90 ANOS DA
REVOLUÇÃO SOCIALISTA PROLETÁRIA RUSSA DE OUTUBRO DE 1917
MORAL E CONSCIÊNCIA, ORGANIZAÇÃO E
DIREÇÃO DAS LUTAS REVOLUCIONÁRIAS
DE EMANCIPAÇÃO
PROLETÁRIO-SOCIALISTA
TEXTOS DE CÉLEBRES
DIRIGENTES BOLCHEVIQUES SOBRE J. M. SVERDLOV
LENIN E SVERDLOV
Em
Face da Assembléia Constituinte
NADEJDA
K. KRUPSKAYA[1]
Concepção e Organização, Compilação e Tradução Asturig Emil von München,
Agosto de 2004 emilvonmuenchen@web.de
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Tornara-se cada vez
mais claro que uma luta encarniçada irromperia em torno da questão da Assembléia
Constituinte.
A fração bolchevique,
ocupado com o tema em realce, começou a sentir as vacilações e o clima de instabilidade,
vindos dos setores da direita.
Em 24 de dezembro,
ocorreu, então, uma reunião do Comitê Central do Partido que se
dedicou a essa questão.
Decidiu-se, ali, que
um informe do Comitê Central seria transmitido à fração bolchevique da Assembléia
Constituinte, devendo serem elaboradas teses acerca da matéria.
Lenin foi encarregado de ambas essas tarefas.
Depois de haver
formulado as teses, apresentou, já no dia seguinte, um relatório referente ao
tema, no Smolny, em uma reunião da fração bolchevique da Assembléia
Constituinte.
Suas teses foram
unanimemente sufragadas e publicadas no Pravda, no curso do dia subseqüente.
As Teses
sobre a Assembléia Constituinte, tais quais formuladas por Lenin,
levantavam a exigência clara de reconhecimento do Governo Soviético e da
política revolucionária que vinha impulsionando nas questões relacionadas com a
paz, a terra, a inspeção operária e a luta dirigida, visando ao esmagamento da
contra-revolução.
A abertura da Assembléia
Constituinte havia sido fixada para ocorrer em 18 de janeiro de 1918.
As preparações que o
Partido vinha realizando, com tanto cuidado e profundidade, sob a direção de Lenin,
representaram uma fase muito importante para a consolidação do Poder
Soviético.
Expressava a luta
contra a democracia burguesa formal, em prol de uma genuína democracia, capaz
de capacitar as massas trabalhadoras a desenvolverem imensas atividades
revolucionárias, em todos os campos do trabalho de construção socialista.
As atividades
realizadas, visando à convocação da Assembléia Constituinte,
demonstraram como haviam sido gradativamente criadas profundas raízes entre as
massas proletárias, conquistando-se o seu apoio, organizando-se-as para a luta,
auxiliando-se os quadros dos Sovietes e do Partido a estabelecerem
com elas laços sólidos e estreitos.
Uma grande quantidade
de coisas ainda restava por ser feita na trilha da organização dos preparativos
e da realização da Assembléia Constituinte.
Com efeito, os socialistas-revolucionários
(SRs.) de direita pressionavam em favor da deflagração de uma luta
contra os bolcheviques.
Os adeptos de sua ala
de extrema direita haviam criado uma organização militar que empreendera, em 1°
de janeiro de 1918, um atentado frustado contra a vida de Lenin.
A organização em
referência realizou também ativas preparatórias, com vistas ao desencadeamento
de uma revolta armada, planejada para ocorrer em 18 de janeiro de
1918, por ocasião da sessão inaugural da Assembléia Constituinte.
Embora o Comitê
Central do Partido Socialista-Revolucionário (SRs.) não apoiasse
oficialmente referida organização militar, estava ciente de suas atividades,
cerrando-lhes os olhos.
A organização militar
em tela associou-se, então, à Liga de Defesa da Assembléia
Constituinte, cujo objetivo era coordenar as atividades de todas
organizações anti-bolcheviques.
A aludida Liga
de Defesa era composta por socialistas-revolucionários (SRs.) de
extrema direita, mencheviques-defensistas, socialistas-populares e certos constitucionalistas-democratas
(cadetes).
Embora desenvolvesse
intensa atividade político-militar, essa Liga de Defesa não conseguiu
arrastar para o seu lado nem os trabalhadores nem a guarnição de Petrogrado.
Assim, a manifestação
de 18
de janeiro de 1918 foi um ato inteiramente limitado.
Nada obstante, rumores
estavam sendo amplamente disseminados na cidade no sentido de que uma revolta
armada estava sendo preparada.
D’outro lado, os
bolcheviques prepararam-se para enfrentá-la.
A Assembléia Constituinte havia
de reunir-se no Palácio Tauride.
Um aparato militar foi
colocado em ação.
Entre seus membros,
encontravam-se Sverdlov, Podvoisky, Proshyan, Uritsky e Bontch-Bruyevitch.
Devidamente
delimitadas em setores a cidade e a área do Smolny, trabalhadores apresentaram-se
como voluntários para guardá-las.
A tripulação do Cruzador
Aurora e duas Companhias do Navio de Combate República
foram chamadas para defender o palácio e patrulhar as ruas das vizinhanças.
Porém, a revolta
armada que a Liga de Defesa da Assembléia
Constituinte planejara acabou não ocorrendo.
Na esquina das Avenidas
Nevsky e Liteiny, a manifestação híbrida por ela realizada sob a
consigna “Todo o Poder à Assembléia Constituinte” dirigiu-se contra
nossa manifestação de trabalhadores, marchando sob o slogan “Vida
Longa ao Poder Soviético”.
Teve lugar, então, um
recontro armado que, porém, foi rapidamente liquidado.
Bontch-Bruyevitch encontrava-se, então, inteiramente ocupado.
Dava telefonemas,
ordens e instruções, visando a que fosse propriamente cercado, do modo mais
sigiloso, o percurso que Lenin faria até o Palácio
Tauride.
Viajou no mesmo carro
em que Lenin se encontrava, sendo Maria Ilitchna, Vera Bontch-Bruyevitch e
eu as demais passageiras.
Dirigímo-nos para o Palácio
Tauride através de uma rua lateral.
Seus portões
encontravam-se fechados, porém abriram-se imediatamente, ao tocarmos a
campainha palaciana segundo o sinal précombinado, de modo que pudemos
rapidamente entrar, antes que se fechassem novamente.
A guarda do Palácio
Tauride conduziu-nos, em seguida, a um aposento especialmente reservado
para Lenin.
Situava-se em algum
lugar do lado direito da entrada principal, projetando-se o caminho para o
salão de sessões através de uma passagem plenamente guarnecida por vidraças.
Na entrada principal,
já se era possível avistar uma fila de delegados, acompanhados por uma multidão
de espectadores, situados ao seu redor.
Sem dúvida, havia sido
muito mais conveniente a Lenin ter utilizado uma entrada
alternativa.
Porém, todo esse
procedimento misterioso e teatral irritava-o consideravelmente.
Quando nos sentamos
para beber chá, vários companheiros
dirigiram-se até nós para conversarmos.
Recordo-me, entre
outros, de Kollontai e Dybenko.
Ficamos ali sentados por
um bom tempo, enquanto uma reunião bastante barulhenta da fração bolchevique da Assembléia
Constituinte transcorria paralelamente.
Varvara Yakobleva, uma companheira moscovita, presidia a reunião em tela.
Os moscovitas
mantinham-se firmes na questão da ruptura da Assembléia Constituinte.
Alguns deles foram até
mesmo um pouco longe demais, pretendendo rompê-la subitamente, de uma vez por
todas, sem atentar para o fato de que as coisas haviam de ser realizadas de
modo que as massas pudessem claramente compreender a razão de sua dissolução.
A Assembléia Constituinte foi,
então, aberta por Jakob Sverdlov.
A sessão inaugural
iniciou-se às 4 horas da tarde.
Em seu caminho rumo ao
salão assemblear, Lenin recordou-se de que havia deixado seu revólver no bolso do
paletó.
Ao voltar
imediatamente para apanhar o revólver, verificou que este já não se encontrava
no lugar em que o havia deixado, ainda que pessoas estranhas não houvessem
ingressado em seu aposento.
Obviamente, um dos
guardas o teria recolhido.
Colheu, então, a
ocasião para repreender Dybenko devido à patente falta de
organização e disciplina, reinante entre os guardas. Este não era capaz de
disfarçar o seu nervosismo.
Porém, logo que Lenin
voltou a sair de seu aposento, Dybenko foi capaz de restituir-lhe o
seu revólver, entregue por um dos guardas que o havia encontrado.
Sverdlov estava um pouco atrasado e a Assembléia Constituinte decidiu que
sua sessão inaugural deveria ser aberta pelo seu membro decano, um
socialista-revolucionário, de nome Shvetsov.
Este havia já subido a
plataforma e começado a discursar, quando Sverdlov chegou a passos rápidos.
Dirigiu-se à mesa de
oradores, arrancou o sino de Shvetsov, empurrou-o para o lado e
anunciou, com sua voz profunda e retumbante, que o Comitê Executivo Central dos
Sovietes de Deputados Trabalhadores, Soldados e Camponeses havia-o
autorizado a abrir a sessão da Assembléia Constituinte.
Então, em nome desse Comitê
Executivo, leu, em alta voz, o texto da Declaração dos Direitos do Povo
Explorado e Oprimido, redigida por Lenin e por ele editada e publicada,
em cooperação com Stalin e Bukharin, nas páginas do Pravda do dia anterior.
A declaração em realce
havia sido adoptada pelo Comitê Executivo Central de Toda a Rússia com
a disposição de que:
“Todas as tentativas,
empreendidas por qualquer pessoa ou qualquer instituição, de assumir qualquer
uma das funções do poder do Estado será considerada ato contra-revolucionário.
Toda e qualquer
tentativa desse gênero será reprimida pelo Governo Soviético, mediante todos os
meios colocados à sua disposição, incluindo o uso da força armada.”(cf. V. I. Lenin,
Obras Completas, Vol. 26, p. 389.)
Além disso, referido
documento proclamou que :
“Pela presente, a
Rússia constitui-se em República dos Sovietes dos Deputados Trabalhadores,
Soldados e Camponeses.
Todo o poder central e
local pertence aos Sovietes ...
A República Russa
Soviética é fundada sobre a base de uma livre união de nações livres, tal como
uma federação de Repúblicas Nacionais Soviéticas.”
A declaração em tela
aprovou também as leis adotadas pelo II Congresso dos Sovietes.
Ademais, as decisões
adotadas pelo Conselho dos Comissários do Povo haveriam de ser sufragadas
pela Assembléia
Constituinte, nos seguintes termos :
“A Assembléia
Constituinte considera sua tarefa, resultante do estabelecimento das bases
fundamentais de reconformação socialista da sociedade, apoiar o Governo
Soviético e os decretos do Conselho dos Comissários do Povo.”(Ibidem, pp. 385,
387.)
A ala direita da Assembléia
Constituinte possuía idéias inteiramente distintas acerca de suas
atividades, as quais - tal como acreditava – consistiriam precisamente em tomar
todo o poder do Estado em suas mãos.
Os socialistas-revolucionários
(SRs.) de direita encontravam-se em
maioria.
Indicaram Tchernov
para Presidente da Assembléia, ao passo que os bolcheviques e os
socialistas-revolucionários (SRs.) de esquerda escolheram Spiridonova.
Tchernov obteve 244 votos e Spiridonova, 151.
Os bolcheviques
votaram a favor de Spiridonova, porque a matéria verdadeiramente em causa era a de
saber se a Assembléia Constituinte votaria ou não pelo Poder
Soviético.
Nessa época, os socialistas-revolucionários
(SRs.) de esquerda encontravam-se do lado dos bolcheviques e a indicação de Spiridonova
havia sido bem calculada, de modo a levar aos camponeses o fato de que
a classe trabalhadora almejava com eles estabelecer uma estreita aliança
política, estando os bolcheviques inteiramente a favor dessa aliança.
O valor
propagandístico da indicação de Spiridonova representou, por isso,
um importante fator.
Depois de consumada a
eleição do Presidente da Assembléia, foram abertas as sessões regulares.
Em nome dos
socialistas-revolucionários (SRs.), Tchernov pronunciou-se acerca da
questão agrária.
Suas palavras foram
entrecortadas com os gritos, provenientes das bancadas da esquerda :
“- Vida longa aos Sovietes que deram terra aos camponeses!”
Bukharin que subiu ao pódio depois de Tchernov, apresentou uma moção, a
fim de que a Declaração dos Direitos do Povo Explorado e Oprimido de autoria
do
Comitê Executivo Central de Toda a Rússia fosse preliminarmente
considerada.
Assim, a primeira coisa
a ser decidida era a questão de saber em benefício de quem se situava a Assembléia
Constituinte:
“- Em benefício de Kaledin, os
cadetes, os proprietários de fábricas, os comerciantes, os diretores dos bancos
de descontos ou do exército cinzento de colarinhos, dos trabalhadores e
marinheiros?”
Depois, Tsereteli
falou em nome dos mencheviques.
Atacou os
bolcheviques, repisou no pântano da Guerra Civil e sugeriu que todo o
poder haveria de ser tomado pela Assembléia Constituinte.
Muitos anos
transcorreram desde então.
Vimos como os
sociais-democratas da Alemanha e de outros países
capitalistas, usando os mesmos velhos métodos de desconcertar as massas
exploradas e oprimidas com os horrores da Guerra Civil e todos os tipos de
promessas vazias, traíram a classe trabalhadora, pavimentando o caminho da
tomada do poder do Estado pelos fascistas, brutais criminosos e campeões da
bestialidade da classe definhante, composta por proprietários latifundiários e
capitalistas, mortalmente apavorados com o ascenso dos comunistas.
Pregam a Paz
Civil em palavras, ao mesmo tempo em que auxiliam, na prática,
latifundiários e capitalistas a explorar prepotentemente o povo trabalhador,
mergulhando-o em uma nova Guerra Mundial, ainda mais
devastadora do que a primeira.
Contudo, os
bolcheviques viram claramente aonde levaria uma conciliação selada com os
socialistas-revolucionários (SRs.) de direita e os mencheviques.
Dirigindo-se a esses, Skvortsov-Stepanov
declarou :
“Entre nós, está tudo acabado.
Hemos de ver a Revolução de Outubro ser conduzida até o fim contra a
burguesia.
Vocês e nós estamos em diferentes lados das barricadas.”
Lenin não discursou nessa ocasião.
Ficou sentado nos
degraus da escada do pódio, sorrindo ironicamente, satirizando e elaborando
anotações.
Obviamente, examinava
tudo o que estava ocorrendo.
Entre os seus papéis,
encontra-se o início de um artigo em que descreve suas impressões acerca da Assembléia
Constituinte:
“Um dia cansativo, doloroso, monótono, transcorrido nos elegantes salões do
Palácio Tauride cuja própria
aparência diverge daquela do Smolny
por ser a de um parlamentarismo burguês elegante, porém despido de vida.
Contrasta com o aparato soviético simples que, embora em muitos sentidos
ainda desordenado e inacabado, é vivaz e vital...
Depois da azáfama da vida real dos
Sovietes, realizada entre trabalhadores e camponeses ocupados com a missão real de reconhecer a floresta e desenterrar as raízes da exploração
capitalista e latifundiária, vi-me, repentinamente, transportado a um “mundo
estranho”, situado entre visitantes vindos de um outro planeta, vindos do campo
da burguesia e de seus seguidores voluntários e involuntários, conscientes e
inconscientes, adeptos, servos e defensores.
Vi-me transportado do mundo de luta das massas trabalhadoras e de sua
organização soviética contra a exploração ao mundo de frases adocicadas, das
declarações suavemente vazias, das promessas e promessas, baseadas, tais como
antes, na conciliação com os capitalistas. (Ibidem, Vol. 26, pp. 392, 393.)”
Apenas 146 deputados
votaram a favor da proposta de discussão preambular da Declaração dos Direitos do Povo
Explorado e Oprimido, elaborada pelo Comitê Executivo Central de Toda
a Rússia.
247 votaram contra
essa proposta.
Os bolcheviques e os
socialistas-revolucionários (SRs.) de esquerda exigiram, então, um adiamento
dos trabalhos.
A seguir, a fração
bolchevique da Assembléia Constituinte reuniu-se
para discutir o curso subseqüente de sua atuação.
Decidiu não mais
retornar ao salão de sessões.
Raskolnikov e Lobov foram, então, enviados para anunciar que os bolcheviques abandonariam a
Assembléia Constituinte, declarando as razões por que estavam assim
procedendo.
A fração bolchevique
decidiu, além disso, não dissolver, desde logo, a Assembléia Constituinte, mas
sim dar-lhe uma chance para reorientar-se, ao mesmo tempo em que observava o
caráter da sessão subseqüente.
Esta durou apenas até
4.40 da madrugada do dia 6 de janeiro de 1918, quando, então, entraram em colapso
os trabalhos parlamentares.
No dia seguinte, o Comitê
Executivo Central de Toda a Rússia declarou dissolvida a
Assembléia Constituinte.
Mais nenhuma sessão
teve lugar então.
A dissolução da Assembléia
Constituinte foi recebida pelas massas com passiva indiferença.
Seu prestígio
encontrava-se muito baixo, de tal sorte que sua extinção não provocou nenhum
tipo de agitação.
Uma barreira que
representava um obstáculo à realização de todo o trabalho subseqüente fora
decididamente removida do caminho, ao mesmo tempo em que uma clara divisória de
águas surgia estabelecida diante de todos os espíritos conciliacionistas.
EDITORA
DA ESCOLA DE AGITADORES E INSTRUTORES
“UNIVERSIDADE COMUNISTA REVOLUCIONÁRIA J. M. SVERDLOV”
DO PROLETARIADO E SEUS ALIADOS OPRIMIDOS
MOSCOU -
[1] Cf. KRUPSKAYA, NADEJDA KONSTANTINOVNA. Vospominania o Lenine (Recordações de Lenin), Vypusk III (Parte III),
Moscou-Leningrado : Gosudarstvennoe Izdatelstvo, 1933, pp. 39 e s.