Texto de Autoria
de
Portau Schmidt
von Köln
A
Enfermidade Gramsciana
no
Movimento Trotskysta Contemporâneo
e nas
Lutas de Emancipação do Proletariado
Polêmica
Trotsky e Gramsci : Gramsci e Trotsky
O SU-QI e a
Corrente Franco-Gramsciana
de Atualização,
Correção
e Superação do
Marxismo
(O Meta-Marxismo
de Actuel Marx)
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Geral
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Reservando a possibilidade
de analisar mais adiante as implicações das citações de Gramsci aqui
apresentadas, indico, a seguir, sinteticamente, o que efetivamente escreveu e
expressamente doutrinou Gramsci, em seus Cadernos do Cárcere, sua obra maior e mais madura, elaborada
entre 1928 e 1937, acerca da doutrina marxista da Revolução Permanente, tal como defendida por Lev
Davidovitch Bronstein, Léon Trotsky:
“É necessário verificar se a famosa teoria de Bronstein
(i.e. de Trotsky) sobre a permanência do movimento (i.e. sobre a revolução
permanente) não é o reflexo político da teoria da guerra de manobra (recorde-se
a observação do General dos Cossacos Krasnov), em última análise o reflexo das
condições gerais-econômicas-culturais-sociais de um país em que os quadros da
vida nacional são embrionários e relaxados e não podem tornar-se “ trincheira
ou fortaleza ”.[1]
Nesse caso, poder-se-ia dizer que Bronstein, que aparece
como um “ocidentalista” era, pelo contrário, um cosmopolita, i.e.
superficialmente nacional e superficialmente ocidentalista ou europeu.
Ao invés disso, Ilitchi (i.e. Lenin) era profundamente
nacional e profundamente europeu.
Nas suas memórias, Bronstein recorda que lhe disseram que
sua teoria havia se demonstrado boa depois ... de quinze anos e responde ao
epigrama com um outro epigrama.[2]
Na realidade, a sua teoria, como tal, não era boa nem
quinze anos antes nem quinze anos depois : como ocorre com os obstinados,
acerca dos quais fala Guicciardini.[3]
Ele ( i.e. Trotsky ) adivinhou de grosso modo, i.e. teve
razão na previsão prática mais geral, tal como ao dizer-se que se está
predizendo que uma menina de quatro anos tornar-se-à mãe.
E, quando ela se torna mãe aos vinte anos, diz-se que “já
se o havia adivinhado”, não se recordando, porém, que, quando a menina tinha
quatro anos, queriam-na estuprar, seguros que haveria de se tornar mãe. ...
A teoria de Bronstein pode ser comparada àquela de certos
sindicalistas franceses acerca da greve geral e à teoria de Rosa(i.e. Rosa
Luxemburg), contida no opúsculo traduzido por Alessandri : o opúsculo de Rosa e a teoria de Rosa
influenciaram, de resto, os sindicalistas franceses como resulta de certos
artigos de Rosmer acerca da Alemanha, contidos em “Vie Ouvrière(Vida Operária)”
(primeira série em pequenos fascículos) : depende em parte também da teoria da
espontaneidade”. [4][5][6]
No mesmo diapasão,
Gramsci
procura invalidar a teoria da Revolução Permanente, tal como
desenvolvida por Trotsky, a partir da dogmática político-doutrinária de Josef
Stálin, escrevendo, nitidamente, acerca do tema, em seus Cadernos
do Cárcere :
„Diferenças entre a França, a Alemanha e a Itália no
processo de tomada do poder por parte da burguesia (e Inglaterra).
Na França, tem-se o processo mais rico de
desenvolvimentos e de elementos políticos ativos e positivos.
Na Alemanha, o processo desenrola-se, em alguns aspectos,
em formas que se assemelham àquelas italianas, em outros, àquelas inglesas.
Na Alemanha, o movimento de 1848 fracassa pela escassa
concentração burguesa (a palavra de ordem de tipo jacobino foi dada pela
extrema esquerda democrática : „revolução em permanência“) e porque a questão
da renovação estatal encontra-se entrelaçada com a questão nacional. ...(p.
215)
A propósito da palavra de ordem „jacobina“, formulada em
1948-49, deve-se estudar seu complicado destino.
Retomada, sistematizada, elaborada, intelectualizada pelo
grupo Parvus-Bronstein (obs.: Gramsci refere-se aqui a Parvus e Trotsky),
manifestou-se inerte e ineficaz em 1905 e, em seguida : tornou-se uma coisa
abstrata, de gabinete científico.
Pelo contrário, a corrente que a antagonizou nessa sua
manifestação literária (obs.: Gramsci alude aqui à corrente de Stálin), sem
empregá-la „de propósito“, aplicou-a, de fato, em uma forma aderente à história
atual, concreta, viva, adaptada ao tempo e ao lugar, como decorrente de todos
os poros da dada sociedade que era necessário transformar, como aliança de dois
grupos sociais, com hegemonia do grupo urbano(p. 217).“[7]
Esposando os
mesmíssimos argumentos, dogmaticamente condensados e plasmados para serem
lançados, sistematicamente, por burocrátas da classe trabalhadora contra as
concepções de Trotsky, Stálin escreveu, em Acerca
das Questões do Leninismo, anos antes da redação dos Cadernos
do Cárcere, da seguinte forma, de maneira, digamos assim, ainda
mais criativa e inovadora do que Gramsci, posto que o fez em 1926,
enquanto que Gramsci apenas a partir de 1930 :
“Lenin foi o único marxista que
entendeu e desenvolveu corretamente a idéia da Revolução Permanente.
Lenin diferencia-se nessa questão
dos “permanentistas”(i.e. dos trotskystas) pelo fato de que os “permanentistas”
deturpam a idéia marxista da Revolução Permanente, na medida em que a
transformam em uma sabedoria livresca sem vida, enquanto Lenin a toma em sua
forma pura, tornando-a um dos fundamentos de sua teoria da revolução.”[8]
Eis aí como,
segundo a apreciação de Gramsci, Stálin, antagonizando „a idéia da Revolução Permanente, na medida
em que a transformam em uma sabedoria livresca sem vida“, aplicou-a,
efetivamente, „em uma forma aderente à história
atual, concreta, viva, adaptada ao tempo e ao lugar, como decorrente de todos
os poros da dada sociedade que era necessário transformar, como aliança de dois
grupos sociais, com hegemonia do grupo urbano“, tendo em vista que Parvus
e Trotsky haviam a transformado em „uma
coisa abstrata, de gabinete científico“.
“A tendência de Léon Davidovitch (i.e. Trotsky) estava,
estreitamente, conectada com essa séria de problemas (i.e. relacionados com a
racionalização da produção e do trabalho), o que não parece ter sido colocado
bem à luz.
Seu conteúdo essencial, desse ponto de vista, consistia
na vontade “excessivamente” resoluta (portanto, não racionalizada) de dar
supremacia, na vida nacional, à indústria e aos métodos industriais, de
acelerar, com meios coercitivos exteriores, a disciplina e a ordem na produção,
de adequar os costumes às necessidades do trabalho.
Dada a colocação geral de todos os problemas conexos à
tendência, essa devia desembocar necessariamente em uma forma de bonapartismo,
daí a necessidade inexorável de destroncá-la (no original italiano :
stroncarla).
As suas preocupações eram justas, mas as soluções práticas
eram profundamente erradas : nesse desequilíbrio entre teoria e prática estava
inserido o perigo que, além disso, já havia se manifestado precedentemente, em
1921.
O princípio da coerção, direta e indireta, no ordenamento
da produção e do trabalho é justo, porém a forma que esse havia assumido era
errada : o modelo militar tinha se tornado um prejuízo funesto e os exércitos
de trabalho faliram.”[13]
Mais uma vez nessa
sede de seus Cadernos do Cárcere, Gramsci diverge, teórica e politicamente, não
apenas de Trotsky, senão ainda
de uma das principais orientações contidas no Programa da Oposição de Esquerda, em sua luta pela construção de um
socialismo internacionalista proletário-democrático na União Soviética e pela
derrubada impiedosa da burocracia stalinista.
Gramsci, com base em seus argumentos retro-apresentados, acusando
agora a oposição trotskysta de tendências bonapartistas, pretendeu legitimar
teoricamente a necessidade de seu aniquiliamento, de sua supressão, de sua
demolição, ou “da ruptura de seus troncos”
- para permanecer fiel à bastante sugestiva terminologia gramsciana -,
fundamentando, pelo contrário, a emergência e a consolidação do stalinismo
burocrático na União Soviética.
Como é possível
perceber diante de todo exposto, o trotskysmo distingue-se do gramscismo
diametralmente, na mesma proporção em que se distancia do stalinismo, já no que
tange à teoria da Revolução Permanente, já
no que concerne à concepção de internacionalismo, já no que
respeita às tarefas de construção do socialismo no Estado Soviético.
EDITORA DA ESCOLA DE AGITADORES E INSTRUTORES
“UNIVERSIDADE COMUNISTA REVOLUCIONÁRIA J. M. SVERDLOV”
PARA A FORMAÇÃO, ORGANIZAÇÃO E DIREÇÃO
MARXISTA-REVOLUCIONÁRIA
DO PROLETARIADO E SEUS ALIADOS OPRIMIDOS
MOSCOU – BUENOS AIRES - SÃO PAULO – PARIS
[1] Recorde-se
que Piotr Nikolaievitch Krasnov(1869-1947) foi o General Russo que, após ter atuado
na arena da I Guerra Mundial, sob ordens do czarismo,
colocou-se, uma vez vitoriosa a Grande
Revolução de Outubro,
a serviço dos imperialistas alemães, na Ucrânia. Depois
da derrota do Exército
Branco na guerra civil, Krasnov fugiu
para a Alemanha, onde escreveu sua mais célebre obra política de ataque aos bolcheviques, intitulada KRASNOV,
PIOTR N. Ot Dvuglavogo Orlá k Krasnomu Znameni(Da Águia Czarista ao Signo
Vermelho), in : Sobranie Satchinenii(Obras Recolhidas), Vol. I, New York, 1969, pp. 17 e s. Na II Guerra Mundial,
Krasnov colaborou, ativamente, com o Estado-Maior Nazista, sendo, por fim, executado em 1947, na União
Soviética.
[2] Trata-se aqui
de uma referência de Gramsci
a uma observação formulada por Anatoly Lunatcharky, no sentido
de que Trotsky se
haveria equivocado na contagem
dos anos relativamente à aplicação de sua concepção acerca da Revolução Permanente.
[3] Anote-se
que Francesco Guicciardini(1483-1540) foi um
renomado advogado italiano do século XVI, cidadão da República de Florença e
contemporâneo de Machiavel, nomeado governador de Módena pelo Papa
Leão X, na luta contra o Imperador Carlo V e a ocupação espanhola na
Itália. Sua obra mais expressiva é GUICCIARDINI,
FRANCESCO. Della Historia d’Italia, Venezia, 1580, pp. 11 e s.
[4] Gramsci refere-se aqui ao célebre opúsculo, traduzido do francês para o italiano por C. Alessandri,
de autoria de LUXEMBURG,
ROSA. Massenstreik, Partei und
Gewerkschaften(Greve de Massas, Partido e Sindicatos)(1906), in : Rosa Luxemburg Gesammelte Werke,
Vol. ½, Berlim, 1972, p. 21 e s. Em italiano : IDEM.
Lo Sciopero Generale. Il Partito e i Sindicati,
Milano : Società Editrice „Avanti
!“, 1919, pp. 5 e s. Expressando seu
juízo causticamente crítico
acerca dessa obra de Luxemburg,
Gramsci assinala, fundando-se
em seu inconfundível
e implacável enfoque
stalinista-burocrático : „A propósito
das confrontações entre os conceitos
de guerra manobrada e guerra de posição
na arte militar e tais respectivos conceitos na arte política, é de recordar-se o livreto de Rosa, traduzido em italiano, em 1919, por C. Alessandri(traduzido do francês). No livreto, são
teorizados, um pouco rapidamente e também
superficialmente, as experiências
históricas de 1905 : Rosa descurou,
com efeito, dos elementos „voluntários“
e organizativos que foram, naqueles eventos, mais difusos e eficientes do que Rosa fosse levada a crer, em virtude de seu
certo preconceito „economicista“
e espontaneísta. Todavia,
esse livreto (e outros ensaios do mesmo autor) é um dos documentos
mais significativos da teorização
da guerra manobrada, aplicada
à arte política.“ Cf. GRAMSCI, ANTONIO. Quaderni del Carcere, Nr.
13 (1928-1937) – A Proposito dei Confronti, in: Antonio Gramsci. Note sul
Machiavelli sulla Politica e sullo Stato Moderno, Torino : Editori Riuniti,
1991, p. 80.
[5] Assinale-se
que Alfred Rosmer(1877-1964) foi um renomado sindicalista,
membro ao Partido
Comunista da França. Após o IV. Congresso do Komintern,
Rosmer tornou-se um dos principais redatores de „L’Humanité“. Posteriormente,
em virtude de seus posicionamentos trotskystas, Rosmer acabou sendo expulso
do PCF
stalinizado.
[6] Cf.
GRAMSCI, ANTONIO. Quaderni del Carcere, Nr.
7 (1928-1937) - Guerra di Posizione e Guerra Manovrata o Frontale, in: Antonio
Gramsci. Note sul Machiavelli sulla Politica e sullo Stato Moderno, Torino :
Editori Riuniti, 1991, pp. 83, 84 e 85.
[7] Cf.
IDEM. Quaderni del Carcere, Nr. 19
(1928-1937) - Il Problema della Direzione Politica nella Formazione e nello Sviluppo
della Nazione e dello Stato Moderno in Italia(segundo
Giovanni Francioni o texto em referência teria
sido redigido, efetivamente, entre fevereiro de 1934 e fevereiro de
1935. Segundo Valentino Gerratana,
porém, entre fevereiro e março de 1930), in :
Antonio Gramsci. Disgregazione Sociale e Rivoluzione. Scritti sul Mezzogiono, Napoli : Liguori Editore, 1996, pp. retro-mencionadas.
[8] Cf.
STALIN, JOSEF W. Zu
den Fragen des Leninismus (Acerca das Questões do Leninismo)(25 de Janeiro de 1926), in : ibidem, Vol. VIII, p. 18.
[9] Vide CERRONI, UMBERTO. Gramsci-Lexikon
(Léxico - Gramsci) : Gedanken Gramsci (Pensamentos de Gramsci), Hamburg-Roma :
VSA-Riuniti, 1978, p. 44.
[10] Gramsci alude aqui, expressamente, ao escrito de STALIN, JOSEF W. Unterredung mit der Ersten Amerikanischen
Arbeiterdelegation (Conversação com a Primeira Delegação dos Trabalhadores
Norte-Americanos) (9 de Setembro de 1927), in : J.W. Stalin Werke, Vol. X, pp. 84
e s. Baseando-se essencialmente
nesse escrito de Stálin, Gramsci deu
desenvolvimento à sua concepção
subjetivista-idealista acerca
da conquista da hegemonia do proletariado
nos processos revolucionários. Acerca do tema, vide o item II.A.B da presente investigação.
[11] Cf. GRAMSCI, ANTONIO. Quaderni del Carcere, Nr. 14
(1928-1937) – Internacionalismo e Política Nacional, in : Antonio Gramsci. Note
sul Machiavelli sulla Politica e sullo Stato Moderno, Torino : Editori Riuniti,
1991, pp. 144 e 145.
[12] Cf. IDEM.
ibidem, p. 145.
[13] Cf. IDEM. Quaderni del Carcere, Nr.22 (1928-1933) – Razionalizzazione
della Produzione e del Lavoro, in : ibidem, p. 462.