À GUISA DE CONCLUSÃO

 

 

Texto de Autoria de

Portau Schmidt von Köln

 

A Enfermidade Gramsciana

no Movimento Trotskysta Contemporâneo

e nas Lutas de Emancipação do Proletariado

Polêmica Trotsky e Gramsci  : Gramsci e Trotsky 

O SU-QI e a Corrente Franco-Gramsciana

de Atualização, Correção

e Superação do Marxismo

(O Meta-Marxismo de Actuel Marx)

 

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http://www.scientific-socialism.de/SUCapa.htm 

 

 

Diante de todo o exposto no presente trabalho, importa esboçar, conclusivamente, uma caracterização analítica, ainda que breve, de índole precisamente marxista, acerca do presente perfil teórico-doutrinário, político-prático e estratégico-programático da direção do Secretariado Unificado da Quarta Internacional (SU-QI), no presente contexto que antecede, por poucos meses, a realização de seu XV Congresso Mundial.

Tal esboço de caracterização analítica, tal desenho de apreciação funcional, não ambiciona o presente texto desenvolver, nesta sede conclusiva, de maneira descritiva, declaratória, expositiva, na forma de um  delineamento algébrico de diagnóstico.

Pelo contrário, pretende-se aqui fornecer ao leitor instrumentos teóricos de valoração que lhe permita, segura e firmemente, formular seu próprio parecer acerca do SU-QI que, nas últimas décadas, percorrendo, regressivamente, um “caminho simétrico” àquele do Euro-Comunismo, já no curso dos anos 70, veio a desembocar, cada vez mais irreversivelmente, no caminho da capitulação à ideologia original que inspirou o próprio Euro-Comunismo, i.e. o caminho de capitulação ao gramiscismo, concebido esse último enquanto doutrina essencialmente renegadora do trotskysmo, revisionista e parasitária da tradição proletário-revolucionária marxista-leninista e mais sensivelmente adaptada aos preconceitos democrático-burgueses que dominam e oprimem as massas proletárias dos países capitalitas-imperialistas, e, adicionalmente, aquelas dos principais países situados na periferia da remundialização capitalista-imperialista.

Porém, uma questão impõe-se, desde logo : qual deve ser o justo padrão, a precisa medida, o rigoroso critério, a ser, validamente, utilizado por um lutador trotskysta para formular seu próprio parecer acerca do pefil político atual do SU-QI, fundando-se em uma base efetivamente marxista ?

Um referencial precisamente sólido para a elaboração de tal juízo analítico é suscetível de ser encontrado em posicionamentos apresentados precisamente por Marx e Engels, Lenin, Sverdlov e Trotsky.

Com efeito, Franz Mering publicou, pela primeira vez, em 1907, nas colunas do órgão oficial do Partido dos Trabalhadores Social-Democrático da Alemanha(SDAP), i.e. o Neue Zeit(Novo Tempo), uma importante carta de Karl Marx, datada de 5 de março de 1852, dirigida a Joseph Weydemeyer, esse último membro das Ligas dos Comunistas, participante da Revolução Alemã de 1848-49 e da Guerra da Secessão Norte-Americana de 1861-1865, bem como redator do Neue Deutsche Zeitung.

Na carta em referência, Marx formulou, precisamente, as seguintes extraordinárias caracterizações :

 

 

“No que me diz respeito, não me cabe o mérito de ter descoberto nem a existência das classes na sociedade moderna nem sua luta travada entre si.

Historiadores burgueses tinham, muito antes de mim, apresentado o desenvolvimento histórico dessa luta de classes e economistas burgueses, a anatomia econômica das classes.

O que eu fiz de novo foi :

1.   provar que a existência das classes está vinculada apenas a fases históricas determinadas ;

2.   que a luta de classes conduz necessariamente à Ditadura do Proletariado (i.e. no original alemão : Diktatur des Proletariats)  ;

3.   que essa mesma Ditadura forma apenas a transição rumo à abolição de todas as classes e à sociedade sem classes (i.e. no original alemão : Übergang zur Aufhebung aller Klassen und zu einer klassenlosen Gesellschaft).”[1]

 

Em valioso comentário a esse posicionamento retro-citado de Karl Marx, Lenin destacou, nitidamente, com grande perpicácia teórico-doutrinária :

 

“Com essas palavras(obs.: com as palavras de sua carta de 5 de março de 1852 a Weydemeyer, retro-referida), Marx logrou expressar, com extraordinário relevo, em primeiro lugar, a principal e fundamental diferença de sua doutrina em face da doutrina dos pensadores dominantes e mais profundos da burguesia e, em segundo lugar, a essência de sua doutrina acerca do Estado.

O essecial da doutrina de Marx seria a luta de classes.

Isso é dito e escrito muito freqüentemente.

Porém, isso é incorreto e, dessa incorreção, resulta, a todo momento, uma deturpação oportunista do marxismo, sua falsificação em um sentido que o torna aceitável para a burguesia.

Pois, a doutrina da luta de classes não é de Marx, mas sim foi antes dele criada pela burguesia e é, dizendo-se em geral, aceitável para a burguesia.

Quem apenas reconhece a luta de classes não é marxista, podendo ainda permanecer nos limites do pensamento burguês e da política burguesa.    

Limitar o marxismo à doutrina da luta de classes significa truncar o marxismo, deformá-lo, reduzí-lo àquilo que é aceitável para a burguesia.

Um marxista é apenas aquele que estende o reconhecimento da luta de classes ao reconhecimento da Ditadura do Proletariado.

Nisso, reside a mais profunda diferença do marxista em face do pequeno (e também do grande) burguês médio.

Essa tem de ser a prova de fogo para a verdadeira compreensão e reconhecimento do marxismo.

E não é de surpreender-se que, quando a história da Europa colocou a classe trabalhadora praticamente diante dessa questão, não apenas todos os oportunistas e reformistas, senão ainda todos os “kautskyanos” (gente que oscila entre o reformismo e o marxismo) demonstraram-se como implacáveis filisteus e democrátas pequeno-burgueses, que rejeitam a Ditadura do Proletariado.

A brochura “A Ditadura do Proletariado”, que surgiu em agosto de 1918, i.e. muito depois da primeira edição do presente livro(obs.: Lenin refere-se aqui à primeira publicação de “O Estado e A Revolução”, de agosto de 1917) é uma obra de arte de deturpação pequeno-burguesa do marxismo, com reconhecimento hipócrita do marxismo em palavras (vide minha brochura “A Revolução Proletária e o Renegado Kautsky”, Petrogrado e Moscou, 1918). ...    

O oportunismo detém-se no reconhecimento da luta de classes precisamente diante do mais importante, diante do período de transição do capitalismo para o comunismo, diante do período de derrubada da burguesia e de sua total aniquilação.

Na realidade, esse período é inevitavelmente um período de luta de classes, incomensuravelmente amargas, com formas dessa luta inauditamente agudas e, conseqüentemente, também o Estado desse período tem de ser, inevitavelmente, democraticamente de novo tipo, ditatorialmente de novo tipo(contra a burguesia).

Mais ainda : a essência da doutrina marxista do Estado entendeu apenas quem logrou compreender que a Ditadura de uma classe é necessária não apenas para a sociedade de classes, não apenas para o proletariado, que derrubou a burguesia, senão também para todo um período histórico, que separa o capitalismo da “sociedade sem classes”, do comunismo.

As formas dos Estados Burgueses são extraordinariamente variadas, sua essência é, porém, uma e a mesma : todos esses Estados podem ser desse ou daquele jeito, porém, em última instância, são, incondicionalmente, uma Ditadura da Burguesia.

A transição do capitalismo para o comunismo deve, naturalmente, produzir uma série e uma variedade monstruosa de formas políticas, porém o essencial nisso será, irrestritamente : a Ditadura do Proletariado.”[2]

           

Eis, portanto, nessas citações de Marx e de Lenin  o justo padrão, a precisa medida, o rigoroso critério, a ser, validamente, utilizado por um lutador trotskysta para formular seu próprio parecer acerca do pefil político atual do SU-QI, fundando-se em uma base efetivamente marxista.

Na introdução ao presente trabalho, foi assinalado que os principais dirigentes políticos e os mais influentes intelectuais do Secretariado Unificado da Quarta Internacional (SU-QI), caminham, regressivamente, no sentido da mais plena deformação e abdicação da herança marxista-revolucionária consubstanciada nos quatro primeiros congressos da Internacional Comunista, bem como nos documentos fundacionais da IV Internacional.

No quadro da presente investigação, foram apresentadas ao leitor, crítica e expositivamente, as premissas lógicas e as expressões políticas mais salientes, segundo as quais as principais forças dirigentes do Secretariado Unificado da Quarta Internacional (SU-QI), desnaturam e refutam, nos dias de hoje, ostensivamente, as experiências histórico-revolucionárias mais sólidas da classe trabalhadora e as concepções socialistas-revolucionárias proletárias mais basilares que dão sustentação às posições doutrinárias de Marx e Engels, Lenin, Sverdlov e Trotsky, mediante alegações falaciosas de que o socialismo poder ser alcançado através da fase transitória da Democracia Socialista, e não da Ditadura Revolucionária do Proletariado.

Assim, cumpre indagar : seguiria sendo correto qualificar, em sentido teórico-político, a direção do SU-QI da atualidade como essencialmente marxista ou, mais apropriadamente, para dar-se aplicação ao seguro parâmetro de análise de Marx e Lenin, retro-apresentado, considerá-la, em verdade, como protagonista da deturpação e da falsificação pequeno-burguesa-oportunista do marxismo nos dias de hoje, em virtude de, seguir reconhecendo, em palavras, às lutas de emancipação dos trabalhadores e demais socialmente oprimidos, renegando, porém, a Ditadura Revolucionária do Proletariado, incorporadora da mais ampla e historicamente superior Soberania proletária, enquanto período indispensável de transição do capitalismo para a sociedade sem classes e sem Estado  ?  

Cabe ao leitor elaborar seu parecer acerca dessa indagação com isenção de ânimos.

No que lhe diz respeito, o presente texto esforçou-se por demonstrar que o SU-QI, em seu atual momento histórico-existencial, encontra-se inconfundivelmente marcado por sua expressiva decomposição em face da enfermidade gramsciana, transmitida às suas abordagens lógico-políticas, sobretudo, por sua desbragada e impudente colaboração intelectual-doutrinária, político-organizativa e estratégico-programática com os mais renomados e expressivos ideólogos do meta-marxismo franco-gramsciano de Actuel Marx, do Partido Comunista Francês(PCF) e dos Espaces Marx Réseau International. Pour Une Construction Citoyenne du Monde.  

Tal como assinalado, os ideólogos do SU-QI, entre eles, em primeira linha, Michaël Löwy, Daniel Bensaïd, Catherine Samary, François Vercammen e Lívio Maitan, fundados em seu amplo e descomedido colaboracionismo „trotskysta-gramsciano“, com os mais expressivos doutrinadores franco-gramscianos meta-marxistas de Actuel Marx, do Partido Comunista Francês(PCF) e dos Espaces Marx Réseau International Pour Une Construction Citoyenne du Monde, afirmam estar traçando o sendeiro da luta em prol da “Democracia Socialista enquanto pressuposto e condição para a transição rumo a uma sociedade realmente comunista”.

Com efeito, o leitor foi informado acerca da maneira segundo a qual a direção do SU-QI, através de „um pequeno escorregão“, abandonou, a defesa da Ditadura Revolucionária do Proletariado em troca das vicissitudes da luta em favor da Democracia Socialista.

Essa última luta político-estratégica já vem sendo, ativamente, impulsionada, programaticamente, pela direção do SU-QI e de suas principais seções nacionais, como demonstrado anteriormente, mediante o afoito fomento dos orçamentos participativos e da denodada luta pela conquista da hegemonia do proletariado, na versão idealista-subjetivista gramsciana(-crociana), como forma de lograr transformar e enfraquecer o Estado Burguês, através ainda de seus audazes clamores levantados em prol da intervenção e permanência das tropas da ONU no Timor do Leste, como meio de apoiar o direito de auto-determinação das nações oprimidas, por intermédio, além disso, da intrépida defesa do Impôsto Tobin, na forma de instrumento financeiro-tributário apto a abrir uma brecha democrática na ditadura dos mercados capitalistas mundiais e ampliar a a democracia cidadã, bem como por meio da aplicação do critério da cidadania – em troca do critério classista de emancipação do proletariado -, visando a democratizar radicalmente a sociedade civil  burguesa e o Estado Burguês, ascendendo, assim, dessa forma, quimericamente, ao socialismo.  

Os resultados do atual perfil político do Secretariado Unificado da Quarta Internacional (SU-QI) já se fazem sentir na prática das lutas objetivas de libertação do proletariado, travadas nos mais diversos países do mundo.

É, nesse quadro, que o presente trabalho se despede do leitor, reproduzindo-lhe os elementos mais comprobatórios da temática concernente à intrigante questão : Para onde foi e para onde vai a atual direção do SU-QI : um pequeno “escorregão” da Ditadura do Proletariado à Democracia Socialista.

 

 

Schmidt von Köln

Emil Asturig von München

Novembro de 2000

 

 

EDITORA DA ESCOLA DE AGITADORES E INSTRUTORES

“UNIVERSIDADE COMUNISTA REVOLUCIONÁRIA J. M. SVERDLOV”

PARA A FORMAÇÃO, ORGANIZAÇÃO E DIREÇÃO MARXISTA-REVOLUCIONÁRIA

DO PROLETARIADO E SEUS ALIADOS OPRIMIDOS

MOSCOU – BUENOS AIRES - SÃO PAULO – PARIS

 

 

 

 



[1] Cf. MARX, KARL Brief an J. Weydemeyer (Carta à J. Weydemeyer)(5 de Março de 1852), in : Marx und Engels Werke (Obras de Marx e Engels), Berlim, 1962, Vol. XXVIII, pp. 507 e 508.

[2] Cf. LENIN, VLADIMIR I. Gosudarstvo i Revolutsia. Utchenie Marksisma o Gosudarstve i Zadatchi Proletariata v Revoliutsi (Estado e Revolução. A Doutrina do Marxismo sobre o Estado e as Tarefas do Proletariado na Revolução) (1917), Moscou, 1989, especialmente Cap. 2.3 : A Colocação do Problema por Marx no Ano de 1852, pp. 34, 35 e 36.