90 ANOS DA REVOLUÇÃO SOCIALISTA PROLETÁRIA RUSSA DE OUTUBRO DE 1917

MORAL E CONSCIÊNCIA, ORGANIZAÇÃO E DIREÇÃO DAS LUTAS REVOLUCIONÁRIAS

DE EMANCIPAÇÃO PROLETÁRIO-SOCIALISTA

TEXTOS DE CÉLEBRES DIRIGENTES BOLCHEVIQUES SOBRE J. M. SVERDLOV

 

Recordações de um Deputado Trabalhador,

Membro da IV Duma do Estado sobre 

JAKOB M. SVERDLOV  

 

FIEDOR N. SAMOILOV[1]

 

Concepção e Organização, Compilação e Tradução Asturig Emil von München

 Julho de 2003 emilvonmuenchen@web.de

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Encontrei-me, pela primeira vez, com Jakob Mikhailovitch Sverdlov, durante o exercício de meu mandato parlamentar como membro operário da Província de Vladimir na IV Duma do Estado, em Petersburgo.

Tudo ocorreu da seguinte forma :

Em janeiro de 1913, Sverdlov veio a abrigar-se, em meu quarto, situado no prédio da Rua Schialier, Nrs. 44-46.

Naquela época, era o responsável de fato pela redação do jornal “Pravda (A Verdade)”.

Vivia ilegalmente, em Petersburgo, na condição de fugitivo, procedente do exílio da região siberiana de Narym, e não saía do quarto para ir a lugar algum.

Durante todas as horas do dia, andava para cá e para lá com manuscritos, a serem publicados no jornal em foco.

Valíamo-nos inteiramente da sua presença entre nós.

Sverdlov participava de todas as nossas reuniões de consulta, realizadas em meu quarto ou no quarto do companheiro Badaiev.

Aconselhava-nos em todas as questões, sejam nas relacionadas com o nosso trabalho partidário, sejam nas tocantes à nossa intervenção na Duma do Estado.  

Participava, igualmente, das reuniões da fração parlamentar social-democrática.

Intervindo nas disputas travadas contra os mencheviques-liquidacionistas, ao lado de outros companheiros que vinham até nós, no seio da fração, prestava-nos um grande apoio.

Além disso, era um glorioso companheiro, pois atuava em todas e quaisquer questões particulares de nossas vidas.

Conviver com ele, em um mesmo quarto, proporcionava-me grande satisfação, de modo que vim a acostumar-me com sua presença ...

 

Sem embargo - parece-me que este fato ocorreu no fim de janeiro ou no início de fevereiro daquele mesmo ano de 1913 -, o síndico do nosso prédio dirigiu-se a mim e, tendo-me chamado no corredor, afirmou que possuía uma informação sobre o fato de que, em meu quarto, encontrava-se morando uma pessoa não registrada.

No pátio do prédio, haveriam surgido agentes secretos da Polícia Czarista, os quais – presumivelmente – “estariam procurando pelo seu companheiro”.

Segundo o parecer do síndico, se o viessem a prender :

 

“ - ... tanto o Sr. como eu teremos de responder à Polícia por quem permitiu que seu companheiro residisse aqui, sem qualquer registro ou autorização.”

 

Respondi ao síndico do prédio que não tinha de se meter na questão de saber quem estava vivendo em meu quarto.

Porém, tão logo o síndico partiu, eu mesmo, dando-me conta de que a questão oferecia ameaças para J. M Sverdlov, no sentido de poder levar à sua prisão imediata, convoquei, instantaneamente, uma reunião de todos os deputados de nosso grupo de seis.

Tendo sido realizada essa reunião com a própria presença de Jakob Mikhailovitch, adotamos a decisão de transferí-lo para o quarto do companheiro deputado Manilovsky.

 

Na tarde desse mesmo dia, quando, no pátio, já havia escurecido, nele penetramos, em grupo, escoltando Jakob Mikhailovitch por todos os lados.

Aproximamo-nos, em conjunto e em massa, da parte traseira do pátio, que dava para uma cerca de madeira, situada perto do Rio Neva.

Em conformidade com a conversa que tivéramos anteriormente, a essa altura já devia encontrar-se esperando do lado de fora, Malinovsky, acompanhado de um cocheiro.

Como se sabe, Malinovsky era um agente secreto de espionagem da Okhrana (i.e. Polícia Secreta Czarista), porém apenas muito posteriormente viria a ser desmascarado. 

De todo modo, naquela ocasião, ajudamos Jakob Mikhailovitch a pular a cerca.

A seguir, ele e Malinovsky partiram juntos, em direção ao quarto desse último.

 

Depois disso, os agentes secretos da Polícia Czarista desapareceram.

Jakob Mikhailovitch, tendo vivido alguns dias na habitação de Malinovsky, foi novamente trasladado, em 10 de fevereiro desse mesmo ano, para o quarto do companheiro deputado Petrovsky.

Por essa época, vieram também a chegar a Petersburgo a esposa de Sverdlov, K. T. Novgorodtseva-Sverdlova, em companhia de seu filhinho.

 

Porém, já na noite do dia seguinte, surgiu a Polícia, no quarto de Petrovsky, efetuando a prisão de todos os três : de Jakob Mikhailovitch, de Novgorodtseva-Sverdlova e de seu filhinho.

Nessa ocasião, a Polícia Czarista não concedeu nenhuma atenção nem aos protestos de Petrovsky nem à sua declaração de que era deputado da Duma do Estado.

Nem sequer lhe permitiu que tivesse acesso ao telefone, no momento em que pretendeu comunicar-se com autoridades competentes, a fim de tratar sobre a violência policial completamente arbitrária, então desencadeada em seu domicílio.

 

Precisamente já no dia subseqüente, provocamos um grande alarde na Duma do Estado, por causa do acontecimento em tela.

Nos dias a seguir, nossa fração parlamentar apresentou também ao plenário da Duma do Estado uma Interpelação sobre a Violação da Imunidade Pessoal e Residencial do Deputado Petrovsky.     

No momento da apreciação desse requerimento, teve lugar um grande escândalo.

Em favor da interpelação, intervieram Petrovsky e Schagov.

Esse último vivia no mesmo quarto de Petrovsky.

Durante o discurso de Schagov, em cujo contexto, entre outras coisas, assinalou que vivia, efetivamente, juntamente com Petrovsky, no interior do mesmo quarto, Purischkevitch gritou :

 

“- Essa história está com jeito de prostíbulo !”

 

Após essa intervenção de vândalo do líder dos Cem-Negros, fizemos o maior estrondo.

Passaram para o nosso lado os socialistas-populares (trudoviques) e, logo a seguir, até mesmo os constitucionais-democratas (cadetes),  seguidos dos progressistas.

Contra Purischkevitch, ouvia-se, a partir de todos os lados estes clamores :

 

“- Vamos espancar esse vândalo, progromista !!!

 

“ - Expulsem-no daqui ou nós mesmos vamos expulsá-lo!!!”

 

Tchkheidze gritava :

 

“- Espião !!! Mercenário !!!”

 

O presidente da sessão conclamava insistentemente à ordem.

Porém a celeuma intensificava-se cada vez mais.

Muitíssimos deputados levantaram-se dos seus assentos e, em meio à grande balbúrdia, não reparei como, de alguma maneira, vim a chegar na rampa, diante da própria tribuna parlamentar.

Por todos os lados e também por detrás de mim, situavam-se, em massa, fortemente exaltados, meus companheiros sociais-democratas, socialistas-populares (trudoviques) e alguns constitucionais-democratas (cadetes).

No momento seguinte, emergiu, repentina e faticamente contra mim, a figura gigantesca do conhecido dirigente da direita, chamado Markov II.

De modo inesperado, surgiu, na sua retaguarda, a massa de seus adeptos ideológicos, composta, na sua maioria, por tipos robustos, barrigudos e gordurosos.

Apenas Markov II demonstrava estar em condições de intervir para valer em uma pancadaria.

Porém, figurava feito um adversário posicionado à espera dos eventos, de maneira inteiramente tranqüila.

O alarde e a gritaria aumentava, cada vez mais, e o som ininterrupto do sininho do presidente em nada ajudava.

A atmosfera da sala da sessão parlamentar contagiava, tanto mais intensamente quanto mais se prolongava.

Tornou-se inteiramente evidente que a confrontação física se aproximava.

Eis que, nesse momento, os seis imponentes policiais da Duma do Estado, convocados pelo presidente da sessão, precipitaram-se sobre a rampa da tribuna, postando-se entre os dois lados inimigos.

Começaram a confabular especialmente com os mais excitados - entre esses ouvia-se a voz de Miliukov – e também com os mais antigos, visando a reintroduzir a tranqüilidade, antes reinante.

Gradativamente, a calmaria retornou à sala e os deputados começaram a, silenciosamente, retomar os seus assentos.

A rampa situada diante da tribuna parlamentar foi evacuada e o presidente da sessão obteve, então, a possibilidade de falar.

Propôs que Purischkevitch e Tchkheidze fossem suspensos por uma sessão, por causa de seus comportamentos.

Em seu discurso de esclarecimento, Purischkevitch, contemplando seu relógio de algibeira, declarou, cinicamente:

 

“- Vocês estão suspendendo-me da sessão, mas não vou perder nada com isso, mesmo porque não está fazendo nem uma hora que acabei de almoçar.”

 

A proposta do presidente do sessão foi acolhida e Purischkevitch deixou a sala.

Tchkheidze declarou, em seu discurso de esclarecimento, que, na opinião de todos nós, Purischkevitch era um membro da Okhrana (i.e. a Polícia Secreta Czarista), um espião e mercenário, havia mais de cinco anos, sendo que disso ele apenas se orgulhava.

Entretanto, observou Tchkheidze que, caso sua expressão houvesse chocado os deputados presentes, estaria disposto a abandonar a sessão.

Tchkheidze não foi excluído, no curso da primeira votação, senão apenas posteriormente, mediante recontagem dos votos.

Saiu da sessão, abandonando-a pela porta lateral, e também permaneceu suspenso por uma sessão.

Esse incidente foi muito marcante : nossa interpelação acabou sendo acolhida e a Duma do Estado passou para o seu “emaranhado” tema subseqüente.

 

Apesar de todo o escândalo que orquestramos na Duma da Nobreza Latifundiária, por causa da violação das leis sobre a imunidade pessoal dos deputados, emanadas em nome dos próprios poderes czaristas, o destino de Jakob Mikhailovitch já se encontrava decidido, àquela altura.

Logo depois dessa ocorrência, foi deportado, por ordem administrativa, pelo período de cinco (5) anos, para a distante região siberiana de Turukhansk.

A partir desse momento, em decorrência de minuciosa espionagem efetuada por parte da Okhrana em nossa correspondência epistolar, veio nossa fração operária da Duma do Estado a perder, quase inteiramente, todas as possibilidades de comunicação com Jakob Mikhailovitch, até o momento em que nós próprios, membros da fração operária social-democrática da IV Duma do Estado, fomos encarcerados pelo Governo Czarista.

Após sete meses de enclausuramento em prisão, fomos sentenciados pelos Tribunais Czaristas ao exílio perpétuo, na Sibéria.

Assim, também todos nós acabamos indo para a região siberiana de Turukhansk.

Nossa chegada a essa região ocorreu no dia 5 de julho de 1915, segundo o calendário de velho estilo.

 

Depois de uma viagem de um mês, realizada por etapas, de Petersburgo a Turukhansk, através da Estrada de Ferro Siberiana e do Rio Enissei, precisamente em 5 de julho de 1915, quando o sol siberiano inclinava-se já para o ocidente, após os dias abrasadores do verão, começou nosso navio a aproximar-se da margem superior na qual espraiva-se a aldeia siberiana de Monastyrskoe.

Em Monastyrskoe, havia uma igrejinha branca, uma escola, uma administração policial, um hospital, uma prisão, algumas dezenas de casas de madeira e algumas choupanas adicionais (palhoças de mongóis nômades).

Nosso navio ainda mal havia ancorado, quando da margem zarpou um barco, rumando em nossa direção.

Neste, encontrava-se sentado uma pessoa que remava, rapidamente.

Logo reconhecemos nessa pessoa a figura de J. M. Sverdlov e começamos a fazer-lhe acenos, com nossos próprios bonés de prisioneiros.

Em resposta a nossos gestos, Sverdlov começou a balançar no ar uma panelinha.

Dentro de um minuto, o seu barco já se encontrava bordejando o navio em que estávamos.

Dele se levantando, Jakob Mikhailovitch adentrou, então, em nossa embarcação.

Pela ordem, fomos-lhe dando fortes e apertados abraços, ao mesmo tempo em que dizia :

 

“Vocês concluiram bem, muito bem, um de seus ciclos de trabalho, colocados a serviço da revolução.

Agora, vamos acomodar-nos nesse barco aí adiante, pois rumaremos para o novo local em que irão habitar.” 

     

Ao atracarmos à margem, constatamos que os nossos companheiros ali exilados haviam vindo encontrar-nos com brados de saudação.

Cumprimentamo-lhes a todos.

Momentos depois, pusemo-nos a subir uma montanha, dirigindo-nos à habitação de Jakob Mikhailovitch. 

Era uma casinha de madeira, com teto baixo, dotada de quatro janelas, um quarto e uma cozinha.

Nela, já se alojavam Jakob Mikhailovitch, sua esposa, K. T. Novgorodtseva-Sverdlova, e seus dois filhinhos.

Seguindo-nos, ingressaram na casinha também diversos trabalhadores exilados.

Formularam-nos perguntas sobre o nosso processo judiciário, as nossas “etapas de viagem” etc.

Quanto a nós, informamo-nos sobre a vida do exílio, os companheiros conhecidos etc.

Feito isso, nossa conversação versou os candentes temas da atualidade, prolongando-se por um longo tempo.

 

Em caráter provisório, alojei-me na habitação de Jakob Mikhailovitch.

Os demais companheiros, que comigo haviam chegado, instalaram-se nas casinhas de outros exilados.

Assim, teve início nossa vida de “exiliados, forçosamente assentados.”

Durante todo o tempo de nossa estadia na aldeia siberiana de Monastyrskoe, permanecemos inseparavelmente ligados a Jakob Mikhailovitch.

Com o seu espírito permanentemente entusiasmado, acalentava, em nossas mentes, a crença invariável e firme no êxito contíguo  da revolução, aliviando em todos nós, desse modo, as severidades dos dias de exílio.

Logo depois, eu e outros dois companheiros, i.e. os companheiros Schagov e Badaiev, assentamo-nos na vizinhança de Jakob Mikhailovitch, passando a ter a possibilidade de avistarmo-nos com ele, por diversas vezes, quotidianamente.

Montando o cavalo de nosso vizinho siberiano, o próprio Jakob Mikhailovitch saía para providenciar a água de beber junto ao Rio Enissei - visto que não havia nenhuma bica de água na localidade onde nos encontrávamos – e, juntamente com K. T. Novgorodtseva-Sverdlova, utilizava a  estação meterológica.

O mês de julho de 1915 foi quente e seco.

Todos nós permanecíamos, durante o dia inteiro, ao ar livre.

Após um prolongado encarceramento, seguido de uma viagem extremamente cansativa, realizada por etapas, sentíamo-nos bastante esgotados e descansávamos.

Começávamos, porém, a pressagiar coisas macabras, quando especulávamos com a idéia do longo inverno de Turukhansk, que se aproximava.

Era composto por aproximadamente 10 meses, castigados por 60 graus centígrados abaixo de zero ou, às vezes, até mesmo mais.

A presença de Jakob Mikhailovitch fazia, entretanto, dispersar, muito rapidamente, esse pensamento lúgubre e, no final das contas, já me estava resignando com o advento do rigoroso inverno que surgia pela frente e com todas as complexas circunstâncias existenciais da floresta selvagem da Sibéria Setentrional.

Assim, comecei bem a preparar-me para os tempos de forte temperatura negativa.

Adotamos algumas medidas relacionadas com a procura de um alojamento mais quente, visto que o quarto em que vivíamos estava prestes a desabar.

Durante o inverno – tal como nos informaram os habitantes daquela região –, ficaria, realmente, extremamente frio.

Porém, no fim do mês de agosto, chegou de Petersburgo uma ordem, determinando a imediata trasladação de todos nós, deputados, bem como de todos aqueles que estavam sendo conosco processados, i.e. Lev B. Kamenev, Lind, Yakoblev e Voropin, para a região de Yalanskoe, a cerca de 35 quilômetros da cidade de Enissei e a cerca de 1.000 quilômetros ao sul de Turukhansk.

 

Tivemos, assim, de nos separar de Jakob Mikhailovitch Sverdlov.

Foi triste essa separação.

Ao acompanhar-nos até o local de nossa partida, Jakob Mikhailovitch encontrava-se, porém - tal como sempre e invariavelmente -, muito vigoroso.

Exprimiu sua inteira confiança no fato de que em breve nos reencontraríamos, na Rússia, no quadro de circunstâncias mais favoráveis.

Como se sabe, os acontecimentos subseqüentes vieram a demonstrar que tinha razão e, em menos de dois anos, todos nós já nos encontrávamos na Rússia.

 

Recordo-me ainda de algumas vezes, em que me ocorreu de tratar com Sverdlov, por ocasião de sua atuação como Presidente do Comitê Executivo Central dos Sovietes de Toda a Rússia(VTsIK) e membro do Bureau do Comitê Central do Partido Comunista Russo – Bolchevique (TsK RKP – б).

A primeira destas, foi em Moscou, no quadro do III Congresso dos Sovietes de Deputados Trabalhadores, Soldados e Camponeses, que teve lugar entre os dias 10 e 18 de janeiro de 1918.

Parece-me que esse último teve lugar no prédio do Instituto Politécnico.

Cheguei, naquela ocasião, a Moscou, para intervir no Congresso dos Comissários do Trabalho, na qualidade de Comissário do Trabalho de Ivanovo-Voznesenk.

Nosso congresso encerrou-se, porém, precisamente no momento da abertura do III Congresso dos Sovietes.

Por isso, antes de retornar a Ivanovo-Voznesenk, tive vontade de dar uma boa olhada no congresso em destaque.

Assim, encontrei-me com G. D. Schklovsk e, em sua companhia, dirigi-me ao prédio do Instituto Politécnico, onde ocorreria a abertura do congresso.  

Quando ingressamos no prédio, a maioria dos deputados já havia adentrado o salão, onde ocorreriam as sessões congressuais.

O companheiro Schklovsk possuía uma credencial para ingressar no salão em foco, ao passo que eu não dispunha de nenhuma.

Penetrando no recinto, Schklovsk foi logo procurar Sverdlov, o qual se achava em meio aos delegados.

Minutos depois, Jakob Mikhailovitch havia-me introduzido no salão das sessões do congresso.

Após termo-nos cumprimentado, trocamos algumas palavras sobre os temas da atualidade de então.

A despeito de toda a dificuldade que aquele momento político nos oferecia, Sverdlov encontrava-se vivaz e, até mesmo, contente.

Presentemente, já não mais me recordo, precisamente, do conteúdo de nossa conversação, porém as palavras de Sverdlov irradiavam a convicção de que lutaríamos até o fim, bem como a crença em nossa vitória final.

Logo a seguir, procedeu-se à abertura do III Congresso dos Sovietes.

Presenciando a sua primeira sessão solene, tive a possibilidade de observar com que tato e arte notáveis Sverdlov, situado na sua presidência, veio a dirigí-la.

Com extraordinária capacidade e sempre impedindo, tempestivamente, em cada uma das questões em pauta, todo e qualquer desnorteamento, Sverdlov direcionava as discussões para um curso corretamente definido.

Não permitia que prolongadas intervenções estreitassem e complicassem as questões em análise.

Poupava tempo, intensamente, e facilitava os trabalhos congressuais.

 

Vim a observar, posteriormente, esse mesmo fenômeno, por diversas vezes e ainda em maior grau, ao comparecer nas reuniões do Comitê Executivo Central dos Sovietes de Toda a Rússia (VTsIK).

Quando Sverdlov pressentia, por exemplo, que uma questão qualquer, tratada em uma das reuniões, havia já se tornado suficientemente clara, erguia sua grandiosa voz metálica, logo após o encerramento da intervenção de um membro qualquer do Comitê Executivo Central dos Sovietes de Toda a Rússia(VTsIK), para dizer :

 

“- Há uma proposta para que encerremos os debates !

Alguma objeção ?

Proposta acolhida !”

  

Há alguns meses antes de sua morte, recebi de Jakob Mikhailovitch a autoridade para comandar a realização de um trabalho revolucionário na Ucrânia.

A formalização desse ato teve lugar no Kremlin, em seu gabinete, no mês de janeiro de 1919.

Entregando-me em mão o respectivo certificado em causa, afirmou :

 

“- Viaje para a Ucrânia.

Lá, existe agora um trabalho de confrontação colossal.

Presentemente, os nossos já estão conduzindo, em Belgorod, uma vitoriosa luta contra os invasores, sendo provável que, em breve, terão acertado contas com eles.”

 

Estava-me preparando já para viajar para Belgorod, quando no cair daquele mesmo dia, em que se daria a minha partida, viemos a saber que a cidade de Kharkov havia sido tomada pelos nossos exércitos,

Nos dois dias seguintes, Kharkov foi depurada dos assediadores, adeptos do caudilho Gaidamak.

Entre os ucranianos, porém, nada se encontrava em boa ordem.

A assim chamada Corrente de Esquerda”, encabeçada por Pyatakov e outros, intervinha, então, por toda a Ucrânia.

Em diversas questões, subsistiam divergências bastantes profundas.

 

Em março de 1919, J. M. Sverdlov compareceu à Conferência do Partido, convocada para realizar-se na cidade de Kharkov, na Ucrânia.

Encontrei-o em uma das sessões dessa conferência.

Nela, tal como de costume, Jakob Mikhailovitch pronunciou algumas palavras acerca da situação política.

Deu-nos prova, então, mais uma vez, de sua antiga animação e de sua habitual vivacidade.        

Porém, ante mim, sua face surgia marcada por um forte cansaço e, além disso, despida de uma particular alegria.

Presentemente, já não mais me recordo da ordem do dia da conferência em tela e tão pouco de como precisamente transcorreram os debates.

Em seu seio, porém, a presença de Sverdlov, intervindo na qualidade de dirigente dos trabalhos, era sentida de modo muito nítido, de modo que os debates e as resoluções foram processadas, em geral, de modo positivo.

Ainda fazia, então, clima de inverno.

Sem embargo, Sverdlov achava-se vestido apenas com uma dessas jaquetas curtas quaisquer que vão apenas até a parte superior do joelho, calçando umas botas de couro e ... nada mais.

 

Esse foi o meu último encontro com ele.

Logo após a conferência partidária retro-mencionada, recebemos uma inesperada notícia de Moscou, informando-nos sobre a morte de Jakob Mikhailovitch Sverdlov ...

 

EDITORA DA ESCOLA DE AGITADORES E INSTRUTORES

“UNIVERSIDADE COMUNISTA REVOLUCIONÁRIA J. M. SVERDLOV”

PARA A FORMAÇÃO, ORGANIZAÇÃO E DIREÇÃO MARXISTA-REVOLUCIONÁRIA

DO PROLETARIADO E SEUS ALIADOS OPRIMIDOS

MOSCOU - SÃO PAULO - MUNIQUE – PARIS

 



[1] Cf. SAMOILOV, FIEDOR NIKITITCH. Vospominania Rabothevo Deputata, Tchelena IV Gosudarstvennoi Dumy, o Y. M. Sverdlova (Recordações de um Deputado Trabalhador, Membro da IV Duma do Estado sobre J. M. Sverdlov), in : Yakov Mikhailovitch Sverdlov. Sbornik Vospominanii i Statei (Jakob Mikhailovitch Sverdlov. Coletânea de Recordações e Ensaios), ed. ISTPART : Otdel TS.K.R.K.P.(b.) po Izutcheniiu Istorii Oktiabrskoi Revoliutsii i R.K.P.(b.), Leningrad : Gosudarstvennoe Izdatelstvo Leningrad, 1926, pp. 128 e s.