Texto de Autoria de
Portau Schmidt von Köln
Emil Asturig von
München
A Enfermidade
Gramsciana
no Movimento
Trotskysta Contemporâneo
e nas Lutas
de Emancipação do Proletariado
Polêmica
Trotsky e Gramsci : Gramsci e Trotsky
O SU-QI e a Corrente
Franco-Gramsciana
de Atualização,
Correção
e Superação do Marxismo
(O Meta-Marxismo de
Actuel Marx)
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No contexto do presente trabalho, resultou já assinalado que o
surgimento da corrente doutrinária meta-marxista franco-gramsciana de Actuel Marx é um fenomêno originariamente relacionado com a produção
teórica de certos intelectuais catedráticos franceses, vinculados, antes de
tudo, à Universidade
Sorbonne de Paris e ao Conselho Nacional da Pesquisa Científica da França (CNRS), advindos do Partido
Comunista Francês (PCF).
Essa é a razão pela qual é devido afirmar tratar-se tal corrente de um
fênomeno intelectual característico da intelligentsia marxiste académico-sorbonnarde da França de nossos dias.
Para o fomento e a propagação mundial do meta-marxismo
franco-gramsciano, i.e. da ambição de correção, completação, atualização, e,
finalmente, superação do marxismo, através do meta-marxismo ou marxismo-do-além, criou-se, nesse contexto, a Revista Actuel
Marx, em 1986, por iniciativa de Jacques Texier e Jacques
Bidet, contando seu Comitê de Redação com os membros do Secretariado Unificado da Quarta Internacional (SU-QI), Michaël
Löwy e Catherine Samary.
Sob a direção de Jacques
Texier e Jacques Bidet (literalmente : sous la direction de Jacques Texier
et Jacques Bidet), passou a ser editada a coleção
de livros Actuel Marx
Confrontation, em concurso com a Universidade de Paris X – Nanterre
(Sorbonne) e o Istituto Italiano per gli Studi Filosofici.
A estruturação ideológica da corrente doutrinária em exame,
impulsionadora da mais profunda desnaturação do marxismo, sob a máscara de uma
interpretação científico-catedrática atualizadora da doutrina de Marx e Engels, respalda-se, historicamente, nas principais publicações de
Jacques Texier acerca de Antonio
Gramsci, dadas ao público já a partir dos
anos 60, intituladas “Antonio
Gramsci”, de 1966, “Gramsci, o Teórico das Super-Estruturas”, de 1968, bem como nos livros de Jacques Bidet, intitulados "Que Fazer do Capital ?
Materiais para uma Refundação", de 1985,
e "Teoria da Modernidade,
Seguida de Marx e o Mercado", de 1990.[1][2]
O meta-marxismo franco-gramsciano de Actuel Marx, fundado, em
sentido lógico-doutrinário, no revisionismo gramsciano do marxismo, iria ao
longo de toda a década de 90, aproximar, influenciar, envolver e corromper,
teórica e politicamente, marcada e progressivamente, os mais expressivos
teóricos trotskystas da Ligue
Communiste Révolutionnaire (LCR), seção
francesa do Secretariado
Unificado da Quarta Internacional, e, finalmente, a própria direção do SU-QI.
Assim, é correto afirmar que os mais pronunciados ideólogos
meta-marxistas franco-gramscianos de Actuel
Marx, i.e. os mais representativos
atualizadores meta-marxistas, em sentido do franco-gramscismo, Jacques Texier e Jacques
Bidet, cristalizam, presentemente, em seus
textos as idéias essenciais, estruturadoras de todo o movimento
político-intelectual, impulsionado ao longo dos últimos anos e ainda nos dias
de hoje, que conduziu e conduz à crescente capitulação da direção do SU-QI à ideologia de correção e superação gramsciana do marxismo, i.e. à sua
atualização em sentido meta-marxista ou pós-moderno, tal como os próprios
ideólogos dessa corrente doutrinária peremptoriamente a afirmam e publicamente
a reivindicam.
Sobre a vertente temática, verifiquemos, pois, como Michaël Löwy, um dos mais acreditados dirigentes “trotskystas” do Secretariado
Unificado da Quarta Internacional (SU-QI), inteiramente prostado perante o meta-marxismo franco-gramiscista de Jacques Texier e Jacques Bidet, pronuncia-se, de modo inteiramente apologético, adulador,
místico, desonesto, infundado, estapafúrdio e lisonjeador, sobre “Antonio Gramsci : O Pensador
Heterodoxo”, propalando, assim, inauditamente,
o carbúnculo gramsciano no seio das lutas contemporâneas de emancipação do
proletariado, dissimulando, feito uma doença secreta idealista-subjetivista,
metafísica-voluntarista, o repúdio implacável de Gramsci ao materialismo
histórico-dialético, tal como defendidos por Marx, Engels, Lenin e Trotsky, para destacar, de modo deslocado, retorcido, embrulhão e unilateral,
simplesmente os contrastes existentes entre as posições inteiramente falsas de Gramsci e um suposto, fantástico, aleatório e genérico-abstrato “marxismo
positivista-estruturalista-cientifista-naturalista-determinista-mecanicista”, reivindicado, a uma só vez e a uma só voz, tanto por Plekhanov e Kautsky, como por Bukharin
e Stalin, tanto por Treves e Turati, como igualmente por Togliatti e Althusser ... no quadro de uma
polêmica aporética, travada exclusivamente entre decaídos revisionistas do
marxismo revolucionário.
Sob a pena
reputadamente doutoral de Löwy, o fiel
apologista de Stalin, Antonio
Gramsci, surge mesclado com o stalinista reciclado, György Lukács e indiferentemente embaralhado com o
ultra-esquerdista incorrigivelmente sectário – porém rompido não apenas com o
stalinismo, senão também com o trotskysmo – Karl Korsch, em um
único balaio de gatos. Se não vejamos :
”Entre as várias razões que estimularam a recepção de Gramsci no Brasil a partir dos anos 60, uma das mais importantes
foi sem dúvida o desejo de levantar a chapa de chumbo do positivismo, que
pesava com várias toneladas não só sobre a cultura "republicana"
brasileira desde o fim do século 19, mas também sobre a cultura política da
esquerda marxista.
Mais conjunturalmente, se tratava de encontrar pontos de apoio
político-filosóficos para resistir à
onda de marxo-positivismo estruturalista promovida por Althusser e seus discípulos, que vinha tendo grande impacto na
França e no Brasil. É nesse contexto que vários pensadores marxistas
brasileiros -- entre os quais Carlos
Nelson Coutinho tem um papel pioneiro -- vão começar a introduzir o
pensamento de Gramsci no Brasil, traduzindo
suas obras e utilizando seus conceitos para interpretar a realidade brasileira.
A obra de Antonio Gramsci
representa, com efeito, uma das tentativas mais radicais de libertar o marxismo da herança
cientificista e positivista que predominou na versão "ortodoxa", tanto da Segunda Internacional (Plekhanov,
Kautsky) como da Terceira (Bukharin, Stalin).
Na obra de juventude de Gramsci
(1916-19) a referência ao idealismo
hegeliano de Croce e Labriola ou ao voluntarismo ético de Bergson e Sorel é
essencialmente um meio para lutar contra a ortodoxia "científica" e o
determinismo economicista dos representantes oficiais do marxismo à cabeça do
movimento socialista italiano: Claudio
Treves e Filippo Turati.
Esse "bergsonismo"
de Gramsci, para citar um termo ambíguo utilizado com frequência por seus
adversários positivistas, será progressivamente superado
("aufgehoben") no curso de sua evolução política e filosófica como
dirigente comunista italiano.
O famoso artigo de 1917, celebrando a insurreição de outubro como "uma Revolução contra O
Capital", deve também ser visto nesse contexto, isto é, como uma
tentativa de romper com o que Gramsci
chamava "as escórias positivistas e
naturalistas" do marxismo.
Encarcerado pela polícia fascista em 1926, Gramsci
vai redigir na prisão, no curso dos anos 1929-35, uma série de notas sobre
temas filosóficos, políticos e culturais que constituem um dos pontos altos na história do pensamento crítico no século 20.
Ao definir o marxismo como filosofia da
práxis e como um método ao mesmo tempo radicalmente humanista e radicalmente
historicista, ele se situa num plano
infinitamente superior ao "diamat" (materialismo dialético) soviético
e suas inúmeras tentativas de "aplicação".
Isso também se traduz, no plano político, por
um "esfriamento", no curso dos anos 30, das relações entre Gramsci encarcerado e a direção do Partido Comunista Italiano (Palmiro
Togliatti).
O historicismo radical implica, antes de tudo, a negação de qualquer tentativa de interpretar a realidade social
segundo o método materialista científico-natural, buscando descobrir
"leis naturais" da sociedade que permitam "prever
cientificamente" o curso dos acontecimentos.
Ele exige também que o materialismo histórico
seja aplicado a si mesmo, definindo assim seus próprios limites
histórico-sociais. Segundo Gramsci,
compreender a historicidade do marxismo significa reconhecer que ele pode -- ou
melhor, deve -- ser superado pelo desenvolvimento histórico, com a passagem do
reino da necessidade ao reino da liberdade, da sociedade divida em classes à
sociedade (comunista) sem classes. Evidentemente, não é possível dizer, sem
cair no utopismo, qual será o conteúdo dessa nova forma de pensamento.
Isso também significa, inversamente, que,
enquanto vivemos num mundo dominado pelo capitalismo e pelas classes
exploradoras, o marxismo continua sendo a forma mais avançada de
ação/interpretação social.
Polemizando contra o historicismo, Louis
Althusser insistia que Marx era "um homem de ciência como os
outros", comparável, em seu terreno, a Lavoisier ou Galileu. Sem o dizer
de forma explícita, ele se opunha diretamente a uma tese de Gramsci, que escrevia: "Graziadei
[...] coloca Marx como unidade em uma série de grandes cientistas. Erro
fundamental: nenhum dos outros produziu uma concepção original e integral do
mundo".
Essa visão do mundo, a filosofia da práxis,
não pode ser decomposta em uma ciência positiva de um lado e uma ética do
outro: ela supera, em uma síntese dialética, a oposição tradicional entre
"fatos" e "valores", ser e dever-ser, conhecimento e ação,
teoria e prática.
Na sua tentativa de reconstrução do marxismo e do comunismo, Gramsci submete a uma crítica radical a
doutrina predominante na Terceira Internacional, que tem uma de suas
manifestações mais inteligentes no livro de Nikolai Bukharin sobre o materialismo histórico, o Manual Popular de Sociologia Marxista
(1922).
Trata-se, para o autor dos Cadernos, de uma
obra totalmente prisioneira de um conceito de ciência copiado das ciências
naturais -- segundo o princípio fixado pelo positivismo de que estas são a
única forma possível de ciência. O resultado é que a compreensão de Bukharin da história não é dialética,
mas inspirada por um "chato e vulgar evolucionismo" que pretende
fazer "previsões científicas" análogas às que buscam as
"ciências exatas".
É interessante observar que alguns anos antes Georg Lukács havia criticado o manual de Bukharin em termos bastante semelhantes na revista Archiv für die Geschichte des Sozialismus
und der Arbeiterbewegung (1925).
É muito pouco provável que Gramsci tivesse lido esse ensaio:
simplesmente os dois partilhavam uma mesma orientação filosófica,
historicista/dialética, humanista revolucionária e antipositivista, da qual
participavam também outros pensadores marxistas como Karl Korsch ou -- desconhecido na Europa -- o peruano José Carlos Mariátegui.
Gramsci praticamente não conhecia os
trabalhos de Lukács; e este último
só descobriu o marxista italiano a partir dos anos 60.
Mas, numa entrevista de julho de 1971 --
pouco antes de sua morte -- para a revista inglesa New Left Review, o filósofo húngaro reconhece que ele, Karl Korsch e Antonio Gramsci haviam tentado lutar, cada um à sua maneira, contra
o positivismo e o mecanicismo que o movimento comunista havia herdado da
Segunda Internacional.
Lukács acrescenta o seguinte comentário
retrospectivo: "Gramsci era o
melhor entre nós".”[3]
EDITORA DA ESCOLA DE AGITADORES E INSTRUTORES
“UNIVERSIDADE COMUNISTA REVOLUCIONÁRIA J. M. SVERDLOV”
PARA A FORMAÇÃO, ORGANIZAÇÃO E DIREÇÃO
MARXISTA-REVOLUCIONÁRIA
DO PROLETARIADO E SEUS ALIADOS OPRIMIDOS
MOSCOU – BUENOS AIRES - SÃO PAULO – PARIS
[1] Acerca do tema, vide,
mais precisamente, TEXIER, JACQUES.
Antonio Gramsci, Paris : Seghers, 1966, pp. 187 e s.; IDEM. Sur le Concept de la Société Civile. Gramsci Théoricien des
Superstructures, in : La Pensée, Paris, 1968, Nr. 139, pp. 35 e s.; IDEM. Gramsci : Nécessité et Créativité
Historique, in : La Nouvelle Critique, Paris, 1973, Nr. 69, pp. 61 e s.; IDEM. Gramsci Sort-Il du Purgatoire ou
Va-t-il en Enfer ?, in : ibidem, 1974, Nr. 76, pp. 33 e s.; IDEM. La Grande Défiguration d’Antonio
Gramsci, in : La France Nouvelle, Paris, 1.484, pp. 27 e s.; IDEM. Gramsci. La Philosophie et la
Politique dans le Texte, in : La Pensée, Paris, 1975, Nr. 181, pp. 116 e s.; IDEM. Gramsci, Togliatti et
d’Iguanodon. A Propos du Tome I des Ecrits Politiques d’A. Gramsci, in :La
Nouvelle Critique, Paris, 1975, Nr. 81, pp. 13 e s.; IDEM. La Spécificité du Matérialisme de Marx et la Critique du
Communisme Réformateur in: Materialismes. Raison Présente, Paris, 1978, Nr. 47,
pp. 85 e s.; IDEM. Rationalité selon
la Fin et Rationalité selon la Valeur dans Les Cahiers de la Prison, in :
Actuel Marx, Paris, 1988, Nr. 4, pp. 97 e s.; IDEM. Sur le Sens de „Société Civile“ chez Gramsci, in : Actuel
Marx, Paris, 1989, Nr. 5, pp. 50 e s.
[2] Nesse sentido, vide BIDET, JACQUES. Que Faire du Capital ?
Matériaux pour une Refondation, Paris : Klincksieck, 1985, pp. 7 e s.; IDEM.
Théorie de la Modernité. Suivi de Marx et le Marché, Paris : PUF, 1990, pp. 15
e s. No ano passado, surgiu, ainda, o seguinte livro de BIDET, JACQUES. Théorie Générale du Droit, de L’Economie et de la
Politique. Actuel Marx Confrontation, Paris : PUF, 1999, pp. 15 e s.
[3] Cf. LÖWY, MICHAËL. Antonio Gramsci : O Pensador Heterodoxo, in : Centro
de Mídia Independente Brasil, http://www.midiaindependente.org/pt/blue//2003/05/255549.shtml,
29 de Maio de 2003.