PRODUÇÕES LITERÁRIAS DEDICADAS À FORMAÇÃO

DE REVOLUCIONÁRIOS MARXISTAS QUE ATUAM NO DOMÍNIO DO DIREITO, DO ESTADO E DA JUSTIÇA DE CLASSE

 

KARL MARX E FRIEDRICH ENGELS SOBRE O DIREITO E O ESTADO, OS JURISTAS E A JUSTIÇA

 

Direito Civil Romano, Aparência de Liberdade e Dominação de Povos Estrangeiros :

 

O Principado de Augusto é Merecidamente

Enumerado entre as Épocas mais Auspiciosas

do Estado Romano?

 

KARL MARX[1]

 

Concepção e Organização, Compilação e Tradução

Emil Asturig von München, Novembro de 2004

 

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Àquele que investiga como foi a época de Augusto, oferecem-se muitas coisas a partir das quais se pode julgar.

Em primeiro lugar, a comparação com as outras épocas da história romana, pois, demonstrando-se que a época de Augusto foi similar às épocas precedentes, denominadas auspiciosas - tendo sido, porém, dissimilar àquelas nas quais, segundo o julgamento dos contemporâneos e dos modernos, os costumes transformaram-se e degradaram-se, o Estado fracionou-se em partidos e, na guerra, derrotas tiveram de ser sofridas -, pode-se, a partir daí, conjecturar-se acerca da época de Augusto.

A seguir, deve-se investigar o que os próprios antigos disseram sobre ela, o que os povos estrangeiros opinaram sobre o Império, se o temiam ou desdenhavam, por fim, porém, como se comportaram as artes e as composições literárias.

Nada obstante, a fim de não me prolongar mais do que o necessário, compararei a belíssima época, havida antes de Augusto, na qual se estabeleceram, afortunadamente, a simplicidade dos costumes, as aspirações pela virtude, a integridade dos magistrados e do povo - época essa, em que a Itália do Sul foi subjugada -, com aquela de Nero, a mais miserável de todas.       

Em nenhum outro momento, os romanos se arredaram mais da ocupação com as belas artes do que na época das Guerras Púnicas, posto que, nela, a erudição foi minimamente apreciada, de vez que os homens mais expressivos de então empregavam seus esforços e trabalhos sobretudo na agricultura. A retórica tornou-se supérflua, pois se falava com poucas palavras sobre aquilo que se fazia, sendo que era valorizado não a elegância do discurso, mas sim o vigor das sentenças. A história não carecia, entretanto, da retórica, posto que apenas relatava ações realizadas e compunha-se meramente da redação de Anais.

Porém, essa época inteira foi preenchida pela luta travada entre patrícios e plebeus, pois, desde o banimento dos reis até a Primeira Guerra Púnica, disputou-se pelo Direito de uns e de outros (EvM.: no original “de utriusque jure certatur”), sendo que uma grande parte da história refere apenas leis que os tribunos ou cônsules produziam, com grande contenda, para ambos os lados (EvM.: no original “leges tantum referet, quas tribuni aut consules, magna utrimque cum contentione, fecere.)

Já discorremos sobre aquilo que, nessa época, há de ser admirado.

Se desejarmos descrever a época de Nero, não careceremos de muitas palavras.

Pois, tendo sido assassinados os melhores cidadãos, sob o vil arbítrio reinante, violadas as leis, incendiada a cidade de Roma, temendo os comandantes provocarem agitações com suas ações bem empreendidas e não havendo o que os estimulasse a realizar grandes feitos, desejando eles a glória, muito mais pela celebração da paz do que pela declaração da guerra, quem é que perguntaria, ainda, como teria sido a época de Nero ?

Que a época de Augusto foi distinta da de Nero, ninguém poderá disso duvidar, pois sua dominação foi caracterizada pela clemência, ainda que toda a liberdade dos romanos  - e, até mesmo, toda e qualquer aparência de sua liberdade - tenha desaparecido, na medida em que as ordens do Príncipe podiam modificar institutos e leis (EvM.: no original “iussis principis instituta legesque mutare), sendo que todas as prerrogativas e honrarias, anteriormente possuídas pelos tribunos do povo, censores, cônsules, passaram a ser exercidas, agora, por um único homem. Nada obstante, os romanos acreditavam que ainda governavam, sendo o Imperador apenas um outro nome para as atribuições de poder que, antes, haviam possuído os tribunos ou cônsules. Não se aperceberam de que a liberdade lhes havia sido tomada.

Porém, trata-se já de uma grande prova de clemência quando os cidadãos podem ter dúvidas sobre quem é o Príncipe, se eles mesmos governam ou se eles mesmos são governados.

Na guerra, os romanos nunca foram, porém, mais venturosos, pois os partos foram subjulgados, os cántabros, derrotados, os retos e os vindelicos, aniquilados.

Contudo, os germanos, os inimigos mais irritantes dos romanos, em vão combatidos por César, venceram os romanos, em verdade, em lutas isoladas, mediante traições, perfídias, valentias e florestas.

Porém, em seu conjunto, o poder de muitos povos germânicos foi quebrado através do Direito Civil Romano que Augusto detalhadamente outorgou, através de guerras que experientes marechais de campo contra eles conduziram e através da discórdia, despertada entre eles mesmos.

Portanto, não se pode comparar a época de Augusto, seja na paz, seja na guerra, com aquela de Nero e com a de dominadores ainda piores.

Os Partidos e as disputas registradas antes da Guerra Púnica deixaram de existir então, pois vemos que Augusto unificou em si mesmo todos os Partidos, todas as dignidades e todo o poder, sendo que, conseqüentemente, o Império não podia em si resultar desunido, fenômeno esse que a todo Estado propicia o maior dos perigos, por reduzir, nomeadamente, sua autoridade em face de povos estrangeiros e fazer com que os negócios do Estado sejam impulsionados muito mais para a satisfação das ambições pessoais do que o bem dos cidadãos.

De tal maneira, a época de Augusto não pode tanto nos iludir, de modo a deixarmos de ver que, então, muitas coisas houve de menos valia. Pois, se os costumes, a liberdade, o sentimento de dever foram prejudicados ou mesmo eliminados, enquanto a avareza, a dissipação e a licenciosidade dominaram, não se pode designar essa época, em si mesma, como tendo sido auspiciosa.

Entretanto, a dominação de Augusto, as instituições e as leis dos homens que ele escolheu levaram a que o Estado arruinado fosse conduzido a uma melhor situação, de tal sorte que o caos provocado pela Guerra Civil chegou ao fim.

P.ex., em relação ao Senado, no qual homens extremamente corruptos haviam penetrado, vemos que Augusto limpou-o dos traços de inatividade, na medida em que afastou muitos cujos costumes eram-lhe odiosos, acolhendo aqueles que eram caracterizados por sua competência e sagacidade.

Sob o Principado de Augusto, sempre serviram ao Estado homens de capacidade e inteligência extraordinárias, pois quem poderia mencionar homens desse tempo mais expressivos do que Maecenas e Agrippa!

Apesar de jamais podermos contemplar a própria atitude do Príncipe livre de seu manto de hipocrisia, não parece ter Augusto – como já assinalado – usurpado do seu poder, ao acobertar o poder odiado com uma aparência de clemência.

E, se o Estado, tal como existente antes das Guerras Púnicas, era, para aquele tempo, o mais apropriado, porque instigava à realização de grandes ações e produzia homens que aterrorizavam os inimigos, porque provocava uma nobre disputa, travada entre patrícios e pebleus – que, nem sempre, foi despida de malevolências -, parece-me, que, em todo o caso, o Estado, tal como instituído por Augusto, foi o mais adequado para o seu tempo.

Pois, se os seres humanos entibiaram-se, tendo-se perdido a simplicidade dos costumes, avolumando-se, porém, o Estado, pode, então, um Autocrata propiciar liberdade ao povo melhor do que uma República pode fazê-lo.

Passemos, agora, para o julgamento dos antigos acerca da época de Augusto ?

Por eles, Augusto era chamado de divinal e consideravam-no não como um ser humano, senão muito mais como um Deus.

Isso não poderia ser afirmado apoiando-se apenas sobre Horácio.

No entanto, também o extraordinário historiador Tácito fala sempre de Augusto e de sua época com a máxima reverência, grande admiração e, até mesmo, amor.

Ciências e artes não floresceram com maior intensidade, em nenhuma outra época, posto que, nessa, viveram muitíssimos escritores a partir dos quais, tal como de uma fonte, todos os povos produziram a sua cultura.

Sendo assim, porque o Estado parece ter sido bem organizado, ao pretender o Príncipe proporcionar bem-estar ao povo, porque, em virtude de sua provocação, os melhores homens detiveram ofícios públicos, porque, ainda, a época de Augusto não recua para trás dos melhores períodos da história romana e surge, porém, distintamente em relação às piores épocas, porque Partidos e litígios desapareceram, florescendo, porém, as artes e as ciências, há de enumerar-se, merecidamente, o Principado de Augusto entre as melhores épocas, cabendo-se admirar o homem que, apesar de tudo poder-se permitir, teve em vista apenas o bem do Estado, depois da conquista de sua dominação.

 

EDITORA DA ESCOLA DE AGITADORES E INSTRUTORES

“UNIVERSIDADE COMUNISTA REVOLUCIONÁRIA J. M. SVERDLOV”

PARA A FORMAÇÃO, ORGANIZAÇÃO E DIREÇÃO MARXISTA-REVOLUCIONÁRIA

DO PROLETARIADO E SEUS ALIADOS OPRIMIDOS

MOSCOU - SÃO PAULO - MUNIQUE – PARIS

 

 

 

 

 

 

 



[1] Cf. MARX, KARL HEINRICH. An Principatus Augusti Merito Inter Feliciores Reipublicae Romanae Aetates Numeretur? (O Principado de Augusto é Merecidamente Enumerado entre as Épocas mais Auspiciosas do Estado Romano? Redação em Língua Latina) (15 de Agosto de 1835), in : Marx und Engels Gesamtausgabe MEGA (Obras de Marx e Engels: Edição Completa MEGA), Seção I, Vol. I, Berlim : Dietz Verlag, 1975, pp. 440 e s.  Anotação de Emil Asturig von München: O presente texto, traduzido agora para a língua portuguesa, foi redigido por Marx em Trier, por ocasião de seu exame de língua latina, prestado junto ao Ginásio Prussiano Friedrich-Wilhelm, cuja direção educacional era exercida por jesuítas. A primeira publicação desse texto em língua latina foi efetuada por GRÜNBERG, CARL. Marx als Abiturient (Marx como Estudante do Segundo Grau), in: Archiv für die Geschichte des Sozialismus und der Arbeiterbewegung (Arquivo para a História do Socialismo e do Movimento dos Trabalhadores), Ano XI, Leipzig, 1925, pp. 437 e s. A avaliação desse exame de Marx, realizada pelos Profs. Wyttenbach e Loers foi a seguinte: “Praeter ea, quae suis locis adnotavimus, et plura menda inprimis versus finem, et argumenti tractatione probataque in ea cognitione historiae, et Latinitatis studio in universum non contemnenda scriptura. Verum quam turpis litera !!!” No vernáculo : “Além daquilo que assinalamos, nos lugares respectivos, e dos diversos erros, sobretudo registrados ao fim da tratação dos argumentos, trata-se, em seu conjunto, de um trabalho respeitável, seja pelos comprovados conhecimentos da história, seja pelo esforço de expressar-se em bom latim. Mas, que letra vergonhosa !!!”