90 ANOS DA REVOLUÇÃO SOCIALISTA PROLETÁRIA RUSSA DE OUTUBRO DE 1917

MORAL E CONSCIÊNCIA, ORGANIZAÇÃO E DIREÇÃO DAS LUTAS REVOLUCIONÁRIAS

DE EMANCIPAÇÃO PROLETÁRIO-SOCIALISTA

TEXTOS DE CÉLEBRES DIRIGENTES BOLCHEVIQUES SOBRE J. M. SVERDLOV

 

 

J. M. SVERDLOV:

Um Organizador Revolucionário

de Excepcional Habilidade

em Meio a Muitos Outros Organizadores Talentosos

das Fileiras Operárias e Camponesas  

 

NADEJDA K. KRUPSKAYA[1]

 

 

Concepção e Organização, Compilação e Tradução Asturig Emil von München,

Julho de 2004  emilvonmuenchen@web.de

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Ao longo de todo o tempo, o cérebro de Lenin trabalhava sistematicamente na temática relacionada com as novas formas de administração.

Refletia acerca de como seria possível organizar um aparato de Governo que permanecesse livre das garras do burocratismo, apoiando-se sobre as massas, organizando a cooperação e a assistência entre elas, demonstrando-se capaz de formar um novo tipo de trabalhador administrativo para a execução desse serviço.

Na Resolução do II Congresso dos Sovietes sobre a Formação do Governo Operário e Camponês, essa sua preocupação é expressa com as seguintes palavras :

 

“A administração dos diferentes setores da atividade estatal é confiado a comissões cuja estruturação deve assegurar a implementação do programa proclamado pelo congresso, em estreita unidade com as organizações de massas dos trabalhadores, marinheiros, soldados e empregados.

O poder de governo está incorporado em um colégio de presidentes das referidas comissões, i.e. o Conselho dos Comissários do Povo.” (cf. V. I. Lenin, Obras Completas, Vol. 26, p.230).

 

Recordo-me das conversações que mantive com Lenin acerca desse tema, durante das poucas semanas em que viveu na habitação de Fofanova.

Nessa época, encontrava-me trabalhando com extraordinário entusiasmo no Distrito de Vyborg, observando, aguçadamente, as atividades revolucionárias das massas e as transformações radicais que estavam ocorrendo em todo o modo de vida de então.

Quando encontrava-me com Lenin, falava-lhe sobre a vida nos distritos. 

 

Recordo-me de ter-lhe contado, certa feita, sobre o ocorrido em uma interessante sessão de um Tribunal Popular Eletivo de Operários, Soldados e Camponeses, à qual tinha comparecido.

Sessões judiciárias semelhantes haviam já ocorrido em alguns lugares, durante a Revolução Russa de 1905, tais como em Sormovo, a propósito de algumas questões jurídicas.

Tchugurin, um trabalhador que eu havia conhecido, em 1911, como estudante da Escola de Longjumeau, promovida, então, por nosso Partido nas imediações de Paris, e com o qual agora trabalhava no Conselho do Distrito de Vyborg, era originário da cidade de Sormovo e foi sua a sugestão de darmos início à organização de sessões de tribunais populares, no Distrito de Vyborg.

 

A primeira destas teve lugar na Casa do Povo de Vyborg.

O local das sessões judiciárias ficavam, então, repletos de pessoas, posicionadas lado a lado, nos corredores, nos bancos e sob os parapeitos das janelas.

Hoje já não recordo exatamente quais questões eram submetidas à apreciação do nosso Tribunal Popular.

Seja como for, não se tratava propriamente de crimes, no sentido estrito da palavra, mas sim de incidentes, ocorridos na vida diária.

 

Certa vez, duas pessoas suspeitas foram processadas por tentarem prender Tchugurin.

Em outra ocasião, um relojoeiro alto e de pele escura foi “processado” por ter espancado seu filho jovem, havendo explorado-o e mantido fora da escola.

Nesse último caso, inúmeras trabalhadoras e trabalhadores do auditório colheram a oportunidade para pronunciar discursos inflamados.

O “acusado” ficou ali exposto, derramando suor de seu fronte e, então, com lágrimas fluindo de seus olhos, prometeu que jamais voltaria a maltratar seu filho.

 

Em estrito senso, não se tratava propriamente de um ”tribunal”, mas sim de um controle público do comportamento dos cidadãos.

Estávamos, assim, testemunhando a ética proletária de julgar.

Lenin interessava-se extremamente por tais “tribunais” e indagava-me sempre, detalhadamente, a respeito do tema em realce.

 

Em muitas oportunidades, contei-lhe também sobre as novas formas do trabalho educativo.

Naquela época, eu era responsável pelo Departamento de Educação, junto ao Conselho Distrital.

Como as escolas infantis não funcionavam no verão, encontrava-me, quase sempre, ocupada com as tarefas de educação política.

Minha experiência de cinco (5) anos, havida durante a última década do século XIX, junto à Escola Dominical Vespertina do Distrito Nevskaya Zastava, foi-me extremamente útil.

Evidentemente, os tempos eram outros e podíamos seguir adiante, efetuando nosso trabalho sem maiores empecilhos burocráticos.

 

Cumpre ainda anotar que, todas as semanas, delegados de aproximadamente quarenta (40) fábricas reuniam-se, a fim de discutíssemos sobre os meios e modos de executar essa ou aquela medida.

Tudo aquilo por nós decidido era imediatamente posto em prática. 

Assim, decidimos, em dada ocasião, acabar com o analfabetismo entre as trabalhadoras e trabalhadores da região.

Os delegados de fábrica – cada qual em seu próprio local de trabalho – organizaram, então, um registro dos analfabetos, providenciando espaços para as aulas de alfabetização e fundos necessários, provindos da coação exercida contra as administrações burocrático-industriais.

Representantes dos trabalhadores, destacados para cada uma dessas escolas, velavam para que estas fossem abastecidas com tudo aquilo que necessitavam, tal quais quadros-negros, giz, livros de alfabetização etc.

Representantes especiais, indicados para atestarem a correção dos métodos de ensino utilizados, investigavam o que as trabalhadores e trabalhadores tinham a dizer acerca do assunto.

Instruimos esses representantes operários e deles recebíamos os seus relatórios.

 

Reunimos também as delegadas das esposas dos soldados, com vistas a discutirmos as condições existentes nos estabelecimentos infantis e organizarmos sua inspeção.

Demo-lhes, então, instruções específicas, impulsionando um extenso trabalho de conscientização entre elas.

Reunimos, por fim, os bibliotecários do distrito e, juntamente com eles e demais funcionários do ramo, discutimos as formas de trabalho nas bibliotecas públicas.

 

Um poderoso impulso foi conferido às iniciativas, empreendidas por trabalhadoras e trabalhadores, de tal sorte que o Departamento de Educação aglutinou forças consideráveis à sua volta.

Lenin dizia, à época, que esse era precisamente o estilo de trabalho que nossos órgãos governamentais e ministros haviam de adotar, um estilo de trabalho modelado segundo os comitês de mulheres e homens trabalhadores, envolvidos densamente nas questões concretas e familiarizados com as condições de vida e de trabalho das massas, bem como com tudo que agitava suas mentes, em dado momento.

Lenin foi sumamente ousado ao lançar-me sobre essas questões.

Acreditava que eu possuía compreensão para aglutinar as massas, engajando-as na dinamização das atividades de Governo.

 

Posteriormente, Lenin teve de pronunciar-se com palavras muito duras contra o ”burocratismo podre” que havia escavado o seu torpe caminho em todos os lugares.

Procurou lançar mão da experiência de cada um para que se fosse empreendida a construção de um Estado de novo tipo.

O Governo Soviético, à cabeça do qual se encontrava Lenin, confrontou-se com a tarefa de construir um tipo de engrenagem estatal que o mundo jamais havia conhecido, uma engrenagem que assentasse sobre o apoio das amplas massas da população.

Tratava-se de remodelar toda a fábrica social e todas as relações humanas, em conformidade com novas linhas soviético-socialistas. (...)

 

Em 21 de novembro de 1917, Jakob Mikhailovitch Sverdlov foi eleito Presidente do Comitê Executivo Central de Toda a Rússia, vindo a substituir Lev B. Kamenev.

Sverdlov foi nomeado por Lenin e a escolha realizada foi excepcionalmente feliz.

Sverdlov era um homem de grande firmeza.

Na luta em favor do Poder Soviético e para a derrota da contra-revolução, Sverdlov era indispensável.

Além disso, havia um trabalho imenso a ser feito no domínio da organização do Estado de novo tipo que clamava por um organizador de habilidade excepcional.

Sverdlov era precisamente esse tipo de organizador.

Lamentavelmente, faleceu, dois anos mais tarde, em 18 de março de 1919, depois de haver realizado um extraodinário trabalho de organização para o bem do país, precisamente no momento em que disto mais necessitávamos.

O discurso de Lenin, pronunciado no Comitê Executivo Central de Toda a Rússia (VTsIK) a respeito da morte de Sverdlov, ingressou na história como esplêndido monumento, proferido em homenagem do campião da causa da classe trabalhadora revolucionária, Jakob Sverdlov :

 

 “No decorrer de nossa revolução e de suas vitórias,” frisou Lenin, “o companheiro Sverdlov conseguiu expressar, do modo mais completo e mais efetivo do que qualquer outra pessoa, a própria essência da revolução proletária. (...)

O atributo muito mais essencial na revolução, bem como o pressuposto de sua vitória, é a organização das massas proletárias.

Nessa organização reside a profunda fonte de sua vitória. (...)

Esse traço da revolução proletária produziu, igualmente, o companheiro Sverdlov, que foi, antes de tudo e em primeira linha, um organizador (...).” (Ibidem, Vol. 29, p. 72)

 

Lenin descreveu Sverdlov como “o tipo mais marcante de revolucionário profissional”, devotado ilimitadamente à causa da revolução, enrijecido por longos anos de atividade ilegal clandestina, um homem que jamais perdeu o contato com as massas, jamais abandonou a Rússia, um revolucionário que logrou tornar-se “não apenas o dirigente amado pelos trabalhadores, não apenas o dirigente que profunda e principalmente conhecia o trabalho prático, mas também o organizador dos proletários mais avançados...”   

E destacou :

 

“Todo aquele que trabalhou dia após dia com o companheiro Sverdlov viu, de modo particularmente claro, que seu singular talento de organização assegurou-nos aquilo de que nos orgulhamos, com pleno direito.

Assegurou-nos a possibilidade de um trabalho organizado, adequado, unânime, que se tornaria digno das massas proletárias organizadas, trabalho esse sem o qual não poderia existir sucesso algum nem seria possível dar resposta, na mais plena dimensão, às necessidades da Revolução Proletária.” (ibidem)

 

Lenin caracterizou Sverdlov como um organizador que conquistou para si mesmo uma “autoridade indiscutível”, um organizador de “todo o Poder Soviético da Rússia” e o “mais completo e mais efetivo” organizador “desse partido que criou os Sovietes e, na prática, executou o Poder Soviético.” (cf. V. I. Lenin, Obras Completas, Vol. 29, pp. 70-74)

 

A Revolução de Outubro havia alterado as condições de luta revolucionária.

Estas exigiam das pessoas maior determinação, maior abnegação, maior “estamina” - para utilizar aqui, de passagem, uma das palavras mais favoritas de Lenin -, maior escopo organizativo.

Lenin disse, muitas e muitíssimas vezes :

 

“A essência da construção socialismo é a organização.”

 

Não foi por acaso que o curso dos eventos produzira pessoas que não temiam arcar com suas responsabilidades, pessoas cujas habilidades haviam sido esculpidas pelas condições da velha clandestinidade.

Precedentemente, prisões e deportações constantes haviam levado ao nada seus esforços organizativos, na medida em que a necessidade de manterem segredos e empreenderem atividades sigilosas conservavam-nos em segundo plano. (...)

 

   __________________

 

 

Foi no ano de 1919 que a Guerra Civil contra Koltchak, Denikin e Yudenitch intensificou-se.[2]

 

As lutas foram, então, conduzidas em condições extremamente difíceis.

Espalhavam-se fome e ruína econômica por todos os lados.

Fábricas e oficinas encontravam-se paralisadas, estradas de ferro, completamente desorganizadas.

O Exército Vermelho não se encontrava ainda eficientemente organizado, apresentando-se fracamente armado.

Em muitas localidades, o Poder Soviético ainda não havia sido propriamente estabelecido, não se identificando solidamente com a população.

Partidos hostilizavam o Poder Soviético.

Todos os elementos que vicejaram em berço de ouro sob os auspícios do velho regime, i.e. os serviçais dos proprietários fundiários e dos capitalistas, os camponeses prósperos (kulaks), os comerciantes etc., empreendiam, agora, uma agitação furiosa contra os bolcheviques, valendo-se da ignorância e da falta de informação existentes entre as massas camponesas para difundir junto a eles todos os tipos de pérfidas histórias.

 

Contudo, já então, o nome de Lenin gozava de grande prestígio, em todos os lugares.

Era contra os latifundiários e os capitalistas.

Lutava por paz e terra.

Todos sabiam que era o dirigente da luta pelo Poder dos Sovietes.

Em todos os recantos e caminhos do país, disso tinham consciência as massas populares.

 

Porém, Lenin não participava diretamente dos combates, não se encontrava nos frontes, e, naqueles dias, era difícil para as pessoas iletradas - pessoas de perspectiva limitada, resultante da vida isolada que levavam - imaginarem como alguém poderia exercer sua liderança à distância.

Assim, lendas emergiram, envolvendo o nome de Lenin.

Na longíngüa Sibéria, pescadores do Lago Baikal contavam, por exemplo, até dez anos atrás, como, no auge de uma batalha travada contra os soldados brancos, Lenin chegou voando em um avião e ajudou os vermelhos a suplantar o inimigo.

No norte do Cáucaso, pessoas diziam que, embora jamais tivessem visto Lenin, sabiam, com certeza, que ali havia lutado, em meio às fileiras do Exército Vermelho, ajudando-o a conquistar a vitória, só que o fizera tão secretamente que ninguém tomara conhecimento do fato.

Hoje, os trabalhadores da cidade e das fazendas coletivas sabem que, apesar de Lenin não ter jamais combatido no fronte, esteve, durante todo o tempo, no coração e na alma do Exército Vermelho, nele sempre pensando e por ele sempre velando.

Sabem quão duro foi trabalhar, com vistas a direcionar a política para o caminho certo.

 

Com efeito, Lenin foi Presidente do Conselho dos Comissários do Povo.

Suas atividades eram variadíssimas.

Porém, seja qual fosse a forma que assumissem, encontravam-se indissoluvelmente ligadas com as questões da Guerra Civil e da luta pelo Poder dos Sovietes.   

Em 13 de março de 1919, Lenin discursou em uma assembléia em Petrogrado, versando sobre os sucessos e as dificuldades do Poder Soviético : 

 

“Pela primeira vez na história, um exército está sendo formado em conexão inseparável - podemos dizer, em unidade inseparável - dos Sovietes com o exército. (N.K.K.: grifos de minha autoria)

Os Sovietes unem todo o povo trabalhador e explorador, sendo o exército construído sobre os princípios da defesa socialista e da consciência de classe.”(Ibidem, Vol. 29, p. 47)

 

Essa unidade de interesses foi expressada através de milhares de modos.

Pois, o Governo Soviético atuava como a própria direção do Exército Vermelho.

Lenin gostava de dormir com as janelas abertas.

Todas as manhãs, o canto dos soldados do Exército Vermelho, acantonados no Kremlin, atroando por todos os lados, irrompia em nosso quarto :

 

“Morreremos até o último homem pelo Poder dos Sovietes!”, cantavam aquelas vozes jovens.

 

Lenin sabia perfeitamente bem o que ocorria nos frontes.

Com eles, mantinha contato direto e encabeçava todas as lutas, ao mesmo tempo em que dava toda a atenção ao que as massas diziam sobre a guerra.  

Algumas vezes, presenciei suas conversações, entabuladas com diferentes pessoas, e percebi quão bem delas extraía as matérias que lhe interessavam.

Interessava-se por toda a situação e por tudo o que acontecia nos frontes.

 

Recordo-me que, certa vez, presenciei um informe prestado a Lenin sobre as desconfianças havidas da parte dos membros do Exército Vermelho em relação aos velhos especialistas militares, provenientes do Exército Czarista.

Com efeito, no início, fomos obrigados a deles aprender.

Isso era, de fato, compreendido pelos soldados do Exército Vermelho.

Porém, estes encaravam aqueles com desconfiança, devido à sua intolerância em face das faltas até mesmo mais insignificantes.

Tal fato era igualmente compreensível, por ter existido uma distância hierárquica considerável entre oficiais comandantes e soldados de tropa, sob o velho regime.

Depois que o informante saiu, Lenin, dirigindo-se a mim, disse que a força do Exército Vermelho residia no fato de que seus comandantes encontravam-se bem próximos da massa de soldados. 

Recordamos, então, das pinturas de Vereshtchagin que esboçavam a Guerra contra a Turquia de 1877 e 1878.

Trata-se de finas descrições.

Vereshtchagin havia estado no palco de batalhas da guerra em referência, onde os oficiais comandantes postavam-se permanentemente na cumeeira de um monte, avistando a partir de lá de longe a batalha desenvolver-se sobre o terreno plano.

Oficiais asseados, trajando luvas, avistavam, com binóculos, os soldados ordinários tombando no campo de batalha, ao mesmo tempo em que se mantinham afastados, fora de perigo, em uma prudente distância que lhes assegurava a vida.

Aos dez anos de idade, havia eu tido a primeira oportunidade de contemplar essas pinturas.

Meu pai levara-me a uma exibição dos quadros de Vereshtchagin e estes permanceram gravados em minha memória por toda a minha vida.

 

Certa feita, Lenin recebeu uma carta de um tal Professor Dukelsky, residente na cidade de Voronej, solicitando que os soldados do Exército Vermelho concedessem tratamento camarada aos velhos especialistas militares.

Lenin respondeu-lhe com um artigo, publicado no ”Pravda (A Verdade)”, em que dizia:

 

“Demonstrem uma atitude camarada ante os soldados exaustos, ante os trabalhadores esgotados, amargurados por séculos de exploração e, então, a aproximação entre os trabalhadores das atividades físicas e os das atividades intelectuais há de avançar, em passos gigantescos.” (Ibidem, p. 207)   

 

Em certa ocasião, presenciei também um informe de Lunatcharsky, dirigido a Lenin, depois da visita daquele ao fronte.

Evidentemente, Lunatcharsky não era nenhum grande especialista de assuntos militares.

Porém, Lenin ficou perguntando-lhe inúmeras questões referentemente ao tema, relacionando fatos aparentemente desconexos, direcionando Lunatcharsky de maneira perspicaz para dentro das vias do pensamento lógico.

Assim, o informe que lhe fora prestado tornou-se algo inteiramente fascinante.

 

Lenin sempre sabia o que perguntar a esta ou aquela pessoa e como obter a informação que desejava de alguém.

Conversava com muitos trabalhadores que íam e vinham do fronte.

Tinha uma boa imagem da fisionomia do Exército Vermelho e sabia que este era composto, em sua maioria, por camponeses oprimidos, cuja traços mais essenciais bem conhecia.

Sabia como haviam sido explorados pelos proprietários latifundiários, como odiavam-nos.

Estava ciente da tremenda força motora que constituíam no quadro da Guerra Civil.

Lenin não idealizava o agricultor individual – e, naqueles dias, os camponeses eram todos agricultores individuais -, embora soubesse quão forte e tenaz era sua mentalidade pequeno-burguesa, quão difícil era para os camponeses organizarem-se, quão efetivamente inútil surgia o camponês, naqueles dias, em matéria de organização.

 

O cerne da construção socialista é, porém, a organização : Lenin jamais se cansou de repetir isso.

Atribuindo colossal importância às questões de organização, depositava suas esperanças na classe trabalhadora, em sua experiência organizativa, em seus estreitos laços mantidos com o campesinato.

Exigia que toda a experiência do velho exército czarista e dos velhos especialistas fosse apropriada, colocando-se o conhecimento e a ciência a serviço do povo trabalhador da República Soviética. (...)

  

Em 1919, a política do Governo Soviético foi direcionada para o fortalecimento dos laços com as massas.

Naquele então, Lenin voltou a afirmar :

 
”Se nos auto-denominamos «
Partido Comunista » devemos entender que apenas agora, quando acabamos com os obstáculos externos e dizimamos as velhas instituições, defrontamo-nos, efetiva e plenamente, pela primeira vez, com a primeira tarefa de uma verdadeira Revolução Proletária : organizar dezenas e centenas de milhões de pessoas.”(Ibidem, Vol. 29, p. 310)  

 

Com efeito, já no II Congresso dos Sovietes de Toda a Rússia, ocorrido em outubro de 1917, Lenin afirmara que “o âmago da construção socialista era a organização”.

Sete meses depois, em março de 1919, na época do VIII Congresso do Partido quando o Poder Soviético estava assegurado, em seus fundamentos –, os problemas de organização emergiram, em toda a sua amplitude.

Com efeito, todas as questões abordadas por Lenin nesse VIII Congresso estavam intimamente vinculadas aos problemas de organização.

Lenin pronunciou-se, então, sobre o pessoal administrativo, a burocracia e a cultura, sobre como a falta de cultura surgia como obstáculo no caminho da construção socialista, impedindo as amplas massas populares de se incorporarem nestas atividades, entravando a luta contra os resquícios do passado, interferindo no processo de extirpação das raízes burocráticas seculares.

Referiu-se às aldeias, ao processo de fortalecimento da influência do proletariado não apenas sobre os trabalhadores rurais e sobre os pobres do campo, senão ainda sobre os mais amplos setores do campesinato, sobre os camponeses médios que viviam de seu próprio trabalho, sem explorar trabalho contratado.

Disse que estes deveriam passar a ser o principal sustentáculo do Poder Soviético, adaptando-se, em matéria de abastecimento.

Pronunciou-se sobre o movimento das cooperativas, assinalando que o comunismo haveria de ser construído a partir do que o capitalismo nos deixara enquanto herança, não podendo ser apenas edificado pelas mãos dos comunistas, cumprindo fazer uso dos velhos especialistas, da ciência e de toda experiência da construção burguesa, visando ao atingimento de nossos próprios propósitos.

Para as pessoas, o mais importante em todo esse trabalho seria saber não apenas como localizar o elo para o despedaçamento de toda a corrente de opressão, senão também aprender de que modo aquele elo poderia ser praticamente despedaçado, i.e. de que maneira a corrente poderia ser arrancada.

 

Dois dias antes do VIII Congresso do Partido de março de 1919, havia falecido Jakob Sverdlov, Presidente do Comitê Executivo Central de Toda a Rússia.

Em seu discurso, pronunciado no funeral desse organizador bolchevique, Lenin colheu a oportunidade para destacar a particular habilidade que Sverdlov possuia de conectar teoria e prática, seu prestígio moral e talento de organização, colocando especial acento sobre o valor de seu trabalho como organizador das amplas massas proletárias :    

 

“Esse revolucionário profissional jamais, nem mesmo por um só minuto, separou-se das massas.

As condições sob o czarismo forçaram-no, tal como todo revolucionário daqueles tempos, à atividade clandestina, ilegal.

Porém, também nela o Companheiro Sverdlov seguiu sempre ombro a ombro, de mãos dadas, com os trabalhadores avançados, que, logo a partir do início do século XX, começaram a ocupar as próprias fileiras das gerações precedentes de revolucionários da inteligência.

Precisamente a essa altura, trabalhadores avançados surgiram às dezenas e centenas.

Educaram-se para o rigor das lutas revolucionárias, não perdendo, ao mesmo tempo, as mais firmes ligações com as massas, sem as quais não poderia ter existido uma revolução vitoriosa do proletariado.”(Ibidem, Vol. 29, p. 72)

 

No congresso em realce, deveria Sverdlov ter apresentado um informe acerca do trabalho organizativo do Comitê Central.

Em razão de morte, seu informe foi apresentado pelo próprio Lenin.

Referindo-se a Sverdlov também nessa ocasião, Lenin assinalou, então, o seguinte :

 

“Possuindo uma vasta e incrível memória, nela conservava Sverdlov a maior parte do informe que apresentava.

Seu conhecimento pessoal do trabalho local de organização (N.K.K.: grifos de minha autoria) permitia-lhe que assim fizesse.

Sou incapaz de substituí-lo, mesmo em uma centésima parte (...)

Dezenas de delegados eram recebidos pelo Companheiro Sverdlov e mais da metade deles não eram provavelmente funcionários soviéticos, mas sim militantes do Partido.” (Ibidem, p. 140)       

 

Lenin dizia que Sverdlov era uma excelente juiz de pessoas, dotado de notável senso para questões práticas :

 

“Todos os que trabalharam dia após dia com o Companheiro Sverdlov viu, de modo particularmente claro, que seu singular talento de organização assegurou-nos aquilo do que nos orgulhamos, com pleno direito.

Assegurou-nos a possibilidade de um trabalho organizado, adequado, unânime, que se tornaria digno das massas proletárias organizadas, trabalho esse sem o qual não poderia existir sucesso algum nem seria possível dar resposta, na mais plena dimensão, às necessidades da Revolução Proletária. (...)

 

Nesse sentido, encontro-me profundamente seguro de que a Revolução Proletária na Rússia e no mundo inteiro gerará diversos grupos de pessoas, inúmeras camadas de proletários e de camponeses trabalhadores que aportarão à vida significado prático e talento de organização, senão individual, então coletivo, sem o qual não será possível atingir a vitória. (N.K.K.: grifos de minha autoria)”(Ibidem, pp. 73, 75) (...)

 

Uma semana depois do VIII Congresso do Partido, em uma reunião do Comitê Executivo Central de Toda a Rússia, em 30 de março de 1919, Lenin propôs M. I. Kalinin como candidato ao posto de Presidente do Comitê Executivo Central de Toda a Rússia, em substituição do falecido J. M. Sverdlov.

Afirmou que Kalinin possuía um currículo de vinte anos de trabalhos partidários e que, na qualidade de trabalhor de São Petersburgo e, ao mesmo tempo, de camponês por origem - oriundo da Província de Tver -, preservava estreitas ligações com a economia camponesa, sendo capaz de renovar e rejuvenescer constantemente esses laços, demonstrando uma postura camarada no trato com as amplas massas do povo trabalhador.

Os camponeses médios veriam na pessoa do mais elevado representante da República Soviética um de seus próprios integrantes.

A nomeação de Kalinin haveria de servir enquanto meio prático de organização de um número de contatos diretos entre o representante supremo do Poder Soviético e os camponeses médios, de modo a levar a que se aproximassem mais estreitamente. (...)

 

Em 12 de abril de 1919, foi publicado, então, um Decreto, contando com as assinaturas de Kalinin, Lenin e Stalin, dispondo sobre a reorganização do Controle do Estado (Stalin era, naquela ocasião, Comissário do Povo para o Controle do Estado)[3].

 

Esse Decreto dispunha da seguinte forma:

 

“Destruiu-se a velha burocracia, porém permanecem existindo os burocratas.

Estes trouxeram consigo para o interior das instituições soviéticas o espírito de conservadorismo, aparatismo, ineficiência e frouxa disciplina.

O Governo Soviético declara que não sera tolerado o burocratismo em qualquer das suas formas, devendo este ser inteiramente banido dos departamentos soviéticos, mediante medidas determinadas.

O Governo Soviético declara que apenas a participação das amplas massas dos trabalhadores e camponeses na administração do país e o detalhado controle sobre os órgãos de vontade governamental eliminarão as faltas cometidas na maquinaria do Estado, libertando as instituições soviéticas do mau burocrático, a fim de avançarmos decididamente na causa da construção socialista.”

 

Em 4 de maio de 1919, o Decreto sobre a Criação do Bureau Central para Requerimentos Junto ao Comissariado do Povo do Controle do Estado foi secundado pelo Decreto sobre a Criação de Departamentos Locais do Bureau Central em referência.

Lenin travava uma luta incansável contra o burocratismo nos departamentos soviéticos. (…)      

 

Lenin tentou erradicar o burocratismo da maquinaria do Estado.

Exigia atenciosa atitude da parte de todos os membros do funcionalismo, requeria que os encarregados de serviços conhecessem bem o seu pessoal, auxiliava-os em seus trabalhos, criando meios necessários à realização de um trabalho eficiente.

Questionava-me, constantemente, sobre os membros de meu próprio departamento. Queria conhecê-los.

Aconselhava-me a fazer melhor uso deste ou daquele trabalhor.

Peguntava-me sempre o que eu fazia por eles, como estavam sendo alimentados, como seus filhos estavam passando.

Examinava cada um dos membros do meu departamento, ainda que, surpreendentemente, jamais os tivesse avistado.

Às vezes, espantava-me por achar que Lenin os conhecia melhor do que eu própria.

 

Há inúmeros registros demonstrando a solicitude de Lenin para com os membros de seu próprio departamento.

Na reunião do Conselho dos Comissários do Povo de 8 de março de 1919, Lenin redigiu a seguinte nota, dirigida à sua secretaria, a respeito de Khryashchova, membro da Junta do Departamento Estatístico Central : 

 

“Se Khryashchova tem uma jornada de trabalho muito longa, tendo de depois ir a pé para casa, é vergonhoso.

Explique-lhe, com tato, tão logo surja uma oportunidade, que pode sair mais cedo ou simplesmente nem vir trabalhar, nos dias em que não surjam questões estatísticas.” (Ibidem, p. 287)  

  

Lenin demonstrava possuir particular preocupação com as condições de vida dos funcionários.

Estávamos em uma época em que até mesmo os funcionários de alto escalão e suas famílias não possuíam o bastante para comer.

Soubemos, então, que A. D. Tsyurupa e Markov, do Comissariado do Povo para os Transportes, bem como outros dos seus, estavam passando fome.

Em 8 de agosto de 1919, Lenin escreveu a seguinte carta ao Bureau de Organização (Orgburo) do Comitê Central :   

 

“Acabei de receber uma informação adicional de uma fonte confiável, dizendo que membros das juntas estão passando fome (p.ex. Markov, do Comissariado do Povo para os Transportes).

Insisto, da maneira mais enérgica, que o Comitê Central deve:

1)          ordenar ao Comitê Executivo Central que conceda uma subvenção de 5.000 rublos, a título de auxílio a todos os membros das juntas (e àqueles de posição equivalente) ;

2)          colocá-los todos, permanentemente, em quotas máximas, de especialistas.

Realmente, é uma vergonha que eles e suas famílias estejam morrendo de fome!

De 100 a 200 pessoas devem ser melhor alimentadas.”(Ibidem, p. 317)   

 

No fim de abril de 1919, uma guinada foi alcançada no fronte oriental.

O Exército Vermelho começou a obter vitórias.

A cidade de Ufa e todo um número de outras cidades foram capturadas das mãos dos brancos.

A ofensiva contra Ekaterinburg e Perm estava sendo desenvolvida com sucesso. (...)

 

Organizou-se, então, a Semana do Partido, em Petrogrado, entre 10 e 17 de agosto de 1919.

Ao mesmo tempo, em conformidade com uma decisão do VIII Congresso do Partido, executou-se um recadastramento dos membros do Partido, atividade essa que durou até o fim de setembro.

Entre 8 e 15 de outubro, a Semana do Partido foi organizada, então, em Moscou.

Em 11 de outubro de 1919, Lenin redigiu seu artigo “O Estado Operário e a Semana do Partido”, dando enérgica expressão às suas idéias sobre o Partido e aquilo que o novo aparato de Governo deveria fazer, ressaltando quão importante era preenchê-lo com tanto trabalhadores e componeses quanto possível fosse.

Em seu artigo, redigiu o seguinte:   

 

“A Semana do Partido em Moscou ocorre em um momento difícil para o Poder Soviético.

Os sucessos de Denikin provocaram um frenético aumento de saques, realizados pelos latifundiários, capitalistas e seus amigos, elevando os esforços da parte da burguesia para semear pânico e minar a força do sistema soviético, através de todos os meios colocados à sua disposição.

Os pequenos-burgueses vacilantes, hesitantes e ignorantes e, junto com eles, a inteligência, os aríetes socialistas-revolucionários e os mencheviques, tornaram-se, como é normalmente o caso, mais irresolutos do que nunca e foram os primeiros a permitirem-se intimidar pelos capitalistas.

No entanto, o fato de que a Semana do Partido em Moscou tem lugar em um momento tão difícil como esse, é para nós – segundo creio – antes de tudo uma vantagem, porque resulta ser muito melhor para a nossa causa.

Não precisamos da Semana do Partido para demonstrar propósitos.

Não carecemos de membros fictícios do Partido nem mesmo dados, como presente.   

Nosso Partido, o Partido da classe trabalhadora revolucionária, é o único Partido de Governo no mundo que se concentra não em aumentar o número de seus filiados, mas em desenvolver sua qualidade e depurar de si mesmo os “interesseiros”.

Mais de uma vez realizamos recadastramentos dos membros do Partido, a fim de livrarmo-nos desses “interesseiros” e permitir que atuassem no Partido apenas os elementos politicamente esclarecidos e sinceramente devotados ao comunismo.

Tiramos vantagem das mobilizações para o fronte e dos sábados comunistas para purgar o Partido dos que estão apenas “procurando” as vantagens acumuladas com sua filiação em uma organização de Governo, não pretendendo carregar o fardo do trabalho auto-sacrificante do comunismo.

Nessa encruzilhada, quando a intensa mobilização para o fronte progride, a Semana do Partido representa uma boa coisa, porque não oferece nenhuma atratividade aos “interesseiros”.

Estendemos um amplo convite para ingressar no Partido apenas aos trabalhadores de base e aos camponeses pobres, camponeses trabalhadores, porém não aos camponeses lucradores.

Não prometemos e não concedemos a esses trabalhadores de base nenhuma vantagem por aderirem ao Partido.

Pelo contrário: apenas trabalho mais duro e perigoso do que o normal recairá sobre a massa dos membros partidários.

Tanto melhor assim.

Apenas os sinceros apoiadores do comunismo, apenas as pessoas que são conscientemente devotadas ao Estado Proletário, apenas o honesto povo trabalhador, apenas os genuínos representantes das massas que eram oprimidas sob o capitalismo, aderirão ao Partido.

E apenas esses membros necessitamos no Partido.

Precisamos de novos membros partidários não, porém, para propósitos de reclames, senão para o trabalho sério.

Essas são as pessoas que convidamos a ingressarem no Partido.

Ao povo trabalhor, abrimos as suas portas, do modo mais amplamente possível.”(Ibidem, Vol. 30, pp. 45-46)    

 

A seguir, repetiu suas palavras, pronunciadas no funeral de Jakob Mikhailovitch Sverdlov, destacando que, no seio da classe trabalhadora e do campesinato, haviam muitos organizadores talentosos e trabalhadores administrativos.

Era a estes que apelava, a fim de impulsionarem a construção socialista.

 

“Se vocês são sinceros apoiadores do comunismo, ocupem-se ousadamente desse trabalho.

Não temam seu ineditismo nem as dificuldades por ele provocadas.

Não se intimidem com os velhos preconceitos de que apenas os que receberam um treinamento formal são capazes desse trabalho.”(Ibidem, pp. 46-47)

 

O artigo de Lenin em tela encerra-se com as seguintes palavras:

 

“As massas do povo trabalhador estão conosco.

É nisso que reside a nossa força.

Essa é a fonte da invencibilidade do comunismo.”

 

Nesses tempos de dificuldade, Lenin apelou, incessantemente, aos trabalhadores e ao Exército Vermelho, em discursos e artigos.

Suas palavras incorajavam-nos.

Os trabalhadores das cidades de Yaroslavl, Vladimir e Ivanovo-Voznesenk, dirigiram-se, em massa, para o fronte.

Disto sempre haverá recordações, ao lermos as palavras de Lenin :

  

“O poder da simpatia dos trabalhadores e camponeses para a vanguarda é por si mesmo suficiente para realizar milagres.

Com efeito, trata-se de um milagre: trabalhadores que experimentaram os indizíveis tormentos da fome, do frio e da ruína econômica não apenas mantêm seu espírito elevado, preservando toda a sua consagração ao Poder Soviético, toda a sua energia de auto-sacrifício e heroísmo, senão também carregam em si mesmo – apesar de sua falta de preparo e inexperiência – o fardo de dirigir o timão do Estado !

Isso tudo em um tempo em que a tempestade atingiu um pico culminante.

A história de nossa Revolução Proletária está repleta de taumaturgias.

Estas hão de conduzir, certa e positivamente, à completa vitória da República Socialista Mundial, sejam quais forem as dolorosas e episódicas provas de fogo.”(Ibidem, Vol. 30, pp.53-54).  

 

 

EDITORA DA ESCOLA DE AGITADORES E INSTRUTORES

“UNIVERSIDADE COMUNISTA REVOLUCIONÁRIA J. M. SVERDLOV”

PARA A FORMAÇÃO, ORGANIZAÇÃO E DIREÇÃO MARXISTA-REVOLUCIONÁRIA

DO PROLETARIADO E SEUS ALIADOS OPRIMIDOS

MOSCOU - SÃO PAULO - MUNIQUE - PARIS



[1] Cf. KRUPSKAYA, NADEJDA KONSTANTINOVNA. Vospominania o Lenine (Recordações de Lenin), Vypusk III (Parte III), Moscou-Leningrado : Gosudarstvennoe Izdatelstvo, 1933-1936, pp. 11 e s.  

[2] Cf. IDEM. ibidem, pp. 57 e s.  

[3] Julgo devido assinalar que, entre outros importantes fatores de ordem econômico-material e militar-revolucionária, foi precisamente a morte de Sverdlov, ocorrida em 18 de março de 1919, que favoreceu mais diretamente, no quadro político-administrativo da República Soviética Russa, a gradativa ascensão de Stalin e de tantos outros representantes operário-burocráticos, contra-revolucionários. Em 27 de outubro de 1917, Stalin começou a desempenhar as funções de Comissário do Povo para as Nacionalidades, exercendo-as até 6 de julho de 1923. A seguir, durante a Guerra Civil, veremo-lo atuar, no curso do verão de 1918, enquanto dirigente da Comissão de Abastecimento de Alimentos e intervir na defesa da cidade de Tsaritsyn (denominada entre 1925 e 1961, Stalingrado). Em 8 de outubro de 1918, logrou ingressar no Conselho Militar Revolucionário (CMR), aí permanecendo até 8 de julho de 1919 e, posteriormente, entre 18 de maio de 1921 e 28 de agosto de 1923. Após a morte de Sverdlov, em decorrência de uma ampla reorganização dos organismos do Partido Bolchevique, Stalin foi apontado, porém, já em 25 de março de 1919, para exercer as funções de membro pleno do Politbureau e do Orgbureau, tendo permanecido nessa condição até 5 de outubro de 1952. É correto, porém, afirmar que, já à época do Decreto de 12 de abril de 1919, desempenhava também as funções de Comissário do Povo para o Controle do Estado. Com efeito, exerceu-as de 30 de março de 1919 a 7 de dezembro de 1920. Em seguida, entre 24 de fevereiro de 1920 e 25 de abril de 1922, assumiu as atribuições de Comissário do Povo para a Inspeção Operário-Camponesa.

Muito provavelmente por haver posteriormente, em fins dos anos 20, capitulado ao stalinismo contra-revolucionário, a grande revolucionária bolchevique Krupskaya deixa de assinalar, em 1936, ao redigir as linhas ora traduzidas para o português, que, já em 3 de abril de 1922, Stalin viria a ser indicado para o Secretariado do Partido Bolchevique, a fim de atuar como Secretário Geral. Investido no exercício das funções e atribuições de Secretário Geral e promovendo sempre mais intensamente o burocratismo operário, impulsionou suas lutas inconfidentes contra outros dirigentes bolcheviques, a fim de baní-los ou assassiná-los. Em um primeiro momento, aliando-se a Lev Kamenev e Grigory Zinoviev no quadro da Primeira Troika, dinamizou sua luta burocrático-contra-revolucionária contra Trotsky e a Oposição de Esquerda. Rompida aquela, em dezembro de 1925, teve início a perseguição da Oposição Unificada, reunindo, então, Trotsky, Kamenev e Zinoviev, entre outros tantos expressivos dirigentes bolcheviques. Rompida, em 1928, a Segunda Troika, selada com Rykov e Bukharin – seus novos perseguidos políticos da Oposição de Direita -, Stalin, pondo um termo à NEP, deu início aos planos qüinqüenais, à industrialização e à coletivização, extremamente forçadas, despóticas e sangrentas, na União Soviética, já então inteiramente burocratizada. A partir de 1930, o culto à sua personalidade, imposto a todos os domínios soviéticos da sociedade e do Estado, aliou-se à prática de Governo Burocrático-Operário, exercida por Stalin, em concurso com um estreito círculo de seqüazes psicopatas, colocados a serviço da contra-revolução a ser impulsionada em escala mundial, como forma de assegurar os privilégios materiais e pessoais dos velhos e novos membros do Partido Bolchevique-Stalinista, não expurgados pelas campanhas movidas contra os “inimigos do povo” e “agentes do nazismo alemão”, antigos companheiros de Lenin e Sverdlov, brindadas sempre, no curso dos anos 30, com execuções macabras da Justiça de Terror, exercida à margem dos Processos de Moscou.