90 ANOS DA REVOLUÇÃO SOCIALISTA
PROLETÁRIA RUSSA DE OUTUBRO DE 1917
MORAL E CONSCIÊNCIA, ORGANIZAÇÃO E DIREÇÃO DAS LUTAS REVOLUCIONÁRIAS
DE EMANCIPAÇÃO PROLETÁRIO-SOCIALISTA
TEXTOS DE CÉLEBRES DIRIGENTES BOLCHEVIQUES SOBRE J. M. SVERDLOV
LENIN E
SVERDLOV
Nos Dias de Abril
NADEJDA K. KRUPSKAYA[1]
Concepção e Organização, Compilação e
Tradução Asturig Emil von München
Novembro de 2003 emilvonmuenchen@web.de
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As massas de Petrogrado –
trabalhadores, soldados, marinheiros – vieram dar as boas vindas ao seu
dirigente.
Lá estavam muitos de nossos
companheiros mais próximos.
Entre eles, encontrava-se Tchugurin, um estudante da Escola de Longjumeau, ostentando um
amplo curativo vermelho que cruzava suas costas. Seu rosto estava húmido de lágrimas.
Achávamo-nos no meio de um
incontrolável mar de pessoas.
Quem jamais viveu uma revolução
não poderá imaginar seu encanto grandioso e solene.
As bandeiras vermelhas, a
guarda de honra dos Marinheiros de
Kronstadt, os refletores da Fortaleza
de Pedro e Paulo, iluminando o caminho da Estação Ferroviária Finliandsky ao Palácio Kshessinskaya, os tanques blindados, as filas de
trabalhadores e trabalhadoras, todos escoltavam o percurso a ser trilhado.
Enquanto isso, os então
representantes oficiais do Soviete dos
Deputados Trabalhadores e Soldados de Petrogrado, Tchkheidze e Skobelev vieram ao nosso encontro, na Estação Ferroviária Finliandsky.
Os companheiros presentes
conduziram, então, Vladimir Ilitch
Lenin à Sala de Espera
Imperial, onde Tchkheidze e
Skobelev encontravam-se
aguardando.
Quando Ilitch desembarcou na plataforma, dele aproximou-se um capitão,
tomou posição de sentido e informou-lhe alguma coisa qualquer.
Embaraçado por ter sido
apanhado um pouco de surpresa, retribuiu a continência.
Na plataforma, encontrava-se um
guarda de honra diante do qual levaram a que Ilitch e toda a nossa irmandade da emigração desfilassem.
A seguir, sentamo-nos em um
automóvel, enquanto Ilitch era
colocado em cima de um tanque blindado.
Todos nós fomos, então,
conduzidos ao Palácio Kshessinskaya.
“ - Salve a Revolução
Socialista Mundial !”, gritou Ilitch, em meio à multidão de centenas de
milhares de pessoas que nos circundavam.
Ele já havia pressentido o
início dessa revolução, em toda a sua essência.
Levaram-nos ao Palácio Kshessinskaya onde
encontravam-se outrora instalados tanto o Comitê Central do Partido como o Comitê de Petrogrado.
Na parte superior do prédio,
foi organizada uma comemoração de camaradagem, brindada à chá.
Os companheiros de Petrogrado possuíam a intenção de
organizar pronunciamentos e discursos de saudações.
Porém, Ilitch redirecionou a conversa para aquilo que lhe interessava
mais do que tudo naquele momento.
Passou a exprimir-se acerca da
tática que haveria de ser sustentada.
Em torno do Palácio Kshessinskaya, encontravam-se,
porém, multidões de trabalhadores e soldados.
Ilitch viu-se obrigado, então, a discursar, a partir da sacada.
As impressões advindas dessa
sua intervenção, bem como o entusiasmo revolucionário que daí emergiu,
obscureceram todo o restante.
Depois, fomos para casa, i.e.
para a casa dos nossos parentes, casa de Ana
Ilinishna e Mark
Timofeievitch.
Com eles, vivia também Maria Ilitchna.
Habitavam na Rua Shirokaya, do lado de cá de Petrogrado.
Concederam-nos um quarto
separado.
Por ocasião de nossa chegada, a
pequena Gora que crescera
junto à Ana Ilinishna pendurou
sobre ambas as nossas camas um quadro com a consigna :
“Proletários de todo o
mundo, uni-vos!”
Quase não conversarmos com Ilitch naquela noite : praticamente não
existiam palavras que pudessem expressar o que havíamos vivenciado.
Porém, mesmo sem palavras, tudo
estava sendo bem compreendido.
Encontrávam-nos em um momento
em que não se poderia perder nem um único minuto sequer.
No dia seguinte, mal tendo Ilitch se levantado da cama, vieram
encontrá-lo alguns companheiros.
Ilitch e Zinoviev dirigiram-se,
em seguida, ao Comitê Executivo do
Soviete de Petrogrado, a fim de lá apresentarem um informe acerca de
sua viagem pela Alemanha.
De lá, Ilitch dirigiu-se à reunião dos bolcheviques, membros da Conferência dos Sovietes dos Deputados
Trabalhadores e Soldados de Toda a Rússia.
Essa reunião transcorreu no Palácio Tauride, em algum lugar de
sua parte superior.
Em suas Dez Teses de Abril, Lenin apresentou seu ponto de vista sobre o
que era necessário ser feito naquele momento.
Nelas, formulou uma apreciação
acerca da situação, bem como assinalou, clara e nitidamente, os objetivos a
serem perseguidos e o caminho a ser percorrido, a fim de ser possível
atingí-los.
Nos minutos subseqüentes,
nossos companheiros ficaram, de algum modo, desorientados.
Muitos declararam que Lenin estava colocando a questão de
modo muito cortante, sendo ainda cedo para falar de Revolução Socialista.
Na parte de baixo do prédio,
tinha lugar uma reunião dos mencheviques.
Um companheiro que de lá viera,
começou a insistir no fato de que Lenin
devia apresentar esse seu mesmíssimo informe em uma reunião conjunta
que contasse com a presença de delegados mencheviques e bolcheviques.
A reunião dos bolcheviques
decidiu, então, que cumpriria a Lenin
repetir seu informe na reunião conjunta em tela, que viria a ser presenciada
por todos os sociais-democratas.
E assim procedeu Lenin.
A reunião conjunta em tela transcorreu,
então, na parte inferior do prédio, na Grande
Sala do Palácio Tauride.
Em primeiro lugar, recordo que
a primeira coisa que saltou aos olhos foi o assento de Goldenberg (Meshkovsky) na presidência da reunião.
Na Revolução de 1905, Goldenberg
havia sido um bolchevique convicto, um dos nossos mais próximos
companheiros de luta.
Agora, encontrava-se seguindo
as pegadas de Plekhanov,
tornara-se defensista.
Lenin discursou por cerca de duas (2) horas.
Contra ele, interviu, então, Goldenberg.
Fê-lo de modo extremamente
áspero, afirmando que Lenin havia
eriçado a bandeira da Guerra Civil,
em meio à Democracia Revolucionária.
Tornou-se visível quão longe
haviam-se separado os caminhos de ambos.
Ainda me recordo também do
discurso de Kollontai, intervindo
candentemente em defesa das Dez Teses
de Lenin.
Em seu jornal “Edinstvo (A Unidade)”, Plekhanov qualificou
as Teses de Lenin de “delírios”.
Em 7 de abril, i.e. três dias
após a reunião em tela, as Teses de
Abril de Lenin foram publicadas no “Pravda (A Verdade)”.
Transcorrido mais um dia,
surgiu, no mesmo “Pravda (A Verdade)”,
o artigo de Kamenev,
intitulado “Nossas Divergências”, o
qual se divorciava das teses leninistas.
No artigo de Kamenev, alegava-se que as Teses de Lenin expressavam exclusivamente
sua opinião particular, sendo que nem o “Pravda
(A Verdade)” nem o Bureau do
Comitê Central do Partido as esposavam.
Kamenev declarou que o “Pravda (A
Verdade)” permaneceria defendendo suas posições anteriores.
Teve início, então, uma luta no
interior da organização bolchevique.
Porém, esta não se prolongou
durante muito tempo.
Na semana a seguir, ocorreu a Conferência dos Bolcheviques de Toda a
Cidade de Petrogrado que assegurou a vitória ao ponto de vista
defendido por Lenin.
A conferência em tela
prolongou-se, em verdade, por oito (8) dias – i.e. de 14 a 22 de abril.
Ao longo de todos esses dias,
processou-se uma série de grandiosos eventos que demonstraram o quanto Lenin se achava correto.
Em 7 de abril, dia em que foram
publicadas as Dez Teses de Lenin,
o Comitê Executivo do Soviete de
Petrogrado havia votado ainda a favor dos “Créditos da Liberdade”.
Nos jornais burgueses e nos
jornais defensistas, deu-se início a uma furiosa campanha contra Lenin e os bolcheviques.
Ninguém se preocupava com as
declarações de Kamenev.
Todos sabiam que, no interior
da organização bolchevique, os círculos dirigentes adotariam o ponto de vista
leninista.
A campanha deflagrada contra Lenin contribui para a rápida
popularização de suas teses.
Com efeito, Lenin qualificou a guerra em curso
de Guerra Imperialista, Guerra de
Pilhagem.
Todos viam que se posicionava,
seriamente, a favor da paz.
Seu posicionamento agitava os
marinheiros, os soldados e todos aqueles para os quais a questão da guerra era
uma questão de vida ou morte.
Em 10 de abril, Lenin discursou para o Regimento Izmailovsky.
Em 15, começou a ser publicado
o jornal “Soldatskaia Pravda (A
Verdade dos Soldados)”.
Já em 16, os soldados e os
marinheiros de Petrogrado organizaram
uma manifestação contra a campanha movida em prejuízo de Lenin e dos bolcheviques.
Então, em 18 de abril (1° de
Maio), teve lugar um grandioso ato de Primeiro
de Maio por toda a Rússia,
o qual jamais fora visto antes.
Ainda nesse mesmo dia 18, Miliukov, Ministro das Relações Exteriores, promulgou
uma declaração, em nome do Governo
Provisório, em que resultava inequívoco o fato de quererem levar a
guerra para adiante até à vitória final, por seu governo considerar
imprescindível dar cumprimento a todos os compromissos, assumidos com os países
aliados.
O que fizeram, então, os
bolcheviques ?
Os bolcheviques clarificaram,
na imprensa, quais eram precisamente esses compromissos.
Demonstraram que o Governo Provisório prometera, na
verdade, cumprir compromissos, contraídos pelo Governo de Nicolau II e por toda a camarilha czarista.
Revelaram que tais compromissos
haviam sido contraídos perante a burguesia.
Quando isso se tornou claro
para as massas populares, saíram às ruas. Em 21 de abril, organizaram uma
manifestação na Avenida Nevsky.
Também os adeptos do Governo Provisório organizaram uma
contra-manifestação, nessa mesma avenida.
Todos esses eventos unificaram
os bolcheviques.
As resoluções da organização
bolchevique de Petrogrado foram
adotadas no espírito leninista.
Em 21 e 22 de abril, o Comitê Central do Partido acolheu
resoluções que claramente indicavam a necessidade de desmascarar o Governo Provisório, condenando a
tática conciliacionista do Soviete de
Petrogrado, clamando por uma nova eleição dos deputados trabalhadores e
soldados, pelo fortalecimento dos sovietes, exortando ao impulsionamento de um
amplo trabalho de clarificação, apontando, ao mesmo tempo, que as tentativas
imediatas voltadas à derrubada do Governo
Provisório eram prematuras.
Assim, no momento da abertura
da Conferência de Toda a Rússia,
i.e. em 24 de abril, i.e. três semanas depois de que Lenin divulgou suas Dez
Teses de Abril, já houvera sido atingida a unidade nas filerias dos
bolcheviques.
Após minha chegada a Petrogrado, pouco passei a
avistar-me com Ilitch.
Ele trabalhava no Comitê Central do Partido, no “Pravda (A Verdade)”, e fazia
viagens, para intervir nas reuniões.
Quanto a mim, fui trabalhar na Secretaria do Comitê Central,
situada no Palácio
Kshessinskaya, porém, nesse local, minhas atividades não mais eram
semelhantes àquele trabalho secretarial que efetuara no exterior e mesmo
àquelas atividades organizativas que realizei entre 1905 e 1907, quando foi
necessário, sob as diretivas de Lenin, impulsionar, de modo autônomo,
um trabalho consideravelmente grande.
Agora, Helena D. Stassova era a secretária.
Sob sua responsabilidade, situava-se uma equipe de
militantes assistentes, ocupados do trabalho técnico.
Fui encarregada de manter conversações com quadros do
Partido que vinham até nós, considerando-se que ainda pouco conhecia as
atividades locais.
Freqüentemente vinham até nós, porém, membros do Comitê
Central do Partido, e, entre eles, com a mais extrema
freqüência, Jakob Mikhailovitch Sverdlov.
Eu mesma não dispunha de informações efetivas e muito me
incomodava o fato de não ter, então, funções definidas a executar.
Em compensação, sorvia, sequiosamente, a vida
circunstante.
As ruas ofereciam-nos, então,
um interessante espetáculo : por toda a parte, reuniam-se pessoas nos pequenos
cruzamentos, por toda a parte, nesses cruzamentos, ocorriam vibrantes
discussões a respeito do momento em curso, acerca dos acontecimentos em fluxo.
Costumava dirigir-me ao
encontro da multidão e escutar.
Certa vez, levei três horas
para ir da Rua Shirakaya até
ao Palácio
Kshessinskaya, por serem tão interessantes essas assembléias de rua.
Em frente da nossa habitação, existia um desses pátios e
eis que, ao abrir-se a janela durante a noite, fervorosas discussões podiam ser
escutadas.
Um soldado estaria sentado por ali e, em volta dele,
sempre alguns cozinheiros, empregadas das casas vizinhas, alguns jovens.
A uma hora da manhã, era
possível agarrar-se palavras soltas: os bolcheviques isso, os mencheviques
aquilo ...
Às três da madrugada, Miliukov isso, os bolcheviques
aquilo.
Às cinco da manhã, também todo
aquele debate de assembléia, dedicado à política.
Presentemente, as “Noites Claras” de Petrogrado encontram-se
sempre associadas, em minha mente, àqueles debates, travados em assembléias
durante toda a noite. (...)
EDITORA DA ESCOLA DE AGITADORES E INSTRUTORES
“UNIVERSIDADE COMUNISTA REVOLUCIONÁRIA J. M. SVERDLOV”
PARA A FORMAÇÃO, ORGANIZAÇÃO E DIREÇÃO
MARXISTA-REVOLUCIONÁRIA
DO PROLETARIADO E SEUS ALIADOS OPRIMIDOS
MOSCOU - SÃO PAULO - MUNIQUE – PARIS
[1] Cf. KRUPSKAYA, NADEJDA KONSTANTINOVNA. Vospominania
o Lenine (Recordações de Lenin), Vypusk II (Parte II), Moscou-Leningrado :
Gosudarstvennoe Izdatelstvo, 1931, pp. 184 e s