicamente mais avançada Soberania proletária.[7]
Mais do
que isso : é imprescendível assinalar que os principais e doutrinariamente mais
ativos ideólogos do SU-QI da atualidade, i.e. Michaël Löwy,
Daniel Bensaïd, François Vercammen, Catherine Samary, Lívio Maitan, não
desenvolveram, em suas obras e artigos públicos, nada essencialmente de índole
doutrinário-fundamental que pudesse conferir embasamento teórico mais profundo
às consignas político-práticas que reproduzem, dogmática e sofisticamente,
vulgar e alienadamente, em seus documentos oficiais : por “Uma Europa
Social e Democrática e um Mundo dos Cidadãos”, „Cidadania Econômica na
Empresa“, “desenvolver-se formas que possibilitem aos cidadãos e cidadãs
alcançar mais controle sobre suas condições de vida ou, em outras palavras,
expandir a democracia” etc. etc.
Com
efeito, no que concerne ao sentido da crítica à concepção da ideologia tradicional
jurídico-burguesa, a temática acerca da cidadania surge já essencialmente
alinhavada, se tomada em precisa consideração as seguintes palavras redigidas
por Karl Marx, em Acerca da Questão Judía, de
1843-1844 :
„Os droits
de l’homme, os direitos do homem, distinguem-se dos droits du citoyen, os
direitos do cidadão do Estado(no original alemão: Staatsbürgerrechten).
Quem é
homme em distinção ao citoyen ?
Ninguém
outro senão o membro da sociedade burguesa ...
Sobretudo,
constatamos o fato de que os assim-chamados direitos do homem, os droits de
l’homme, em distinção aos droits du citoyen, nada são senão os direitos do
membro da sociedade burguesa, i.e. do homem egoísta, do homem separado do homem
e da comunidade. ...
A liberdade
é, portanto, o direito de fazer tudo e tudo empreender, desde que não
prejudique o próximo.
O
limite no qual cada um pode se movimentar sem prejudicar o próximo é
determinado pela lei, tal como o limite de dois campos é determinado por um
poste de arame farpado.
Trata-se
de uma liberdade do homem enquanto indivíduo isolado e recolhido em si
mesmo ....
O
direito da liberdade não se baseia na ligação do homem com o homem, senão muito
mais na separação do homem em relação ao homem.
É o
direito dessa separação, o direito do indivíduo limitado em si mesmo.“[10]
Com é
possível entrever-se dessa citação de Marx relativa à sua análise
do caráter dos direitos contidos na Déclaration des droits de l’homme et
du citoyen de 1789, a condição de citoyen é colocada,
diretamente, em face da questão do Estado, i.e. „droits du citoyen“,
direitos do cidadão do Estado(Staatsbürgerrechten).
Tendo-se
em conta, por consegüinte, as atuais condições de opressão do Estado e do
Direito Burgueses – tal como se trata de uma „sociedade burguesa“
como pressuposto da existência da condição de homme – a
noção jurídico-política de cidadania, veiculada na presente época histórica de
exploração e dominação do despostismo capitalista, haverá de estar sempre
condicionada, necessariamente, pelo seu caráter de classe burguês.[11]
Inversamente,
a luta por uma cidadania proletária pressupõe, sempre, a
destruição dos aparatos estatais e jurídico-burgueses, mediante revolução
violenta do proletariado hegemônico, em sentido dialético-materialista, e a
instituição de um Estado e de um Direito Proletários, enquanto
fase intermediária rumo ao atingimento do socialismo.
„Art.
15. A fim de assegurar autêntica liberdade de reunião para o povo trabalhador,
a República Soviética Federativa Socialista Russa, reconhecendo o direito dos
cidadãos da República Soviética de livremente realizar assembléias, atos,
manifestações etc., coloca à disposição da classe trabalhadora e do campesinato
pobre todos os edifícios adaptáveis para a realização de reuniões públicas,
completos com móveis, iluminação e aquecimento.“[12]
No
mesmo sentido, o mesmo diploma constitucional soviético, sufragado pelo V
Congresso dos Soviets de Toda Rússia, presidido por Jakov
Michailovitch Sverdlov, prescreveu, em seu artigo 18, de modo solene e
claro :
„Art. 18. A República Soviética Federativa Socialista Russa
declara ser o trabalho dever de todo cidadão da República e proclama o slogan :
„Quem não trabalha, não come !“[13]
Sendo
assim, a nova lógica da cidadania hiperbólica haveria de ser
postulada de modo radicalmente diferente pelos meta-marxistas
franco-gramscianos de Actuel Marx e dos Espaces Marx –
bem como sufragada deploravelmente pelos prinicipais ideólogos do Secretariado
Unificado da Quarta Internacional(SU-QI) – a fim de poder renegar, cabalmente,
a doutrina marxista acerca do tema, como nos dá conta o professor sorbonnard,
de atual linhagem franco-gramsciana, antigo mao-stalinista-althusseriano, Etienne
Balibar :
„“Ter direito de cidade“ : essa expressão, outrora,
aplicava-se aos homens, doravante, ela se aplica, sobretudo, às idéias, aos
problemas(p. 5). ...
É necessário retomar, a partir de mais alto, e – por tão
improvável que possa parecer à primeira vista – investigar, em todos os níveis
(local, nacional, transnacional) a convergência das práticas democráticas e das
reformas, revoltas, revoluções, que relançarão, em um outro quadro, a dialética
da cidadania, como estatuto individual, e a cidadania, como emancipação
coletiva, para além da figura histórica do Estado nacional-social(p. 9). ...“ [14]
Procurando
defender, consolidar, desenvolver e conciliar, plenamente, a lógica da cidadania,
tal como equacionada novidadeiramente por Etienne Balibar em face
do pensamento contratualista dos principais ideólogos de Actuel Marx, i.e.
Jacques Texier e Jaques Bidet, André Tosel, professor de linhagem
gramsciana da Sorbonne(Paris) e da Sophia
Antipolis(Nice), assinalou, a seguir, de maneira meridianamente clara,
em seu artigo intitulado Democracia e Servitude: Um Problema Aberto, publicado
em 1991, qual o pretendido sentido e significado da nova lógica da
cidadania, que haveria de inspirar as doutrinas e reflexões teóricas
não apenas de Actuel Marx, do Partido Comunista
Francês(PCF) e dos Espaces Marx, senão também a
orientação político-prática dos principais dirigentes do SU-QI e
de suas seções nacionais, nos anos seguintes :
“É, pois, do lado da figura do cidadão, mas de um cidadão
paradoxalmente projetado hiperbolicamente, para além dos limites da nação
única, ao qual é necessário nos voltar para encontrar uma saída.
Aqui, é indispensável fazer aparecer a insuficiência de
uma certa concepção da unidade da prática, desde há muito tempo desenvolvida
pela tradição marxista(obs. : Tosel refere-se aqui sobretudo a tradição
marxista de Lenin e Trotsky, porém também de Engels e do próprio Marx), em cujo
quadro bastaria prolongar a tomada de consciência coletiva na tomada do poder
do Estado e na formação do homem novo.
Haveria de se impor, pelo contrário, o paradigma da
heterogeneidade dos níveis da prática e, mais particularmente, aquele da
prática jurídico-política.
Basta dizer que a figura central não pode ser nem aquela
do sujeito nem aquela do livre trabalhador explorado, mas sim aquela do cidadão
integral.
Nossa situação nos obriga a voltar a isso : os direitos
declarados em 1789 são aqueles do homem enquanto cidadão.
A democracia não pode ser senão a ordem instituída pela
soberania do cidadão e isso determina a liberdade que não pode ser engendrada a
não ser através e no interior da “res publica”, a comunidade do Estado, em uma
tensão ineliminável com a liberdade definida como garantia da única propriedade
privada.
A idéia é aquela de uma soberania igualitária, de uma
liberdade fundada na igualdade e por ela engendrada.
Essa liberdade não tem outros limites senão aqueles que
ela confere a si mesmo para poder respeitar a regra da igualdade e essa última
enuncia : “O cidadão é um homem que goza de todos os seus direitos naturais,
que realiza sua humanidade de homem livre porque é, simplesmente, igual a todo
outro”.
Nesse sentido, esse princípio encontra-se sempre em uma
instância infinita de realização e, bem longe de se petrificar em princípio
formal, tende, por sua própria formalidade, a trabalhar nas relações de força
para concretizar sua universalidade.
Nesse ponto, poder-se-ia perguntar se não possuiria
atualidade a tese do contrato social, tal como a sugerem, cada a qual a sua
maneira, Norberto Bobbio e Jacques Bidet(em Teoria da Modernidade seguida de
Marx e o Mercado, Paris, 1990).
O primeiro propõe o alargamento social-liberal do
liberalismo político clássico à custa do liberalismo econômico. O segundo
sugere o aggiornamento(obs: Tosel quer dizer aqui a atualização) do marxismo no
seu contato com a tradição liberal.”[20]
Confirmando
e defendendo, então, a formulação da lógica da cidadania, tal qual
concebida por Etienne Balibar, em face das teses políticas de Norberto
Bobbio – voltada ao “alargamento social-liberal do liberalismo
político à custa do liberalismo econômico” – e de Jacques Bidet –
dedicada à “atualização do marxismo no contato da tradição
liberal” , acrescenta o mais ínclito entre os mais festejados
franco-gramscianos meta-marxistas de Actuel Marx, do PCF e
dos Espaces Marx, André Tosel, demonstrando como a luta
pela cidadania hiperbólica ou integral poderia, supostamente, conduzir
à instituição de uma Democracia Neo-Contratualista ou Pós-Liberal,
em inteira substituição e radical impedimento da Ditadura Revolucionária
do Proletariado, defendida por Marx, Engels, Lenin, Sverdlov e
Trotsky, essa última incorporadora da mais ampla e historicamente
superior Soberania proletária :
“Se o contrato social não se confunde com a esfera das
relações contratuais inter-individuais que regem o mercado, ele tem o poder de
tomar por objeto da contratualidade central a esfera da inter-individualidade
econômica.
O princípio da cidadania hiperbólica, para retomar a
feliz fórmula de Etienne Balibar, poderia ser traduzida em termo de um
neo-contratualismo.
A democracia pós-liberal que poderia nascer, retomaria as
esperanças abortadas pelo comunismo histórico (obs.: "comunismo
histórico" traduzido do
idioma filosófico-especulativo de Tosel em linguagem dos seres humanos normais
significa : o Estado Proletário instaurado pela Revolução de Outubro, quer sob
o regime leninista, quer sob o regime stalinista, indiferentemente - dado que
os franco-gramscianos, i.e. Tosel, Texier, Bidet etc. não diferenciam
substancialmente entre esses dois regimes políticos que consideram, tout
simplement, ditatoriais) e revivificaria a tradição social-democrática,
tornando-se, definitivamente, a democracia neo-contratualista :
Apenas ela teria em conta a diferença entre escravidão e
o assalariamento, ela apenas assumiria as potencialidades que envolvem o
assalariamento moderno, ao mesmo tempo fundado na livre associalibilidade e na
inter-individualidade, subordinado aos mecanismos da submissão real do trabalho
sobre o capital.
A democracia pós-liberal seria uma forma de vida
suportada pelo procedimento estrutural da modernidade, o contrato universal, um
contrato que poderia decidir acerca da parte reservada ao mercado e/ou ao
plano, que poderia subordinar plano e mercado.”[21]
Concluindo
seu raciocínio, relativamente ao sentido e significado da lógica da
cidadania de Etienne Balibar, no que concerne à construção de uma Democracia
Cívica ou Cidadã, corolário necessário da Democracia
Neo-Contratual ou Pós-Liberal, assinala André Tosel, como
de costume, de modo ardiloso e sibilino, na mais plena e perfeita coerência com
sua tão prezada ideologia gramsciana(-crociana), versão
idealista-subjetivista do pensamento dialético-materialista de Marx e Engels, essencialmente
renegadora do trotskysmo, revisionista e parasitária da tradição
proletário-revolucionária marxista-leninista e mais sensivelmente adaptada aos
preconceitos, fórmulas e mitos democrático-burgueses que dominam e oprimem as
massas proletárias dos países capitalitas-imperialistas, e, adicionalmente,
aquelas dos principais países situados na periferia da remundialização
capitalista-imperialista :
“Levar em conta a instância da democracia da direta dos
produtores, avançada e experimentada pelo movimento operário em suas mais significativas
invenções – Marx e a Comuna de Paris, Lenin e os Soviets, R. Luxemburg e os
Conselhos de Trabalhadores e Soldados, Gramsci e os Conselhos de Fábrica – pode
ajudar a tomar medida da aporia(Tosel se refere aqui à aporia da soberania do
povo), não a superá-la, porque a democracia é essencialmente representativa.
Aporia redobrada, quando se pensa que, em nosso século, o
despotismo sempre coincidiu com a supressão de fato ou a limitação da
representação.
Não podemos negar a formalidade jurídica no que ela tem
de constitutivo e não podemos, além disso, esquecer a crítica do formalismo,
sob pretexto de ela ter autorizado o comunismo real e seu despotismo(obs.:
“comunismo real e seu despotismo” no idioma do grande mestre franco-gramsciano
é aqui sinônimo de “comunismo histórico”, cujo significado, em linguagem dos
seres humanos mortais, surge apontado em nossa citação anterior). ...
Nossas dúvidas sobre a atualização da contratualidade
central não significa o retorno a uma afirmação da força contra a forma.
Elas tendem, pelo contrário, a esboçar uma dialética da força e da forma.
No momento, a problemática da cidadania nos parece mais
fecunda que sua inscrição em uma temática generalizada do contrato.
Nada exclui, a priori, que o desenvolvimento das relações
de força não coloquem na ordem do dia a lógica de uma cidadania voltando-se
contra a lógica da propriedade e o despotismo do capital e de suas
sobre-determinações.
Não se deve ao acaso o fato de que a reivindicação da
abolição das diferenças de classes se tenha exprimido na linguagem igualitária
da democracia cívica ou cidadã.
Se a transnacionalização do capital desperta,
contraditoriamente, a partir das reivindicações diferencialistas – étnicas,
nacionalitárias, regionalistas -, a cidadania diferencial que autorisa a se
querer francês, italiano, alemão, ou basco, corso, ou africano, etc. é um
momento particular da lógica da cidadania, quando essa última se particulariza
em um território, em uma configuração étnico-cultural(p. 297).
Porém, essa particularização é, com efeito, parcial e
exige que seja elucidado o horizonte de universalidade concreta que permite a
essas particularidades dividir alguma coisa de comum que se revela, em última
instância, como cosmopolítica, em sua extensão, e como pluri-determinada, em
sua qualidade intensiva.
O princípio da cidadania segue uma lógica de abertura que
o obriga a recolocar-se em questão, para a superar ou destruir a última figura
de sua atualização.
A história do sufrágio e de sua universalização no quadro
da nação, a da extensão dos direitos, de início civis, depois sociais, e hoje
cívicos, no sentido de uma cosmo-polis, comprovam-no.
Não é mais possível limitar-se às definições
institucionais já dadas, a isso em que todas essas definições são discutíveis e
discutidas, porque os laços sensíveis em que se coloca a questão da cidadania
não possuem a mesma estrutura.
Possamos retomar a feliz fórmula de Etienne Balibar :
concernente à natureza hiperbólica da lógica da cidadania ...
O cidadão é o homem sem propriedade, sem signo
particular, que afirma o excesso de sua reivindicação de participação pública e
a extensão dos pontos de vista em que se constitui a divisão, seja tratando-se
dos direitos civis, sociais, cívicos ou da inclusão de todos os que são deles
excluídos na comunidade das “cives”.
Nesse sentido, a cidadania sem qualidade, a
cidadania-excesso sobre suas próprias determinações é uma categoria
meta-política(p. 298).”[22]
Tal como
é possível atestar-se da perspicaz argumentação do professor franco-gramsciano
sorbonnard, André Tosel, “o cidadão é o homem sem propriedade,
sem signo particular”, sendo que, entretanto, a figura central da lógica
da cidadania “não pode ser nem aquela do sujeito nem aquela do livre
trabalhador explorado, mas sim aquela do cidadão integral”.
Esse “cidadão
integral” deve afirmar “o excesso de sua reivindicação de participação
pública e a extensão dos pontos de vista em que se constitui a divisão, seja tratando-se
dos direitos civis, sociais, cívicos ou da inclusão de todos os que são deles
excluídos na comunidade das “cives””.
Eis,
portanto, como a ideologia gramsciana, despregrada com a
maestria especulativa de um dos grandes intelectuais de Actuel Marx, do
Partido Comunista Francês(PCF) e dos Espaces Marx, projeta-se,
incisivamente, na problemática do critério da cidadania,
utilizado hoje, profusamente, pela direção do SU-QI, em substituição
e abandono do critério classista de emancipação do proletariado.
O
presente subtítulo restaria, porém, manifestamente incompleto se não
apresentasse ao leitor os mais basilares argumentos de Etienne Balibar, formulados
por sua própria pena, acerca da lógica da cidadania.
Para o
cumprimento dessa tarefa, cumpre trazer à luz as formulações desse célebre
pensador atualmente franco-gramsciano, outrora mao-stalinista-althusseriano,
professor sorbonnard, condensadas em sua obra mais recente que, digamos assim,
pretende coroar seu trabalho de uma década em prol da afirmação da cidadania
projetada hiperbolicamente.
Em seu
obra aparecida em 1998, sob o título Direito de Cidade. Cultura e
Política na Democracia, Balibar assinala, com grande claridade :
„Ainda que seu conceito seja paradoxal, defendo que uma democratização
da instituição das fronteiras (obs.: Balibar fala aqui de espaços,
territórios, fronteiras sociais etc. em sentido amplo, e mesmo de „casamatas,
fortalezas e trincheiras“, em sentido especificamente gramsciano) é
indispensável, se quisermos instituir uma cidadania viável e vivível para
todos(p. 6). ...
Não considero absolutamente que a desobediência à
autoridade de Estado, a recusa de executar as leis cujo o conteúdo ou as
condições de elaboração parecem contestáveis, constitua a essência da
cidadania.
O individualismo do „cidadão contra os poderes“ não forma
mais uma política tal como o anarquismo do „perecimento do Estado“ não funda
uma comunidade(obs.: Fiel ao quadro da perspectiva gramsciana de conquista da
sociedade civil e democratização do Estado Burguês, Balibar volta seus
argumentos aqui, não apenas contra os anarquistas bachunistas, senão também
contra Marx e Engels, Lenin e Trotsky, que defendem a destruição do Estado
Burguês e o perecimento do Estado Proletariado a ser instituído, como forma de
atingimento do socialismo).
Creio, contudo, que a cidadania e a comunidade não podem
existir sem essa referência necessária à desobediência e mesmo sem que, periodicamente,
o risco de recorrer a ela não seja efetivamente assumido....
Ela (i.e. a desobediência civil) é um comportamento
político no sentido forte do termo, destinado a reconstruir as bases simbólicas
do Estado(p. 10). ...
O que mobilizou (e mobiliza), por sua vez, intelectuais
que se reivindicam, antes de tudo, cidadãos, não é, contrariamente ao que se
tem lido, a nostalgia das figuras messiânicas do engajamento, a pesquisa de um
substituto ridículo ao proletariado perdido. ...
Essa cidadania não será a-nacional ou anti-nacional, mas
sim inevitavelmente transnacional : na ordem das referências simbólicas (a
liberdade, a igualdade dos homens, sua solidariedade) como também na dos
direitos sociais e econômicos.
Ela não será arbitrariamente anti-estatal, mas ela
suporá, de toda forma, a retificação dos mitos do todo poderoso Estado-Nação
„soberano“ e a desmultiplicação dos laços de sua instalação, portanto o
alargamento considerável da esfera da publicidade das ações humanas.
Eu diria, no fim das contas, que ela passará pela civilização
do Estado – no duplo sentido
da expressão – que deborda largamente a „civilização dos costumes“, no que ela
não exige apenas de hábitos e virtudes, nem apenas leis, porém ideais e
solidariedades, atos de revolta coletiva ou de insurreição e práticas de
civilidade, segurança, resistência, no desenvolvimento da violência e da
contra-violência(p. 12)“(grifos do autor)[23]
No
mesmo sentido, Balibar ainda observa :
„Não se
trata de substituir o sentimento de impotência pelo sentimento do todo
poderoso, i.e. por um discurso voluntarista : „nós somos os senhores do
Estado“, „somos os mestres da economia“, finalmente, somos os mestres do mundo.
Existem
coisas que estão muito mais imediatamente situadas ao nosso alcance e que foram
sempre a própria substância do problema e da prática da cidadania : elas são,
por uma parte, o controle dos poderes, e, por outra, a representação
ou a representatividade efetiva dos indivíduos, dos grupos, de todos os
interesses legítimos na sociedade, nas instituições e no Estado(p.125). ...
A
consequência que disso deve-se tirar é a de que se terá, novamente, a cidadania
na medida em que existam contra-poderes, um controle do poder, uma representação
efetiva, em todos os níveis em que existem, efetivamente, poder e
representação. ...
O
segundo aspecto da política, sobre a qual me contentaria de dizer hoje duas
palavras, é a tranformação social : talvez não a „transformação do
mundo“, como havia escrito Marx, mas a das condições, das instituições e das
estruturas(p. 126). ...
Para
terminar, existe um nível da política que não se reduz a nenhum de seus
precedentes.
Ele não
é nem a cidadania nem a transformação das estruturas sociais ou das formas de dominação
de que dependemos, mas sim o que chamaria de civilidade.
Talvez
alguém possa encontrar uma palavra melhor, porém essa mesma possui certas
vantagens.
Tanto polidez
como urbanidade são por demais fracas e não gosto muito de civilização,
porque esse termo acompanha a idéia que existe bárbaros e selvagens e
sabemos o que quer dizer levar a civilização aos outros.
Ora,
nesse caso, não se trata de levar aos outros, trata-se de civilizarmos a nós
mesmos, i.e. desenvolver formas de vida e de comunicação que nos permitam
assumir uma certa distância em relação à histerilização das identidades a qual
assistimos e que, na realidade, nos subjulga a nós mesmos(p. 129).“[24]
Como é
possível entrever das citações acima apresentadas, Etienne Balibar, professor
da Universidade de Paris I, candidato natural ao posto de
professor da cátedra de Educação Moral e Cívica da Sorbonne, advoga,
fervorosamente, a luta pela cidadania viável e vivível para todos mediante
o recurso à „desobediência civil“, a „atos de revolta
coletiva“, à „insurreição“, à „resistência, no
desenvolvimento da violência e da contra-violência“, visando a
promover-se a civilização do Estado Burguês – supondo-se
naturalmente que Balibar habite sobre o globo terrestre dos
séculos XX e XXI e que, referindo-se, receptivamente, ao pensamento de Marx,
não esqueceu que o Estado e o Direito são
instrumentos que necessitam ser contemplados segundo a perpectiva classista.[25]
No
quadro de sua sacratíssima cruzada cívica em favor da civilização do
Estado Burguês, a defesa da cidadania hiperbólica teria o
condão de reconstruir as bases simbólicas do Estado Burguês e
democratizar a instituição das fronteiras.
Luta essa
pela cidadania a ser travada, porém, „na ordem das referências
simbólicas (a liberdade, a igualdade dos homens, sua solidariedade) como também
naquela dos direitos sociais e econômicos“.
Projetando
sua lógica da cidadania integralmente no quadro da ideologia
gramsciana da „guerra de posição“, da conquista de „casamatas,
fortalezas e trincheiras“, Etienne Balibar, convertido, agora, ao
gramscismo meta-marxista de Actuel Marx e dos
Espaces Marx, pretende demonstrar que, na substância do problema da “prática
da cidadania“ situa-se a luta pelo „controle dos poderes“ e
da „representação ou representatividade efetiva de todos os interesses
legítimos na sociedade, nas instituições e no Estado“, voltada para a
conquista de um balanceamento de poderes intermediários - „se terá,
novamente, a cidadania na medida em que existam contra-poderes“, os
quais, em sentido lógico-epistêmico do pensamento de Balibar, em
nada se diferem da fórmula estratégico-política defendida pelo Barão de
la Brède et de Montesquieu, dela distanto, em sentido
histórico-material, porém, por um interstício temporal de praticamente 300
anos, sem se considerar o fato importantíssimo de que a sociedade medieval
diferia, substancialmente, das relações sócio-econônomicas e jurídico-políticas
existentes sob o período de agonia do capitalismo imperialista remundializante
da atualidade.
Referindo-se
aos escritos de Marx para remoê-lo, corrigí-lo, atualizá-lo,
superá-lo e, finalmente, repudiá-lo, Etienne Balibar, em
sua defesa da ideologia gramsciana, discorre ainda acerca da luta
por uma „tranformação social”, transformação „das condições,
das instituições e das estruturas, transformação também portanto de uma
instituição social de primeira importância, i.e. a tranformação do Estado
Burguês, tal como defende a Tendência Democracia Socialista(DS), seção
brasileira do Secretariado Unificado da Quarta Internacional(SU-QI), em
suas Teses para uma Atualização do Programa do Partido dos Trabalhadores,
de abril de 2000.[26]
Almejando
alcançar a civilização do Estado Burguês, o „controle dos
poderes“ e a „representação ou a representatividade efetiva de
todos os interesses legítimos na sociedade, nas instituições e no Estado“,
Balibar apresenta ao leitor, então, o zênite de seus argumentos, a
saber : a luta pela cidadania e pela transformação das
estruturas sociais ou das formas de dominação não se reduziriam, mas
sim implicariam, a luta em favor da civilidade, contra a histerilização
de identidades, i.e. a luta pela civilização de nós mesmos, ou
seja, do que já existe, i.e. a civilização da barbárie e da selvageria do
capitalismo imperialista já existente na atualidade e reproduzida,
quotidiana e violentamente, através sobretudo de sua imposição aos países
situados no processo de recolonização do capitalismo imperialista
remundializante – e, assim, portanto, não a derrubada implacável dessa bárbarie
e selvageria capitalista-imperialista, mediante a deflagração de revoluções
proletárias em todos os continentes do mundo.
Aplicando,
então, sua lógica da cidadania no quadro da construção
capitalista-imperialista européia, Balibar assinala, de modo
efetivamente coerente com a perpectiva de promover a civilização do
Estado Burguês, lançado as bases doutrinária para as consignas
levantadas pela LCR Francesa e pelo Secretariado Unificado
da Quarta Internacional(SU-QI) em face da União Européia :
„É mais urgente manter aberta a dialética das diferentes
noções necessariamente vizinhas, porém de nenhuma forma sinônimas : aquelas de
comunidade e de exclusão, porém também aquelas de cidadania dos Europeus (entendendo
por essa, de início, a identidade de „origem“, portanto o pertencer nacional
prévio, com a qual franceses, alemães, gregos etc. entram em um campo de
direitos e de obrigações comunitárias) de cidadania européia, de cidadania na Europa (ou de uma
„Europa dos cidadãos“, disso concebendo, dessa vez, sobretudo, a idéia de um
espaço de direitos cívicos e sua progressão que a Europa pretenderia fazer
avançar), ou de cidadania aberta, transnacional, cuja a construção
européia seria, por uma parte, no mínimo, o apoio.“[27]
Etienne
Balibar, demonstrando,
então, claramente, ao leitor que sua lógica da cidadania
não tem absolutamente nada em comum com o pensamento de Marx e Engels, poupa
o elaborador do presente texto, já bastante castigado pelas incontáveis agruras
hiperbólicas do meta-marxismo franco-gramsciano, de prosseguir,
indefinidamente, lançando mão de seu parco latim para patentear a mais ignóbil
empresa teórica de Balibar no sentido de condenar as lutas e as
mobilizações das massas trabalhadoras exploradas e oprimidas de todo mundo à
mais integral impotência política e ao mais impudente colaboracionismo de
classes, na busca do horizonte perdido de sua cidadania hiperbólica e da
civilização do Estado Burguês, apanágios inseparáveis do mais
conseqüente emprego da ideologia gramsciana :
„Para
fazer-me compreender, eu evocaria, por um instante, as formulações que herdamos
de Marx e Foucault, cuja incompatibilidade das filosofias tornam, no final das
contas, a convergência tanto mais significativa.
Muito
cedo, como se sabe, Marx escolheu como objeto o socialismo utópico.
Porém,
o sentido dessa crítica foi ocultado pela falsa alternativa do socialismo
utópico e do socialismo científico, com os efeitos que se conhece(obs.: quais
efeitos se conhece ? Os que Balibar conhece, segundo a cartilha,
precedentemente, mao-stalinista-althusseriana, presentemente,
gramsciana(-crociana) idealista-subjetivista ... )
O
socialismo científico, é necessário dizê-lo bem claramente, não é oposto ao
socialismo utópico (não mais do que o capitalismo científico, aquele dos
prêmios Nobel da economia o é em relação ao capitalismo utópico, no qual se
harmonizaria, naturalmente, os interesses dos indivíduos).
Ele
representa, antes de tudo, seu resultado, sua transposição em uma linguagem
positivista.
O
sentido da crítica marxista da utopia não deve ser procurada do lado da ciência
(cuja função é totalmente outra : de conhecimento, precisamente), porém sim no
lado da prática e da concepção revolucionária(p. 13)....
Porém,
convém também anotar que Marx e Foucault exploram, cada um à sua maneira, uma
dimensão essecial da política, não como seu „outro“ absoluto, mas como sua
diferença íntima, necessária, contrapartida de sua mobilidade inelutável ou de
sua „historicidade“.(p. 14) ...
Sem dúvida, o que mais importa para a reinvenção da
política no mundo de hoje, seja como responsabilidade individual, seja como
esquema de comunicação entre os grupos, é o encontrar, mediante a experiência,
os lugares da ficção.(p.15)“[28]
EDITORA DA ESCOLA DE AGITADORES E INSTRUTORES
“UNIVERSIDADE COMUNISTA REVOLUCIONÁRIA J. M. SVERDLOV”
PARA A FORMAÇÃO, ORGANIZAÇÃO E DIREÇÃO MARXISTA-REVOLUCIONÁRIA
DO PROLETARIADO E SEUS ALIADOS OPRIMIDOS
MOSCOU – BUENOS AIRES - SÃO PAULO – PARIS
[1] Observo ao leitor,
desde logo, que o objeto limitado do presente subtítulo é abordar a
problemática da lógica da cidadania tal como concebida pelo SU-QI,
em seu colaboracionismo teórico-doutrinário com os meta-marxistas
franco-gramscianos de Actuel Marx, do Partido Comunista
Francês(PCF) e dos Espaces Marx. Nada obstante, cumpre
salientar que o programa e a política da atual frente popular francesa
( ou do „bloco hegemônico“ para usar a terminologia da ala
comunista dessa frente ), composta pelos socialistas de Hollande,
comunistas de Hue, os verdes do ex-trotskysta do „Socialismo
e Barbárie“, Cohen-Bendit, e ativistas do movimento pela
cidadania de Chevènement – colaboradores do sistema institucional
presidido pelo gaullista Chirac, do RPR, - levanta como
principais eixos ordenadores „sociais“ de direção desse governo de coalizão a
luta pela ampliação da cidadania, da democracia, dos direitos humanos e do
Estado Direito, da defesa dos sans papier etc. Esses eixos surgem
acompanhados de outras reivindicações democrático-burguesas como supremacia do
legislativo, poder executivo colegial, não acumulação de mandatos, ao lado da
encantadora Lei Aubry, relativa à redução da jornada de trabalho.
Presentemente, são, em verdade, os impulsos dos intelectuais e políticos
frente-populistas da França que conferem, preponderantemente, à
dinâmica das lutas européias a análise sócio-reformista mais corrente de que,
diante da derrota histórica do „comunismo histórico“ e o „fracasso
do paradigma marxista“, acarrentando consigo a ofensiva neo-liberal
contra o todo sagrado Estado Social, Democrático e de Direito,
torna-se inadiável o impulsionamento da luta contra a „désemancipation de
la citoyenneté“ (Jean-Pierre Chevenement, Domenico Losurdo), em favor
da „citoyenneté hyperbolique“ (Etienne Balibard), do „élargissement
des droits sociaux-libéraux“ (Norberto Bobbio), no quadro de um „contratualisme
centraliste“ (Jacques Bidet) ou néocontratualisme (André Tosel), conceitos
políticos esses adiante analisados. Resulta, desde saída, evidente, mesmo na
ausência de análise mais aprofundada, o significado desses termos sociológicos
muito sedutores, mas que, em regra, represam o potencial das lutas dos
trabalhadores explorados e dos demais socialmente oprimidos nos confins
estreitos da ordem burguesa-democrática, fundada na dominação e no despotismo
do capitalismo imperialista remundializante. De toda sorte, não apenas na França,
mas também na Alemanha e na Itália, publicam-se, na
atualidade, diversas obras acerca da necessidade do revigoramento da luta pela
cidadania, em todos os níveis. Alain Supiot, da Universidade de
Nantes, é um dos principais defensores da cidadania na empresa(1993). Fala-se,
então, como moeda corrente, de „démocratie industrielle“ ou „industrial
democracy“ ou „Wirtschaftsdemokratie“. Ulrich
Muckenberger, da Universidade de Hamburg, fundado no pensamento de Jürgen
Habermans, por sua vez, é um dos principais arautos da concepção de Empresa
Cidadã(1992). Detlef Merten, da Universidade de
Speyer-Berlim, escreve sobre o „Arbeitsbürger“ (o cidadão no trabalho)
e o „Sozial-Bürger“ (o cidadão social)(1993). Jean
Rivero defende as liberdades públicas na empresa(1988), Jean
Savatier, a liberdade no trabalho (1990). Na Itália, Edoardo
Ghera(1990) discorre no mesmo sentido dessa ou dessas cidadanias na
empresa, na indústria, no trabalho, na sociedade, no movimento etc. e Norberto
Bobbio, em inúmeras obras, defende a democracia nas empresas. Joël
Boudant escreve, hoje, amplamente, sobre a cidadania européia.
Assim, os frente-populistas de todos os gêneros almejam, na Europa de hoje, com
base na doutrina desses pensadores, alcançar a cidadania hiperbólica, concebida
originalmente por Balibar, em seu famoso „Citoyen Sujet.
Réponse à la question de Jean-Luc Nancy. Qui vient après le Sujet ?“,
Cahiers Confrontation, Paris, N. 20, Hiver 1989. Além disso, T. H.
Marshall, com efeito, em suas obras de 1950, já tratava da cidadania no
contexto das classes sociais, postulando a cidadania na empresa e
o direito a um rendimento real. Nesse sentido, soam com pretensão
de veracidade os argumentos de Jacques Bidet que indicam que,
apesar da ambivalência e da equivocidade vernacular, as grandes doutrinas
modernas – libéralisme, socialisme, conservatisme, social-démocratie ou
communisme –, i.e. todas essas, de alguma forma, se alimentam
dos mesmos paradigmas, a saber – citoyenneté, contrat, justice,
participation, Etat de droit, etc. Acerca do tema, vide
sobretudo Cf. BIDET, JACQUES. Démocratie et Modernité. Jalons pour une
Théorie Générale, in : Les Paradigmes de la Démocratie. Actuel Marx
Confrontation. Colloque du CNRS, 29-30 Mai 1990, organisé par la Revue Actuel
Marx et l’Université de Paris X - Nanterre, sous la direction de Jacques Bidet,
Paris : PUF, 1994, pp. 5 e s.
[2] Vide, acerca do tema, WELMOVICKI, JOSÉ. O
Discurso da Cidadania e a Independência de Classe, in : Marxismo Vivo. Revista
do Koorkom, Nr. 1, Junho/Setembro de 2000, pp. 66 e s.
[3] Cf. IDEM. ibidem, p. 66.
[4] Cf. IDEM. ibidem, p. 76. Aqui, entretanto, uma observação
parece fazer-se necessária, sobretudo em relação ao título do artigo em
referência „O Discurso da Cidadania e a Independência de Classe“.
Existe um sentido diferenciado, nitidamente claro, na utilização das expressões
„independência de classe“ e „independência da política e
das organizações de classe“. A primeira expressão, „independência
de classe“, apesar de ter-se generalizado amplamente no seio do
movimento proletário do século XX, expressa, necessariamente, uma concepção
confusa e equivocada, por incorporar uma lógica realista-construtivista, sendo
que não é aquela adotada por Marx e Engels e preservada por Lenin
e Trotsky. Tanto uns como outros falavam sempre, ou quase
sempre, de „emancipação ou libertação de classe“, i.e. Emanzipation
ou Befreiung der untedrückten Klasse. Em verdade, o proletariado não se
encontra em relação de dependência em face da burguesia – de modo a convir
falar-se de „independência de classe“, sendo que, pelo contrário,
é a burguesia que dele depende para, em sentido material, seguir,
historicamente, sobrevivendo enquanto classe exploradora e opressora. O
proletariado situa-se, efetivamente, em relação de exploração e dominação em
face da burguesia e encontra-se submetido, em princípio, à vigência das leis
materiais do modo de produção capitalista, daí porque Marx e Engels consagraram
a expressão „Emanzipation der unterdrückten Klasse“, tomando
emprestado o termo em destaque: Emanzipation, do léxico latino : e-mancipare,
de e-mancipatio, nas línguas neo-latinas, literalmente, desescravização
ou deservidão de classe. No idioma materno de Marx e Engels, lexicalmente
mais rudimentar do que o latim, ainda que incomensuravelmente mais flexível e
conformável, utilizaram eles, alternativamente, quase sempre, o termo mais
comum „Befreiung“, i.e. libertação, quando não pretendiam
empregar a forma latinizada Emanzipation. De toda sorte, jamais
falaram de“Unabhängigkeit der unterdrückten Klasse“ ou ainda „Klassenunabhängigkeit“
i.e. independência de classe ... Uma situação totalmente diferente é
falar-se de „independência da política e das organizações de classe“, essa
última expressão plenamente coerente com a doutrina marxista e utilizada
amplamente por Marx e Engels, Lenin e Trotsky. Assim, a luta do
proletariado é voltada, antes de tudo, para sua emancipação ou libertação de
classe, sendo que, para tanto, é indispensável o impulsionamento de sua luta
por sua independência política enquanto classe. É nesse último sentido que, em
verdade, parece escrever, com precisão, Welmovicki, quando
assinala, na conclusão de seu artigo em destaque : „A real situação dos
trabalhadores demonstra, ao contrário, que para lutar por esses direitos
mínimos, que qualquer cidadão mereceria ter, se necessita de uma organização
independente dos trabalhadores contra a reação burguesa! Essa organização
independente, política e sindical, pressupõe uma consciência de classe e uma
ação classista. Do contrário não se travará a luta. A batalha contra o
neoliberalismo hoje exige uma luta de classes sem trégua. ... “ Cf. IDEM.
ibidem, pp. 76 e 77.
[5] Nesse sentido, vide LIGUE COMMUNISTE REVOLUTIONNAIRE,
Une Révolution Démocratique et Sociale. Urgence contre le Chômage. Pour une
Europe Unie Démocratique et Socialiste, in : Propositions de la LCR pour une
autre Europe. Au Parlement Européen. Documents, 1999.
[6] Cf. TENDENZ SOZIALISTISCHE DEMOCRATIE. These für
eine Aktualisierung des Programms der Arbeiterpartei(Tese para uma Atualização
do Programa do Partido dos Trabalhadores), in : INPREKORR. Internationale
Pressekorrespondenz, Nr. 342, April 2000, pp. retro-referidas.
[7] Cf. GRAMSCI, ANTONIO, Quaderni del Carcere (1928-1937)
– Passagio dalla Guerra Manovrata (e dall’Attacco Frontale) alla Guerra di
Posizione anche nel Campo Politico, in: : Antonio Gramsci. Scritti Politici,
Roma, 1967, pp. 821 e s.
[8] No sentido tradicional retro-mencionado, a questão da
cidadania é enfocada presentemente, na França, sobretudo por ROBERT,
JACQUES. Préface à de la Citoyenneté, in : Geneviève Koubi & Jean
Baudain. De La Citoyenneté, Colloque des 3, 4 et 5 novembre 1993, Faculté de
Droit et de Sciences Politiques de Nantes, Paris : Litec, 1995, pp. II e s.; MADIOT,
YVES. Citoyenneté. Un Concept à Facettes Multiples, in: ibidem, pp. 17 e
s.; MOURGEON, JACQUES. Citoyenneté et Ordre Juridique, in : ibidem, pp.
23 e s.; CAPORAL, STÉPHANE. Citoyenneté et Nationalité en Droit Public
Interne, in : ibidem, pp. 59 e s.; VINCENT, JEAN-YVES. Citoyenneté et
Dignité : Les Exclus de la Citoyenneté par Décision de la Justice, in : ibidem,
pp. 103 e s.; HELIN, JEAN-CLAUDE. Un Malade Hospitalisé est-il un
Citoyen, in : ibidem, pp. 155 e s. Na perspectiva de uma cidadania cosmopolita,
„aberta a todos os que, nacionais ou não, tenham mais de 21 anos e residam
desde há um ano sobre o território da República“, vide LE COUR-GRANDMAISON,
OLIVIER. Condorcet : Citoyenneté, République et Démocratie, in : ibidem,
pp. 8 e s. No que tange à problemática levantada acerca da cidadania da
União Euopéia, vide, desde essa mesma perspectiva filosófico-jurídica e
histórico-sociológica eminentemente burguesa-crítica, antes de tudo, BOUDANT,
JOEL. La Citoyennté Européenne, in : Geneviève Koubi & Jean Baudain. De
La Citoyenneté, Colloque des 3, 4 et 5 novembre 1993, Faculté de Droit et de
Sciences Politiques de Nantes, Paris : Litec, 1995, pp. 39 e s.; LOCHAK,
DANIELE. La Citoyenneté Européenne : Facteur d’Union ou Vecteur d’Exclusion
?, in : ibidem, pp. 52 e s.
[9] Nesse sentido propriamente franco-gramsciano, vide,
antes de tudo, BALIBAR, ETIENNE. Droit de Cité. Culture et Politique en
Démocratie, Paris : Editions de l’Aube, 1998, pp. 5 e s.; IDEM.
Citoyen Sujet. Réponse à la Question de Jean-Luc Nancy : Qui Vient Après le
Sujet ?, in : Cahiers Confrontations, Paris, Nr. 20, Hiver 1989, pp. 3 e s.;
IDEM. „Droit de L’Homme“ et „Droit du Citoyen“ : La Dialeticque Moderne de
l’Égalité et de la Liberté, in : Actuel Marx, Nr. 8, 1990, pp. 7 e s.; TOSEL,
ANDRE. Democratie et Servitude : Un Probleme Ouvert, in : La Démocratie
Difficile. Actes du Colloque Franco-Italien-Urbino, Mai-Octobre 1991, Paris VI
: Diffusion Les Belles Lettres, 1993, pp. 293 e 294.; LOSURDO, DOMENICO. Le
20e. Siècle entre Emancipation et Désémencipation, in : ibidem, pp. 157 e s.; ROBELIN,
JEAN. Faut-il Jeter au Feu la Critique Marxienne de la Représentation, in :
ibidem, pp. 64 e s.
[10] Cf. MARX, KARL. Zur Judenfrage (Acerca da Questão
Judía) (1843-44), in : Marx und Engels Werke. Gesamtausgabe(MEGA), Vol. II,
Berlim : Dietz, 1982, p. 157. Acerca da problemática em exame, vide tb.
comentários de ASTUTO R. GOMES, EMILIO. Banque Centrale Européenne(BCE)
et Banques Centrales Nationales(BCN) du Système Européen des Banques Centrales
: Réflexions Juridiques sur l’Indépendance de la Technobureaucratie Capitaliste
Supranationale Responsable de la Poltique de la Monnaie et du Crédit au sein de
l’Union Européenne, Thése de Paris, Paris, 1999, especialmente I.a. Citoyenneté
Européenne et Capitalisme Oligopolistique Européen Supranational, pp. 35 e s.
[11] Acerca do tema, escreveu Rosa Luxemburg, brilhantemente,
da seguinte forma : „O atual Estado não é, precisamente, nenhuma „sociedade“ no
sentido da „classe trabalhadora ascendente“, mas sim é o representante da
sociedade capitalista, i.e. um Estado de classe. Por isso, também a
reforma social por ele manejada não é uma atividade do „controle social“, i.e.
do controle da sociedade livre trabalhadora sobre o próprio processo de
trabalho, senão um controle da organização da classe do capital sobre o
processo de produção do capital“. Cf. LUXEMBURG, ROSA. Sozialreform
oder Revolution ? (Reforma Social ou Revolução ?)(1899), especialmente :
Nr. 3 : Einführung des Sozialismus durch soziale Reformen (Introdução do Socialismo
através de Reformas Sociais), , in : Rosa Luxemburg Gesammelte Werke, Vol. ½,
Berlim, 1972, p. 392.
[12] Cf. CONSTITUTION OF THE RUSSIAN SOCIALIST FEDERATED
SOVIET REPUBLIC, Adopted by the Fifth All-Russia Congress of Soviets
(Adotada pelo V Congresso dos Soviets de Toda Rússia), Moscou, 10 de Julho de
1918, Chapter V, art. 15. Vide tb. comentários de STUTCHKA, PIOTR.
Constitutsia Grajdanskoi Voinyi (1918 - A Constituição da Guerra Civil.
Tradução em Língua Portuguesa de Emil von München), in: Textos Jurídicos de
Formação dos Juristas Socialistas da Classe Trabalhadora. Instituto Luís e Rosa
Sunderman : Ed. Jurídica Socialista dos Trabalhadores, São Paulo-Munique-Paris,
2000.
[13] Cf. ibidem, Art. 18.
[14] Cf. BALIBAR, ETIENNE. Droit de Cité. Culture et
Politique en Démocratie, Paris : Editions de l’Aube, 1998, pp.
retro-mencionadas. Em sua exposição, apresentada no seminário franco-europeu de
pesquisa sobre o Estado, soberania nacional e construção européia, do
Ministério da Pesquisa e da Tecnologia da França, de 12 de fevereiro de 1993,
em que participaram Eric Hobsbawn e Emmanuel Terray, Etienne Balibar assinalou
ainda o seguinte, quanto a pretender resituar, novidadeiramente, a problemática
da abordagem da lógica da cidadania : „As reflexões que seguem
não pretendem traçar o contorno sobre a questão da cidadania européia, porém
fornecer alguns elementos em vista de um posicionamento de suas implicações.
Essa abordagem é ditada não apenas pelo caráter prospectivo do seminário no
qual nos inserimos, mas também pela convicção de que os temas : „Europa
dos Cidadãos“, a „Cidadania Européia“, não podem, hoje, ser objeto nem de um tratamento
jurídico puramente normativo (em nível legislativo ou regulamentar), nem de um
tratamento dedutivo(a partir de um conceito pré-existente de cidadania e de
cidadão). O que eles reclamam é, sobretudo, uma reflexão de seus mecanismos, de
suas tensões, de suas contradições“. Cf. IDEM. ibidem, p. 43.
[15] Acerca desses argumentos, vide GRAMSCI, ANTONIO.
La Conquista dello Stato(L’Ordine Nuovo, 12 de Julho de 1919), in : Antonio
Gramsci. Scritti Politici, Roma, 1967, pp. 218 e s.; IDEM. Lo Stato e il
Socialismo(L’Ordine Nuovo, 28 de Junho-5 de Julho de 1919), in : ibidem, pp.
210 e s.; IDEM. Socialisti e Anarchici(L’Ordine Nuovo, 20-27 de Setembro
de 1919), in : ibidem, pp. 237 e s.; IDEM. Quaderno del Carcere Nr. 19
(1928-1937) - Il Problema della Direzione Politica nella Formazione e nello
Sviluppo della Nazione e dello Stato Moderno in Italia, in : Antonio Gramsci.
Disgregazione Sociale e Rivoluzione. Scritti sul Mezzogiono, Napoli : Liguori
Editore, 1996, p. 188.; IDEM. Quaderni del Carcere (1928-1937) –
Passagio dalla Guerra Manovrata (e dall’Attacco Frontale) alla Guerra di
Posizione anche nel Campo Politico, in: : Antonio Gramsci. Scritti Politici,
Roma, 1967, pp. 821 e s. Sobre esse tema, vide, mais ainda mais detalhadamente,
o Capítulo III da presente investigação.
[16] Acerca do tema, vide BALIBAR, ETIENNE. Citoyen
Sujet. Réponse à la Question de Jean-Luc Nancy : Qui Vient Après le Sujet ?, in
: Cahiers Confrontations, Paris, Nr. 20, Hiver 1989, pp. 3 e s.; IDEM.
„Droit de L’Homme“ et „Droit du Citoyen“ : La Dialeticque Moderne de l’Égalité
et de la Liberté, in : Actuel Marx, Nr. 8, 1990, pp. 7 e s.
[17] Acerca do tema, vide BARCELONA, PIERO. L’Individualismo
Proprietario, Torino : Boringhieri, 1985, pp. 101 e s.
[18] Segundo os argumentos de Etienne Balibar : „Recolhendo
ensaios e intervenções desses últimos anos, inéditas ou surgidas nos diversos
jornais, revistas e obras coletivas, gostaria de convencer o leitor a conceder
direito de cidade, na França, às questões vivas da cidadania. Dir-se-ia que
elas se encontram entre as mais rebatidas, ao ponto de não ser mais
praticamente possível apresentar qualquer temática que seja, trate-se da
educação, da empresa ou dos serviços públicos, da responsabilidade dos eleitos
e dos costumes políticos, do movimento associativo ou das funções da cultura,
sem fazer intervir os adjetivos de „cívico“ e de „cidadão“. ... Assim, é de
considerar-se o problema dos fundamentos da obediência coletiva, ou da
aplicação dos princípios da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão nas
condições históricas novas, porém também o estatuto do estrangeiro na nação, ou
a articulação dos conflitos do mundo e da cidade com os desenvolvimentos
contemporâneos da antropologia e das artes plásticas“. Cf. BALIBAR, ETIENNE.
Droit de Cité. Culture et Politique en Démocratie, Paris : Editions
de l’Aube, 1998, p. 5
[19] Nesse sentido, vide tb. BALIBAR, ETIENNE. „Droit
de L’Homme“ et „Droit du Citoyen“ : La Dialeticque Moderne de l’Égalité et de
la Liberté, in : Actuel Marx, Nr. 8, 1990, pp. 7 e s.
[20] Cf. TOSEL, ANDRE. Democratie et Servitude : Un
Probleme Ouvert, in : La Démocratie Difficile. Actes du Colloque
Franco-Italien-Urbino, Mai-Octobre 1991, Paris VI : Diffusion Les Belles
Lettres, 1993, pp. 293 e 294.
[21] Cf. IDEM. ibidem, pp. 294.
[22] Cf. IDEM. ibidem, pp. retro-mencionadas.
[23] Cf. BALIBAR, ETIENNE. Droit de Cité. Culture et
Politique en Démocratie, Paris : Editions de l’Aube, 1998, pp.
retro-mencionadas.
[24] Cf. IDEM. Ibidem, pp. retro-referidas.
[25] Essa perspectiva político-estratégica, plenamente
contraditória do pensamento de Etienne Balibar, surge também
retratada nos raciocínios mais recentes de Antonio Negri, quando
assinala acerca da garantia da cidadania, dando relêvo às lutas sociais,
posicionadas em abandono das lutas proletárias : „Garantia de
Cidadania. Não existe maior ilusão entre aqueles que querem lutar contra o
Império sobre a base do Estado-Nação. É apenas movendo-se no interior do
Império que poderemos rebelar-nos. Para fazê-lo, é imprescindível entender que
o Império é um enorme ordenamento biopolítico, de produção de subjetividade. É
aqui, nesse terreno, dentro desses longos sendeiros, que se forma a oposição.
Em todos os sentidos. Não existe uma única linha que possa ser perseguida :
existem milhares e apenas se são milhares são eficazes. Trata-se de opor-se ao
Império, pedindo-lhe cidadania para todos, garantia de renda para todo cidadão,
Direito de emigração para todo homem, Direito para todo grupo produtivo de
apropriar-se não apenas de uma quota de riqueza, senão ainda de uma quota de
poder. Trata-se de colocar o Direito de cidadania na esfera mundial. Trata-se
de transformar a condição biopolítica da produção e da cooperação em força, em
biopoder a ser oposto àquele do capitalismo (e dos direitos humanos que esse
prescreve). Para empurrar o Império rumo à catástrofe, carece levá-lo a sério.
E, pois, rechaçar cada rito, mesmo aqueles da OTAN como os de Milosevic. Mutter
Courage ensina mais sobre o modo de resistir a essa guerra do que todas as
experiências de pacifismo dos séculos passados. Ou melhor, apenas a deserção
pode nos salvar. Lutas Sociais. Nos anos que passaram, estávamos
habituados a viver no ciclo da luta proletária. Os ciclos de luta pacifista
normalmente ligavam-se a ciclos de luta econômico-política. Agora, essa
ciclicidade não pode ser mais reconhecida. Entretanto, fios secretos mais
fortes ligam as grandes lutas dos anos 90, desde Tien An Men a Berlim, de Los
Angeles a Chiapas, de Paris a Seul : todas essas lutas repropõe um velho adágio
ainda válido : transformar a reorganização imperial em luta social. A guerra
social no Império é realizada movendo-se nos espaços. Não, não será certamente
no Palácio Chigi que reencontraremos o poder. Será indo o mais longe possível
dele. Recusando-se. Recusando obediência e produção. Insensíveis ao poder e a
todas as pompas. Fugindo sempre para impedir que a destruição e a corrupção
desmoronem sobre nós, a destruição da guerra e a corrupção desse poder
insensato. Construindo além de legitimidades, biopolíticas que destruam a
própria possibilidade do poder exprimir-se.“ Cf. NEGRI, ANTONIO. Il
Declino della Civiltà, in : Alias. Il Manifesto, Nr. 16, 17 de Abril de 1999.
[26] Vide, nesse sentido, TENDENZ SOZIALISTISCHE
DEMOCRATIE. These für eine Aktualisierung des Programms der
Arbeiterpartei(Tese para uma Atualização do Programa do Partido dos
Trabalhadores), in : INPREKORR. Internationale Pressekorrespondenz, Nr. 342,
April 2000, pp. retro-referidas.
[27] Cf. BALIBAR, ETIENNE. ibidem, p. 69.
[28] Cf. IDEM. ibidem, pp. retro-indicadas.
[1] Vide, acerca do
tema, WELMOVICKI, JOSÉ. O Discurso
da Cidadania e a Independência de Classe, in :
Marxismo Vivo. Revista do Koorkom, Nr. 1,
Junho/Setembro de 2000, pp. 66 e s.
[2] Cf. IDEM. ibidem, p. 66.
[3] Cf. IDEM. ibidem, p. 76. Aqui, entretanto, uma observação parece fazer-se necessária, sobretudo em relação ao título do artigo em referência „O Discurso da Cidadania e a Independência de Classe“. Existe um sentido diferenciado, nitidamente claro, na utilização das expressões „independência de classe“ e „independência da política e das organizações de classe“. A primeira expressão, „independência de classe“, apesar de ter-se generalizado amplamente no seio do movimento proletário do século XX, expressa, necessariamente, uma concepção confusa e equivocada, por incorporar uma lógica realista-construtivista, sendo que não é aquela adotada por Marx e Engels e preservada por Lênin e Trotsky. Tanto uns como outros falavam sempre, ou quase sempre, de „emancipação ou libertação de classe“, i.e. Emanzipation ou Befreiung der untedrückten Klasse. Em verdade, o proletariado não se encontra em relação de dependência em face da burguesia – de modo a convir falar-se de „independência de classe“, sendo que, pelo contrário, é a burguesia que dele depende para, em sentido material, seguir, historicamente, sobrevivendo enquanto classe exploradora e opressora. O proletariado situa-se, efetivamente, em relação de exploração e dominação em face da burguesia e encontra-se submetido, em princípio, à vigência das leis materiais do modo de produção capitalista, daí porque Marx e Engels consagraram a expressão „Emanzipation der unterdrückten Klasse“, tomando emprestado o termo em destaque: Emanzipation, do léxico latino : e-mancipare, de e-mancipatio, nas línguas neo-latinas, literalmente, desescravização ou deservidão de classe. No idioma materno de Marx e Engels, lexicalmente mais rudimentar do que o latim, ainda que incomensuravelmente mais flexível e conformável, utilizaram eles, alternativamente, quase sempre, o termo mais comum „Befreiung“, i.e. libertação, quando não pretendiam empregar a forma latinizada Emanzipation. De toda sorte, jamais falaram de“Unabhängigkeit der unterdrückten Klasse“ ou ainda „Klassenunabhängigkeit“ i.e. independência de classe ... Uma situação totalmente diferente é falar-se de „independência da política e das organizações de classe“, essa última expressão plenamente coerente com a doutrina marxista e utilizada amplamente por Marx e Engels, Lênin e Trotsky. Assim, a luta do proletariado é voltada, antes de tudo, para sua emancipação ou libertação de classe, sendo que, para tanto, é indispensável o impulsionamento de sua luta por sua independência política enquanto classe. É nesse último sentido que, em verdade, parece escrever, com precisão, Welmovicki, quando assinala, na conclusão de seu artigo em destaque : „A real situação dos trabalhadores demonstra, ao contrário, que para lutar por esses direitos mínimos, que qualquer cidadão mereceria ter, se necessita de uma organização independente dos trabalhadores contra a reação burguesa! Essa organização independente, política e sindical, pressupõe uma consciência de classe e uma ação classista. Do contrário não se travará a luta. A batalha contra o neoliberalismo hoje exige uma luta de classes sem trégua. ... “ Cf. IDEM. ibidem, pp. 76 e 77.